14.11.06

LER OS OUTROS

"A tese de Rio foi sempre a de que primeiro está o leite nas escolas e o saneamento, o que me parece sensato. Não se vê bem que famintos e porcalhões possam vir a constituir os futuros espectadores de Beckett ou Sófocles. Mais, o que Rio faz é aprofundar um elemento essencial à cultura: o conflito. Infelizmente truncou-o um pedaço, como veremos adiante. A democratização trouxe um inevitável abismo entre os agentes culturais e o público: do não ter nada ou ter cultura passou-se para ter uma data de coisas - livros idiotas, televisão boa e má, cinema - e ter , ou não, cultura. A velha ideia que obrigava o homem de bem a educar o povo já não faz qualquer sentido."

(continua aqui). Não faria mal ao Ricardo Pais - nem a Rui Rio - ler o Filipe Nunes Vicente, apesar de não ser um indispensável "agente cultural" ou (suponho) um "adepto" do presidente da Câmara.

7 comentários:

Anónimo disse...

Não me parece que a não inter-acção "porcalhões-famintos/Sófocles-Beckett, seja assim tão linear.
Sou do tempo em que meninos e meninas descalços e piolhosos, mas convenientemente separados por género, andavam nas Escolas do Ensino Primário do centro do Porto. Na minha 4.ª classe, de 40 miudas, só 6 fizemos "admissão ao liceu". As outras foram para aprendizas de costura, tomar conta dos irmãos, ajudar os pais na mercearia.
O mundo mudou é certo. Mas nesses piolhosos tempos, faziam-se filas à porta da "Livraria Divulgação" - actual "Leitura", para pedir um autógrafo a Aquilino Ribeiro ou José Régio.
À conta das utopias do "mundo novo", da democracia, do "fim da exploração do homem pelo homem", imaginou-se que todos teriam direito ao lazer, à Cultura. Veio o 25, a dignidade do operariado e dos "trabalhadores". Têm dinheiro agora, muito mais do que o que tinham em tempo de "casas de prego" e "ilhas" insalubres, mas é para futebóis e algarves alarves e buliçosos, e um apartamento em Gaia e dois carros a prestações. Cultura? O tanas!!!Sei de crianças a aprender um instrumento de Música ou outra coisa que não seja karaté, que são segregados pelos borgessos dos colegas, certamente filhos de pais borgessos.
O senhor Rio é vagamente merceeiro. E não tem perfil para autarca de uma cidade onde tocaram, entre outros, Ravel e Rubinstein e que deu e dá ao país os melhores romancistas (Agustina), acolhe grandes poetas (Florbrla,Eugénio), os melhores cineastas (António Lopes Ribeiro, Manoel de Oliveira), os melhores arquitectos (Siza, Souto Moura, Távora), os melhores músicos (Guilhermina Suggia, Helena de Sá e Costa), os melhores pop-tugas (Rui Veloso, Sérgio Godinho),os melhores artistas plásticos (Soares dos Reis, Aurélia de Sousa,Júlio Resende, Alberto Carneiro, Ângelo de Sousa). E grandes compositores e grandes editores e livreiros e grandes ensaistas como Óscar Lopes e António José Saraiva. E em que existe a Cadeia da Relação onde Camilo escreveu "O Amor de Perdição". E o "Colégio da Lapa" onde andou o Eça. E a Foz onde nasceu António Nobre...
Tanto, tanto legado de que um edil merceeiro é indigno, enquanto qualquer Câmara de Alguidares de Baixo, organiza Congressos, Festivais de Música, Prémios Literários...
Para não ir mais longe, Matosinhos, Póvoa de Varzim, Maia, Vila do Conde...
Os projecros culturais, necessitam como quaisquer outros, de orçamentos para convites atempados.
Não é dando o "papel" depois da queca no automóvel, como se faz no mundo do "trottoir".

Anónimo disse...

A propósito de "ler os outros" :

«A história do défice - durante décadas a fio acompanhada da do "empréstimo" - continua, tranquilamente, a ser a história das finanças portuguesas.
Já Rodrigues Sampaio (1806-1882), numa tirada memorável, que apanhava a essência da coisa, clamou perante o parlamento:
"Quase me chego a assustar de que acabe o défice entre nós, com medo de que, acabando ele, acabe o sistema parlamentar"»

bvtana (minha rica casinha)

Anónimo disse...

Quando a cultura descer do pedestal, sim oprque semear batatas também é cultura, aí sim estaremos prontos para a revolução cultural, frase perigosa. Ao "homem de bem" compete acima de tudo fazer o bem, que é aquilo que miutos deles se têm esquecido de fazer, a boçalidade o analfabetismo e a sabujice são próprias de uma sociedade que se deixou degradar, pelo laxismo, pela incúria dos governos, pior pela lenta desmoralização da própria sociedade, que se entregou a joguinhos de poder e guerras de sacristia, estéreis e dispensáveis. Ao invés de Beckett ou Sófocles, Gil Vicente ou Santareno, Viegas ou Frei Amador, Camões ou Junqueiro. Boa semana.

Logros disse...

Muito bem. E o meu aplauso vai também para a "senhora portuense". Relembrando que Sophia e Graça Moura, para além de tantos outros, também cá nasceram.
E as "miudas" que não iam "para os estudos", iam para "criadas", "mulheres-a-dias",cozinheiras, apanhadeiras de malhas, em portais esconsos, lavadeiras, empregadas fabris, aprendizas de balcão ou de cabeleireira e sobretude "sublimes mães" amigadas com "partenaires" zurzidores. Algo semelhantes a muitos hodiernos descendentes."Choldra" queirosiana, de ontem e de hoje.

Este RIO a que estamos votados, foi a consequência de "performances" anteriores de "orientações" impensadas e erros de casting, tipo Gomes e Assis.

Saúde.

isabel mendes ferreira disse...

rios que nunca chegam ao mar: da sabedoria!


__________________


bom dia!


__________________

e assim é um prazer seguir os links da Vida Involuntária.

__________________

obrigada.

Anónimo disse...

"Pãozinho, senhores do surrealismo" - gemia o Luís Pacheco há uma catrefa de anos.

O Rio bem que podia parafraseá-lo, dizendo "Leitinho, senhores do pós-modernismo". se ele soubesse do que se trata...

Anónimo disse...

Tri-parolos!!!