27.4.10

UMA COMISSÃO EM TEMPOS SOMBRIOS


Há muito tempo que não concordava com o dr. Mário Soares. É evidente que jamais partilharei do seu optimismo antropológico, genético, ou da forma babada com que defende o parlamento português como se aquilo fosse exemplo para alguém. Também o desvelo com que encara Sócrates - depois de incialmente o ter entrevisto como ele na realidade é - só o diminui numa história pessoal e política que não precisa de insignificâncias contingentes como ele. Dito isto, Soares tem razão acerca da famosa comissão de inquérito presidida por Mota Amaral. Só ontem, ao assistir a um pouco daquilo em directo, percebi a vacuidade do exercício em tempos sombrios para um país com muito mais para fazer.

«Acho [as comissões] fastidiosas e inúteis. (...) Primeiro, os deputados-inquisidores que participam na comissão são na sua maioria jovens, portanto, com pouca experiência, salvo, obviamente, algumas excepções (...) Mota Amaral - que é um político lúcido, experiente e, do seu natural, prudente e moderado -, também começa a sentir-se desconfortável na posição em que se encontra. O que é que resultou até agora de positivo - depois de tantas intermináveis audiências - para o progresso da justiça e para um melhor conhecimento dos factos alegados pelos acusadores? Alguém é capaz de responder, com objectividade? Não creio. Mas há uma coisa que julgo não poder evitar-se, depois de tantas horas de audiência: o desinteresse do público e o desprestígio dos deputados participantes (ao contrário da publicidade que julgam merecer) e do Parlamento, que lhes cumpre, em princípio, defender. Por isso, apoiei a decisão do primeiro-ministro de não comparecer na comissão.»

9 comentários:

Anónimo disse...

Uma comissão que faz de conta que escutas legais e públicas não existem é uma coisa extraordinária, ainda por cima depois de na Quadratura do Círculo o representante do PS se referir à inocência de Sócrates com base numa dessas escutas, feita depois de já saberem que estavam a ser escutados.

Ana Gabriela A. S. Fernandes disse...

João
Penso ser esta a 1ª vez que comento um post seu, e ainda por cima, coincidentemente, logo antes de linkar um post do Portugal dos Pequeninos no meu cantinho... mas francamente, a resistência às Comissões de Inquérito do Dr. Soares é tudo menos inocente...
E digo-lhe mais, aquilo não se frequenta realmente, mas a culpa não é dos deputados. Aquilo não se frequenta por causa de personagens do círculo do Dr. Soares, ele foi e é o mentor de tais criaturas...

Além disso, só nestas Comissões não-frequentáveis é que se vai sabendo a que nível descemos na vida política nacional... e é isso precisamente que o Dr. Soares não quer que se veja e que se saiba... porque ele foi talvez o que mais contribuiu para esta triste situação nacional...
É certo que só a História o poderá concluir, mas esse papel histórico penso que ele já o tem garantido.
Com os meus cumprimentos
Ana http://vozes_dissonantes.blogs.sapo.pt/

Alves Pimenta disse...

Ora, ora. Toda a gente - menos, pelos vistos, o dr. Soares - sabe que o sr. José Sócrates decidiu "não comparecer na comissão", mas usar a faculdade de responder por escrito às perguntas que a mesma lhe faça, apenas porque não tem a coragem, a hombridade e a humildade democráticas necessárias para enfrentar, olhos nos olhos, quem poderia desmascará-lo. Só isso.
Não é ainda desta vez, portanto, que, ao fim de tantos anos, concordo com o dr. Soares.
Quanto à comissão propriamente dita, estamos conversados: antes esta que nenhuma. E, sobre as atitudes do respectivo presidente, como já o conheço bem desde o tempo da "outra senhora", talvez seja melhor esperar para ver...

Anónimo disse...

A galeria de personalidades que tem desfilado e enfeitado as recentes e sucessivas comissões de inquérito é variada, bizarra e reveladora do que é a sociedade. Lá, à espera, já se encontra outra extraordinária coleccção de conchas raras: os deputados. Todos ensaiaram previamente os salamaleques e sabem os respectivos lugares. As indumentárias, apropriadas e previsíveis; assim como a argumentação e as piadas - por vezes demonstrando finura e lucidez pujante. No meio disto tudo sempre se vai sabendo mais qualquer coisa - sobretudo acerca do carácter dos inquiridores e dos inquiridos. Vara esteve ao seu nível. Com rui-boy-soares, mais se confirmou acerca do modo como estes honrados senhores fazem negócios, colocam rapazes, asseguram fidelidades, traçam planos (operação mercúrio...). É, ao mesmo tempo, instrutivo e nauseante. Meu pai, há muitos anos, e ao serviço dos tribunais, fez muitas autópsias e algumas exumações - mas sempre recebia o pequeno extra devido a todos os médicos que se disponibilizassem, à falta de gente do Instituto. Aqui, pagamos para ver.

Ass.: Besta Imunda

Anónimo disse...

Soares é um homem bom, exemplar, e acima de qualquer crítica.

Anónimo disse...

Qual Soares? O Rui-Pedro?

Ass.: Besta Imunda

Anónimo disse...

É urgente "engavetar" alguns inquiridos e alguns inquiridores (as rosas, senhor, as rosas!).

Quanto às opiniões do dr. Soares ... já há muito que não as ouço.

O ex-presidente Soares insurgia-se, com violência, porque o dr. Salazar 'governou' o país durante quarenta anos; um dia destes, o crítico do ditador, vai-nos 'obrigar' a ouvi-lo para além dos cinquenta 'anitos'.

É tempo demais!

Contudo, espero que não se cale para 'dar' voz ao eloquente filho; se assim for ... emigrarei.

Sete estrelas para Ana Gabriela (1:49 pm.)

antónio chulado

Luísa A. disse...

João, é certo que estas comissões não vão fazer luz sobre o seu objecto. Mas têm, a meu ver, duas vantagens: a primeira é de ocupar alguns deputados que, de outro modo, ou não estariam ocupados de todo, ou teriam de se ocupar em coisas talvez menos inócuas para o cidadão comum. A segunda é que me têm proporcionado a mim, nos raros tempos livres – e provavelmente a muitos como eu - interessantes exercícios de análise de perfil psicológico. E feito bastante luz nesse domínio. Uma coisa é ver esta gente na hoje extrema e descontraída irresponsabilidade da sua vida pública. Outra é vê-la numa espécie de «acareação». Torna-se mais fácil perceber quem é quem. O que se deve, também (em parte), à entrega dos interrogatórios aos tais «inquisidores jovens», que ainda não tiveram tempo de apurar as técnicas do artifício político «lúcido, experiente e, do seu natural, prudente e moderado». :-)

Anónimo disse...

Estou completamente d'acordo com o que escreveu a Ana Gabriela sobre essa criatura execrável que se auto-intitula - julga que o pobre povo o considera como tal - o "pai da democracia"(!!!) Coitado dele...
Quanto à comissão d'inquérito, o que ele quer é que aquilo acabe o mais depressa possível não vá lá aparecer alguém sem papas na língua dizer o que não convém nada, mas mesmo nada, sobre as vergonhosas mega fraudes e demais manobras secretas dentro das principais empresas do país com o beneplácito do governo, que se vêm processando há longos anos nas costas deste infeliz povo.

Nota: Quanto às "irrelevantes" comissões d'inquérito, apesar de muitos dos depoentes "não se lembrarem pràticamente de nada" dos negócios nos quais os próprios participaram..., ainda assim e com a ajuda de um ou outro mais afoito, muito já se vai sabendo dos ditos "negócios" e dos maraus que neles participaram de corpo inteiro. E se mais não fora só por isso valem bem a pena.
Maria