... que perde tempo a discutir Isaltino, agora candidato do dr. Jorge Coelho a Oeiras, mais meia dúzia de "autarcas" de província, o pesadelo da regionalização e tretas afins, um país povoado de mediocridades vaidosas e invejosas que persiste em se afundar suavemente, iletrado e economicamente débil, é um país que não se respeita a si próprio e que não merece que se perca muito tempo com ele. Até qualquer dia.
«Somos poucos mas vale a pena construir cidades e morrer de pé.» Ruy Cinatti joaogoncalv@gmail.com
30.4.05
28.4.05
O ACÓRDÃO DE PONTA DELGADA
No meio do Atlântico, nos Açores, há um magistrado que deve ter lido Suetónio e o prefácio de Gore Vidal à célebre versão da "Vida dos Doze Césares" do primeiro, de Robert Graves. Vem isto a propósito da decisão do "tribunal de júri" de Ponta Delgada que se recusou a aplicar um artigo do Código Penal aos condenados no processo de pedofilia de Lagoa. De acordo com aquele tribunal, na pessoa do juiz de direito Araújo de Barros, a Constituição, revista em 2004, no seu artigo 13 º proíbe a discriminação em função da orientação sexual. Logo - entende este magistrado - constitui uma "ofensa ao princípio da igualdade" a citada norma do Código Penal que pune "quem, sendo maior, praticar actos homossexuais de relevo [onde diabo estará o "relevo" de um "acto homossexual" ? e existirão "actos homossexuais sem "relevo"?] com menor entre 14 e 16 anos". Porém, este juiz vai mais longe. No acórdão lido nos Açores, Araújo de Barros critica um outro acórdão, este do venerando Supremo Tribunal de Justiça, de 2003, onde se defende a conformidade desta norma com a Constituição. Que diz então o acórdão da instância suprema do poder judicial e órgão de soberania do Estado português? Diz esta coisa extraordinária: que se devem considerar os crimes que se traduzem em actos heterossexuais com adolescentes "mais normais" (sic) do que os resultantes de actos homossexuais com adolescentes. Na sua análise desta pequena pérola jurídica, Araújo de Barros refere que a tal norma penal representa "uma operação de cosmética" do legislador destinada a impedir que se compare "em geral as duas formas de sexualidade [a homo e a hetero]", reduzindo manhosamente a homossexualidade "para a área da anormalidade". E explica porquê. "Se já é pouco normal ter relações heterossexuais com um adolescente, muito menos o será ter com ele relações homossexuais", uma tese que, no seu entender, equivale aos "argumentos falaciosos que historicamente se esgrimiram para legitimar a xenofobia, o racismo ou a discriminação das mulheres". Como a tal norma do Código Penal prevê a condenação por actos homossexuais, independentemente de haver ou não lugar ao abuso da inexperiência dos adolescentes, Araújo de Barros, no acórdão dos Açores, escreve que se está a "consagrar um regime que discrimina, aqui notoriamente sem qualquer fundamento, o acto homossexual em relação ao acto heterossexual". Como a história abundantemente mostra, não há na sexualidade propriamente uma norma, um dever-ser e, nesse sentido, não há nenhuma sexualidade "natural". O que existem são pessoas que possuem uma sexualidade que se manifesta, ora consigo mesmo, ora com mulheres, ora com homens, ora com ambos, ou, como na antiguidade pagã, com os "rapazes". Gore Vidal vai até mais longe e explica que não há homo ou heterossexuais, mas antes actos homossexuais ou actos heterossexuais. Nem Suetónio, primeiro, nem Gore Vidal ou Mary Renault séculos depois, diriam melhor que este acórdão de Ponta Delgada.
LER OS OUTROS
1. Pelo Mário, cheguei ao Nuno e, de facto, têm razão. Por que é que as "crianças" da D. Catalina e os mediáticos intervenientes do processo "Casa Pia" são mais ou menos "crianças", mais ou menos "arguidos", do que os protagonistas dos Açores? Por que é que será?
"...a forma como foi dirigido o caso de pedofília dos Açores. Como ninguém pode dizer que umas crianças valem mais que outras, fica a suspeita que a causa do sucesso deste caso face ao pântano casapiano se deve meramente à ausência de nomes sonantes e câmaras de televisão. Mas outro exemplo foi dado, talvez ainda mais surpreendente:
Numa palavra, exemplar."
2. No Random Precison, isto.
O PROFESSOR CAVACO VOLTOU A FALAR
Para ler na Grande Loja, em jeito de "complemento" à minha "impressão" de ontem. As eleições presidenciais ainda podem vir a tornar-se num assunto de "segundas" e de "terceiras" escolhas. Como escrevi um dia ou dois depois das legislativas, a famosa "passadeira vermelha" para Cavaco Silva podia, com a maior facilidade, passar para um tapete de uma "loja dos trezentos". Suspeito que a vontade do professor mudou com os congressos da "direita". Só valia a pena ser candidato se não ficasse prisioneiro destes corifeus, dos que ganharam e dos outros. Para isso, como defendi, deveria ter dito que era candidato logo a seguir às legislativas, ou seja, inapropriável por quem quer que fosse e insuspeito de instabilizar a "nova maioria". Teria tido, nessa altura, a vantagem da claridade. Se avançar oportunamente, não deixarão de lhe recordar os nomes daqueles que, antes mesmo do próprio, suscitaram a candidatura como sendo "deles". E aí será, para ele, uma péssima recordação.
27.4.05
É IMPRESSÃO...
... minha ou Cavaco Silva terá ficado horrorizado com a perspectiva de ter como "apoiantes" a canzoada que se distinguiu nos congressos do PSD e do PP, a qual lhe terá aumentado as "dúvidas" quanto à sua candidatura a Belém? Realmente, com "amigos" daqueles, para que é que Cavaco precisa de inimigos?
26.4.05
BOA PERGUNTA
Só por não ser na capital ...
Por que razão não teve a semana de inauguração da Casa da Música no Porto o mesmo impacto mediático que a Festa da Música do CCB está a ter, com directos televisivos a todas a horas e dias seguidos de primeiras páginas nos jornais?
LER OS OUTROS
O artigo de José Medeiros Ferreira no Diário de Notícias, O Sacro Império e os continentes. "Agora que sou sexagenário também saboreei a eleição de um vigoroso intelecto de quase 80 anos para governar a Santa Sé e milhões de fiéis espalhados pelos cinco continentes. É uma lição a reter por algumas sociedades que seleccionam os seus dirigentes à saída do ginásio escolar e em que uma das principais discriminações é a da idade".
25.4.05
31 ANOS
Nunca aqui pus este poema até hoje. Apesar de ter desaparecido entretanto, Sophia permanece como uma das vozes eternas da madrugada de há 31 anos. E, podendo parecê-lo, está longe de ser um lugar comum.
Esta é a madrugada que eu esperava
O dia inicial inteiro e limpo
Onde emergimos da noite e do silêncio
E livres habitamos a substância do tempo
Esta é a madrugada que eu esperava
O dia inicial inteiro e limpo
Onde emergimos da noite e do silêncio
E livres habitamos a substância do tempo
24.4.05
LIBERTAI-VOS DO DESERTO, NÃO TENHAIS MEDO!
Bento XVI começou hoje oficialmente o seu pontificado. É um intelectual superior e, como tal, percebe perfeitamente o que se passa por aí. O seu diálogo do ano passado com o filósofo Jürgen Habermas vem comprová-lo. Acontece que não compete à Igreja, e muito menos ao sucessor de Pedro, seguir a "agenda" dos outros, mesmo que isso comporte o rótulo apressado de "reaccionário" ou "fundamentalista". Ao apelar aos "jovens", Ratzinger, na linha de João Paulo II, pretende uma "fé viva" e dar combate àquilo que chama de "ideologia média". Verdadeiramente, quem é que no seu perfeito juízo não deseja "fugir do deserto" da "ideologia média" que nos rege em todos os lances da vida, algo a que O'Neill chamava o "modo funcionário de viver"? Quem?
(...) La parabola della pecorella smarrita, che il pastore cerca nel deserto, era per i Padri della Chiesa un’immagine del mistero di Cristo e della Chiesa. L’umanità – noi tutti - è la pecora smarrita che, nel deserto, non trova più la strada. Il Figlio di Dio non tollera questo; Egli non può abbandonare l’umanità in una simile miserevole condizione. Balza in piedi, abbandona la gloria del cielo, per ritrovare la pecorella e inseguirla, fin sulla croce. La carica sulle sue spalle, porta la nostra umanità, porta noi stessi – Egli è il buon pastore, che offre la sua vita per le pecore. Il Pallio dice innanzitutto che tutti noi siamo portati da Cristo. Ma allo stesso tempo ci invita a portarci l’un l’altro. Così il Pallio diventa il simbolo della missione del pastore, di cui parlano la seconda lettura ed il Vangelo. La santa inquietudine di Cristo deve animare il pastore: per lui non è indifferente che tante persone vivano nel deserto. E vi sono tante forme di deserto. Vi è il deserto della povertà, il deserto della fame e della sete, vi è il deserto dell’abbandono, della solitudine, dell’amore distrutto. Vi è il deserto dell’oscurità di Dio, dello svuotamento delle anime senza più coscienza della dignità e del cammino dell’uomo. I deserti esteriori si moltiplicano nel mondo, perché i deserti interiori sono diventati così ampi.
(...) In questo momento il mio ricordo ritorna al 22 ottobre 1978, quando Papa Giovanni Paolo II iniziò il suo ministero qui sulla Piazza di San Pietro. Ancora, e continuamente, mi risuonano nelle orecchie le sue parole di allora: “Non abbiate paura, aprite anzi spalancate le porte a Cristo!” Il Papa parlava ai forti, ai potenti del mondo, i quali avevano paura che Cristo potesse portar via qualcosa del loro potere, se lo avessero lasciato entrare e concesso la libertà alla fede. Sì, egli avrebbe certamente portato via loro qualcosa: il dominio della corruzione, dello stravolgimento del diritto, dell’arbitrio. Ma non avrebbe portato via nulla di ciò che appartiene alla libertà dell’uomo, alla sua dignità, all’edificazione di una società giusta. Il Papa parlava inoltre a tutti gli uomini, soprattutto ai giovani. Non abbiamo forse tutti in qualche modo paura - se lasciamo entrare Cristo totalmente dentro di noi, se ci apriamo totalmente a lui – paura che Egli possa portar via qualcosa della nostra vita? Non abbiamo forse paura di rinunciare a qualcosa di grande, di unico, che rende la vita così bella? Non rischiamo di trovarci poi nell’angustia e privati della libertà? Ed ancora una volta il Papa voleva dire: no! chi fa entrare Cristo, non perde nulla, nulla – assolutamente nulla di ciò che rende la vita libera, bella e grande. No! solo in quest’amicizia si spalancano le porte della vita. Solo in quest’amicizia si dischiudono realmente le grandi potenzialità della condizione umana. Solo in quest’amicizia noi sperimentiamo ciò che è bello e ciò che libera. Così, oggi, io vorrei, con grande forza e grande convinzione, a partire dall’esperienza di una lunga vita personale, dire a voi, cari giovani: non abbiate paura di Cristo! Egli non toglie nulla, e dona tutto. Chi si dona a lui, riceve il centuplo. Sì, aprite, spalancate le porte a Cristo – e troverete la vera vita. Amen.
23.4.05
À VISTA
Não foi apenas na comunicação social portuguesa que foram registadas as férias de Durão Barroso a bordo de um iate amigo. Revistas e jornais europeus mencionaram o facto como negativo para a imagem do presidente da Comissão Europeia, já que o dono do iate possui "interesses" susceptíveis de colidirem com a isenção exigida ao cargo detido por José Manuel Barroso. Parece, portanto, que a "honra nacional" Barroso - lembram-se?... era assim que a pátria política o via em Junho do ano passado - não consegue reprimir a sua vaidade pequeno-burguesa e a atracção kitsch por descansos paradisíacos e milionários. Dir-se-á que é "vida privada" e "inveja". Não é bem assim. A visibilidade e a relevância da função obrigam a ponderar todos os passos, mesmo aqueles dados sob o sol e em pé descalço com a família. Sobretudo quando se é particularmente "vigiado" por causa do debate em curso na Europa no qual Barroso, o "neoliberal", anda sob fogo cerrado. Lá como cá, Barroso não consegue fugir ao seu magnífico destino de "mal amado". Se dúvidas restassem sobre as qualidades político-pessoais da criatura, Paulo Portas, na despedida, encarregou-se de as "explicitar". Na verdade, um pequeno-burguês de "espírito" será sempre um pequeno-burguês, aqui, no Brasil, em Bruxelas ou a bordo de um luxuoso iate. Com o tempo, a "Europa" entenderá no que se meteu ao escolher Barroso para chefe da sua burocracia máxima . Como diria Shakespeare, "ele é o que ele é". Está, aliás, à vista.
22.4.05
QUASE NADA
Certamente a mando de Santana Lopes, os seus empregados superiores na CML, vulgo vereadores, tentaram, numa cena patética, mostrar a sua indignação a Marques Mendes por este não ter escolhido o seu patrão para recandidato à Câmara. É bem feito para Carmona Rodrigues. Talvez agora perceba o género de gente com quem andou a tratar. Não lhe adiantará muito afastar-se deles. Santana fará tudo para o arrastar para dentro do seu privado "Titanic" camarário. Gente desta não perdoa. E Carmona pôs-se a jeito ao aceitar tudo e o seu contrário de Santana Lopes. A sua "competência" aparece assim diluída no lodaçal deste infeliz mandato autárquico onde praticamente não sobra pedra sobre pedra. Carmona é apenas o melhor do que não presta. E isso é quase nada.
LIBERDADE
Pierre Hassner dava ontem uma entrevista ao Público, conduzida por Teresa de Sousa. Falou abundantemente sobre o referendo em França e das causas pelas quais os franceses se inclinam para o "não" à "constituição europeia". É um texto "pedagógico" de um "seguidor" de Raymond Aron e explica por que é que os franceses têm alguma dificuldade em se reconhecer "aronianos". Também me serve perfeitamente e é uma bela frase para o "25 de Abril". É difícil ser a direita da esquerda e a esquerda da direita, e eu percebo isso porque também sou assim. Todos nós somos pela igualdade e contra a miséria, mas o que nos faz caminhar é mais a liberdade que a igualdade. O que fez a nossa paixão não foi a questão social mas a questão política. Não a justiça, no sentido de haver muitos ricos e poucos pobres - sobre isso somos todos a favor - mas a questão da liberdade e do totalitarismo.
21.4.05
PESSIMISTA
Jornais e revistas por este mundo de Cristo não param de "comentar" Joseph Ratzinger. Um jornalista português viu bem a coisa e definiu-o como um pessimista que duvida da natureza humana, uma manifesta qualidade que só abona Bento XVI.
20.4.05
REFERENDOS
Jorge Sampaio explicou pacientemente aos partidos políticos a inoportunidade da realização de um referendo sobre a interrupção voluntária da gravidez a curto prazo. Tem razão. Não é manifestamente uma prioridade. Já o referendo acerca da "constituição europeia" terá aparentemente outro destino. Contudo, é melhor esperar pelo "29 de Maio" em França por causa das surpresas e não andar já por aí a "excomungar" frivolamente os apologistas do "não". Há vida para além de Bruxelas, da França e do dr. Barroso.
"DOUTRINADORES"
Os "comentários" à escolha de Ratzinger ainda não ultrapassaram o patamar da vulgaridade. O "pensamento correcto" manda naturalmente que não se aprecie em demasia a criatura. Julgo até, com manifesta benevolência, que "doutrinadores" como o dr. Soares, o dr. Louçã ou o Nobel Saramago, não estariam à espera que a Capela Sistina produzisse um compagnon de route, um intrépido "pacifista" ou um bonzo "conciliador". Leia-se: alguém que verdadeiramente não saísse "desta" igreja e lhes pertencesse por inteiro, um "deles". Em suma e com algum realismo, jamais poderia ser escolhido um "igual" a nós. João Paulo II, ainda há dias tão elogiado por alguns destes "conservadores da fé", tratou bem do assunto e soube perfeitamente o que queria para o day after. Reduzir Ratzinger ao papel de "grande inquisidor" ou a líder espiritual ultra-conservador é, respectivamente, uma graçola medíocre e uma leviandade intelectual. Estudem-no primeiro e depois, se quiserem, falem. Para já, congratulo-me com as palavras de José Adelino Maltez : "(...) não faço considerações teológicas, nem à maneira de Mário Soares. E sem dizer que os conservadores venceram os progressistas. Apenas noto uma velha evolução numa continuidade de dois mil anos. Participou como soldado do exército alemão nos últimos meses da Segunda Grande Guerra e, entre 1946 e 1951, estudou filosofia e teologia na universidade de Munique, mas, segundo o padre Vaz Pinto, que, com ele, privou, antes de 1974, preocupava-se "com a democracia em Portugal" e "com a autodeterminação das colónias portuguesas". Compreendemos o comentário de Francisco Louçã, um dos poucos seres que consegue aceder ao código genético da humanidade, hoje".
19.4.05
BENTO XVI
Cidade do Vaticano, dia 19 de Abril de 2005, Joseph Ratzinger, Papa Bento XVI: "Cari fratelli e sorelle, dopo il grande Papa Giovanni Paolo II i signori cardinali hanno eletto me, un semplice e umile lavoratore nella vigna del Signore. Mi consola il fatto che il Signore sa lavorare e agire anche con strumenti insufficienti e soprattutto mi affido alle vostre preghiere. Nella gioia del Signore risorto, fiduciosi del suo aiuto permanente andiamo avanti. Il Signore ci aiuterà, Maria sua Santissima Madre sta dalla nostra parte".
"Quanti venti di dottrina abbiamo conosciuto in questi ultimi decenni, quante correnti ideologiche, quante mode del pensiero... La piccola barca del pensiero di molti cristiani è stata non di rado agitata da queste onde - gettata da un estremo all'altro: dal marxismo al liberalismo, fino al libertinismo; dal collettivismo all'individualismo radicale; dall'ateismo ad un vago misticismo religioso; dall'agnosticismo al sincretismo e così via. Ogni giorno nascono nuove sette e si realizza quanto dice San Paolo sull'inganno degli uomini, sull'astuzia che tende a trarre nell'errore..."
ESCOLHA
Depois do pontificado de João Paulo II, a pior coisa que pode acontecer à Igreja de Roma é escolher para seu sucessor um Papa "banana".
18.4.05
RATZINGER
O post de hoje parte do Mário. Ele escreve com ironia sobre Ratzinger. Eu nem tanto. Como lembrei no Independente outro dia, "o “politicamente correcto” via-o [ a João Paulo II ] como um “fundamentalista” ou mesmo como um “reaccionário” quando, na realidade, ele não podia ser outra coisa, sob pena de quase tudo perder sentido e passar a ser pura e simplesmente “outra coisa”. E acrescentei que, "na sua intransigência, na sua ortodoxia e, sobretudo, na sua fé, Wotjyla manifestou permanentemente, com método e sem desfalecimentos “intelectuais”, ao que vinha". Ora a escolha do novo Papa, olhada pelo lado da Igreja, passa por isto. É este o significado das palavras de Ratzinger na missa que antecedeu o conclave dos cardeais: "estamos a avançar para uma ditadura de relativismo que não reconhece nada como certo e que tem como objectivo central o próprio ego e os próprios desejos". Logo, exige-se uma fé "mais madura" e um combate sem tréguas ao "radicalismo individual" que nos faz "ser criança andando ao sabor de ventos das várias correntes e das várias ideologias". Ratzinger não representa a "evolução na continuidade". Ele é, como deve ser, radical na continuidade. Não podia, aliás, ser outra coisa.
17.4.05
C' EST TOUT
Vous y allez tout droit à la solitude.
Moi,non, j'ai les livres.
Silence, et puis
Je me sens perdue.
Mort c'est équivalent.
C'est terrifiant.
Je n'ai plus envie de faire l'effort.
Je ne pense à personne.
C'est terminé le reste..
Vous aussi.
Je suis seule.
(...)
Quelle est ma vérité à moi?
Si tu la connais, dis-la-moi.
Je suis perdue.
Regarde-moi.
Je crois que c'est terminé.Que ma
vie c'est fini.
Je ne suis plus rien.
Je suis devenue complétement
effrayante.
Je ne tiens plus ensemble.
Viens vite.
Je n'ai plus de bouche, plus de visage.
Marguerite Duras
Moi,non, j'ai les livres.
Silence, et puis
Je me sens perdue.
Mort c'est équivalent.
C'est terrifiant.
Je n'ai plus envie de faire l'effort.
Je ne pense à personne.
C'est terminé le reste..
Vous aussi.
Je suis seule.
(...)
Quelle est ma vérité à moi?
Si tu la connais, dis-la-moi.
Je suis perdue.
Regarde-moi.
Je crois que c'est terminé.Que ma
vie c'est fini.
Je ne suis plus rien.
Je suis devenue complétement
effrayante.
Je ne tiens plus ensemble.
Viens vite.
Je n'ai plus de bouche, plus de visage.
Marguerite Duras
LIMITAÇÕES
Recomendo os artigos de António Barreto e de Mário Mesquita no Público de hoje. No essencial, constituem uma visão crítica do dispositivo legal aprovado pelo governo acerca da limitação de mandatos políticos. A utilização da via legislativa - administrativa e burocrática - para resolver questões inerentes à cultura política democrática, é uma suave perversão das coisas e, curiosamente, uma manifestação "politicamente correcta" de populismo. Não há ninguém, desde o motorista de táxi à mulher-a-dias, que não rebole de gozo perante a possibilidade de se "humilhar" um qualquer eleito, mesmo que tivesse sido eleito por eles. Como sublinha Barreto, parece que a democracia, afinal, desconfia de si própria. Quem se ri disto tudo são os mesmos poderes fácticos de sempre, aqueles que muito mandam, que pouco ou nada devem ao escrutínio da cidadania e que se "auto-perpetuam". Esta "pedagogia" demagógica da limitação de mandatos é mais um sinal de que a nossa democracia, na sua 31º hora, continua, em muitos aspectos, imatura. O mesmo se passa com a remuneração dos titulares dos cargos políticos. Parece preferível ao "legislador" não aumentar os vencimentos dos detentores de cargos políticos, para não desagradar ao "povo", do que evitar ter de os recrutar nos "aparelhos" medíocres onde cresceram sem nunca terem feito mais nada, sobrevivendo à custa de ligações, de "amiguismos" e de interesses comprometedores. Quem quer democracia com qualidade tem de a pagar. Limitar no tempo alguns mandatos políticos, conquistados legitimamente nas urnas, a partir da secretaria, ou ter medo de aumentar os vencimentos dos "políticos" por causa da populaça, são aspectos que revelam uma limitação mais profunda. A falta de uma cultura democrática sólida que se sobreponha à tentação normalizadora e oportunista do primeiro "legislador" anónimo de serviço.
Adenda: Acerca de "perpetuações" vs. "limitações", leia-se este "post" de José Adelino Maltez, por exemplo.
A CASA II
Neste blogue encontramos uma "petição" em prol da área envolvente da Casa da Música. É de pública subscrição e cheguei lá pelo Crítico. Para além das entidades ali mencionadas a quem a "petição" é primeiramente dirigida, eu atrevo-me a recomendar que se junte Manuel Dias Loureiro, coordenador autárquico do PSD e administrador - julgo que não executivo ou coisa parecida - no Grupo BPN, alguém cuja "influência" em ambas as "sociedades" que contam - a política e a civil - é perfeitamente conhecida. Por outro lado, é daquelas personagens que conseguem sempre fazer "pontes" curiosas em matéria de "interesses", tipo "bloco central", o que, para o efeito, interessa. Por exemplo, a Couto dos Santos ou a Artur Santos Silva não deve ser difícil trocar umas "palavrinhas" com ele.
16.4.05
O PIPI DOURADO
Dantes, era apenas aos fins-de-semana. Quando muito, havia uma ou outra transmissão às quartas-feiras. Agora, a "futebolização" da vida colectiva é uma praga que nos atinge praticamente todos os dias. Há sempre uma taça qualquer em disputa a justificar jogos no mais remoto lugarejo de Portugal ou numa das maiores cidades europeias. Os horários "nobres" das televisões generalistas são ocupados com a bola, numa manifestação sadia do princípio "democrático" de que devemos dar ao povo aquilo que o povo gosta verdadeiramente de ver. Nos últimos anos, a "futebolização" vinha invariavelmente associada ao nome de Pinto da Costa e aos sucessos em cadeia do seu glorioso clube. Ao que parece, a exportação do sr. Mourinho, outra fantástica eminência nacional, fez abater sobre o clube do sr. Costa e sobre ele próprio as maiores catástrofes e as mais nefandas decepções. Como se não bastassem as derrotas no relvado, o poder judicial aventa a hipótese de, a mando de Pinto da Costa, alguns árbitros terem sido corrompidos com prebendas, algumas das quais com duas pernas e a falar brasileiro, gentilmente servidas num quarto de hotel. Não faço ideia do que vai sair do processo "Apito Dourado", se é que vai sair alguma coisa. No entanto, estas peripécias e outras também conhecidas, são reveladoras do mundo sórdido, rasca e digno de telenovelas mexicanas que caracteriza grande parte da actividade futeboleira no nosso país. Por trás de uma fachada de respeitabilidade "cívica" e "local" dos grandes homens da bola, apascentada interesseiramente por muita gente da política e da chamada "sociedade civil", escondem-se muitas vezes as mais profundas misérias de carácter. A "queda" mediática de Pinto da Costa é apenas um sintoma dessa miséria. É evidente que, até prova em contrário, ninguém é culpado de nada a não ser da "imagem" que, involuntariamente, fica do futebol português. Das glórias do Euro 2004 já pouco sobra. E Pinto da Costa, quer se goste dele ou não goste, é um brilhante dirigente desportivo. Merecia, apesar de tudo, melhor destino do que ver o seu nome envolto em perfume barato e em lingerie de terceira categoria, tudo no preciso momento em que o seu clube se afunda paulatinamente nos estádios.
15.4.05
LER OS OUTROS
Via Blasfémias, cheguei a esta curiosa entrevista de João Pedro George, no Esplanar, a Fernando Savater, um dos meus preferidos. Vou passar a andar mais de comboio para ver se consigo ter encontros destes. Onde param as pessoas interessantes que raramente se vislumbram?
UM MÊS
Cerca de um mês depois de ter tomado posse como primeiro-ministro, José Sócrates falou na RTP-1. A boa estratégia dos "pequenos passos", a credibilidade serena, a firmeza nos propósitos e a recuperação da dignidade do poder político democrático que andou perdida nos últimos tempos, mantêm as razões do meu voto de Fevereiro último.
14.4.05
A CASA
Após as habituais trapalhadas, abre finalmente ao público aquele que será um dos maiores e melhores equipamentos culturais do país, a Casa da Música. Abre "formosa mas não segura" já que ainda pairam dúvidas sobre o recorte definitivo do seu modelo de gestão, apesar dos progressos garantidos pela Ministra da Cultura, a Prof.ª Isabel Pires de Lima: um presidente indicado pelo poder público com "voto qualificado" na escolha do director artístico, na definição do "plano de actividades" e com um papel determinante na "delegação de competências" a efectuar no director executivo, bem como a promessa de 10 milhões de euros/ano por parte do MC, com a integração da Orquestra Nacional do Porto. Dependerá da imaginação e do talento dos futuros dirigentes a atracção do mecenato à Casa, sem que isso signifique a demissão do Estado na gestão de um espaço onde os contribuintes já investiram muito dinheiro. Lou Reed dá o concerto inaugural e o pontapé de saída para uma programação que se espera "pluridisciplinar", como é próprio de uma grande sala de espectáculos cosmopolita: nem sempre Mahler, nem nunca Lou Reed. "Take a walk on the wild side" e vá até ao Porto, nem que seja para apreciar a obra - como todas as que são verdadeiramente ousadas e grandes, polémica - de Rem Koolhaas. Boa sorte, que esta Casa bem precisa dela.
13.4.05
LER OS OUTROS
No Blasfémias, este pequeno exemplo da nossa inquietante "modernidade" administrativa.
PALHAÇADA
Os alunos do ensino básico e secundário "cumprem" uma "jornada de luta", faltando às aulas e manifestando-se nas ruas. Entre outras reivindicações, estes pequenos monstros querem aulas de educação sexual e de planeamento familiar. Como mostram estudos recentes, a inteligência que lhes escapa acima do pescoço, concentrou-se nas respectivas "partes baixas". Os meninos e as meninas fornicam como coelhos e aparentemente desprezam o preservativo. "Jornada de luta"? Palhaçada...
PERIPÉCIA
Calhou-me assistir a parte de um "seminário" da DGCI sobre "fiscalidade" e assuntos conexos. Escolhi os palestrantes dos assuntos conexos. Eduardo Catroga falou da economia portuguesa e explicou por que é que vamos continuar a "borregar" durante pelo menos mais dois anos. Saldanha Sanches, que tem sempre graça mesmo quando é "técnico", falou do "direito à audição" dos contribuintes no quadro do praticamente "todo poderoso" Estado tributário. Pelo meio, apareceu a dra. Maria Eduarda Azevedo para falar do "tratado constitucional europeu". A dra. Azevedo exerce presentemente as funções de "investigadora-jurista" (designação extraordinária!) no Centro de Estudos Fiscais. Este Centro pertence ao Ministério das Finanças e é uma espécie de oráculo constituído por uns quantos "sábios" juristas e economistas que, como o nome indica, "estudam" e publicam na área fiscal e financeira. Antes de se dedicar à "investigação", a dra. Azevedo foi secretária de Estado do dr. Barroso e - parece-me - ornamentou uma comissão política do PSD. Representou também o país - via, presumo, PSD - na Convenção do sr. Giscard d' Estaing que preparou o tratado constitucional, assinado, no Verão, em Roma. Para além de só ter sido capaz de apresentar uma cronologia maçadora e inócua dos passos que conduziram à Constituição, a dra. Azevedo, em nenhum momento, esclareceu a plateia acerca do essencial. E o essencial consistia em explicar sinteticamente em que medida este Tratado constitucional é relevante para as nossas vidas e, consequentemente, por que é que deve ser votada favoravelmente a "Constituição Europeia" em referendo. Depois de ouvir a errática exposição da dra. Azevedo, percebi por que é que o "não" avança delicadamente. Como ela, há na Europa dezenas de "dras. Azevedo" que, enredadas na sua burocratice cinzento-comunitária e no jargão que se consome diariamente nos corredores da Comissão do dr. Barroso, não conseguem "comunicar" com os cidadãos a quem primariamente a sua frenética actividade "legislativa" se dirige. Note-se que a plateia que ouvia a dra. Azevedo era exclusivamente constituída por licenciados e quadros superiores e dirigentes da administração fiscal portuguesa, e um intruso. Suspeito que, se no final da prédica se fizesse ali mesmo um "referendo", a senhora e a "sua" Constituição chumbariam inapelavelmente. Se as "sessões de esclarecimento unitárias" que se preparam para o referendo em Outubro estiverem a este nível, bem podem o dr. Sampaio, o eng. º Sócrates e o dr. Marques Mendes esperar o pior. Maria Eduarda Azevedo, a "investigadora-jurista", falou do tema como se estivesse numa reportagem sobre uma peripécia para a revista Caras, nunca esquecendo o lado "charmeur" (sic) de Giscard d'Estaing. Infelizmente, ela, e muitos como ela, raramente percebem para quem é que estão a falar ou então julgam que os cidadãos europeus são todos parvos. Como tal, a peripécia da Constituição Europeia arrisca-se a não passar disso mesmo, de uma vaga peripécia, sobretudo após o referendo de Maio próximo em França. Depois não se queixem.
12.4.05
EU TAMBÉM...
... apoio a ida de Guterres para Alto Comissário da ONU para os Refugiados. Quem não apoia...
O QUE IMPORTA
O suplemento Mil Folhas do Público de sábado último, trazia um artigo de Maria Filomena Mónica intitulado A Covardia dos Intelectuais, escrito a partir da leitura do livro do sociólogo Frank Furedi, Where Have All The Intellectuals Gone?, Continuum, London. Edito aqui parte desse artigo – sem link por causa da “nova política” do Público – porque o considero uma importante reflexão sobre o que importa, embora verdadeiramente ninguém se importe.
(…) As actuais políticas educativas constituem um cruzamento entre o infantilismo e a psicoterapia: menorizam os estudantes, porque os nivelam pelo menor denominador comum, e psicoterapizam a cultura, porque não querem beliscar a “auto-estima” dos adolescentes. O resultado é a ignorância dos jovens licenciados, muitos deles tendo frequentado, com enormes custos para as famílias, a universidade. Basta ver o concurso da RTP-1 Um Contra Todos para nos apercebermos até que ponto a falta de cultura geral aflige os portugueses.
O facto de a actual ortodoxia pedagógica contribuir para aprisionar os pobres na sua classe de origem não parece perturbar os responsáveis pela Educação – do PSD ou do PS – que, ao longo dos anos, se têm sucedido, à frente do ministério. Os seus filhos frequentam escolas privadas; são os outros, os filhos dos pobres, a ser sujeitos às experiências pedagógicas. Se fosse paranóica, diria que se trata de uma conspiração, por parte dos poderosos, para que os meninos pobres não compitam, no mercado de trabalho, com a geração nascida em berço de oiro.
No final, Furedi alarga a sua polémica a outros campos culturais, nomeadamente à televisão. Aqui, o seu objectivo é o de questionar o postulado que pressupõe serem as audiências elevadas incompatíveis com a excelência. A retórica que declara que aquilo que se está “a dar ao povo é o que ele gosta” tem como base a crença de que as massas populares são intrinsecamente estúpidas e, portanto, incapazes de seguir um raciocínio complexo ou de admirar uma obra de arte. Uma tendência paralela é o endeusamento da Internet como transmissora de cultura, tema retomado, entre nós, na recente campanha eleitoral, sob a designação do “choque tecnológico” proposto pelo PS. Num país de analfabetos, o computador transformou-se numa varinha mágica capaz de transformar um bronco num génio. Por outro lado, a profusão recente dos blogues pode dar a ilusão de que existe uma maior democratização da opinião pública. Nada é menos verdade: a maioria dos blogues são versões modernizadas do que dantes se escrevia nas paredes das casas de banho públicas. Os jornais, as rádios e as televisões continuam seguros nas mãos de quem tem dinheiro.(…)
Num momento em que tantos baixam os braços, Furedi continua a lutar e, mérito seu, a recordar o tempo em que existiam intelectuais, como Bertrand Russell (cuja “Autobiografia” recomendo), capazes de, em simultâneo, produzirem obras intelectuais de peso e de se envolverem nos debates contemporâneos. Na raiz do mal contemporâneo está a incapacidade de se estabelecer a distinção entre elitismo e exclusão social. Se é verdade que, por vezes, elites sociais e intelectuais coincidem, isto está longe de ser a regra, especialmente em Portugal, onde, desde sempre, as classes altas consideraram a cultura um adereço desnecessário. (…)
(…) As actuais políticas educativas constituem um cruzamento entre o infantilismo e a psicoterapia: menorizam os estudantes, porque os nivelam pelo menor denominador comum, e psicoterapizam a cultura, porque não querem beliscar a “auto-estima” dos adolescentes. O resultado é a ignorância dos jovens licenciados, muitos deles tendo frequentado, com enormes custos para as famílias, a universidade. Basta ver o concurso da RTP-1 Um Contra Todos para nos apercebermos até que ponto a falta de cultura geral aflige os portugueses.
O facto de a actual ortodoxia pedagógica contribuir para aprisionar os pobres na sua classe de origem não parece perturbar os responsáveis pela Educação – do PSD ou do PS – que, ao longo dos anos, se têm sucedido, à frente do ministério. Os seus filhos frequentam escolas privadas; são os outros, os filhos dos pobres, a ser sujeitos às experiências pedagógicas. Se fosse paranóica, diria que se trata de uma conspiração, por parte dos poderosos, para que os meninos pobres não compitam, no mercado de trabalho, com a geração nascida em berço de oiro.
No final, Furedi alarga a sua polémica a outros campos culturais, nomeadamente à televisão. Aqui, o seu objectivo é o de questionar o postulado que pressupõe serem as audiências elevadas incompatíveis com a excelência. A retórica que declara que aquilo que se está “a dar ao povo é o que ele gosta” tem como base a crença de que as massas populares são intrinsecamente estúpidas e, portanto, incapazes de seguir um raciocínio complexo ou de admirar uma obra de arte. Uma tendência paralela é o endeusamento da Internet como transmissora de cultura, tema retomado, entre nós, na recente campanha eleitoral, sob a designação do “choque tecnológico” proposto pelo PS. Num país de analfabetos, o computador transformou-se numa varinha mágica capaz de transformar um bronco num génio. Por outro lado, a profusão recente dos blogues pode dar a ilusão de que existe uma maior democratização da opinião pública. Nada é menos verdade: a maioria dos blogues são versões modernizadas do que dantes se escrevia nas paredes das casas de banho públicas. Os jornais, as rádios e as televisões continuam seguros nas mãos de quem tem dinheiro.(…)
Num momento em que tantos baixam os braços, Furedi continua a lutar e, mérito seu, a recordar o tempo em que existiam intelectuais, como Bertrand Russell (cuja “Autobiografia” recomendo), capazes de, em simultâneo, produzirem obras intelectuais de peso e de se envolverem nos debates contemporâneos. Na raiz do mal contemporâneo está a incapacidade de se estabelecer a distinção entre elitismo e exclusão social. Se é verdade que, por vezes, elites sociais e intelectuais coincidem, isto está longe de ser a regra, especialmente em Portugal, onde, desde sempre, as classes altas consideraram a cultura um adereço desnecessário. (…)
11.4.05
UMA FRASE...
... para toda a semana - no pior dia da semana -, todo o mês e todos os anos, lida no Abnoxio: QUEM TOLERA TUDO É PORQUE NÃO SE IMPORTA COM NADA.
10.4.05
BLADE RUNNER
A próxima disputa pela liderança do PSD deverá ser entre Marco António, o "génio" nortenho do partido, e António Preto, o "dono" dos militantes de Lisboa, apresentando para secretário-geral respectivamente os nomes de Valentim Loureiro e de Isaltino Morais. Deverá existir ainda uma "terceira via" promovida por Helena Lopes da Costa, que contará com Luís Filipe Meneses para o lugar do "cobrador do fraque". Mota Amaral fica como "provedor religioso" de qualquer líder e Alberto João Jardim encarrega-se da "agitação e propaganda" e da perseguição ao "sr. Silva", um perigoso clone do Presidente da República à solta no país. Os "intelectuais" reunidos em torno de António Borges deslocam-se uma vez mais a Marte para a implantação da primeira secção do partido num outro planeta. Entretanto, o PSD vai sendo dirigido aos domingos à noite a partir da RTP-1, durante cerca de 20 minutos de verdadeiro "serviço público", altura em que Marques Mendes aproveita para tomar notas para o resto da semana. Graças ao satélite colocado em Marte, sob o alto patrocínio do "choque tecnológico" gentilmente cedido por José Sócrates a António Vitorino, que é vizinho de Borges naquele planeta, é possível detectarem-se todos os movimentos de Santana Lopes que, diz-se, "anda por aí" aos "caídos". No salão do livro de Bruxelas, de 2006, é entregue a Durão Barroso o prémio "Luís Delgado" para o melhor argumento de ficção político-científica para o período 2002/2006. A tradução do livro para português foi garantida por Vasco Graça Moura e a edição esteve a cargo de Zita Seabra que, juntamente com os primeiros cem mil exemplares, ofereceu gratuitamente um preservativo e um opúsculo poético de Mendes Bota. A adaptação que deu origem ao argumento aqui relatado, foi feita por Manuel Dias Loureiro e Margarida Rebelo Pinto, estando já garantida uma versão em "braille" para os militantes do PSD.
9.4.05
O OURO E O BANDIDO
Há precisamente dez anos, numa célebre entrevista a Margarida Marante - ainda é viva? -, Durão Barroso, então candidato à liderança do PSD, dizia que estava ali porque era essencial "não entregar o ouro ao bandido". O cinismo do protagonista e as graçolas frias com que brindava as audiências acabaram por se virar contra ele. Dez anos depois, está descoberto o verdadeiro "bandido" daquela "história", numa curiosa antecipação autobiográfica. Sabe-se hoje que Barroso foi o maior "barrete" enfiado pelo PSD. Salvou do anonimato o "pequeno partido" à sua direita - termo por que tratava o PP no congresso de Tavira -, recuperou Santana Lopes para seu "número dois", alguém verdadeiramente sempre por ele detestado e "acabou" com ele ao chamá-lo para lhe suceder. Por fim, abandonou o barco quando intuiu o inevitável afundamento. Não merecia francamente a cargo que exerce a seu exclusivo benefício pessoal. Como bom "bandido", escapou ao julgamento no partido e no país. Por isso a disputa está agora reduzida a uma medíocre diatribe entre dois pequenos galos de uma velha capoeira. A rendição quase unânime da nomenclatura - a nobre e a plebeia - ao nome de Marques Mendes, diz quase tudo acerca do que se pode esperar dali nos próximos tempos. Nem a moção "intelectual" de Borges salva nada. São os mesmos de sempre que lá estão, atrás do biombo representado pela "nova esperança" tecnocrática que, a seu tempo, Marcelo se encarregará de destruir sumariamente. É preciso, portanto, dar um nome à coisa e não deixar o vexame do Pombal exclusivamente nas mãos de Santana Lopes. Este entertainer limitou-se a cumprir um papel que há muito lhe estava reservado pelo seu velho amigo de Bruxelas, o verdadeiro "bandido" desta triste história sem ouro nem glória.
8.4.05
SANTANA LOPES...
... pior que o seu pior e a demonstrar que não percebeu nada do que o eleitorado lhe disse em Fevereiro, "ameçou" o congresso do seu partido com os "direitos" que tem até domingo, como presidente. Grotesco, disparou contra os "moínhos" habituais, Cavaco e Pacheco. Nenhum membro da corte lhe pediu que evitasse o patético. Pelo contrário: querem vê-lo imolar-se no seu próprio fogo suicidário. Já não se trata da mera "queda de um anjo". Lopes limita-se a implodir no terrível vazio ao som das palmas acéfalas dos delegados. Estica-se para além do verosímil. Não percebe que é já coisa inteiramente do passado. É penoso e, sobretudo para quem está de fora, insuportável. Por este caminho, só merece sair pela única porta possível, a baixa, a mesma por onde, num verão impossível de 2004, o deixaram entrar.
6.4.05
AZUL
Edward Hopper
É tudo o que basta: uma nesga de sol, um horizonte de mar e o céu azul. Proust dizia que devíamos guardar um pouco do céu azul por cima das nossas cabeças. É isso mesmo: guardar um pouco de céu, azul.
ADIVINHE QUEM VEM JANTAR
Deus sabe como eu não sou dado a homenagens. Neste caso, prefiro chamar-lhe um encontro de amigos por causa de um amigo. Na antiga FIL, à Junqueira, em Lisboa, decorre amanhã, dia 7, um jantar com o primeiro Inspector Geral da Administração Interna e procurador-geral adjunto jubilado António Henrique Rodrigues Maximiano que, para felicidade dele, já só trata agora da sua vida. Para quem quiser inscrever-se, tipo "última hora", este tlm - que não pertence ao autor do blogue pelo que escusam de insultar quem atende - serve para esse efeito: 912225426.
COMO AS CEREJAS
O curioso depoimento de Catalina Pestana no Tribunal de Santa Clara irá certamente ficar na história judicial portuguesa. Há dias consecutivos que a senhora anda a "contar conversas" que terá tido com as "crianças", algumas das quais já "adultas" e bem crescidinhas, e que deverão comparecer por si próprias em tribunal como testemunhas. Este "voyeurismo" judiciário, baseado no "diz-que-disse" e na "palavra" aparentemente sagrada de Catalina Pestana, é só mais uma originalidade portuguesa que, em teoria, abre a porta a tudo. Não é verdade que as conversas são como as cerejas?
5.4.05
TENTAR PERCEBER
Alguma blogosfera "militante" sofreu um súbito ataque de "laicidade" moralista por ocasião do passamento de João Paulo II, da mesma forma que podia ter tido uma crise de hemorroidal. Eu assento as minhas convicções "societárias", entre outros, no princípio da separação do Estado das confissões religiosas. Acontece que tento perceber o "lado" da igreja, particularmente da representada até agora por Karol Wotjyla, mesmo ou sobretudo quando não concordo com ela. Nada disto preocupa verdadeiramente os nossos parodiantes do "politicamente correcto". Prefeririam eles, por exemplo, ver o Papa a lançar preservativos pelas janelas do Vaticano ou D. José Policarpo a deslocar-se a Roma numa carreira da Rodarte? À realidade, mesmo a mais discutível e polémica - eles sabem lá o que é uma polémica -, hão-de sempre preferir o circo.
A SERVIDORA
O Jumento, remetendo para outro blogue e para a revista Actual do Expresso, fala-nos do estado aparentemente caótico em que se encontra o Instituto Camões, dirigido pela sublime Simonetta Luz Afonso. Diz-se ali, com manifesta candura, que existe "informação mais do que suficiente para demitir a presidente daquele Instituto". Pura ilusão. Acontece que Simonetta não tem nada de burra. Tem aliás "elasticidade" suficente para aguentar qualquer "estação". Não lhe faltam amizades em qualquer das virtuosas "casas" políticas que, uma vez uma, outra vez outra, nos pastoreiam. Um dia, no Coliseu, num remake dos Estados Gerais do eng. º Guterres - ela que, por sinal, já vinha "de trás" -, quando a jornalista lhe perguntou o que é que estava ali a fazer, Simonetta explicou tranquilamente que, uma vez que era "funcionária pública", estava, muito naturalmente, junto de quem mandava. Aplicou-se, com método e dedicação, a desenvolver o mesmo princípio após o sumiço do referido engenheiro. Suponho que é assim que vai continuar. E suponho que é assim que a vão deixar continuar, ali ou noutro sítio qualquer. É que existe uma enorme diferença entre o servidor público e o servil público. Isso percebe-se. Até um burro o entende.
4.4.05
OS GESTOS IMPREVISÍVEIS DE KAROL, O RESTAURADOR
O Público passou a pedir-nos uma assinatura para a versão "online". Faz muito bem. Na edição impressa, no entanto, publicou-se um texto magnífico - o melhor que li sobre o assunto até hoje - sobre João Paulo II da autoria do escritor Claudio Magris. Foi editado originariamente no Corriere della Sera, mais magnânimo nestas coisas da "web". Porventura envergonhado pela versão que ofereceu aos seus leitores - cheia de erros ortográficos e de imprecisões -, o Público poupou os seus novos assinantes a esta miséria. Como "quem não tem cão, caça com gato", aqui deixo a versão original para quem a puder e souber ler na bela língua de "músicos e de traidores", os termos de Flaubert para os "italianos", no seu Dictionnaire des Idées Reçues.
Il restauratore ribelle
I gesti imprevedibili di Karol il restauratore
Un Papa, ha scritto Stefano Jacomuzzi nelle «Storie dell’ultimo giorno», non muore mai solo. È circondato da alti dignitari e anonimi servitori della Chiesa, è seguito da innumerevoli telecamere; anche l’ultimo dettaglio della sua fragilità terrena, il difficile respiro o il sudore, è sotto gli occhi di tutto il mondo. Forse un Papa non è mai veramente Papa come nel suo agonizzare e morire, quando subisce «il grande soffrire e la soggezione del male, inevitabili come il respiro», scriveva Alberto Cavallari tempo fa, in un’occasione in cui si temeva per la vita di Giovanni Paolo II.
Se il Papa è il vicario di Cristo, di Dio che si è spogliato di ogni potenza e si è calato nell’estremo della debolezza e dell’angoscia umana—sino a invocare per un istante, nel Getsemani, che non si compia la Passione—ilmomento in cui un Papa rappresenta Cristo con maggior verità è il momento in cui anch’egli è più assoggettato a questa debolezza. Pure per un Papa, dunque, il trapasso è il momento più universale, quello in cui ogni uomo incarna tutti gli uomini e muore nel suo segreto, nella sua capacità o incapacità di affrontare la morte, di farne il compimento e non solo la brusca e casuale interruzione della vita.
Anche un Papa, morendo, cade in quell’abisso imperscrutabile in cui si mescolano il niente e l’assoluto: anche a lui non resta che ripetere — come chiunque altro e senza capirne di più — le due invocazioni apparentemente contraddittorie di Cristo sulla Croce: «Dio mio, Dio mio, perché mi hai abbandonato?» e «Padre, nelle tue mani raccomando il mio spirito».
L’attenzione spettacolare peraltro si addice a Giovanni Paolo II; egli è stato una singolare simbiosi di tradizionalismo vecchio stampo, senso sacrale della vita e istintiva familiarità con la società mediatica più secolarizzata, con i suoi strumenti e i suoi riti, che egli ha usato e padroneggiato sapientemente e, talora, con spregiudicata disinvoltura. Allo stesso modo univa una dimensione fortemente provinciale, con i suoi robusti pregi e i suoi angusti limiti, a una visione mondiale dei grandi processi storici e politici. Una sua indubbia virtù, sottolineata dal cardinal Achille Silvestrini, è stata il coraggio; quel coraggio che nasce dalla consapevole decisione di porre la propria persona al servizio di valori che la trascendono e dunque libera dalle miserie e dalle ansie personali.
Coraggio significa pure saper scegliere e dunque rinunciare, assumere posizioni nette e quindi care ad alcuni e invise ad altri, sacrificare quell’urbanità spesso vile che ci induce spesso — in nome della complessità e dell’ambiguità della vita — a voler essere d’accordo con tutti e graditi a tutti, a dire sì a una cosa e al suo contrario. Tale ruvidezza può talora risultare poco simpatica e Giovanni Paolo II non ha compiuto alcuno sforzo per accattivarsi le simpatie di chi lo trovava indigesto. Questo è un merito incontestabile, specie in un’epoca in cui ognuno cerca di piacere a tutti come un presentatore di quiz e il sorriso «cheese» viene scambiato per bontà, che invece è la capacità di riconoscere il male, di mostrargli i denti e di colpirlo.
Del resto è tale gagliarda ruvidezza che lo rendeva spesso irresistibilmente e bruscamente simpatico, come un compagno di gite in montagna. La sua fermezza nel ribadire l’ortodossia cattolica è stata essenziale per la Chiesa ed è meritoria, perché definire contenuti e confini di una fede — e di qualsiasi pensiero — permette di aderirvi o di non aderirvi a ragion veduta, anche se alla nostra pigrizia facilmente piace una concezione del mondo così vaga da poterla contemporaneamente accettare e rifiutare a seconda dei casi e dunque un cattolicesimo optional da supermarket, in cui ognuno possa prendere quello che gli pare.
Certamente il Papa, per la sua formazione culturale fortemente condizionata dalla sua storia, era — specie all’inizio — succube di una sensibilità anche grezzamente conservatrice che poteva confondere la verità di fede al di sopra del tempo con costumi e mentalità storicamente condizionate, come rivelano certe sue goffe e penose uscite sulle donne. Talvolta sembrava scambiare, con una teologia inadeguata, questioni di carattere disciplinare e quindi suscettibili nel tempo di soluzioni diverse — come il celibato ecclesiastico o il sacerdozio femminile— con verità sovratemporali della fede.
Ma, anche a questo punto di vista, ha saputo percorrere un grande cammino, superando certi suoi stessi atteggiamenti retrivi, celebrando la dignità femminile, chiedendo coraggiosamente perdono per le colpe della Chiesa e denunciandone le responsabilità nell’antisemitismo, bollando ingiustizie sociali, aprendosi al dialogo ecumenico e iniziando perfino un nuovo discorso su una possibile funzione diversa del primato del Papa. Il Pontefice restauratore ha anche profondamente innovato la Chiesa con un’opera di apertura culminata nella radicale, dettagliata richiesta di perdono non solo per le colpe dei singoli pur altissimi membri della Chiesa, ma per gravi colpe ed errori di quest’ultima stessa quale istituzione.
Questo gesto non è stato adeguatamente valutato nella sua grandezza, ed è stato ingenerosamente considerato insufficiente da chi, sino a quel momento, non si sognava nemmeno di chiederlo. È un gesto di forza che non ha messo in discussione neppure una virgola dell’ortodossia e ha anzi riaffermato la funzione guida della Chiesa; un Pontefice più debole e incerto non avrebbe potuto osarlo senza timore di scatenare un processo di dissoluzione. Deciso a colpire ciò che egli riteneva un errore, Giovanni Paolo II è stato talvolta privo di carità verso alcuni ecclesiastici che temeva potessero non allinearsi al suo progetto, come—ma è solo un esempio—verso il padre Arrupe, il Generale dell’Ordine dei Gesuiti.
Non poteva non condannare certi aspetti teorici della teologia della liberazione, ma avrebbe potuto e dovuto essere più vicino a tanti sacerdoti che, in situazioni disperate fra i dannati della terra, hanno testimoniato il Vangelo e l’amore e salvato l’anima della Chiesa e che egli ha lasciato soli, forse in nome di grette preoccupazioni politiche che facilmente inducono ad aridità di cuore. All’inizio ha avuto talora due pesi e due misure nel correggere le deviazioni «progressiste» o «reazionarie». Per essere buono, anche un Papa, che si definisce servo dei servi di Dio, ha bisogno della sua grazia.
Risoluto ed efficace nel combattere il comunismo. Giovanni Paolo II ha assistito a una progressiva scristianizzazione del mondo, di cui il capitalismo — una delle forze più rivoluzionarie e sradicanti della storia — è oggettivamente lo strumento, con la sua travolgente trasformazione della terra, della civiltà tradizionale e dei suoi valori. Per la prima volta dopo venti secoli, il Cristianesimo potrebbe essere assorbito e dissolto, volatilizzato, eliminato come le macerie da una ruspa. Questa consapevolezza ha gettato un’ombra di drammaticità dolente, quasi un senso d’impotenza, sul pontificato pur energico e trionfale di Giovanni Paolo II e ha dettato iniziative politiche contraddittorie, colpi a destra e a sinistra, apertura a Castro e appoggio a Tudjman, un anticapitalismo sferzante ma vago e dunque retorico, mosse infelici come l’iniziale simpatia verso la disgregazione della Jugoslavia presto foriera di tanto sangue e magnanime difese dell’umanità, mobilitazioni quasi demagogiche e sofferte testimonianze di altissimi valori che hanno aiutato credenti e non credenti a resistere agli idoli, ingerenze politiche indebite e regressioni a un invadente clericalismo per altri versi a lui estraneo, beatificazioni all’ingrosso e spettacolarità devozionali — come a Fatima—simili a karaoke, buone a riempire per qualche giorno le piazze ma non le chiese nella realtà quotidiana.
La dura condanna della guerra in Irak è nata non da generico pacifismo— che sarebbe peraltro contraddetto da altri casi in cui egli non ha decisamente bollato l’uso della forza— bensì da una drammatica consapevolezza della crisi mondiale e delle sue imprevedibili conseguenze, consapevolezza così irresponsabilmente assente in tanti leader politici. Nei suoi gesti capaci di spiazzare le attese c’era una vera grandezza. Èdifficile dire in che situazione egli lasci la Chiesa, forse oggi più debole di quanto si creda, dinanzi alle selvagge trasformazioni del mondo. Per il suo successore sarà assai arduo sia continuare sia mutare la sua linea. Alla fine della sua vita il Papa, sempre più logorato dalla malattiama incorreggibile nella sua affascinante forza e voglia di vivere, sembrava a volte un prigioniero, dai gesti pesanti e meccanici, quasi obbedienti a fila tenute da altri.
Ma nel viso irrigidito e spento si accendeva il guizzo di uno sguardo ribelle e malizioso, quasi una strizzatina d’occhi ai veri amici, l’indomita volontà di giocare qualche tiro imprevedibile che rimetteva a soqquadro la sua immagine consolidata; forse anche il desiderio di scappare una volta di più dalla Curia Romana e andare in giro per il mondo.
Se il Papa è il vicario di Cristo, di Dio che si è spogliato di ogni potenza e si è calato nell’estremo della debolezza e dell’angoscia umana—sino a invocare per un istante, nel Getsemani, che non si compia la Passione—ilmomento in cui un Papa rappresenta Cristo con maggior verità è il momento in cui anch’egli è più assoggettato a questa debolezza. Pure per un Papa, dunque, il trapasso è il momento più universale, quello in cui ogni uomo incarna tutti gli uomini e muore nel suo segreto, nella sua capacità o incapacità di affrontare la morte, di farne il compimento e non solo la brusca e casuale interruzione della vita.
Anche un Papa, morendo, cade in quell’abisso imperscrutabile in cui si mescolano il niente e l’assoluto: anche a lui non resta che ripetere — come chiunque altro e senza capirne di più — le due invocazioni apparentemente contraddittorie di Cristo sulla Croce: «Dio mio, Dio mio, perché mi hai abbandonato?» e «Padre, nelle tue mani raccomando il mio spirito».
L’attenzione spettacolare peraltro si addice a Giovanni Paolo II; egli è stato una singolare simbiosi di tradizionalismo vecchio stampo, senso sacrale della vita e istintiva familiarità con la società mediatica più secolarizzata, con i suoi strumenti e i suoi riti, che egli ha usato e padroneggiato sapientemente e, talora, con spregiudicata disinvoltura. Allo stesso modo univa una dimensione fortemente provinciale, con i suoi robusti pregi e i suoi angusti limiti, a una visione mondiale dei grandi processi storici e politici. Una sua indubbia virtù, sottolineata dal cardinal Achille Silvestrini, è stata il coraggio; quel coraggio che nasce dalla consapevole decisione di porre la propria persona al servizio di valori che la trascendono e dunque libera dalle miserie e dalle ansie personali.
Coraggio significa pure saper scegliere e dunque rinunciare, assumere posizioni nette e quindi care ad alcuni e invise ad altri, sacrificare quell’urbanità spesso vile che ci induce spesso — in nome della complessità e dell’ambiguità della vita — a voler essere d’accordo con tutti e graditi a tutti, a dire sì a una cosa e al suo contrario. Tale ruvidezza può talora risultare poco simpatica e Giovanni Paolo II non ha compiuto alcuno sforzo per accattivarsi le simpatie di chi lo trovava indigesto. Questo è un merito incontestabile, specie in un’epoca in cui ognuno cerca di piacere a tutti come un presentatore di quiz e il sorriso «cheese» viene scambiato per bontà, che invece è la capacità di riconoscere il male, di mostrargli i denti e di colpirlo.
Del resto è tale gagliarda ruvidezza che lo rendeva spesso irresistibilmente e bruscamente simpatico, come un compagno di gite in montagna. La sua fermezza nel ribadire l’ortodossia cattolica è stata essenziale per la Chiesa ed è meritoria, perché definire contenuti e confini di una fede — e di qualsiasi pensiero — permette di aderirvi o di non aderirvi a ragion veduta, anche se alla nostra pigrizia facilmente piace una concezione del mondo così vaga da poterla contemporaneamente accettare e rifiutare a seconda dei casi e dunque un cattolicesimo optional da supermarket, in cui ognuno possa prendere quello che gli pare.
Certamente il Papa, per la sua formazione culturale fortemente condizionata dalla sua storia, era — specie all’inizio — succube di una sensibilità anche grezzamente conservatrice che poteva confondere la verità di fede al di sopra del tempo con costumi e mentalità storicamente condizionate, come rivelano certe sue goffe e penose uscite sulle donne. Talvolta sembrava scambiare, con una teologia inadeguata, questioni di carattere disciplinare e quindi suscettibili nel tempo di soluzioni diverse — come il celibato ecclesiastico o il sacerdozio femminile— con verità sovratemporali della fede.
Ma, anche a questo punto di vista, ha saputo percorrere un grande cammino, superando certi suoi stessi atteggiamenti retrivi, celebrando la dignità femminile, chiedendo coraggiosamente perdono per le colpe della Chiesa e denunciandone le responsabilità nell’antisemitismo, bollando ingiustizie sociali, aprendosi al dialogo ecumenico e iniziando perfino un nuovo discorso su una possibile funzione diversa del primato del Papa. Il Pontefice restauratore ha anche profondamente innovato la Chiesa con un’opera di apertura culminata nella radicale, dettagliata richiesta di perdono non solo per le colpe dei singoli pur altissimi membri della Chiesa, ma per gravi colpe ed errori di quest’ultima stessa quale istituzione.
Questo gesto non è stato adeguatamente valutato nella sua grandezza, ed è stato ingenerosamente considerato insufficiente da chi, sino a quel momento, non si sognava nemmeno di chiederlo. È un gesto di forza che non ha messo in discussione neppure una virgola dell’ortodossia e ha anzi riaffermato la funzione guida della Chiesa; un Pontefice più debole e incerto non avrebbe potuto osarlo senza timore di scatenare un processo di dissoluzione. Deciso a colpire ciò che egli riteneva un errore, Giovanni Paolo II è stato talvolta privo di carità verso alcuni ecclesiastici che temeva potessero non allinearsi al suo progetto, come—ma è solo un esempio—verso il padre Arrupe, il Generale dell’Ordine dei Gesuiti.
Non poteva non condannare certi aspetti teorici della teologia della liberazione, ma avrebbe potuto e dovuto essere più vicino a tanti sacerdoti che, in situazioni disperate fra i dannati della terra, hanno testimoniato il Vangelo e l’amore e salvato l’anima della Chiesa e che egli ha lasciato soli, forse in nome di grette preoccupazioni politiche che facilmente inducono ad aridità di cuore. All’inizio ha avuto talora due pesi e due misure nel correggere le deviazioni «progressiste» o «reazionarie». Per essere buono, anche un Papa, che si definisce servo dei servi di Dio, ha bisogno della sua grazia.
Risoluto ed efficace nel combattere il comunismo. Giovanni Paolo II ha assistito a una progressiva scristianizzazione del mondo, di cui il capitalismo — una delle forze più rivoluzionarie e sradicanti della storia — è oggettivamente lo strumento, con la sua travolgente trasformazione della terra, della civiltà tradizionale e dei suoi valori. Per la prima volta dopo venti secoli, il Cristianesimo potrebbe essere assorbito e dissolto, volatilizzato, eliminato come le macerie da una ruspa. Questa consapevolezza ha gettato un’ombra di drammaticità dolente, quasi un senso d’impotenza, sul pontificato pur energico e trionfale di Giovanni Paolo II e ha dettato iniziative politiche contraddittorie, colpi a destra e a sinistra, apertura a Castro e appoggio a Tudjman, un anticapitalismo sferzante ma vago e dunque retorico, mosse infelici come l’iniziale simpatia verso la disgregazione della Jugoslavia presto foriera di tanto sangue e magnanime difese dell’umanità, mobilitazioni quasi demagogiche e sofferte testimonianze di altissimi valori che hanno aiutato credenti e non credenti a resistere agli idoli, ingerenze politiche indebite e regressioni a un invadente clericalismo per altri versi a lui estraneo, beatificazioni all’ingrosso e spettacolarità devozionali — come a Fatima—simili a karaoke, buone a riempire per qualche giorno le piazze ma non le chiese nella realtà quotidiana.
La dura condanna della guerra in Irak è nata non da generico pacifismo— che sarebbe peraltro contraddetto da altri casi in cui egli non ha decisamente bollato l’uso della forza— bensì da una drammatica consapevolezza della crisi mondiale e delle sue imprevedibili conseguenze, consapevolezza così irresponsabilmente assente in tanti leader politici. Nei suoi gesti capaci di spiazzare le attese c’era una vera grandezza. Èdifficile dire in che situazione egli lasci la Chiesa, forse oggi più debole di quanto si creda, dinanzi alle selvagge trasformazioni del mondo. Per il suo successore sarà assai arduo sia continuare sia mutare la sua linea. Alla fine della sua vita il Papa, sempre più logorato dalla malattiama incorreggibile nella sua affascinante forza e voglia di vivere, sembrava a volte un prigioniero, dai gesti pesanti e meccanici, quasi obbedienti a fila tenute da altri.
Ma nel viso irrigidito e spento si accendeva il guizzo di uno sguardo ribelle e malizioso, quasi una strizzatina d’occhi ai veri amici, l’indomita volontà di giocare qualche tiro imprevedibile che rimetteva a soqquadro la sua immagine consolidata; forse anche il desiderio di scappare una volta di più dalla Curia Romana e andare in giro per il mondo.
CLAUDIO MAGRIS
3.4.05
RELEITURA
Aos bochechos, do livro de Bernard Henry-Lévy, O Século de Sartre (Quetzal Editores). Uma "reconciliação" intelectual post-mortem e uma interessante reflexão sobre o "homem pensamento", visto a partir dele próprio e do "contexto" terrível do "inferno dos outros": "O eixo Espinosa-Voltaire-Sartre. O clube, fechado, dos grandes execrados. Esses grandes reveladores da verdade, que odeiam a espécie, essas pessoas que não vivem para nos dourar a pílula e que pagam por isso. Temível honra a de ter suscitado um tal ódio". Ou sobre a relação Sartre/Beauvoir: "Poucas histórias de amor do século XX foram tão singulares, o que explica que poucas foram tão metodicamente conspurcadas pelos cretinos..."
TIPOS
No Divã de Maquiavel, o blogue de um leitor que gosta de me "aconselhar" de vez em quando, leio esta magnífica frase de Madame Indira Gandhi: Há dois tipos de pessoas: as que fazem coisas e as que ficam com os louros. Procure ficar no grupo das primeiras – lá há menos competição! Contudo, e sem desprimor para a veneranda figura, um comentário feito ao post, de certo modo "actualiza" o pensamento daquela dirigente indiana: Desculpe, mas há 3 tipos: as que mandam, as que empatam e as que mandam à merda todas as outras. Eu, por exemplo, sinto-me maravilhosamente bem neste último "tipo".
CANDURA REPUBLICANA
Soube pelo Jumento - um blogue que, apesar do seu irritante anonimato, devemos seguir com atenção - que o dr. Augusto Santos Silva, por quem tenho estima, num misto de candura portuense e de ironia "agustiana", se referiu nestes termos ao "delicado" tema dos assessores e dos gabinetes: "o Governo seguirá uma conduta de moralização e de "austeridade republicana" na atribuição de ordenados a assessores, adjuntos de ministros e gestores de empresas públicas", numa lógica que "deverá estender-se ao sector empresarial do Estado". Tal como o Jumento, eu também confesso a minha "ignorância republicana" já que não sei o que quer dizer "austeridade republicana". Suspeito que o dr. Santos Silva, que não deve saber "da missa a metade", também não.
2.4.05
KAROL WOTJYLA - JOÃO PAULO II (1920-2005)
Não tenhais medo daquilo que vós próprios criastes, não tenhais medo nem sequer de tudo o que o homem produziu e que está a tornar-se cada dia que passa maior perigo para ele! Enfim, não tenhais medo de vós próprios!
João Paulo II
CONVERSA DA TRETA
1. Num comentário ao post com este título, um leitor identificado (eu penso que seja ele...)perguntou : e que fazer aos "altos dirigentes" fruta cores que pisam passadeiras ora rosa, ora laranja, quais rameiras de pernas abertas à espera de Alexandre? Não se preocupe que eles sabem muito bem o que hão-de fazer...
2. Num outro comentário, outro leitor, mais "engraçadinho" e naturalmente anónimo, escreveu: ... com os panegírios e encómios que tem feito a M M Carrilho pode ser que faça parte das suas listas, passando, assim, a ter estatuto de eleito local... numa nova comissão de serviço. A ser assim, o sintoma deixava de ser seu...Caro leitor: quando deixar de ser anónimo, embora mantendo-se engraçadinho, agradecia que explicasse o "meu sintoma", já que não sinto a menor vocação para "eleito local". Quanto a Carrilho, aconselho ao leitor o seu livro "Aventuras da Interpretação", Editorial Presença, 1995, particularmente o artigo "Progressos da Estupidez". Parece estúpido, mas não é.
A CANABALIZAÇÃO...
... que os órgãos de comunicação social estão a fazer da agonia de João Paulo II: desde ontem, o Papa já foi morto e enterrado vezes sem conta e todos já "vimos" o que se vai passar nos dias e semanas seguintes no Vaticano. Fazer de tudo, da vida e da morte, uma permanente "quinta das celebridades", é o único conceito de "serviço público" em vigor entre nós.
ANTÓNIOS SEBASTIÕES
No PS existe um misterioso António Vitorino, uma glória aparentemente perdida para a sua irreprimível vocação eterna de não-candidato. Naquilo a que vagamente tentou candidatar-se, perdeu sempre. Na NATO ou na Comissão Europeia, Vitorino ficou à porta. Para o óbvio, não tem paciência: o partido ou o governo. Talvez por isso alguns camaradas mais aflitos com o desfecho belenense já só pensem nele como o melhor (não) candidato presidencial. Seria, sem dúvida, um belo prémio à inércia e ao nojo que o homem sente pela cosa nostra. O PSD também tem o seu António. Não é Calvário, mas é Borges, alguém que sibila à espera que o verdadeiro calvário por que o partido vai ter que passar, passe. Babuja a sua vaidade pelos jornais e pretende pairar sobre o partido pequeno-burguês que é o PPD/PSD como um morgado de visita à quinta. Reclama-se da "sociedade civil" e vê na actividade partidária um refúgio de párias. Quer e não quer ao mesmo tempo, e é essa a sua verdadeira e única "ideologia". A partir de certo ponto nauseante, pessoas como estes dois Antónios deixam de ser inteligentemente ambíguas, politicamente voluptuosas ou humanamente interesseiras. São simplesmente uns gnomos disfarçados de génios. Alguém faça, pois, o favor de arranjar um Alcácer Quibir para estes novos Sebastiões de paróquia. De nevoeiro já estamos razoavelmente bem servidos, muito obrigado.
PASSEIO DOS PRODÍGIOS
Vamos lá contar as armas
tu e eu, de braço dado
nesta estrada meio deserta
não sabemos quanto tempo as tréguas vão durar...
há vitórias e derrotas
apontadas em silêncio
no diário imaginário
onde empilhamos as razões para lutar!
Repreendo os meus fantasmas
ao virar de cada esquina
por espantarem a inocência
quantas vezes te odiei com medo de te amar...
vejo o fundo da garrafa
acendo mais outro cigarro
tudo serve de cinzeiro
quando os deuses brincam é para magoar!
Vamos enganar o tempo
saltar para o primeiro combóio
que arrancar da mais próxima estação!
Para quê fazer projectos
quando sai tudo ao contrário?
Pode ser que, por milagre,
troquemos as voltas aos deuses
Entre o caos e o conflito
a vontade e a desordem
não podemos ver ao longe
e corremos sempre o risco de ir longe demais
somos meros transeuntes
no passeio dos prodígios
somos só sobreviventes
com carimbos falsos nas credenciais
Vamos enganar o tempo
(Jorge Palma)
tu e eu, de braço dado
nesta estrada meio deserta
não sabemos quanto tempo as tréguas vão durar...
há vitórias e derrotas
apontadas em silêncio
no diário imaginário
onde empilhamos as razões para lutar!
Repreendo os meus fantasmas
ao virar de cada esquina
por espantarem a inocência
quantas vezes te odiei com medo de te amar...
vejo o fundo da garrafa
acendo mais outro cigarro
tudo serve de cinzeiro
quando os deuses brincam é para magoar!
Vamos enganar o tempo
saltar para o primeiro combóio
que arrancar da mais próxima estação!
Para quê fazer projectos
quando sai tudo ao contrário?
Pode ser que, por milagre,
troquemos as voltas aos deuses
Entre o caos e o conflito
a vontade e a desordem
não podemos ver ao longe
e corremos sempre o risco de ir longe demais
somos meros transeuntes
no passeio dos prodígios
somos só sobreviventes
com carimbos falsos nas credenciais
Vamos enganar o tempo
(Jorge Palma)
1.4.05
O MEGALÓMANO
Segundo os jornais, Durão Barroso passou por cá um dia destes e deixou "cair" esta pérola: "o meu trabalho é o mais difícil do mundo". A megalomania deste rapaz aparentemente só tem o céu como limite. Não apenas por causa dele, naturalmente, mas muito por causa de muitos como ele, o "não" ao tratado constitucional europeu vai fazendo o seu caminho em França. De facto, o mundo fica bem mais díficil com o "trabalho" de políticos "modestos" como Barroso. Depois não se queixem.
O EVANGELISTA
Depois de um célebre "retrato" de António Guterres feito por António Barreto há uns anos, numa das suas crónicas do Público, Adelino Cunha, em O Independente, mostra-nos o "lado político-espiritual" da criatura, ou, na expressão do autor, "a ascensão de um menino do coro" que quer dedicar-se agora aos refugiados: "A história de Guterres na Mocidade Portuguesa". Afinal, existem sempre várias oportunidades para causar primeiras ou segundas "boas impressões".
CONVERSA DA TRETA
Estão em curso umas patuscas reuniões "de alto nível" aparentemente destinadas a resolver a ocupação dos cargos dirigentes na administração pública. A coisa oscila entre a nomeação "política" e o concurso "democrático", por um lado, e os "níveis" aos quais qualquer um destes "métodos" deve ser aplicado, por outro. Talvez a opinião pública, com alguma equanimidade, prefira pensar que o "concurso" é mais "transparente" do que a nomeação. Puro engano. Os concursos, de uma maneira geral, são abertos com "retratos a cores" dos concorrentes. Ou seja, são para "aquelas" pessoas e não para todos os putativos concorrentes em igualdade de circunstâncias. Por isso, eu preferirei sempre a nomeação "política", seja para que "nível" for, a qualquer concurso trapalhão e hipócrita. Os que nomeiam e os nomeados sabem todos com o que contam. Assiste a uns e a outros a legitimidade de confiarem ou não confiarem uns nos outros. Em ambos os casos, a democrática porta da rua é a serventia da casa quando qualquer das partes não está satisfeita. Por exemplo, eu gostava de saber quantos "dirigentes" actuais da administração pública que não "confiam" neste governo, já falaram. Ou quantos ministros e secretários de Estado que não "confiam" nesses dirigentes, já o disseram. Não é por haver mais ou menos nomeações "politicas" ou mais ou menos concursos "democráticos" que o governo - este ou outro qualquer - vai deixar de colocar quem entender onde entender, como, aliás, deve acontecer. Tudo o que se disser em contrário releva apenas do domínio da conversa, da conversa da treta.
ESPERANÇA CONTRA TODA A ESPERANÇA
No momento em que escrevo - às primeiras horas do dia - João Paulo II parece estar entre a vida e a morte. Quando teve início este papado eu entrava na universidade. Agora, se pudesse, já me aposentava. Tantos anos não podem passar sem deixar uma marca profunda na história da igreja e em nós. Nessa altura eu era seguramente muito mais crente do que sou hoje. Muitas das "convicções" deste Papa contribuíram - para além da minha própria "vida" e do conhecimento dos "outros", particularmente dos que passam o tempo a bater com a mão no peito -, para me afastar da "igreja una, apostólica, romana" que me ensinaram a respeitar. Nada disso me impede de reconhecer em Karol Wojtyla uma dos carácteres mais poderosos do século XX. Teimoso, conservador, fiel ao "núcleo duro" da doutrina, de João Paulo prefiro reter a frase do homem proferida aquando da sua primeira visita à Argentina: "I hope against all hope". Para mim, que creio em pouca coisa, esta é uma mensagem de esperança desesperada que valeu uma missão: manter a esperança contra toda a esperança.
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