31.7.07

CHUMBADA


Foi dolorosa, pareceu-me, a prestação da ministra da Educação no Parlamento. Quando penso em alguns nomes - deste e do outro regime - que a antecederam no cargo, pior é praticamente impossível. Maria de Lurdes até nem tinha começado mal. Depois perdeu-se por causa de querer meter o professorado todo no mesmo saco de gatos. A seguir demonstrou que, afinal, o "monstro" acéfalo da 5 de Outubro permanecia, inerme, no alegre fomento da idiotia nacional logo a partir da idade do bibe. Os episódios sucessivos com os exames nacionais são dignos do Burundi e não de um país que preside à União Europeia. Finalmente, a ministra caiu na esparrela de ir ao Parlamento defender um processo administrativo indefensável, com um argumentário tosco que algum assessor lhe pôs à frente dos olhos. Tentou a dialéctica e a técnica do ovo e da galinha. Insulto? Processo? Processo? Insulto? O que é mais grave? Se era assim tão grave, punisse e não arquivasse. Era intelectualmente mais honesto do que a conversa que manteve com os deputados sobre o assunto. Isto para não falar da triste figura dos deputados do PS que usam a cabeça como tapete para o governo limpar os pés. Maria de Lurdes é uma estrela cadente deste governo. Se ainda não percebeu isso, vai a tempo de meter explicador. Nem sequer precisa de exame nacional. Está chumbada.

GOVERNO MENOS MÁRIO LINO

E se, para além da fórmula correcta "Portela mais um", se introduzisse outra que decorre da primeira, "governo menos Mário Lino"?

O SENTIMENTO DE DIGNIDADE PRÓPRIA

"Há coisas e pessoas a quem não se responde por um sentimento de dignidade própria: eu não responderei (...). Há pessoas que desconhecem que pode haver na alma dos outros coisas inolvidáveis e sagradas que a gente esconde cuidadosamente das vistas dos tolos e dos maus, porque não podem compreendê-las nem são capazes de senti-las."


in Oliveira Salazar, "A minha resposta (no processo de sindicância à Universidade de Coimbra)", Inéditos e Dispersos - I - Escritos Político-Sociais e Doutrinários (1908-1928), Bertrand Editora

DE COSTA A CONTRA-COSTA


Por falar em dr. Costa, parece que se estreia amanhã como presidente da Câmara de Lisboa. E parece que fará "maioria" com a "esquerda" da esquerda, com o sr. Fernandes, meio vereador, meio oposição, e com Roseta, que acha que vai fazer realmente coisas pela cidade. É evidente que um político profissional como o dr. Costa só tem uma ideia na cabeça acerca de Lisboa. É ganhar a CML daqui a dois anos com a tal maioria absoluta que lhe faltou em meados de Julho. A CML é o reduto político do dr. Costa, tal como foi no passado, com sucesso para Sampaio e com quase nenhum sucesso para Soares que sempre imaginou que era um grande político e uma imensa figura nacional. Nunca foi nenhuma das duas coisas. Costa é mais peixe de águas profundas, como diria o outro. Costa liberta-se, na Praça do Município, da tutela socrática e do cortejo dos socráticos. Costa, enquanto prepara a CML-2, prepara-se para o que der e vier. É mais um sapo no caminho do majestático secretário-geral. Talvez se repita a saga do sapo e do boi, desta vez com mais sorte para o sapo. O decurso do tempo o dirá.

30.7.07

UM BOM RAPAZ

Extraordinário retrato da representação nacional feito pelo Miguel. Por acaso apanhou um bom rapaz, o "Tó Zé", ódio de estimação do futuro presidente da CML, o dr. Costa. Mas é isso. Não passa de um bom rapaz, como tantos outros, cujo estofo é feito de tanto terem roçado os rabiosques pelos estofos dos sofás das secções das respectivas seitas noites a fio. E não foi a ler livros.

TERRITÓRIO OCUPADO


Quem anda pelo Algarve - eu andei nas últimas semanas -, mesmo que seja cego, surdo e mudo não pode deixar de reparar no efeito devastador da "modernidade" e dos autarcas, essa genial invenção do "25 de Abril". Torres, rotundas, casas construídas em locais inverosímeis, assassinato premeditado do litoral à conta de condomínios de luxo e de hotéis de patos-bravos, e outras badalhoquices, são a paisagem. Não contente com isto, Sócrates foi a Lagos prometer mais hotelaria. Lá estava o inefável dr. Patrão, do instituto do turismo e seu ex-chefe de gabinete, por sinal irmão de um "industrial" do sector e íntimo do assessor de sua excelência para o turismo, o sr. Luís Pinto, por sua vez um rapaz também muito interessado na matéria. O turismo é uma indústria que talvez deva ser cultivada desde que se perceba onde começa a rapacidade e termina a indústria. O Algarve, salvo raríssimas excepções, é a vítima mais evidente do chico-espertismo autoctóne e alheio. Como se não bastasse esta maciça destruição ambiental, a ASAE, ex-inspecção das actividades económicas, anda por lá a farejar "bolas de berlim" e a maravilhosa aguardente de medronho feita em casa. O Algarve, profundo ou superficial, é, literalmente e em todos os sentidos, território ocupado.

29.7.07

AQUI NÃO

Quando questionaram - salvo erro, António Ferro - Salazar acerca da censura, este foi sucinto na resposta: "tentamos reduzir a sua acção ao indispensável". Neste blogue pratica-se assumidamente a censura dos comentários, reduzindo-se o corte ao mencionado "indispensável". E faz-se isso porque o blogue é meu e eu - só eu - defino o que é e o que não é editável. Por exemplo, comecei por rejeitar o anonimato e agora admito algum. Neste, como noutros aspectos, sou bastante mais democrata do que outros bloggers declaradamente mais democratas do que eu e ilustres membros do sistema que não aceitam qualquer comentário. No resto, sou um anti-democrata convicto. Quem quiser escrever - repito-o - vai ao Blogger e segue os três passos constitutivos de um blogue. Aqui não.

NASCER COM COLUNA

"Isto da coluna, nada como já nascer com ela." Quatro anos do Nova Frente, um blogue de pensamento. Os melhores vão ser os próximos quatro. Believe me.

SIMPLESMENTE HELENA

Em condições normais, Helena Lopes da Costa nunca teria chegado a sair de casa onde a esperava, certamente, muito louça para lavar. Só que Helena decidiu-se pelo regime e pela política. Começou, obscura, em Algés. Gatinhou com Isaltino Morais, fez parte de umas agremiações locais e acabou em presidenta da junta. A seu tempo, passou-se para Lisboa e, pela mão de António Preto com quem entretanto se zangou, aparece como a "número 2" de Santana Lopes na CML. Era uma vereadora "todo-o-terreno" com assessores para tudo e mais alguma coisa o que a tornou famosa. Nem sei por que é que o "escândalo" dos assessores foi todo transferido para Carmona. Não foi Helena quem inventou, por exemplo, o sr. Lippari? Foi. Não foi Helena quem colocou um batalhão de capachos "laranjinhas" em todo e qualquer buraco da CML? Foi. Até acabou premiada com o cargo de vice-presidente do PSD, no tempo de Santana, o que diz tudo acerca da plutocracia partidária, seja ela qual for. Varrida pelos rápidos ventos da política nacional, Helena dedicou-se à conspiração, umas vezes ao lado do inefável Santana, outras ao lado de Menezes, a face risível e possível de Santana em 2007. Agora aparece muito indignada- sim, esta gente sem vergonha na cara é muito dada a indignações - com o partido por causa das quotas que ela aparentemente paga aos magotes. Foi um hábito que deve ter aprendido com o António Preto, outro generoso cacique, que tratava amiude do assunto dos outros quando era presidente de secção e mesmo depois. Helena, e muitos outros como ela noutros partidos, são os principais responsáveis pelo asco progressivo a que muito justamente a maioria dos portugueses vem votando os partidos, não votando neles. Pensem nisso enquanto é tempo.

SIMPLESMENTE DINA


O escritor norte-americano Norman Mailer, insuspeito de não gostar de mulheres, manteve sempre com elas uma relação muito estranha. A uma delas chegou mesmo a dar umas facadas. Literais. Todavia é dele a mais bonita biografia de Marilyn Monroe e um outro livro em que ela aparece, Of Women and their elegance. Por causa das mulheres e da sexualidade, Mailer manteve grandes polémicas televisivas e escritas com o seu coevo Gore Vidal. Vidal apreciou sempre as mulheres, não exactamente pelos mesmos motivos de Mailer. Talvez por isso lhe tivesse tantas vezes atirado à cara a sua indisfarçável misoginia. Vem isto a propósito de uma extraordinária entrevista na Única à ex-mulher do antigo governador de New Jersey, um Jim qualquer coisa, democrata, que "saiu do armário" na pior altura para a "sua" Dina. Dina Matos, como o nome indica, é de cá. Aos dezoito anos levaram-na para os EUA. Felizmente, diz ela, já que Dina considerava insuportáveis "a história e a cultura portuguesas". Lendo a Dina e as perguntas idiotas que o sr. Jenkins, o correspondente do Expresso lhe coloca, percebe-se por que é que o Jim vagueava por livrarias e estações de serviço (sic) à procura de fruta. Dina deve ter sonhado com a Casa Branca, uma vez que o dito Jim era politicamente prometedor. Era, porque depois de um "caso" com um "segurança" (dele) israelita e de outras "suspeitas" que o sr. Jenkins e a Dina apreciam na entrevista, designadamente o habitual número da chantagem, o Jim declarou-se um "americano homossexual" (sic também). Agora vive alegremente com o "companheiro", dá lições de ética numa universidade qualquer e vende o seu livrinho de "confissões". Dina, uma quase Hillary até na "traição" - com a diferença nos pêlos no peito dos amantes de Jim -, respondeu na mesma moeda, ou seja, com um livro. E pretende, naturalmente, vender o melhor possível a figura de parva que andou a fazer no casamento. Como Dina Matos, existem por aí muitas "Dinas", só que as pobres não aspiram a nada a não ser tratar modestamente das suas casinhas não brancas. Pelo meio havia filhas, duas de casamentos diferentes, o que prova que não há nada mais fácil no mundo do que cuidar da natalidade e da fruta simultaneamente. De que é que estão à espera, portugueses?

DOS LIVROS - 7


A propósito do derradeiro patriota - cada dia que passa tenho mais a certeza de que o é - seria bom que os herdeiros do Doutor Salazar e a Coimbra Editora se entendessem para que fossem reeditados os seis volumes dos "Discursos e Notas Políticas" do primeiro. São prosas que ultrapassam a circunstância - o Doutor Salazar, ao contrário dos papagaios de hoje, não era um homem de circunstâncias - e que dão testemunho de uma época longa da nossa história através de uma límpida retórica político-literária jamais recuperada. Para além disso, foram escritos pelo punho do próprio Doutor Salazar enquanto agora se reune um petit comité de pseudo sábios e de pseudo estrategas que preparam uns quantos papiros consoante as "especialidades" de cada um, deixando a alguém que saiba ler e escrever a "síntese" final que o venerando representante do regime lerá ao povo em teletexto. Salazar cultivava, entre outros, Vieira. A esta gente basta-lhes o primeiro escriba que articule minimamente duas frases. Também, tanto faz. Emissores e destinatários estão, nessa matéria, praticamente ao mesmo nível. E quanto menor for o ruído da presente retórica política, melhor. Não se deve maçar excessivamente as crianças.

28.7.07

O MONÓLOGO INSTITUCIONAL DA VAGINA

Como ainda não tive tempo para ler o fascículo semanal das memórias de José Hermano Saraiva, não tenho tema. De qualquer forma, e ainda acerca do aborto, afigura-se-me que o "monólogo da vagina" passou a verdadeira questão constitucional e nacional. Já devo ter ouvido o Chefe de Estado a perorar sobre o mesmo assunto e com o mesmo argumentário alguma meia dúzia de vezes. Fora a repetição da entrevista de Sócrates na SIC Notícias. Pobre país.

27.7.07

ERA UMA VEZ NA MADEIRA

Desculpe que lhe diga, Fernanda, mas apesar de V. ter ido à Madeira, ainda não chegou à Madeira. Aquela tirada das queixinhas ao Mário Soares - realmente esta criatura prestou-se e presta-se às coisas mais deliciosas, como, por exemplo, ter para com Chávez uma complacência retórica que cá dentro não teve e não tem com tanta gente - é um must. Pena ele não estar nas mesmas funções para ver se recebia quem quer fazer queixinhas do senhor primeiro-ministro e do dr. Santos Silva. Adiante. Falta-lhe só uma nota de rodapé no seu esclarecedor artigo, escrito no melhor estilo Stephen King, onde se nota a falta da rábula de comer criancinhas com peixe espada preto e banana frita. É explicar aos leitores que os serviços de saúde da Madeira e dos Açores estão "regionalizados", como as finanças na primeira. Daí a circunstância de a sua amada lei do aborto dever ser aplicada ali com as nuances exigidas por este quadro constitucional e regional. Nem mais nem menos do que isto. O resto é mais da mesma fábula.

NO CENTENÁRIO DO ASSASSINATO DE D. CARLOS

Outra petição. A memória de um chefe do Estado assassinado por dois "heróis" republicanos e democráticos e vítima de conspiradores como Aquilino e Afonso Costa. Ao menos este foi posto na rua e interdito o seu regresso a Portugal, morrendo em Paris em 1937. Ao outro, espera-o o Panteão se o dr. Gama não tiver um acesso do bom senso que o costuma caracterizar.

O DERRADEIRO PATRIOTA


No dia 27 de Julho de 1970, faz hoje trinta e sete anos, desaparecia o Doutor António de Oliveira Salazar. Menos de quatro anos depois, na noite de 25 para 26 de Abril de 1974, o General António de Spínola, na RTP, anunciava o propósito, uma vez derrubado o regime do defunto, de manter a integridade da Nação "no seu todo pluricontinental". Em cerca de um ano, isto é, entre este anúncio e a independência da última colónia, Portugal cedeu gratuitamente a terceiros cerca de quinhentos anos de história. Spínola obviamente já tinha saído de cena. Para o efeito, o ministro dos negócios estrangeiros do novo regime e meia dúzia de ideólogos do MFA andaram um pouco por todo o lado a preparar a rápida transumância. A "correlação de forças" no terreno e fora dele, uma expressão tão cara ao PC, encarregou-se do resto. Valeu ao novo regime, uma vez encerrado abruptamente o ciclo colonial - sem sequer ter sido ponderado o ciclo "federal" proposto pelo antigo governador militar da Guiné - a circunstância de aquele ministro, já transformado em primeiro-ministro, e ao arrepio dos "conselhos" de brilhantes economistas que viríamos a conhecer mais tarde, ter solicitado a adesão de Portugal à então CEE. Foi este verdadeiramente o acto fundador desta outra fase da vida nacional, tal como, cinquenta anos antes, tinha sido o "28 de Maio" ou o discurso da Sala do Risco. Despojados de memória, de territórios ultramarinos, de "patriotismo" e enterrado com o Doutor Salazar um determinado registo geo-estratégico e geo-político, precisávamos rapidamente de nos agarrar a outra coisa que continuasse a justificar-nos enquanto nação. Essa outra coisa foi - é - a Europa. Salazar dizia de Marcello Caetano, seu involuntário sucessor, que era "um fraco". Era. Era-o tanto quanto foi um insigne jurista e um eminente professor. Caetano catalisou as direitas que julgavam poder escapar ao sortilégio do antigo catedrático de Coimbra. À sua sombra floresceram "alas liberais" e pusilânimes de diversas proveniências. Toda esta gente acalentou o sonho de uma direita "liberta" de Salazar: uma direita liberal, moderna e europeia. Tentaram isso com Marcello, tentaram isso, depois, com o PPD, com o PSD, com o CDS e com o PP. Este regime, com a pressa de se querer ver livre do espectro salazarento, não quis ou não soube interpretar Salazar. Preferiu escondê-lo, como se tivesse vergonha da história. Aquelas direitas partidárias também por causa do trauma do anti-fascismo. Durante os quarenta anos que governou Portugal, Salazar manteve a viabilidade do país como nação. Primeiro, preservando a independência e a integridade nacionais aquando dos conflitos espanhol e mundial de 39-45, sempre em absoluta consonância com a aliança inglesa. Depois, colocando o país na NATO, na OCDE, no Banco Mundial, no GATT e na EFTA, entre outros organismos internacionais. A terceiro-mundista ONU nunca suportou o nosso estatuto pluricontinental e apoucou o mais que pôde o regime, diminuindo a sua capacidade de acção internacional na defesa do Ultramar. Muitos compatriotas nossos, de cá e espalhados pelo mundo à conta da oposição a Salazar, juntaram-se a este coro de carpideiras emancipadoras. Salazar fez sentido enquanto não houve Europa e o país possuia uma fronteira ilimitada que ia para além do Atlântico. Salazar deixava de fazer sentido com a Europa e com um país periférico confinado à sua exígua fronteira terrestre, à burocracia demo-liberal de Bruxelas e aos negócios obscuros com as nomenclaturas que mandam nas ex-colónias. O país, esse, já tanto lhe faz ser governado por este ou por aquele, de plástico ou de plasticina, venha ele de fora ou de dentro, ou vá ele de dentro lá para fora. Em certo sentido, o Doutor António de Oliveira Salazar foi o derradeiro patriota.

26.7.07

ONDE PÁRA A PETIÇÃO?

Como ignoro se o dr. Jaime Gama abandonou ou não o propósito de colocar Aquilino Ribeiro no Panteão, ali a Santa Clara, é um bom momento para se saber do paradeiro desta petição.

O OUTONO DOS PATRIARCAS


Tem razão, Medeiros Ferreira. A blogosfera e os jornais fizeram mais pelo professor Charrua do que a sua insuportável langue de bois típica "da casa". Do regime, naturalmente, que ele já serviu como deputado. Só não o acompanho na celebração das "datas libertadoras". As do século XIX, ainda vá que não vá. Agora o "5 de Outubro", a data da implantação da ditadura "democrática" de outro Costa e respectiva camarilha, não calha muito consigo. Eu, por exemplo, sou mais "moderno". Ao Outono de 1910 preferirei sempre a Primavera de 1926.

O PROBLEMA NACIONAL

A avaliar pelo que leio online, a grande preocupação do senhor primeiro-ministro - revelada na SIC - é que a lei do aborto, o único ex libris que ele faz questão de apresentar para se sentir da "esquerda moderna", se cumpra na Madeira. Talvez esteja mesmo a pensar em enviar umas fragatas, os submarinos do dr. Portas e umas pilecas de Mafra para obrigar ao cumprimento da dita lei. Bendito país cujo único problema nacional é o aborto. Que gente mais feliz.

25.7.07

O PS NO SEU LABIRINTO


Há três anos, por esta altura, os deputados Manuel Alegre, José Sócrates e João Soares disputavam a liderança do PS. Sabemos o resultado. Um ano e meio depois, Alegre, à revelia do homem que o derrotou no partido, obtinha um milhão de votos nas presidenciais. Soares, o pai e candidato oficial, era humilhado com menos de 15%. O Joãozinho, o Soares pequenino, nunca contou para nada nesta disputa. Por isso, nem ele nem o pai - este só muito timidamente criticou alguns "aspectos" da "situação" - podem falar demasiado alto contra o absolutismo democrático de Sócrates. Sobra Alegre que, politicamente, pouco conta a não ser possuir uma bela voz e alguma iconoclastia partidária. Daí o artigo do Público, um derrame melancólico sobre a liberdade e o medo que nenhum de nós hesitaria subscrever. Imagino que o senhor presidente em exercício não se tenha sentido afectado pela prosa já que nunca levou Alegre a sério. Eu também não levo, mas gosto de gente que não alinha em manadas acéfalas e oportunistas. Sócrates, em apenas dois anos, já conseguiu irritar muita gente, sobretudo gente que votou nele. Que é "dele". Apesar disso, continua impávido e sereno como um promotor de margarina contra o colesterol num supermercado. Ainda ontem saiu de um daqueles "balcões electrónicos" que lhe inventaram para "facilitar" a "sociedade civil" e a única coisa que lhe ocorreu dizer foi que aquilo é tão bom, tão bom que "até apetece comprar uma casa". Faltou-lhe, no entanto, prodigalizar o dinheiro para se comprarem as ditas casas. E é por aí - e pela petulância sem substância que o caracteriza - que Sócrates e os seus acólitos começarão a cair, mais cedo do que a fartação de Cavaco que só se sentiu a pouco mais de um ano de ele dizer que se ia embora. Ninguém fora do PS o vai derrubar. Ninguém. Porventura nem Cavaco, num eventual segundo mandato em que esteja vivo. É o seu imenso vazio que, um dia, acabará com ele de vez.

Nota: Isto foi escrito antes de uma entrevista de Sócrates a uma televisão. Como dizia o outro, para esse peditório já dei.

O MUNDO DÁ MUITAS VOLTAS


O facto de alguém ser acusado num processo não faz dele imediatamente um criminoso ou um pária. Aliás, o processo ainda é o meio mais seguro - e o único adequado - para tratar questões como as levantadas, não politicamente, mas juridicamente, pelo apelidado "caso Portucale". Paulo Portas e os seus apaniguados sabem disso melhor que ninguém. Uma vez encontrei o Pedro Guerra, à altura jornalista no Independente, a ler tranquilamente, numa esplanada na Júlio Dinis, uma cópia bem gorda de algo que, pelo timbre, era manifestamente uma peça processual. O Pedro Guerra terá sido o derradeiro "herdeiro" de uma "escola" de "fazer jornalismo" monitorizada no Independente - e não só - que "vivia" da promiscuidade com as "fontes" judiciárias e de investigação criminal. A técnica é sempre a mesma. Primeiro crucificam-se os visados em "cacha alta" e nas primeiras páginas. Depois, ignora-se o curso do processo. E, finalmente, se ninguém é condenado mediante sentença transitada em julgado, nem que seja três ou cinco anos depois, tem, quando muito, direito a duas linhas na última página. Portas e os seus amigos vão agora passar pela "via sacra" que tão bem dominam. O Pedro Guerra, o da esplanada, acabou em assessor político de Portas, ministro da defesa. Devia ter aconselhado melhor o seu mentor.

DOS LIVROS - 6


George Steiner, como todos os bons professores e ensaístas, é um grande escritor. Nem a "fixação" judaica, presente em todos os seus escritos, diminui - antes pelo contrário - a extraordinária capacidade que possui de nos pôr a pensar. O Silêncio dos Livros* é uma curtíssima reflexão sobre o papel do livro hoje. Retoma - em Steiner a persistência temática é a melhor evidência da sua coerência intelectual e da sua aristocracia de espírito, ambas qualidades em vias de extinção no mundo em que as elites se movem - coisas postas em letra de forma num livro bem mais antigo e, nem por isso, mais "desactualizado", No castelo do Barba Azul - algumas notas para a redefinição de cultura, traduzido na Relógio D'Água: "os livros bem-amados são a sociedade necessária e suficiente do indivíduo que lê a sós". Este Silêncio fala do essencial que nos anda a escapar por causa das "competências" (essa palavra hedionda do calão "eduquês") e do facilitismo. "A educação moderna cada vez se assemelha mais a uma amnésia institucionalizada. Deixa o espírito da criança vazio do peso das referências vividas. Substitui o saber de cor, que é também uma saber do cor(ação), pelo caleidoscópio transitório dos saberes efémeros. Reduz o tempo aos instante e vai instilando em nós, até enquanto sonhamos, uma amálgama de heterogeneidade e de preguiça." E quando se "cede aos valores veiculados pelos mass media ou ao matraquear da publicidade, como acontece hoje em dia na Europa ocidental, assistimos ao triunfo da mediocridade."

*seguido de Esse vício ainda impune, de Michel Crépu (Gradiva, 2007)

24.7.07

A ÁRVORE E A FLORESTA

O arquivamento do processo disciplinar do professor da DREN não arquiva a questão política de fundo. E a questão política de fundo tem a ver com a possibilidade efectiva de alguém poder ser perseguido, administrativamente ou através de qualquer outro procedimento, por uma coisa que não existe, o delito de opinião. O "caso Charrua" foi apenas um sintoma público do muito que se passa às escondidas. Margarida Moreira, a da DREN, é uma comissária política. E age e pensa como tal. Há muitos mais por aí doidos para se porem em bicos dos pés.

A PROMULGAÇÃO DO CONTROLO

Mais um lamentável frete do PR ao governo que passa por um atestado de indispensabilidade a essa anacrónica "entidade reguladora da comunicação" do sr. Azevedo e da professora doutora Serrano. Se é assim para a lei da televisão, é de esperar o pior em relação ao resto do "pacote" controleiro do dr. Santos Silva. Cavaco nunca percebeu bem o papel de uma comunicação social livre, sem os burocratas-delegados do poder a vigiar. E, pelos vistos, continua a não perceber - ou a não querer perceber - o que é bem mais grave.

NÃO ESTÁVAMOS EM ÁFRICA


Ainda sobre os pequenitos e a propaganda do governo, a boa lembrança de um leitor acerca da diferença dos tempos, das personalidades e da ética pública, aquela a que apelidam de republicana:

"Anos 80/82. O oficial responsável pela aquisição de um lote de Citroens e de um super Citroen, topo de gama, para o PR, informa o PR: que a direcção da Citro gostaria de ter uma fotografia com o PR junto do carro. Resposta pronta ...diga-lhes lá que não estamos em África."

QUESTÕES ABRUPTAS

O José Pacheco Pereira, apesar de ser do "sistema", nem por isso se coíbe, quando lhe dá a veneta, de o zurzir lá onde ele deve ser mais denunciado. Por exemplo, leiam-se no Abrupto as últimas prosas sobre as desatenções cavaquistas em matéria de liberdades públicas (honra e glória ao Paulo Gorjão), sobre o eterno retorno em Portas e sobre o servilismo de certos comentadores "especializados" em assuntos europeus acerca do "tratado reformador". Aqui JPP tem mais graça porque escreve ao lado deles e delas. É por causa destas e de outras que há quem gostasse de o ver fora do "sistema" ou, no limite, fora do seu próprio partido. Deste JPP e do dos livros*, é que eu gosto.

*A parte dos livros é uma private joke à espera de melhores dias. Dias...

AGITPROP


O mesmo país que preside à UE, que tresanda a "choques" tecnológicos por todo o lado - incluindo o aborto que apresenta quase como um novo "25 de Abril" -, que é governado pela "esquerda moderna" mas que não deixa reformar gente com doenças terminais, que oferece diariamente espectáculos de pequena e grande corrupção na sociedade dita civil, que faz da banal detenção de criminosos um "show", etc., etc. este mesmo país e o governo que o dirige prestam-se a esta palhaçada digna do pior terceiro-mundo. "A ideia era mostrar as potencialidades da utilização dos quadros interactivos numa sala de aula. Sentadas em carteiras, cerca de uma dezena de crianças respondiam ao “professor” e faziam os exercícios descritos no quadro, com ajuda do rato ou de uma caneta especial que faz as vezes de giz. Só que para além da sala improvisada no Centro Cultural de Belém havia algo mais encenado. Os “alunos” eram crianças que tinham sido recrutadas por uma agência de casting: a NBP, num trabalho que rendeu 30 euros a cada um, de acordo com o relato feito por um dos miúdos à RTP." Li no Público e acredito, até por ter prestado vagamente atenção à notícia na RTP. Instado nessa mesma peça a comentar a coisa, Sócrates lançou aquele olhar de "animal feroz" de quem não está para ser perturbado no seu sonho de grandeza por primitivismos jornalísticos. Sucede que foi ele quem propiciou o "momento Chávez", a fazer lembrar os pioneiros dos falecidos países de leste e de Cuba. A diferença é que estes miúdos foram pagos para a propaganda do governo com se estivesse. - e estavam - numa telenovela venezuelana. Não há meio deste pobre regime em fim de festa ter um pingo de vergonha na fuça.

23.7.07

O PRESIDENTE DA JUNTA


Hoje é um dia histórico para a presidência portuguesa. O dr. Amado, um dos poucos homens com algum nível no meio dos que nos pastoreiam, abriu a chamada conferência inter-governamental para a elaboração do novo tratado europeu, o chamado reformador, o pequenino. E quer - aí já está "a variar" - aprovar a coisa até Outubro. Quem não perdeu pitada deste prolegómeno foi o dr. Barroso, que perorou imediatamente para jornais e televisões. O dr. Barroso quer voltar a casa com obra na labita. E cola-se, como uma lapa, à presidência de um Sócrates pouco experimentado nestas matérias. Se tudo correr bem, Barroso - não duvidem - aparecerá aos ombros dos seus próprios ombros. Se tudo correr mal, nomeadamente se Sarkozy se exceder no chauvinismo francês, se os amáveis gémeos polacos se reforçarem domesticamente e se Sócrates não tiver fôlego suficiente para tamanha opus, Barroso, como é seu timbre, dará uma desculpa esfarrapada para "descolar" do seu país de origem e continuar a tratar daquilo que ele trata melhor: a sua vidinha. Não suponha, pois, o governo português que Barroso anda por ali apenas para dar uma mãozinha amigável. Não anda. Barroso gosta demasiado da sua pessoa e da figura que quer fazer na comissão - e de que pretende fazer "download" para Portugal - para se preocupar com minudências. Na cabeça dele - e desde a altura da pensativa foto de 1975 - ele é que é o presidente da junta.

A ELITE E O POVO

Estes e estas hipócritas que constituem a elite pátria e que não descansaram enquanto não liberalizaram o aborto até às 10 semanas de gestação, equiparando-o a um banal e mais cómodo meio de travar a concepção, foram agora a Espanha "copiar" o demagógico subsídio de natalidade. De repente, o povo e a elite que o pastoreia descobriram-se velhos. Velhos e envilecidos. Gente que não sabe cuidar dos vivos, que não respeita os seus mortos e que banaliza o aborto não merece um subsídio meramente político e propagandístico. Merece pagar uma taxa sobre o seu endémico oportunismo e sobre a sua crónica estupidez. A própria e a da elite. Com uma raça destas, não vamos decididamente a lado nenhum.

DOS LIVROS - 5

Não se vê bem, mas é mais um livro sobre Salazar, desta vez de Jaime Nogueira Pinto que já tinha escrito o notável guião do programa dedicado ao antigo presidente do conselho no concurso da D. Elisa, o tal que ele ganhou, obrigando a apresentadora a engolir uma vassoura. O título: António de Oliveira Salazar, O Outro Retrato, da Esfera dos Livros. O facto de o casal Nogueira Pinto me andar a irritar ultimamente, não justifica o menoscabo da prosa do marido da futura colaboradora da câmara socialista de Lisboa. Nem tão pouco os "aconselhamentos estratégicos" do autor. O objecto do trabalho - o Doutor Salazar - supera as precauções. Vale sempre a pena revisitá-lo e aprender novas coisas sobre um velho tema.

22.7.07

MENDES E OS OUTROS

O dr. Marques Mendes devia criar as condições para que os cento e vinte mil militantes do PSD se possam candidatar, querendo, ao seu lugar. Sobretudo propiciar - já que são muitos - que se "arrebanhem" em grupos, dirigidos por um militante mais "informado" que lhes pague as quotas até ao natal e que, em caso de necessidade, indique o seu endereço para os acolher. Há cerca de três anos abandonei o PSD. Enviei uma carta com o cartão ao secretário-geral e recebi uma amável carta em troca que me informava da "desfiliação". Mesmo assim, continuei, durante uns tempos, a ter as quotas em dia... Ou seja, alguém pagou, sem que eu lhe pedisse, as quotas que nem sequer já devia. E, antes disso, aquando de um congresso qualquer em que me interessava votar, dirigi-me à Lapa para pagar quotas em atraso. Paguei e, pouco tempo depois, devolveram-me o dinheiro porque, afinal, já tinham sido pagas. Só conto isto para que se perceba por que é que, eventualmente, Mendes acabe por ir sozinho às "directas". Não é bom para ele, nem para o partido, nem - concedo - para o país. Todavia, pior é eternizar os caciques e servir-se deles para constituir os chamados sindicatos de voto que ninguém controla. Menezes, no seu choradinho, "esqueceu-se" de mencionar esta evidência e estranho que Ferreira Leite, sempre tão firme e hirta, lhe tenha dado indirecta razão. O problema é outro. Todos, como bons cobardolas, "guardam-se" para umas quaisquer "vacas gordas" depois de 2009, à espera que Mendes perca estrondosamente contra a situação. Acontece que, com ou sem Mendes, não se vislumbra sucesso na direita em matéria de pastar a vaca, dado o estado anestesiado e bovino em que nos encontramos por obra e graça do novo senhor do dr. Júdice. Provem-me que qualquer das salvíficas alternativas a Mendes é melhor do que ele e depois falamos.

A PREBOSTE


A D. Inês Pedrosa escreve livros e crónicas nos jornais. Consequentemente é uma escritora portuguesa. Todavia, a sra. D. Inês passa mais tempo nas comissões de honra deste e daquele e em porta-voz de missionários políticos do que a escrever senão não escrevia as baboseiras que costuma escrever. O derradeiro delíquio "cívico" deste grande vulto nacional foi o apoio ao dr. Costa, futuro presidente da CML. Danada por os eleitores de Lisboa terem votado o acto eleitoral ao descrédito, a senhora, na sua croniqueta do Expresso, reclama por sangue. Fala em "gravíssimo desdém" pela democracia e exige a punição dos abstencionistas. A D. Inês - que supostamente deveria ser trinta vezes mais democrata do que eu - entende que os vilões que não votam deviam ser, por exemplo, excluídos dos empregos públicos e impedidos de se candidatarem a "bolsas". Fugiu-lhe logo o pé para aquilo que ela, e muitos como ela, melhor conhece: a prebenda, o premiozinho da treta sempre esmolado ao Estado que os carregue, a distinção pública por meia dúzia de parágrafos mal esgalhados. Esta literata de bolso não percebe que são justamente criaturinhas como ela - que contribuem com o seu bolsar em letra de forma para o estado a que isto chegou precisamente porque "vão a todas" - quem mais afasta as pessoas da coisa pública. O estalinismo norte-coreano tardio da D. Inês emparelha com a vocação esquerdina serôdia do dr. Júdice. Podem, por isso, contar com o desdém eterno, e em cada vez maior número e qualidade de portugueses, por esta coisa em forma de democracia a que a senhora se agarra como gato a bofe. E vá dar lições da dita e de cidadania para o raio que a parta. Aqui já estamos cheios de dondocas "intelectuais" como a senhora, nada, criada e inventada pelo sistema. A literatura portuguesa passa muito bem sem si. E esta coisa que passa por democracia também, muito obrigado.

ABORTOS, UNI-VOS

Quem aterrasse, assim, de repente em Portugal, lesse os jornais e desse uma olhadela às televisões, podia pensar que aqui nunca se fez um aborto. A diarreia verbal que tem acompanhado a entrada em vigor da "nova "lei e respectiva regulamentação, a pseudo-novidade da coisa, só são comparáveis à corrida maciça às salas de cinema depois do "25" para ver filmes "eróticos". O cuidado que os dirigentes do SNS colocam na abordagem do tema, sobretudo a preocupação que evidenciam em "mostrar serviço", só pode ser consequência de uma má consciência qualquer misturada com o medo palonço de não desagradar aos "líderes de opinião". Parece que o único problema de saúde pública do país é o aborto, o aborto e mais o aborto. Grandes abortos é o que eles todos são.

O NEÓFITO

De um leitor, grande comentador e amigo "de guerra", o Rui, que ainda se dá ao trabalho de acompanhar o "pensamento" do dr. Júdice, o neófito da "esquerda moderna":

«A entrevista do Dr. Júdice à Dr. Margarida Marante no “Sol” de 21.07.2007 é a “Bíblia” do arrivismo e um autêntico “manual de sobrevivência” mascarado de grande frontalidade e independência.Uma conversa entre dois amigos de sempre, no Centro de Emprego, após receberem notícia de que tinham arranjado uns empregozinhos através do empenho do presidente da junta, não seria tão reles. O lambe-botismo da entrevistadora, na nota de rodapé, é rastejante e aviltante perante a isenção jornalística que lhe é exigível. Gosto especialmente da pose para a foto, pé em cima do ressalto da parede, ao lado duma estátua que se advinha fálica e os sapatinhos a precisarem de renovação. É a vidinha… Apenas gostei de uma profecia do mestre Alarcão Judice; parece que o PSD e o PP tendem a desaparecer e a ser substituídos por um grande partido de direita, onde, ele Júdice, considera não ter lugar. Óptimo, espero que muitos outros iguais ao Dr. Júdice, que pululam no PSD e no PP fujam para o PS, onde ficam entre iguais, para que possa aparecer definitivamente um novo partido mesmo de direita, com gente séria e ideologicamente honesta.»

21.7.07

O SLOGAN


Dezoito - tantos como os distritos - ministros andaram pelo país a distribuir computadores e a prometer "novas oportunidades". À cabeça, claro, Sócrates. Sobre este momento de propaganda digno de Merché Romero, nada como dar a voz a um camarada esclarecido, Manuel Maria Carrilho, que, já no tempo do profeta Guterres (também com ele as prioridades eram a educação e a qualificação, e é o que se vê), denunciava o embuste. «O slogan do «acesso de todos à Net» pretende, no seu fervor militante, passar a ideia de uma nova igualdade, agora ao alcance do teclado, como se entre o analfabeto e o investigador, o rural e o urbano, o europeu cosmopolita e o habitante de África, as diferenças desaparecessem quando se «surfa» na Net. Ele ignora que, pelo contrário, é justamente aí que as diferenças mais se evidenciam, se nada as tiver atenuado, ou anulado, antes.» Ou a Filomena Mónica que, mesmo depois do episódio auto-biográfico, mantém a devida lucidez quanto ao fundamental.«A retórica que declara que aquilo que se está “a dar ao povo é o que ele gosta” tem como base a crença de que as massas populares são intrinsecamente estúpidas e, portanto, incapazes de seguir um raciocínio complexo ou de admirar uma obra de arte. Uma tendência paralela é o endeusamento da Internet como transmissora de cultura, tema retomado, entre nós, na recente campanha eleitoral, sob a designação do “choque tecnológico” proposto pelo PS. Num país de analfabetos, o computador transformou-se numa varinha mágica capaz de transformar um bronco num génio.»

BARRIGADA DE RISO


Cada vez que o clínico de Gaia Luís Filipe Menezes abre a sua boca enjoada e faz beicinho e queixinhas, percebo por que é que o dr. Marques Mendes ganha. Para complementar este ilustre autarca, encontra-se em fase de "pensamento" - digo assim para não confundir com a "reflexão" do dr. Portas - o dr. Aguiar-Branco, ex-fugaz ministro da justiça, que pode querer tomar o lugar de Mendes. Repito. O dr. Mendes, mesmo ao arrepio dos estatutos, devia permitir que se candidatassem ao seu lugar todos os militantes do PSD que o desejassem fazer. Tínhamos um verão em cheio, um verão de barrigada de riso.

VIDA E MORTE DOS "NOVOS PARTIDOS"

Sobre o "novo partido", apenas duas ou três vulgaridades. Em primeiro lugar, sempre que alguém saiu de um partido do regime para criar outro partido do regime, gerou puras inutilidades anãs. O PS "deu", logo em 74, uma coisinha chamada "frente-não-sei-quê" do Manuel Serra, e os camaradas Carmelinda Pereira e Aires Rodrigues que costumam aparecer em todas as eleições. Depois, "deu" o "movimento reformador" do António Barreto e do Medeiros Ferreira, a que pertenci, sem pretensões partidárias, a pensar na evolução do próprio regime, reforçando a componente presidencial, nas instituições políticas, e a flexibilização do mercado, na componente económica. Estávamos - é preciso recordá-lo num momento em que pululam liberais por todos os lados que nessa altura eram das "extremas- esquerdas"- em 1979, a menos de cinco anos da "revolução". Depois ainda "deu" a UEDS, do generoso Lopes Cardoso e da D. Constância, o eterno Vitorino. Em 1980 "fingiram" uma "frente republicana e socialista" com a ASDI, a grande dissidência do PPD/PSD - o grupo parlamentar que fugiu quase todo de Sá Carneiro - que acabou estatelada aos pés do mencionado Sá Carneiro, na repetição da maioria absoluta da AD. O PPD entretanto já tinha "dado" um sinal em Aveiro, contra a alegada "ditadura" do antigo deputado da "ala liberal", com Graça Moura, Mota Pinto, Sá Borges e outros a abandonarem o partido logo em 75. Do CDS, aquando do "transformismo" em PP, saiu muita gente e, finalmente, do próprio PP, Manuel Monteiro que anda para aí lamentavelmente a falar sozinho. Os que deixaram o PC, integraram o PS com o sucesso que se conhece, e só Zita Seabra levou o famoso "desvio de direita" às últimas consequências. Os "extremas", ou fundiram-se sob o chapéu de abas largas do BE, ou ficaram no irrelevante MRPP do burguês dr. Pereira. Em segundo lugar, a direita, porque é bronca e fisiologicamente governamentalista como dizia o Cunha Rego em 82, não sabe respeitar-se ou dar-se ao respeito. E respeitar-se e dar-se ao respeito é não promover mediocridades como salsichas de talho e dar tempo ao tempo. Mário Soares, que foi o que quis neste regime, apenas segurou a cadeira de chefe de governo entre 1976 e 1978 (dois anos) e 1983 e 1985 (outros dois). Fora isso, e contando com os anos de chumbo, Soares esteve no "contra", à vontade, quase a vida toda. Foi eleito PR aos cinquenta e oito anos e Mitterrand, depois de três ou quatro tentativas falhadas, aos sessenta e cinco. Isto é, e em terceiro e último lugar, enquanto a direita estiver entretida com os seus bonecos insufláveis e com os seus dirigentes instantâneos, sem estofo nem biografia, não vai a lado algum. Mais. Foi por causa desta mediocridade carreirista e analfabeta que outro subproduto instantâneo - Sócrates - chegou onde chegou, "elogiado" agora por antigos epígonos oportunistas das direitas. A direita não precisa de mais labregos. Precisa de paciência e de um módico de seriedade. Até por isso, Marques Mendes deve deixar concorrer o maior número possível de "desejados" ao seu lugar para que o país se aperceba da cãzoada de inúteis que prolifera nas secções do PSD, de norte a sul do país. A vaidade pessoal ou um bom plasma na sala para nos revermos narcisicamente nunca deram "novos partidos". Deram vaidades pessoais e uma televisão na sala. Até porque um "novo partido", construído a partir do ranço dos "velhos", não se recomenda.

A SOLIDÃO DE COSTA

Felizmente o dr. Costa não conseguiu "acordar" uma maioria camarária com ninguém. É bem feito. Tem dois anos para gerir o caos e mostrar o que vale. Como não é politicamente inepto, deve safar-se se não insistir nos cócós de cão no lugar da Portela. Aliás, o teste decisivo do dr. Costa chama-se aeroporto internacional de Lisboa. Atreva-se a desmembrar o actual e vai ver o que lhe acontece.

20.7.07

AUTORITÁRIOS

O meu autoritário é melhor que o teu.

DON'T SHIT WHERE YOU EAT

José Miguel Júdice, o tal que contraria diariamente a velha e honrada máxima de que "Roma não paga a traidores", saiu-se com esta: "sinto-me um ginecologista: trabalho onde espero que muitos se divirtam", a propósito de ir gerir a zona ribeirinha de Lisboa. Tardio em muita coisa, Júdice também anda um bocado atrasado em relação ao tema "género". O gineceu feminista não diz nada? Ou sentem-se bem com a imagem do circo Chen, com elefantes e tudo dentro da tenda? Pobre dr. Júdice. Além de homofóbico, também é heterofóbico. Quem lhe terá feito tanto mal?

DOS "À FRENTES" E DOS "ATRASES"


Alertado por sms pelo João, percebi que está - ou esteve - em curso na blogosfera uma polémica tipicamente redonda. Tudo começou por causa de uma ex-deputada e ex-uma data de coisas, de seu nome Patrícia Lança. A dita Patrícia, com a veneranda idade de 82 anos, lançou-se literalmente a alguns temas a que o correcto apelida de fracturantes. Ela escreveu uma coisa, uns e outros responderam com outras tantas e assim por diante. Sexo anal? Com certeza. Desde tempos imemoriais - e, nestas matérias, tanto gregos e latinos como cristãos - que a sodomia, praticada indistintamente entre soi-disant same sexers ou soi-disant heterossexuais, existe. Não é pelo facto de a religião a proibir que ela não anda por aí. Anda. Aliás, conheço umas moças muito badaladas no pobre socialite português que, para se aliviarem do marido do momento, não pretendem outra coisa já que os "à frentes" são pseudo- sagrados, abortos incluídos. É esta também a "teoria" seguida por raparigas das melhores e das piores famílias, antes do casamento. Preservem-se os "à frentes" e seja o que Deus quiser com "os atrases" e com a boquinha. Qualquer meu conhecido em idade adequada pode comprová-lo perfeitamente. Farto-me de citar esta, mas lá vai mais do mesmo. "Não te metas na vida alheia se não quiseres lá ficar", termina assim o "Nome de Guerra" do Almada Negreiros. Eu, nestas coisas dos "à frentes e dos atrases", recomendo sempre Suetónio. Com os seus "Doze Césares", o historiador esclareceu definitivamente a duplicidade na sexualidade humana sem ser preciso esperar pelo idiota relatório Kinsey. Não quer dizer que, ao longo de uma vida inteira, ela se manifeste. Pelos vistos não se manifestou em Patrícia Lança. Tal como não se manifestou nem decerto se manifestará em muito boa gente. Para mim, que sou praticamente um reaccionário, não existe uma "normatividade" sexual, salvo a que decorre da previsão da lei penal. Entre "consenting adults", todos os "à frentes" e todos "os atrases" são sempre bem vindos. E quem nunca apanhou uma camada de "chatos" que atire a primeira pedra.

DISTRACÇÕES

Um amável leitor chama a atenção para o artigo de José Miguel Júdice no Público. Acontece que eu deixei de ler o dr. Júdice há muito tempo tal como muitos outros distintos ornamentos da democracia. Aliás, e pela primeira vez de muitas, deixei de votar. Como aprendi com uma colega de liceu, só ligo a merda quando estou distraído. E raramente me distraio.

19.7.07

DIA 19 DA PRESIDÊNCIA


Grande dia para a presidência. A sra. D. Rice, o sr. da ONU cujo nome não consigo pronunciar e o pepsodent Blair andaram por aí. Tiveram direito a trânsito fechado, a helicóptero e a centenas de polícias. E à RTP oficiosa, babada e regimental. Tudo por causa do Médio-Oriente que este chamado "quarteto" monitoriza com o sucesso flamejante que se surpreende diariamente. Para ajudar o senhor presidente em exercício, o czar Putin zangou-se com o sr. Brown e vice-versa. Já havia uma vaga dificuldade por causa do preto fascista Mugabe e, agora, aparece o sr. Putin com o seu caprichismo chauvinista para perturbar a harmonia presidencial feita de cimeiras disto e daquilo. O mundo volta a estar perigoso, areia em demasia para o camião do senhor presidente. E, "quarteto" por "quarteto", preferirei sempre o de Pedro Bandeira Freire.

NOVOS CÍNICOS

Diógenes de Sinopa é a figura que ilustra momentaneamente este blogue. Vivia dentro de um barril, no meio da rua e rodeado de cães. Tem na mão a famosa lanterna que usava à luz do sol para encontrar, sem sucesso, "um homem". Diógenes deve ser recuperado e tornar-se presença viva. Em certo sentido como Cristo que, afinal, não resolveu o Seu caso e deixou-nos a braços com o horror da cruz. Precisamos, com urgência, de novos cínicos. Cabe-lhes a sublime tarefa de arrancar máscaras, de denunciar os "quentinhos", de esmagar as diversas mitomanias e mitologias, de reduzir a pedaços as hipocrisias geradas e mantidas em e pela sociedade. Resistir, é o lema do novo cínico. Resistir às cristalizações sociais e culturais, às "virtudes" colectivas do correcto instituído pelas esquerdas. Por isso o novo cínico é fatalmente de direita e contra o "labreguismo" dominante. Detesta o conformismo, a ideologia e o supérfluo. Promove a singularidade e a iconoclastia contra a frivolidade pequeno-burguesa, típica de "republicanos". É enérgico. Nietzsche chamar-lhe-ia "super-homem", outros apenas uma alma pura. O homem comum tem - julga ele e foi assim que lhe ensinaram - "esperança". O novo cínico possui a desesperança dos malditos luminosos. Aprende-se muito com os cínicos, os antigos e os por vir.

HOMENS COM IMAGINAÇÃO

No Público de hoje, só uma frase vale a pena. É de Proust. "Deixemos as mulheres bonitas para os homens sem imaginação". O Verão ajuda a perceber melhor o sentido da coisa.

Foto: "Cortesia" do mesmo Público.

PEDROSANTANALOPES.BLOGSPOT.COM


Leio o primeiro post e há qualquer coisa que "não é" PSL. Leio o segundo e já me parece mais PSL. Tudo junto, duvido. Só o próprio poderá garantir. Este blogue é seu, Pedro?

18.7.07

A GRANDE LEI


A legislação estalinista sobre o aborto foi considerada pelo secretário-geral do PS como a opus magnum desta sessão legislativa. É certo que o referendo deu o resultado que deu e é certo que o PR promulgou a lei apesar das advertências. Tudo isso é verdadeiro. Sucede que a legislação, por mais perfeitinha que seja - e esta, na sua regulamentação, é manifestamente um aborto - não "torce" a realidade. E a realidade - os hospitais, os médicos, os enfermeiros - não mudam a sua natureza por causa da lábia deste ou daquela. Pedir aos clínicos objectores de consciência que assinem declarações como estas - "tenho conhecimento da minha obrigação de prestar assistência às mulheres cuja saúde esteja em risco, em situações decorrentes da interrupção da gravidez" e "tenho conhecimento da minha obrigação de encaminhar as grávidas que solicitem a interrupção da gravidez para os serviços competentes, dentro dos prazos legais" - tem qualquer coisa mais adequada a regime totalitário do que a de "esquerda moderna". Depois disto, vêm aquelas senhoras deputadas do BE, com ar de freiras arrependidas, "exigir" que as mulheres madeirenses abortem à viva força e que o respectivo governo regional, à semelhança do de cá, as encoraje. Como me costumam dizer, supostamente para eu me rir, get a life.

WELTGEIST

Como é possível ler com a tranquilidade exigida pela matéria - cirenaicos e cínicos - e ter ao lado um paizinho que, de cinco em cinco minutos, pergunta à menina se ela quer fazer cócó?

LER OS OUTROS...

... talvez fizesse bem à iluminada cabeça da jornalista Teresa de Sousa, a mandatária do regime para a comunicação social dos "assuntos europeus". Uma "especialista". Começava com este post, por exemplo, e depois podia ir tratar dos dentes.

O QUE ESTÁ

"Nenhum candidato [à CML] foi capaz de reagir à degradação. Pelo contrário, vimo-los, sem excepção, despudoradamente submetidos à demagogia mais labrega. A dada altura, pareceu que todos concordavam que cada assessor representa um crime e que, em princípio, quem não é empregado do Estado não é bom cidadão. Não houve ninguém que não tivesse ajudado a abstenção a chegar aos 62,6%. Nada disto é específico da política municipal de Lisboa. E se o parlamento a eleger em 2009 reproduzir alguma coisa parecida com a pulverização e incerteza da vereação lisboeta? Talvez comece então a contagem decrescente para o primeiro governo de iniciativa presidencial desde 1979. Deus guarde o professor Cavaco Silva."

Rui Ramos, in Público

A DIREITA QUE ESTÁ

Às vezes aparecem aqui comentários que me deixam perplexo. Esclareço mais uma vez. Não ambiciono nada deste regime e desta gente, seja qual for o partido em causa. Por vezes dedico mais tempo à chamada direita porque esse é o meu "lado". Não a direita que está, mas a direita por vir. Gostava que fosse possível desenvolver um pensamento institucional neo-salazarista, sem complexos e sem os melros do costume. Quanto a partidos, os que existem, chegam e sobram, embora preferisse uma espécie de "UMP" portuguesa que substituisse toda a direita actualmente visível e sempre em bicos dos pés. Entram e saem, mas são sempre os mesmos a entrar e a sair. A rever-me nalguma coisa, só no PSD-Madeira que, infelizmente, não é transponível para este quadrado de quadrados. É por lá que volto, se voltar, à direita que está.

O ÍMPETO

O sr. Canas que, inexplicavelmente, continua a ser o porta-voz do PS - imagino que um partido com a tal fantástica "adesão popular" do sr. Perestrello tenha melhor para o representar do que o balofo e boquinhas Canas - descansou o país, no fim de uma reunião da seita, quanto ao "ímpeto reformista" do governo. Apesar da presidência europeia, disse Canas, o "ímpeto" mantém-se. E por causa da referida presidência, nada mais nada menos do que doze ministros estiveram "por fora", no Parlamento Europeu, a explicar as respectivas "prioridades". Um deles, Jaime Silva, da agricultura, anunciou em Bruxelas o corte de cerca de dezassete mil hectares de vinha, em abono da "harmonia" da União. O Marquês de Pombal tinha criado a região demarcada do Douro e a respectiva Companhia para internacionalizar a matéria, sobretudo o vinho do Porto. Estes burocratas da modernidade querem acabar com isso em nome das quotas que aprovam para tudo e para nada: para o leite, para as mulheres, para o tamanho das pilas, para o vinho, para o tabaco, etc. etc. Por isso, e ao contrário do que alardeia o sr. Canas a propósito do "ímpeto", não existe reformismo algum em curso. Há umas coisas avulsas, desconexas e em função dos apetites ministeriais, e o que Bruxelas comanda, que é muito. O sr. Silva, que é um subproduto da burocracia europeia, é que sabe. Cortar, cortar e cortar até não haver mais nada a não ser o "progresso" e a "felicidade" transpostos para efeitos domésticos como uma directiva. Isto é que é "ímpeto". Não duvidem.

17.7.07

DOS LIVROS - 4

As sete ou oito últimas linhas deste post "definem" eloquentemente Maria Gabriela Llansol, vá-se lá saber porquê, uma escritora portuguesa muito querida do nosso maoísta de Bruxelas.

APRECIAR PERSONALIDADES

José Medeiros Ferreira tem razão. Sempre apreciei a personalidade de Paula Teixeira da Cruz. Devia ter-se "chegado à frente" e não ter permanecido no quentinho maioritário do cinema Roma. Por isso, por gostar dela, espero que saia.

Adenda: Dito isto, a perspectiva da sra. D. Helena Lopes da Costa à frente da "distrital" de Lisboa do PSD seria de gargalhada se não fosse trágica. Antes o Henrique de Freitas. Sempre é meu amigo e bom rapaz.

FRÁGIL, RUA DA ATALAIA


O Frágil comemora esta noite vinte e cinco anos. Quando ouço a miudagem dizer - com a falsa intimidade de quem não sabe nada nem viveu ainda nada - que vai "ao Bairro", sorrio para dentro. O "Bairro" que eles conhecem, o dos shots, das ganzas e do copinho de plástico na mão no meio da rua, não é exactamente o mesmo Bairro Alto dessa altura. Aliás, quase todos os actuais frequentadores mais assíduos nem sequer eram vivos. O Frágil e, em restaurante, o Pap'açorda, recriaram o Bairro Alto em Lisboa, nos primeiros anos da década de oitenta. Manuel Reis, o José Manuel Miranda e o Fernando "mudaram" aquele lado da noite. Em rigor, criaram uma outra noite que tinha o seu coração na Rua da Atalaia. Saía-se de um para o outro lado e, cada noite, pelo menos nesse verão primeiro, era a primeira. Única. O Frágil tinha sempre à porta homens e mulheres lindíssimos e sofisticados. Anamar começou naquela porta, por exemplo. Lá dentro circulava gente para todos os gostos e todos os gostos eram relativamente saciáveis. Corri para o Frágil quase todo o mês de Agosto desse ano, ao lado do meu amigo Vicente - que se mantém um amigo firme ao fim de um quarto de século -, apenas variando nas companhias. Tinha vinte e um anos e, julgava eu, uma vida genial por vir. Tudo era possível. Nada ou muito pouco, afinal, veio. E tudo se revelou improvável ou, no limite, impossível. Entretanto o Frágil foi definhando até se tornar no estábulo indefinido - logo ele, cujo maior fascínio era justamente essa indefinição - que perdeu as graças dos deuses. Como escrevi noutra ocasião - e já estou em boa idade de não ter de inventar nada - "o ambiente toldou-se e virou lixo, em sentido material e humano. Uma vez, o Miguel Lizarro, em pleno Frágil, olhou em volta e sussurrou-me : "já reparaste, estão todos cheios de vontade de ir para a cama uns com os outros, mas ninguém avança". Alguém acabava sempre por avançar. Agora, nem vontade, nem cama, nem "avanços". Nada. É tudo de plástico como os copos. O Bairro Alto perdeu definitivamente o que tinha de mais belo: a sua noite, a sua autenticidade e o seu esplendor."

RAPAZ COM FUTURO

O sr. Perestrello, o terceiro ou quarto vereador do dr. Costa, acumula com a direcção não sei de quê no aparelho do PS. Já avisou que vai continuar a tomar conta do aparelho para além da fatia que lhe cabe na CML. Para se avaliar o estilo do dito - apenas com trinta e cinco anos mas muito rodado na partidarite aguda - veja-se o comentário a propósito da "manifestação espontânea" do Altis, no domingo. "O PS tem muita adesão popular", afiançou o jovem apparatchik. Tem futuro.

A SENHORA REITORA


Nunca vi nem tenciono ver um único filme de Harry Potter. Da mesma maneira que não tenciono ler livro algum da Sra. Rowling. Todavia não posso deixar de reparar na propaganda do novo filme que aparece frequentemente na televisão. Parece que a "má da fita" é uma senhora reitora qualquer. Pois bem. Manuela Ferreira Leite é a reitora com que algumas almas pueris do PSD sonham. Manuela é o totem do PSD, o oráculo a que se recorre quando os anões começam a esbracejar. Talvez pela dureza do rosto, pela inflexibilidade na acção e pela poupança na palavra, Manuela é o permanente alter ego da liderança de um partido que aprecia chefes e não presidentes. Fiz parte das suas listas, em Lisboa, numa outra encarnação e, confesso, nunca percebi o que é que a unia ao António Preto e vice-versa. E fiz por causa do respeito vagamente autoritário que a sua pessoa inspira. Quando exerceu um cargo nitidamente político - presidente do grupo parlamentar com Marcelo, salvo erro - Manuela não deixou marca, boa ou má memória. Os outros postos - chefe de gabinete de Cavaco ministro, secretária de Estado, ministra (da Educação e das Finanças) -, sendo políticos, eram essencialmente pura intendência. Aliás, Manuela exerceu-os com a perícia de uma auditora e a proficiência de uma contabilista. Nem mais, nem menos do que isso. Ou seja, nada a distingue particularmente para a chefia de um partido a não ser, neste momento, poder concorrer com o autoritarismo dirigido do senhor presidente em exercício. Manuela não representa política alguma. É, antes, uma campeã do "apolítico" na política, como Cavaco, seu mentor. A diferença é que Cavaco tem um lado político profissional que o catapultou ao lugar que ocupa e que Manuela, por mais que se esprema ou a espremam, não tem. Falta-lhe, numa palavra, o talento para a coisa. Mesmo assim, ela vai andar por aí nas próximas semanas, na boca de outros ou motu proprio. Para a telenovela ser completa, só falta Santana Lopes. Mas, a seu tempo, ele aparecerá. Não resiste.

16.7.07

AS ALTERNATIVAS


O dr. Mendes já tem duas "alternativas". Uma, eterna, é o dr. Menezes, autarca de Gaia, uma espécie de "Kompensan" ambulante que se acha sublime e que não compreende por que é que o partido, primeiro, e o país, depois, não o desejam. A segunda, também nortenha, é o dr. Aguiar Branco, mundialmente famoso depois de ter exercido as funções efémeras de ministro da justiça. Estas excelências, repare-se, aspiram a dirigir a direita. Sim, porque enquanto o regime for o que é, quem dirige a direita é o PSD e jamais o CDS-PP. Ora com gente desta, o dr. Mendes persiste, com a maior naturalidade, até 2009. Viu-se agora em Lisboa o que dá brincar com amadores da estirpe do novo militante Negrão. A macrocefalia política de Lisboa praticamente impede que qualquer "homem do norte" mande. Sá Carneiro era do Porto mas há muito que tinha "adoptado" Lisboa. Só existe um homem no norte que podia apoderar-se das hostes "laranja" com a possibilidade de um módico de êxito. Não é do regime, não segue o sistema, é teimoso e tem uma forma algo iconoclasta de tratar a coisa pública. Não é adulado pela opinião que se publica e não teme reverencialmente ninguém. Chama-se Rui Rio e sabe alemão. Tivesse ele pachorra e "treino" e talvez, esse sim, pudesse avançar sem que fosse preciso tirar quinze dias de riso nacional. De resto, e ao contrário do que se pode pensar, Mendes é um osso duro de roer. O meu palpite é que é mesmo ele quem vai levar o andor até 2009.

A UNIÃO DOS CORAÇÕES


Encontro, no programa de Bárbara Guimarães "Palavras Soltas", e alertado por uma amiga comum, o José Manuel dos Santos. Fala de Antero* e de Cesariny. Exibe dois manuscritos, um de Antero - uma carta - e outro de Cesariny, para ele, outra carta que termina com um "abraço-te, triste, o alegre, fulano". Ouço-o referir que Eduardo Lourenço é a antítese do enunciador de lugares-comuns culturais. Fica a sugestão de dois livros de Lourenço, os mais recentes, com Antero e Eça. Tenho uma saudade profunda destas conversas com José Manuel dos Santos que estimo e admiro. Da sua argúcia e inteligência luminosas. da sua generosidade. Não sei se ele aprecia São Tomás de Aquino. Eu tenho dias. Todavia gostava que ele - e outros que se afastaram ou, se calhar, fui eu quem se afastou - meditassem nesta sua frase que está à porta da casa do Restelo do prof. José H. Saraiva: "a concórdia é a união dos corações, não a das opiniões". Tal como Mitterrand, acredito nas forças do espírito e, mesmo sozinho, eu não os abandono. Abraço-te, triste, J.

Foto: Minha, péssima, do local no Campo de São Francisco, em Ponta Delgada, onde Antero acabou com a sua amargura.

DA MEDIOCRIDADE


Viu-se ontem, com o "povo" do Altis. Por que é que o senhor presidente em exercício não o exibe nos fora europeus em que vai passar a vida estes seis meses? Ou só os Júdice e os Salgados da vida videirinha é que são exibíveis? Ou os vereadores eleitos em Lisboa que já se dizem "disponíveis" para o dr. Costa quais "meninas de programa"? A elite merece o povo que a saúda e vice-versa.

LER OS OUTROS

Fora a parte final - estou-me nas tintas para a "esquerda" ou para o que passa por isso na actual plutocracia regimental -, dei por mim a concordar com o ABB. E, claro, com o Dragão, um rapaz mais da minha "criação".

UMA DEMOCRACIA COM CARA DE FODA-SE


Nos intervalos das suas correrias tontas como presidente em exercício, conviria ao secretário-geral do PS - tão emocionado com a "riqueza" da participação eleitoral que só deve ter existido na sua autoritária mona - nos magros cinquenta e oito mil votos que a sua seita arrebatou através do dr. Costa. Costa que, por sua vez, demonstrou pela enésima vez que não possui uma ideia para a cidade (ele vive de conspirar, não vive de pensar) a não ser a tal da "limpeza geral" e mais dois ou três lugares-comuns. E não foi em Cabeceiras de Basto, a terra que estranhamente ocupou o Altis, que ele ganhou. Foi em Lisboa. Dos restantes partidos, nem vale a pena falar. Ontem registou-se uma derrota geral da plutocracia partidária - cega, surda e muda aos valores da abstenção - e a apoteose do "estou-me nas tintas" generalizado. Aos poucos, os portugueses, mais preocupados com as suas coisinhas, com as suas vidas medíocres e com os seus filhos ranhosos e analfabetos, votam a pseudo-cidadania política ao maior desprezo. Os sempre-em-pé já não entusiasmam ninguém. A democracia está cada vez mais com cara de foda-se.

15.7.07

CONTRA O OPTIMISMO


"Tenho o maior desprezo pelo optimismo."

Oscar Wilde, O Retrato de Dorian Gray

PORTELA+1

Costa não chegou a 30% dos votantes que foram 196 mil em 524 mil eleitores potenciais*. Santana Lopes teve mais de 42% em 2001. Costa teve menos votos que Carrilho em 2005*. Ganhou, mas para quem queria a maioria absoluta, ficou-se por uns maravilhosos 58 mil*. O PS e o governo, na capital, em sondagem real, tiveram 58 mil votos. A malta está mesmo farta da corja. E decididamente - pelo menos nós, em Lisboa - não quer a Ota nem passarinhos e cagalhões de cão na Portela.

Fonte: O blasfemo João Miranda

A LUTA CONTINUA


Marques Mendes foi o único dirigente partidário - de cinco com representação parlamentar - que parece ter percebido a abstenção, os votos nulos e os dois "independentes" metidos no meio dos dois partidos do regime, um deles, Carmona, à frente do PSD, e Roseta à frente do PC e do BE. Isto é, o descalabro - por agora, lisboeta - desse mesmo regime e do sistema que o sustenta. Vai, por isso, a votos dentro do PSD. Faz bem. Mas faria melhor - tal como Portas - se percebesse que a Direita precisa de outra coisa e de novos protagonistas. A menos que pretenda que tenhamos de aturar o senhor presidente em exercício e respectivos acólitos por muitos e bons anos. Como diriam outros, a luta continua. Arranje-se rapidamente um Sarkozy.

LIMPEZA GERAL - 2

O dr. Costa insiste na "limpeza geral" da cidade. Porém, a gente olha para a primeira fila dos seus melancólicos apoiantes e tira a conclusão óbvia. É por ali que é preciso dar início à "limpeza geral".

O SUPRA-PORTAS

O sr. Telmo veio tomar as dores do dr. Portas e lamber as respectivas feridas. Depois o dr. Portas, correctamente, engoliu tudo. Nenhum deles percebeu, para já, que o tempo deles passou. Pode ser que volte, mas não é agora. Passou.

CIRCO

O PS trouxe gente de autocarros, gente que vive fora de Lisboa, para fingir a alegria no Hotel Altis. Que palhaçada democrática.

DAQUI PARA DIANTE - 2

O sr. Perestrello, do aparelho do PS, explicou que quer "governar" Lisboa sozinho, com a sua maioriazinha. Isto como se não andassem já de telemóvel na mão. Cambada de papagaios falsos.

DAQUI PARA DIANTE

Dois anos - dois - para dar a volta completa à direita, senão o senhor presidente em exercício, sem mexer uma palha, eterniza-se e só tem o dr. Costa como oposição, a partir de Lisboa, quando a coisa começar a resvalar para o nada, para já oculto e, a seu tempo, evidente.

DOMINGO IDIOTA EM LISBOA - 7

Infelizmente o "Zé" continua, com o habitual pé fora da vereação, mas desta vez com um olhinho trémulo em Costa "noves fora" Júdice, esse novo herói socialista da zona ribeirinha de Lisboa.

DOMINGO IDIOTA EM LISBOA - 6

Pedro Santana Lopes que, contra tudo e contra todos, ganhou a CML em 2001 e, indirectamente, deu o impulso final para a saída nocturna de Guterres, deve falar.

DOMINGO IDIOTA EM LISBOA- 5

Se Negrão ficar em 3º, o PSD também não pode passar por isto como cão por vinha vindimada. Todavia, Mendes não se rende com facilidade.

DOMINGO IDIOTA EM LISBOA- 4

Portas deverá averbar a sua segunda derrota em escassos meses. Madeira e, agora, Lisboa. O seu não-luto vai sair-lhe muito caro. Não aprendeu nada com a paciência chinesa do dr. Barroso que andou com ele às costas. A direita resvala rapidamente para "outra" coisa, graças a Deus.

DOMINGO IDIOTA EM LISBOA -3

Para já , grande derrota das nomenclaturas partidárias. O primeiro a abrir a bocarra, o dr. Júdice, é todo um programa. Fala do PS como se fosse um "histórico". Mais da mesma miséria, mais do mesmo regime, mais dos mesmos papagaios. Costa não teve o que pediu e Carmona deverá servir a sua vingança relativamente fresquinha.

DOMINGO IDIOTA EM LISBOA -2

A SIC Notícias, perto das 19 horas, está a lamber as botifarras do dr. Costa, o irmão do senhor director de informação e putativo presidente da CML eleito num mar de indiferença a que todos deverão reagir com a costumada necedade.

DOMINGO IDIOTA EM LISBOA


Aí por volta da hora do almoço, só pouco mais de 15% de distraídos tinha votado em Lisboa. E o domingo, já por si, convida à idiotia. Votar em qualquer das 12 nulidades insupríveis que se apresentam como candidatos à pastorícia camarária, devia ser punido através de uma postura municipal. Vergonha dupla. Ser candidato e votar em qualquer um deles.

BÁSICO


O sr. Saramago sempre se distinguiu por não ser excessivamente patriota. Nos idos do PREC, quando dirigiu o DN - como, aliás, fica claro no livro da Zita Seabra - era um dos "controleiros" do partido para a "revolução nacional e patriótica" que se preparava, isto é, para a tomada absoluta do poder à boa maneira de 1917. Primeiro Fevereiro, depois Outubro e com o que havia: meios de comunicação social, tropa, "comissões" para tudo e para nada. Saramago controlou e saneou. Agora tem o regime e o sistema a seus pés, tal como o camarada Carvalho da Silva, a avaliar pelas presenças no seu "doutoramento" no ISCTE. Saramago acha que nos vamos fundir com a Espanha, mais tarde ou mais cedo. Não deixa, desta vez, de ter alguma razão. Mais tarde ou mais cedo, vamos pagar a factura da periferia e do primitivismo, apesar da Europa. À medida que esta avança para o seu centro, nós ficamos mais longe e a Espanha mais perto do fundamental. Não há Ota ou TGV que nos safem. Saramago, traduzido por todo o lado, já nem sequer é bem português. Nem sei mesmo se, a partir de dada altura, aquilo que ele escreve é português ou "literatura" portuguesa. Saramago já tem aquela boa idade em que nos começamos a cagar para tudo. Felizmente, e com o estado da arte em que nos colocaram, a coisa começa mais cedo. É já no básico e no secundário. Aliás, já há muitos anos, e em praticamente tudo, que não largamos o básico. Literalmente.

DESOBEDIÊNCIA CIVIL


Existem dois bons motivos para praticar, durante todo o dia, a desobediência civil. Em Lisboa, não votando nas eleições intercalares para a CML ou votar nulo em nulos. No resto, e particularmente no que concerne aos hospitais do SNS pagos pelos impostos dos contribuintes, abortistas e não abortistas, os médicos com consciência que a usem. E usem-na não apenas nos hospitais públicos mas igualmente nos privados. Desde o referendo que está amplamente provado que não existem condições objectivas, em todo o território nacional, para perpetrar abortos. Ou pior do que isso. Os que as possuem, não têm meios para assegurar tratamentos, por exemplo, do foro oncológico, esses, sim, bem mais prioritários do que o recurso ao facilitismo anti-concepcional, ainda por cima sem pagamento de taxas moderadoras. Tal como existia, a lei servia perfeitamente os propósitos terapêuticos da interrupção justificada da gravidez. A partir de hoje, e até às 10 semanas, é como usar um dispositivo intra-uterino ou um preservativo, apenas com mais garantias de sucesso e de rapidez. Preparar o futuro não se faz à conta da incerteza desse mesmo futuro, esmagando o passado e o presente. Se houver por aí um resquício de pensamento e de opinião pública em Lisboa e no país inteiro, então marimbem-se no futuro senhor presidente da Câmara e entreguem-na ao caos e às apalpadelas mútuas que já se preparam na sombra da hipocrisia partidária e "independente". E aproveitem o dia para reflectir sobre o país que a "esquerda moderna" anda a preparar. Um país de velhos infantilizados para velhos modernaços.

14.7.07

MEMÓRIAS DE SARAIVA


Nos seus livrinhos semanais de "memórias", José Hermano Saraiva vai ajustando contas com a petite histoire. Neste 5º exemplar, Saraiva já deixou de ser ministro da Educação - meteórico, audaz, agitado, diferente - e passou a nosso embaixador no Brasil onde o "25" o apanhou. Como se sabe, foi substituido por esse socialista tardio chamado Veiga Simão, na altura uma "jovem" promessa do "marcelismo" cuja passagem por Moçambique acabou por o aproximar desse todo-o-terreno deste regime, o ancião Almeida Santos. Tanto assim que, enquanto Saraiva foi expeditamente demitido das suas funções no Brasil depois da "abrilada", Simão seguiu imediatamente para Nova Iorque como embaixador do novo regime na ONU. Finalmente, Guterres repescou-o para ministro da Defesa de onde saiu, sem honra nem glória, depois de alguém lhe ter "puxado o tapete" com os "espiões" militares. Estava, ao fim de trinta anos, "vingada" a esperteza luso-moçambicana deste físico que tanto se gabava da sua formação anglo-saxónica. Também se recorda neste número a figura - sempre apresentada na opinião que se publica como sinistra e venal - do Almirante Henrique Tenreiro, afinal um menino de coro ao pé dos arrivistas posteriores a actuais dos nossos partidos "democráticos". Mas o período mais curioso é o dedicado a esse herói do anti-salazarismo e "grande português" (por acaso, no programa da D. Elisa foi "defendido" por esse mito jurídico-político do sistema, o dr. Júdice, mandatário de Costa para a Câmara e do governo para o rio Tejo), Aristides de Sousa Mendes. "O salvamento dos 30000 refugiados deu-se ao mesmo tempo que o cônsul de Portugal em Bordéus, em cumplicidade com dois funcionários da PIDE, falsificava algumas centenas de vistos, que vendia por bom preço a emigrantes com dinheiro. Um dos que utilizavam esta via supôs que todos os outros vieram do mesmo modo - e assim nasceu a versão, hoje oficialmente consagrada, de que a operação de salvamento se deve ao cônsul de Bordéus, Aristides de Sousa Mendes. Este, muito afecto ao Estado Novo, nem sequer foi demitido, mas sim colocado na situação de aguardar aposentação. Os seus cúmplices da PIDE foram julgados, condenados e demitidos". Aprende-se muito com os velhinhos.

José Hermano Saraiva, Como íamos dizendo, memórias, confidências e lembranças, Álbum de Memórias, 6ª Década (Anos 70) I Parte: Em Brasília), pág. 17, Edições Sol

13.7.07

O OCASO

Grave é o que se passa com os alunos do secundário. Baixar as expectativas, triturar a exigência, fugir do esforço, ficar pela "meia-educação" ou por nenhuma, facilitar, institucionalizar o "small is beautiful", arredar os livros, promover a televisão, a bola ou o Ipod, conduziram à conclusão óbvia. Os alunos não percebem o que lêem e chumbam maciçamente, seja na matemática, seja noutra coisa qualquer. É esta a sociedade de trampa que estamos a preparar no ano da graça da presidência europeia. É ao crepúsculo que a ave de Minerva levanta voo. Pode ser que, quando esta porcaria bater totalmente no fundo, outra coisa comece.

LIMPEZA GERAL

Com a gravitas de quem já se sente presidente de Lisboa, o dr. Costa anunciou uma "limpeza geral" da cidade a partir de Setembro. Como munícipe e lisboeta, julgo que a "limpeza" deve começar já no domingo não votando ou votando nulo. Qualquer das duas hipóteses é a mais consentânea com as alternativas em presença. Entre o sol e o vazio, há alguém que ainda hesite?

MACACADA


Uma das coisas mais abjectas numa campanha autárquica, sobretudo numa cidade como Lisboa, é ver os candidatos de transportes públicos. Eles, que nem o preço de um bilhete conhecem, que roçam o rabo em carros estofados a couro, alguns mesmos só com motorista, agora é vê-los de barquinho, de Carris, de metro e a pé por bairros e ruas que nunca visitaram na vida. Ainda bem que este massacre termina esta noite. Que pensará o resto do país de tamanha macacada?

A ELITE E O POVO

"Há nações em que as elites parecem não pertencer ao povo de onde saíram; aqui as elites são um aviltamento do povo. Teimo - acusem-me de lunático - que este povo, se foi e fez o que foi, merece melhor sorte que as elites que se lhe impuseram."

in Combustões


Nota: Como isto é um país macrocéfalo, a elite concentra-se essencialmente em Lisboa. A que manda, faz bicha atrás do dr. Costa. Há vinte anos, na campanha de Mário Soares, António Costa era um rapaz das liberdades. Agora, é o o homem dos plutocratas do sistema. Pelos vistos, o "povo" aprecia uma boa trela e dispensa pensamento. Força.

SOL E VIDA NA POLÍTICA

O presidente francês, Nicolas Sarkozy, pronunciou ontem, em Epinal, um discurso decisivo acerca do futuro das instituições políticas francesas recorrendo à história. Sei perfeitamente que o nosso "regime salamaleque" não "encaixa" uma personalidade como a de Sarkozy. É um discurso de um francês para franceses e para a França. É, como me chamou a atenção um leitor, uma das mais extraordinárias reflexões político-filosóficas dos últimos tempos. É um discurso sobre o Estado, a República e a reforma das instituições. Por cá, num momento em que tanto papagaio surpreende "reformas" onde apenas existe propaganda e circo, e em que se proclama a "excelência" de uma medíocre e dependente "sociedade civil" pseudo-asfixiada pelo Estado (asfixiada, sim, pela sua néscia cupidez e pela sua auto-comiseração), era bom que aparecesse um Sarkozy para começar tudo de novo. Este regime não só nasceu anquilosado como já está velho há demasiado tempo. Precisa de sol e vida.

12.7.07

ZITA E O CAMARADA


Li, de fio a pavio, o livrinho de Zita Seabra sobre a sua militância no PCP entre 1966 e 1988. "Sempre cândida e às vezes comovedora", escreve Vasco Pulido Valente na contracapa. Não exageremos. Zita passou à clandestinidade com apenas dezassete anos, depois de uma promissora adolescência de burguesinha do Norte. Podia ter ido parar a um romance de Agustina e nem num de Manuel Tiago, afinal, coube. Filha única, mimada, familiares da "oposição", deixou-se tentar pelo romantismo revolucionário prometido pelo "partido". Quis experimentar e acreditou que a coisa era mesmo "cientifica" como ressumavam os manuais. Teve sorte. Nunca foi presa, torturada ou expelida do país. Mergulhou apenas no Portugal profundo da oposição tal como o PC e a sua máquina o concebiam: secreto, misterioso, desconfiado, umbiguista e alheio ao "outro". O "outro" era sempre o mesmo, os mesmos. Cresceu politicamente nessa dureza e, se ainda o não era, ficou uma mulher dura para o resto da vida. Quando eu tinha dezasseis anos e a conheci na UEC - estava então grávida -, Zita era famosa pela sua intransigência típica de filha dilecta "adoptiva" do proletariado. O melhor do livro são as peripécias da clandestinidade sem "malícia" da "camarada", o salto de casa em casa e os relatos de algumas conversas surrealistas da época. Nunca houve ingenuidade nem candura. Zita jamais poderia ter tido a mão livre para criar e sedimentar a UEC se não fosse um quadro bem cotado. Uma profissional. Levou vinte e poucos anos a perceber o logro ou a enjoar-se dele. Em 1987, na primeira maioria de Cavaco, ainda era da comissão política do PC de onde foi expulsa no ano seguinte. O relato podia ser mais interessante quanto a Cunhal. Por mais de uma vez, a autora repete-se em relação ao "Camarada" e em aspectos perfeitamente banais. Não acredito - dada a proximidade até praticamente ao fim - que Zita não tivesse mais para contar acerca do secretário-geral. Foi, diz ela, intelectualmente "libertada" por dois ex-esquerdistas (do "radicalismo pequeno-burguês de fachada socialista", nos termos de Cunhal), agora grandes e insuportáveis "liberais" do regime, os drs. Espada e Carlos Gaspar. E teve o apoio paternalista de Mário Soares que merece os maiores encómios como uma espécie de "grande educador nacional para a democracia e a liberdade". A frieza e o profissionalismo da personagem Zita Seabra - a militante comunista, a dirigente estudantil implacável, a dissidente, a social-democrata, a editora - estão inteiros (sem nenhum tipo de rasgo literário ou pretensão de "historiadora" que, aliás, rejeita logo no início) nas quatrocentas e trinta e tal páginas de Foi Assim. Se alguém aprendeu com Álvaro Cunhal - e nunca por nunca com Soares - foi Zita Seabra. Daí, talvez, a imperfeição do "retrato" do homem da amarga derrota dos últimos tempos, remetido melancolicamente a um andar nos Olivais. Propositada? Não saberemos nunca verdadeiramente que "história" Zita Seabra teria para contar.