31.10.05

"TRISTE"

Para ler no Abrupto:

É triste ver o desespero de causa que leva Mário Soares a levantar a questão da pensão de Cavaco. É a mais desapropriada das questões, em particular, vinda de Mário Soares que se pensava estar acima deste tipo de ataques rasteiros, que nele tem o precedente da campanha contra a situação conjugal de Sá Carneiro. É exactamente o mesmo tipo de tiros desesperados, alimentando a nossa inveja socializada de país pobre, que normalmente se voltam contra quem os dispara. O problema é que no caminho deixam lama por todo o lado, atingindo sempre mais quem mais próximo está dos defeitos típicos do nosso sistema político e do seu crónico desprestígio. E isso, queira-se ou não, seja injusto ou não, será sempre mais fácil de cair em cima de um político como Soares do que de um político como Cavaco.

SUPER-HERÓIS?

A RTP 1 passou ontem uma reportagem idiota sobre a "blogosfera presidencial". A menina que preparou o texto, andou pelos "blogues" ditos não oficiais de apoio aos candidatos e pelas "páginas" já "abertas" pelas candidaturas. O "super -Mário" e um "mega-Cavaco" - parece que é assim que se chama -, tiveram lugar de destaque, aparentemente por apelarem ao "imaginário" infantil dos espectadores e dos eventuais leitores. A menina da reportagem, se tivesse perdido algum tempo a investigar, veria que não é nesses "blogues" que se anda a discutir o que é preciso discutir nestas eleições: política. Os candidatos presidenciais não são "super-heróis" dos cromos que a imagem analfabeta da reportagem tentou passar cá para fora, menosprezando o debate que ocorre na blogosfera mais crescidinha. A rematar, avisou que as eleições presidenciais "passam" pelas ruas e pelos meios tradicionais de comunicação social e não pela "net". Lembrou-me uma frase de um humorista brasileiro que cito muitas vezes. Mais vale estar calado e passar por parvo, do que abrir a boca e acabar com as dúvidas.

Adenda: No mesmo sentido, o Elba Everywhere.

A "FALTA DE MUNDO"...

... de José Sócrates, nas palavras sempre "serenas" de Ana Gomes, uma verdadeira "espanta-votos" de quem quer que seja, agora na "comissão de honra" de Mário Soares. Podemos dormir descansados, não é verdade?

A RAZÃO...

... de Belmiro de Azevedo:

"Cavaco vai ganhar e vai ser um excelente Presidente para trabalhar com um excelente primeiro-ministro."

Entrevista ao jornal Público/Rádio Renascença/2:

O QUE É QUE MUDOU?

Via Minha Rica Casinha:

“o Portugalete apareceu-me [...] com huma cara de vilãozinho, encarquilhada, muy trefo, tudo penedos escabrozos e montes, sem nenhuma lhanesa, muyta silveiyra e a terra partida aos palmos com suas paredinhas, como quem diz. Isto he meu, não he teu, não me furtes as minhas uvas [...]

in "Fastigimia", de Thomé Pinheiro da Veiga

(in cristovao-de-moura)

A RAZÃO...

...à "direita". E uma maneira de ver a questão.

30.10.05

OTELLO...

... De Giuseppe Verdi, para ver no Teatro Nacional de São Carlos, a partir de amanhã, 31 de Outubro, e dias 2, 4, 6 e 10 de Novembro. Libreto de Arrigo Boito, baseado na tragédia Othello, The Moor of Venice, de William Shakespeare. A direcção musical pertence a Antonio Pirolli, a encenação é de Nicolas Joel e a cenografia de Ezio Frigerio. Os cenários e figurinos são do "Théâtre du Capitole de Toulouse". Cantam, entre outros: Mario Malagnini, Otello; Dimitra Theodossiou, Desdemona; Carlo Guelfi, Jago; Carlos Guilherme, Cassio; Carlo Cigni, Ludovico. Toca a Orquestra Sinfónica Portuguesa com o Coro do Teatro Nacional de São Carlos. Otello regressa ao São Carlos depois de, em 1989, Placido Domingo lhe ter dado voz, naquela que foi a única presença do tenor no nosso teatro lírico. É a primeira de um conjunto de óperas que Paolo Pinamonti escolheu para uma temporada que, se não existirem os habituais trambolhões por causa dos "dinheiros", se anuncia auspiciosa. Destaco Otello por, além disso, ser uma das minhas óperas preferidas. Como sugestão discográfica, considero imperdível a versão "ao vivo" - primeiramente ouvida, em "vinil", na casa do saudoso José Ribeiro da Fonte - captada no Teatro alla Scala de Milão, em 1976, dirigida por Carlos Kleiber, com Placido Domingo (a estreia no papel titular), Mirella Freni e Piero Cappuccilli, todos no auge das suas carreiras. Também recomendo as versões onde aparecem os tenores americanos Jon Vickers e James Mckracken, seguramente dois dos maiores "Otellos" do século passado. Ou ainda o Otello de Herbert von Karajan, com Mario del Monaco e Renata Tebaldi (existe uma outra gravação de Karajan, magnificamente dirigida e musicalmente fabulosa, com a Freni e com Vickers, porém "estragada" por um inexplicável Jago de Peter Glossop). Escrevo de cor. Coisas da idade.

MUDANÇA DA HORA

Para quem detesta o inverno, como eu, este post do Blogame Mucho, via Origem das Espécies, por causa da "mudança da hora":

"Pronto. Vai anoitecer mais cedo, outra vez. Já não basta vir aí o inverno, ainda temos de lhe adoptar a puta da hora. Aos tipos que gostam do inverno, e aos que acham bem que fique escuro mais cedo, havia a noite de lhes começar às onze da manhã. Todos os dias."

A "ARTILHARIA PESADA"

Esqueçam tudo o que até agora foi dito sobre a "união", a "concórdia" e os "afectos". O verdadeiro candidato Mário Soares está "todo", inteiro, naqueles breves segundos em que, fugindo à banalidade, vergastou Cavaco com a sua "reforma" de "político profissional". Basta ter olhado para as televisões, como previ, ou lido os jornais, para perceber "o que é que interessa". Os "manifestos" e as "declarações de candidatura" vão rapidamente esfumar-se por entre bravatas captadas pelas câmaras e pelos textos. Atrair Cavaco para a "peixeirada" - duvido do sucesso do exercício - é o que importa. É preciso recuar a Agosto para situarmos as coisas no seu devido sítio. No famoso "perídodo de reflexão", Soares deu logo conta ao que vinha. Evitar, a todo o custo, o "passeio pela Avenida", alegadamente preparado para e por Cavaco, é o verdadeiro "programa". Vai, por isso, valer tudo. Soares acha - sempre achou - que Cavaco não possui aquilo a que ele e os seus amigos apelidam de "cultura democrática". Não ter estado escondido da PIDE, nem que por breves instantes, atrás de uma moita, é uma falha curricular grave. Não "praticar" a política, nem tão-pouco "teorizar" sobre ela a partir de uma visão jacobina do mundo e dos outros, é outra. Finalmente ter tido de suportar, durante os dez anos de mandato, a esquálida figura que, na sua concepção sobranceira, emergiu do "nada", terá sido a última das provações. Como se tudo isto não bastasse, Cavaco "ainda" tem o desplante de se candidatar a Belém, e, imagine-se, a veleidade plausível de vencer. Soares, o "real" - e não o das sonolentas apresentações a que temos assistido -, está-se nas tintas para os "afectos" quando a sua sobrevivência está em causa. Fazer dele um "coitadinho", perdido na bruma das sondagens, é uma falácia perigosa. Como ele explicou na Visconde Valbom, numa tarde de domingo solarento de Inverno, a uma plateia de "jovens" que faziam parte do MASP I, em 1985, com Zenha era forçado a recorrer à "artilharia pesada". É essa que ele irá buscar à medida que as coisas forem "aquecendo". A da "reforma" é apenas um "cheirinho" do que aí vem.

O DICHOTE POPULISTA

O dr. Louçã deve estar "roído" a esta hora, a pensar como é que isto não lhe ocorreu primeiro.

O MEMBRO

Esta "prosadora" é membro da "comissão de honra" do dr. Soares e "deu a cara" na televisão para dizer que gosta muito do Manuel Alegre. Podemos dormir descansados, não é dr. Soares?

29.10.05

A RAZÃO...

... de um "blasfemo" liberal, seja lá o que isso for.

O GUERREIRO NO SEU LABIRINTO

Numa cerimónia íntima e para os íntimos, Mário Soares apresentou, no Porto, as suas "comissões". Vasco Vieira de Almeida, o mandatário nacional, que pode ter talento para tudo menos para falar, aborreceu. Sobrinho Simões, o mandatário distrital, gracejou. Terminou o evento com um meio improviso do candidato. Soares quer uma campanha "diferente" e andar suavemente pelo país a pregar a "mudança", nas "colectividades", nas "universidades" e onde mais o "convidarem", tudo sem comícios e com sobriedade. Quer uma campanha "descentralizada" e os seus a trabalharem por si, nas localidades. E não conseguiu explicar por que é que achou "necessário" candidatar-se de novo, apesar da retórica das "circunstâncias" a que recorreu para justificar um exercício artificial. Lançou, por fim, uma "pérola" irritada ao "não político profissional", no que constituiu o único momento excitante e significativo da cerimónia. As televisões encarregar-se-ão de o divulgar como a melhor "ideia" que ali brotou. Por outro lado, no "Expresso", Mário Mesquita - que é da "comissão política" de Soares e que, presumo, partilha o candidato com o secretário geral do PS -, afirmou que "Cavaco Silva potencia o pior de José Sócrates". Não vale a pena comentar. Ça va de soi.

UM LIVRO

"Spinoza admonished us that it is necessary to love God without ever expecting Him to love us in return."

Harold Bloom, Where Shall Wisdom Be Found?, Riverhead Books, New York, 2005

O VELHO "NOVO HOMEM PORTUGUÊS"

Depois de escutar com atenção a leitura do "manifesto" de Cavaco Silva - ao contrário do Paulo Gorjão, não tenho paciência para os ler -, percebi que aquilo ia levar muita pancada. Salvo meia dúzia de interessados que, por dever de ofício ou por malícia, os têm de consumir, ninguém que esteja de bem com a vida perde um segundo com manifestos eleitorais. Não é por aí que se perde ou ganha o que quer que seja. De Soares veio o trivial. De Cavaco, chegou aquilo a que Vasco Pulido Valente hoje chama (link indisponível) "um manifesto misterioso". A crítica mais imediata é de que se trata de "um programa de governo". Não é, embora pareça. Cavaco propôe um programa de ajuda pessoal e política ao governo, seja ele qual for. Para o efeito, viu-se na necessidade de falar praticamente de tudo. Foi a opção dele e de quem o aconselhou - não seria a minha -, o que deu ao "manifesto" um "tom" misto de redacção e de dicionário de lugares-comuns políticos, como sublinha Pulido Valente. Qualquer coisa de mais escorreito teria servido perfeitamente o propósito. No fundo, Cavaco quis voltar ao velho mito do "novo homem português", revisto, corrigido e aumentado para o século XXI. Não vale a pena. O "novo homem", o dos anos noventa, deu no que deu. Arrivista, irreformável, ambicioso, ignorante e melífluo, este "produto" da democracia está espalhado, como praga, um pouco por toda a parte, do Estado à "sociedade civil". Quando as coisas mudaram, passou-se, com a tranquilidade própria dos invertebrados, e depois de ter sumariamente liquidado o "pai", para o aconchego maternal do "socialismo" de Guterres o qual, quando deu por isso, já estava enterrado no célebre "pântano". Vieram Barroso e Santana Lopes e, aí, o nosso "novo homem" tornou a prosperar com o "tempo novo" daqueles dois. Sócrates renovou a "ambição" ao propôr, em vez de um "novo homem", um "homem novo" para uma legislatura. É mais do mesmo. Há coisas onde, por bom senso e pudor, não vale a pena tocar. Nem Sócrates nem Cavaco nos livram da sua essencial viscosidade. O velho "novo homem português" veio para ficar. Não muda e nem eles - muito menos eles - o conseguem mudar.

SETECENTOS E UM

Santana Lopes esteve na SIC Notícias a "comentar" as eleições presidencias e, naturalmente, a comentar-se a si próprio. Continua ressabiado com o mundo e, em especial, com o dr. Sampaio. Desdenhou Cavaco Silva e, uma vez mais, "passou a mão" por Mário Soares. Não faltará ninguém nos setecentos nomes que fazem parte da "comissão de honra" da candidatura do ex-presidente?

REACÇÕES

A "novela" da interrupção voluntária da gravidez, agravada pela "esperteza saloia" com que o assunto foi tratado em diversas sedes, teve um final provisório com a decisão do Tribunal Constitucional. A partir de Setembro do próximo ano, a coisa regressa. Esteve bem o secretário-geral do PS, fiel à sua posição eleitoral e à sua palavra. Pôs um bom final às trapalhadas do seu grupo parlamentar, às do dr. Sampaio e às do dr. Jaime Gama. Pelo contrário, esteve péssimo o dr. Marques Mendes, a perorar, a despropósito, sobre a "competência" do governo, em vez de saudar o processo referendário anunciado. Péssimo e despropositado.

28.10.05

BATER NO CEGUINHO

O facto de Cavaco ter anunciado que não tenciona ser presidente a partir da estratosfera, vai desencadear - já desencadeou - as mais divertidas reacções. Como perguntava o outro: e se o país gostar da ideia? Ou -pergunto eu -, e se o país gostar da ideia de ter um presidente que, finalmente, sabe do que é que está a falar?

A GRANDE ILUSÃO

Ontem, ao comentar o "barómetro" presidencial que colocava Cavaco distanciado dos mais próximos na "corrida" presidencial, Medeiros Ferreira (sempre e praticamente só ele, eu não tenho culpa...) disse que havia "qualquer coisa que não bate certo neste barómetro, porque a soma de todos os candidatos de esquerda pouco ultrapassa os 30 por cento". E acrescentou que não via "a esquerda, que saiu das últimas eleições legislativas com 60 por cento dos votos, agora reduzida a pouco mais de 30 por cento". Esta frase traduz a grande ilusão do "20 de Fevereiro". MF quer forçosamente somar o que não é somável. Já nessa altura, o hoje candidato Mário Soares recorreu ao mesmo argumentário. Nada existe de mais distinto na política portuguesa contemporânea do que o híbrido das "esquerdas". O que é que Louçã tem a ver com Jerónimo, e vice-versa, ou Sócrates, um "social-democrata", com aqueles dois? Que "agendas" têm estas almas em comum? Os "barómetros" e "sondagens" têm repetidamente demonstrado que a fluidez eleitoral amorteceu o tradicional confronto entre a "esquerda" e a "direita". As pessoas simplesmente votam para "correr" com alguém ou para escolher uma "válvula de segurança" independentemente da cor da blusa. Não é estranho que, em 30 anos de democracia, o PS só tivesse chegado à maioria absoluta com um neófito pouco dado ao jacobinismo político próprio da seita? Ou que Louçã, tão moralista e urbano, perdesse nas autárquicas depois de uma "subida" razoável nas legislativas? Ou que Jerónimo, o generoso estalinista de Pires Coxe, arrancasse uma votação muito equilibrada nas mesmas autárquicas? Cavaco parte para estas eleições com o voto - garantido ainda antes da procissão sair do adro - de muito bom povo de "esquerda", na acepção que lhe dá M. Ferreira. É tão simples quanto isso. Por outro lado - e já o escrevi várias vezes - não foi a "esquerda" que levou Sócrates à maioria absoluta, como MF bem sabe. Todas as "esquerdas" subiram a 20 de Fevereiro e nem todas se mantiveram - a começar pelo PS - nas autárquicas. Fazer o género de contabilidade que MF faz, não leva a lado nenhum, mas percebe-se por que é que é feita. Não tarda nada começam as "reuniões" e os "apelos" contra o perigo. No entanto, toda a gente já avançou tanto que qualquer recuo, nesta altura do campeonato, seria puro descrédito. Falta, à "esquerda" de M.Ferreira, um verdadeiro ungido. Parece que o seu não é totalmente o dela. A "mão esquerda de Deus" anda, de facto, um pouco adormecida.

27.10.05

VALE A PENA

Cavaco Silva vai levar muita "pancada" por causa deste "manifesto". "Neste país em diminutivo", ousar não ser nem um "presidente-banana", nem um "presidente-ornamento", e propôr-se, pelo contrário, ser um "agente de desenvolvimento" e um "presidente-cooperante", é praticamente incompreensível para a ortodoxia vigente, sempre atenta ao menor desvio ao jargão. É, no entanto, um combate que vale a pena.

UM MOMENTO

No dia da greve dos juízes, a sra. D. Fátima Felgueiras tomou posse. É uma mera coincidência, naturalmente. O sentimento e o respeito que a autarca nutre pela administração da justiça em Portugal é bem conhecido, aqui e no Brasil. Por isso, ela é apenas mais um "modelo" a seguir com atenção. Para já, tratou-se de um momento - mais um - de rara beleza na nossa vida democrática.

MÍSIA E ARDANT

Mísia apresenta a sua mais recente produção discográfica - Drama Box - no palco da Sala Garrett do Teatro Nacional D. Maria II. "Primero hay que saber sufrir, después amar, después partir y al fin andar sin pensamiento..." Lisboa, Paris ou Buenos Aires e autores como Vasco Graça Moura, Natália Correia ou Astor Piazolla. Esta noite, com a participação especial de Fanny Ardant que lerá o poema de Vasco Graça Moura Fogo Preso.

Quando se ateia em nós um fogo preso,
O corpo a corpo em que ele vai girando
Faz o meu corpo arder no teu aceso
E nos calcina e assim nos vai matando
Essa luz repentina até perder alento,
E então é quando
A sombra se ilumina,
E é tudo esquecimento, tão violento e brando.
Sacode a luz o nosso ser surpreso
E devastados nós vamos a seu mando,
Nessa prisão o mundo perde o peso
E em fogo preso à noite as chamas vão pairando
E vão-se libertando
Fogo e contentamento,
A revoar num bando
De beijos tão sem tento
Que não sabemos quando
São fogo, ou água, ou vento
A revoar num bando
De beijos tão sem tento,
Que perdem o comando
Do próprio esquecimento

LER

Francisco José Viegas, no Jornal de Notícias: "O Sebastianismo". A dramatização, a invocação permanente da ameaça do fascismo, a má-fé contra Cavaco e a sua demonização, as acusações de "saudosistas de Salazar", são argumentos de sociedade recreativa e não merecem ser usados por alguém com a sua biografia [de Mário Soares].

A "BOUTADE"...

... bem escrita, com a ironia habitual do Almocreve ("Já tomou o seu Cavaco hoje!?"), e que também pode ser lida noutro sentido, no da "brigada anti-cavaquista". Eu que o diga.

A PERGUNTA

... do dia.

PORQUE NÃO?

O Rui Costa Pinto - que também faz parte da qualificada "brigada anti-cavaquista" - acha que os portugueses não desejam verdadeiramente ver Cavaco em Belém. Até porque devem estar lembrados, diz ele, da "pesada herança" dos dez anos de "cavaquismo", o suficiente para qualquer forma de vida inteligente fugir dele. Na opinião de Costa Pinto, Sócrates, o governo e o "assalto ao aparelho do Estado" são os maiores responsáveis por esta eventual ignomínia insinuada nas sondagens. A solução passa por Sócrates assumir "uma governação credível", única hipótese de "eleição de um candidato à esquerda". Com o devido respeito, Costa Pinto não tem razão nenhuma. Começo pelo fim. Quem for eleito PR, desta vez não o será por estar mais torto para a "esquerda" ou mais torcido para a "direita". E muito menos por se reclamar de "esquerda" ou de "direita". O eleitorado sabe perfeitamente de onde todos procedem e avalia quem é que, neste momento, tem melhores condições para protagonizar, com credibilidade e autoridade, a chefia do Estado. Acabaram definitivamente os "fantasmas", mas o "vale tudo" vai andar por aí. Por outro lado, Costa Pinto também não tem razão ao ligar a eleição presidencial ao desempenho do governo. Apesar de tudo, Mário Soares "vale" mais - ou "valerá" menos - do que a simplificadora ligação umbilical ao PS e ao governo. Os resultados que alcançar, serão dele, em exclusivo, e uma sua eventual derrota não prejudica, um milímetro sequer, o eng.º Sócrates. Julgo, aliás, que grande parte daqueles que estão predispostos a votar em Cavaco Silva, acha razoavelmente "credível" o "estilo" do primeiro-ministro e aceita, no essencial, o que está a ser feito em sectores como a Educação, a Justiça ou a Defesa. Finalmente, os "dez anos de cavaquismo" foram julgados em eleições adequadas, em 1995. Mesmo assim, uns meses depois, Cavaco "conseguiu", num escrutínio previamente condenado ao fracasso, 46% contra Sampaio e, como disse M. Soares na altura, com mais algum tempo "ainda ganhava". De facto, eu compreendo as dúvidas de Costa Pinto e de outros respeitáveis membros da "brigada". É que lhes é cada vez mais penoso responder, com um módico de lucidez e de respeito pela "realidade", a esta pergunta trivial: por que é que Cavaco Silva não pode ser eleito livremente Presidente da República? Só porque não?

O "PATHOS" DO PASSADO

"De repente pensei que a Joana Amaral Dias pode estar para a candidatura de Mário Soares, como este esteve, como mandatário da juventude, para a candidatura de Norton de Matos." Será que Medeiros Ferreira, numa notável antecipação estratégica, já antevê uma candidatura presidencial de J. Amaral Dias, digamos, para 2050? E Norton de Matos, essa veneranda figura, como "estava" e como ficou em meados do século passado? O general Norton de Matos apresentou-se oficialmente às eleições para a Presidência da República, em Julho de 1948, após algumas hesitações, já que a sua candidatura demorou a criar consenso. António Sérgio apostava no general Costa Ferreira, que tinha sido ministro da Instrução de Setembro a Dezembro de 1929, e outros preferiam Mário de Azevedo Gomes, um dos patriarcas da oposição ao salazarismo e membro do directório Democrato Social. Manuel Serras e a antiga estrutura do Partido Republicano Português eram da opinião que a Oposição não devia apresentar um candidato às eleições. A campanha eleitoral começou a 3 de Janeiro de 1949, e as eleições realizaram-se em 13 de Fevereiro, tendo o general Carmona sido reeleito e Norton de Matos desistido no dia anterior.


Adenda: No final da inauguração da sede de campanha do dr. Soares, a mandatária Amaral Dias, num arrebatamento feito de nostalgia "anti-fascista" e de "bloquismo" primitivo, avisou que "daqui partimos da resistência para a luta". Em que mundo e em que tempo viverá a ilustre mandatária?

CAVACO REVISITADO

O Kapa "recuperou" a entrevista realizada por Vasco Pulido Valente a Cavaco Silva, em Setembro de 1991, nas vésperas da segunda maioria absoluta, para a revista Kapa. Entre outras coisas, lá vem o que, pelos vistos, o agora candidato continua a pensar sobre os famigerados "poderes presidenciais" e que tanto preocupa os "guardiões do templo". Para reler, na íntegra.

K: Não o incomoda a condescendência da burguesia portuguesa consigo?
Sei o que a burguesia portuguesa pensa de mim. Não venho da «cultura de cocktail», como toda a gente sabe. Depois da Figueira da Foz, percebi que tinha entrado, de uma forma inesperada e radical, num novo universo e que, se não me adaptasse depressa e não surpreendesse, era crucificado.

K: Gosta da burguesia portuguesa?
Respeito as diferenças; respeito o direito à diferença.

K: Gosta ou não gosta?
Depende das pessoas. De algumas gosto.

K: E os ares de superioridade dos «intelectuais>,? Não o afectam?
Alguns julgam-se uma vanguarda esclarecida. O pior, para eles, é que se enganaram.

K: Em quê?
Fizeram, por exemplo, previsões catastróficas sobre o que ia suceder ao País e a mim, pessoalmente.

K: E as insinuações sobre a sua cultura?
Sou especialista de determinados assuntos, não sou de outros: e não pretendo fingir que sou aquilo que não sou.

K: E não se irrita?
Não. Acho algumas dessas pessoas bastante azedas e um bocado frustradas. Mas não me irrito. Continuo a minha vida com toda a normalidade.

K:Onde está a Direita e onde está a Esquerda em Portugal?
Foram desaparecendo... foram desaparecendo. Hoje é difícil identificar claramente uma Esquerda e uma Direita em Portugal. As transformações do mundo arrasaram as barreiras ideológicas. E em Portugal, desculpe que lhe diga, também contribuí um pouco para isso. O eleitorado tornou-se fluido e move-se com uma facilidade inconcebível há meia dúzia de anos. Quem imaginava que milhares de eleitores comunistas pudessem vir a votar em mim, ao mesmo tempo que milhares de eleitores do CDS?

Sempre que o Presidente da República, seja ele quem for, membro do partido do poder ou chefe do partido da oposição, interferir nas competências do governo cria inevitavelmente instabilidade no País. O Presidente deve ficar confinado às suas funções. Cabe ao governo conduzir a política geral do País. O Presidente não dispõe dos instrumentos necessários para o fazer e, se o fizer, fá-Io-à por força pela negativa...

26.10.05

OS TORTUOSOS CAMINHOS...

... de defesa de uma candidatura onde se pressente o verso de Pessoa/Campos, o da "distância subitamente impossível de percorrer".

GOSTOS

Gostei de ver o Francisco nesta lista. Já agora, e se me é permitida uma sugestão, também gostaria de ver, por exemplo, António Barreto e Vasco Pulido Valente na comissão política da candidatura presidencial de Aníbal Cavaco Silva.

"O QUADRADO"

Os "infantis" que "jogam" aqui, têm muito que aprender com estes (bons) "seniores". É só ir comparando, espera-se.

É...

... mesmo cínico!

"OS PORTUGUESES CONHECEM-NO"

Para ler no Elba Everywhere, de Bruno Pais. Sim, Portugal "conhece-o". E respeita o que conhece. Contudo, não chega para justificar esta aventura desmesurada contra mais um "inimigo" de estimação. Os mais novos - ou não sabem, ou não se lembram -, mas alguns dos seus apoiantes de hoje - que o queriam ver derrotado a favor de Zenha, em 1986 - certamente recordam o texto da sua intervenção no último tempo de antena dessa longínqua 1ª volta, em Janeiro de 86. Salvo erro, o título era mesmo esse - "Os portugueses conhecem-me" - e foi o mais bonito de tantos que essa inesquecível campanha nos proporcionou. Tenho-o guardado, algures, em casa, e não era má ideia que alguns papagaios e outros cristãos-novos deste MASP 3 o fossem ler. O "meu" Soares está ali, inteiro, a milhas desta algaraviada medíocre que agora o rodeia. Quanto mais longe Soares se puser disto, melhor para ele e para a (boa) memória que, os portugueses que o conhecem, dele têm.

PATÉTICO

De facto. E a "luta" continua. Boa resposta do primeiro-ministro ao patético incompreensível e a uma incompreensível noção de "independência".

25.10.05

NO FIO DA NAVALHA

... de Medina Carreira, para ler na Grande Loja.

LER...

A RAZÃO...

... de um "blasfemo":
Razões para votar Cavaco
O fim do unanimismo à volta da figura do Presidente da República.

O "MANIFESTO"

Ninguém - aliás, muito legitimamente - liga a "manifestos". Nem ao do dr. Soares nem aos que se lhe seguirão. O que interessa é a "deixa", o "ambiente" e a frivolidade narrada nos "directos". Nada mais. Estas, aliás, serão umas eleições inteiramente decididas nas televisões e nos jornais. Se o candidato ultrapassar o limiar da trivialidade e do lugar-comum, corre o risco de ser delicadamente insultado pelo consenso "mole" do "regime", sublimemente representado pelos "comentadores" e pelos "guardiões da legalidade". Por isso Soares quer apenas que durmamos "descansados", em "concórdia nacional", porém em alerta contra aquilo que chamou o "messianismo revanchista", o termo mais brando que arranjou para "saudar" Cavaco Silva. De resto, garantiu-nos a famosa "magistratura de influência" - sem esclarecer qual o "modelo" que preferia, se o do seu primeiro mandato, se o do segundo ou se o do torpor "sampaísta" - e a falácia do "moderador e árbitro" que, com tanto sucesso, arremessou contra Cavaco nos anos 90. Não houve novidades neste "manifesto". Foi um ersatz do discurso de Agosto, sem rasgos particulares. Onde Soares esteve bem, como era esperável, foi nas respostas aos jornalistas, uma vez liberto do jargão escrito. É "à solta" - e não espartilhado pela mesquinhez retórica - que Soares é sempre maior do que ele próprio. De qualquer maneira, sente-se que, desta vez, Soares não arrebata. E aquela gente que teima em aparecer à sua volta, muito menos. Soares não consegue explicar por que é que a sua candidatura é "necessária", nem tão-pouco qual a "mais-valia" que dela se pode retirar. O embaraço com que os dirigentes nacionais andam pelo país "socialista" a catequizar os militantes, é a prova disso mesmo. Há 20 anos nada disso era preciso. A coisa "andava" por si. Era, digamos, "natural". Agora não é.

O "AMADOR" E O "PROFISSIONAL"

Eu também começo por uma "declaração de interesses". É conhecido - pelo menos de quem lê este blogue - o meu apoio à candidatura de Cavaco Silva. Cavaco avançou sob o lema da não resignação. Medeiros Ferreira "pega" nesta ideia e procura contrariá-la através daquilo a que chama uma "longa resignação". Este artigo insere-se no plano geral do núcleo "intelectual" da candidatura de Mário Soares, destinado a subalternizar e a menorizar o "trajecto" de Cavaco Silva perante o "gigantismo" da biografia política de M. Soares. Aliás, a síndrome do passado, designadamente a "anti-fascista", será amiúde arremessada a torto e a direito. Duvido, no entanto, da sua utilidade para o que importa ao eleitorado de 2005/2006. Este "tom" de superioridade moral e política sobre qualquer outra candidatura - e não apenas a de Cavaco Silva - é, a meu ver, o ponto mais desagradável nas "vistas" de alguns dos apoiantes mais qualificados de M. Soares. O que os conduz a exercícios menos probos, por exemplo, quando se levantam questões que nunca se colocaram, como a de Cavaco poder ter sido candidato presidencial em 1991 e 2001. E se Cavaco é catalogado, com soberba e desdém por M. Ferreira, como um "político amador" (Cavaco disse que não era um "político profissional", mas está longe de ser um "amador" ou um ingénuo), por que diabo "perde" ele tempo num artigo de jornal com esse "amador" em vez de defender, como lhe compete, o seu "profissional"?


Adenda (das onze da noite): O dr. Medeiros Ferreira encara a recandidatura do dr. Soares como um brinquedo novo há muito prometido. Cada gesto, mesmo que previsível, é "novo". Por isso, gostou de ver os mandatários, o dr. Vieira de Almeida, e a colega de blogue, Joana Amaral Dias, "serenos nas suas convicções". O primeiro estava tão sereno que nunca chegou a abrir a boca, nem para as televisões. A segunda, ouvi-a murmurar umas vacuidades sobre um dr. Soares que, ao contrário de MF, ela acabou de conhecer. "Convicções"? Mas diz mais MF. "Ainda não será desta que o regime democrático ficará à mercê dos indiferentes e dos seus inimigos", afiança. Mas, meu caro amigo, com tantos candidatos presidenciais -só o PS tem dois - e ainda com a eventual emergência de um "Pintasilgo de direita", "encavalitado" no seu estimulante candidato, acha mesmo que existe "indiferença"?

QUEM MANDA -2

Os agricultores "betinhos" também vêm ao assalto das ruas de Lisboa, aparentemente para pedir a "cabeça" do ministro Jaime Silva. Não percebem que o seu "mundo" - harmonioso, florido e marialva - desapareceu há muito por força das circunstâncias e de Bruxelas. A seca, uma realidade, não é tudo. O "mal" vem de trás e o Portugal que vagueia nas cabeças dos "agricultores" está bem morto e enterrado. Não vale a pena exbir cadáveres adiados pelas ruas.

QUEM MANDA

A "justiça", de quem Fátima Felgueiras escarneceu e fugiu, a "justiça" que investiga grandes contribuintes que a desafiam publicamente pela sua "incompetência", a "justiça" que se atrasa na definição da situação jurídica dos remediados, a "justiça" que persegue o trivial, enfim, este vasto mundo a que, tantas vezes por equívoco toponímico chamamos "justiça", entra em greve. Começa pelo Ministério Público, abrange os funcionários judiciais, a PJ, "técnicos" e chega aos verdadeiros administradores da dita, os juízes. Têm direito? Não tenho a certeza. São supostos servir a comunidade, uns como órgãos de soberania e seus auxiliares, outros por defenderem os desvalidos, como manda o seu estatuto, outros ainda porque perseguem para debelar o crime? Não tenho dúvida. O governo é, a partir de hoje, desafiado no cerne da sua autoridade por grupos sócio-profissionais que servem justamente para a garantir. O que a estes falta em legitimidade democrática, sobra ao poder político em autoridade democrática, sufragada devidamente em eleições. Vacilar, neste momento, seria fatal para o governo. Há alturas na vida pública, sobretudo na democrática, em que a opinião pública gosta de saber quem efectivamente manda. Esta é uma delas.


Adenda: Complementar com este post do Jorge Ferreira.

24.10.05

DIZER "NÃO"

"Só ganha a confiança dos homens quem lhes disser "não". Cavaco disse "não" no Congresso da Figueira, ao garantir que apoiava Freitas do Amaral para a Presidência da República. Cavaco ganhou porque estava preparado para perder." José Miguel Júdice, em Lisboa, na apresentação do livro de Adelino Cunha, A Ascensão ao Poder de Cavaco Silva 1979-1985, da editora Edeline.

LER...

... estas "Tentações" bem "rebatidas" por Vital Moreira.

PODEM, SFF...?

LER OS OUTROS

Os últimos posts do "Desesperada Esperança", no "Linha do Horizonte", "Candidatos Presidenciais?" e "O Grau Zero da Argumentação" (vários) no Bloguítica. A propósito do "Expresso" "cavaquista", este post da Grande Loja. Não estimo particularmente o "Expresso", mas sei que certamente os próximos números darão "capa" a outros candidatos presidenciais, que Cavaco descerá nos "altos&baixos", outros subirão e por aí fora. Contudo, o jornal limitou-se a relatar uma evidência: o anúncio formal da candidatura de Cavaco Silva é o verdadeiro acto fundador da eleição de 2006. Não era disso que todos os outros estavam à espera?

PERGUNTAS E RESPOSTAS

1. Luís Grave Rodrigues, do Random Precision, "desafia-me" a responder à "parte" da crítica política que faz a Cavaco Silva, num post onde a mistura com referências desagradáveis. Não possuo nenhum mandato para falar "em nome" do candidato que apoio, mas julgo que é importante que se faça um debate sério em torno das presidenciais e não chicana gratuita. Aliás, dois artigos do Público de domingo - de António Barreto e de Mário Mesquita - constituem bons contributos para esse debate. No seu texto, LGR coloca várias perguntas que, como ele bem sabe, só a leitura do "manifesto eleitoral" de Cavaco Silva poderá responder e outras, ainda, que só o decurso da campanha esclarecerá. Porém, há assuntos que LGR levanta e cuja "resposta" já julga adivinhar por causa das convicções pessoais e religiosas de CS. Pode ser que, nalguns casos, tenha alguma surpresa e noutros, naturalmente, obtenha confirmação. Uma pessoa credível não costuma ceder no essencial e é bom que assim seja senão éramos todos "iguais". No entanto, parece-me inequívoco - e só por má-fé compulsiva ou por ignorância desculpável é que se pode defender o contrário - que CS tem obviamente perfil "para representar Portugal nas mais altas instâncias internacionais". Já o fez, no âmbito da direcção da política externa que pertence ao governo, quando exerceu o cargo de 1º ministro e acho que ninguém se queixou. Pergunte ao socialista Felipe Gonzalez, por exemplo, o que é que ele opinava sobre CS quando ambos eram os chefes de governo da Península Ibérica. Achará porventura LGR que CS não está à altura da representação externa do Estado Português - que é uma das funções do PR - apenas porque não encara o cargo como um híbrido monárquico-jacobino destinado a exibir universalmente lugares-comuns ou vaidades pessoais? Ou, pior, porque aí o argumento seria puramente reaccionário, por pensar que CS não é suficientemente "civilizado" para o efeito?
2. Quanto à minha posição, simultaneamente de suporte a CS e de crítica à recandidatura de M. Soares, a quem, por duas vezes, apoiei, reproduzo parte de um post escrito em Setembro que sumariza, por agora, o essencial. O "regime", se não se regenerar, afunda-se, mais tarde ou mais cedo, nas suas trapalhadas e na sua venalidade. Restaurar, com sensatez, a sua autoridade, sem pôr em causa a "natureza das coisas", é a tarefa mais nobre do próximo PR. Não é preciso ser "presidencialista" para achar que não é com magistraturas "monárquico-republicanas", requentadas com discursatas redondas e vazias, que "isto" lá vai. Cavaco não virá para a "desforra", como se insinua maliciosamente, e o país sabe-o. Sócrates tem um mandato claro que o obriga a ser mais clarividente do que tem sido. Ninguém mais do que Cavaco Silva aprecia a "estabilidade" para que se possa fazer alguma coisa. Mário Soares apenas quer a "estabilidade" - a dele - para não mudar nada e para embaraçar Sócrates quando este não respeitar o "cânone". Cavaco deverá transmitir solitariamente aos portugueses quais as razões políticas que o fazem ser, agora e de longe, o concidadão que, na chefia do Estado, melhores condições possui para prestigiar a democracia e honrar, com decência e um módico de equilíbrio, as instituições. Para isso não precisa de uma "corte". Basta-lhe estar só, com Portugal.

23.10.05

"BLASÉ"

Ainda não consegui ler - deficiência minha, seguramente - um único post escrito pela mandatária "BE" do dr. M. Soares para a juventude, a socióloga Joana Amaral Dias, em que ela fizesse o favor de nos dizer por que é que apoia Soares e por que é o devemos preferir a qualquer outro. Vejo-a, sim, ao contrário dos colegas de blogue Medeiros Ferreira e Bettencourt Resendes, a escrevinhar ou a copiar baboseiras e graçolas tipicamente "bloquistas" contra Cavaco Silva. É de esperar que assistamos nas próximas semanas ao destilar do tradicional ódio de classe a Cavaco, misturado com a sobranceria "intelectual" típica dos urbano-depressivos e de algumas luminárias plumitivas. Tudo servirá ao vómito - a família, as origens, os apoiantes - e pouca coisa honrará a política. À dra. Joana, por seu lado, ficaria melhor tratar da sua própria intendência e evitar que a candidatura que apoia seja mais "negativa" do que já é. Tem idade e juízo suficientes para isso.

Adenda: Outro exemplo do aqui digo, vem do blogue de Luís Grave Rodrigues, o Random Precision, que eu costumo seguir com alguma atenção. Depois de uma (legítima) crítica "política" ao candidato Cavaco Silva, o autor termina o post com esta desnecessária "pérola" alarve, referindo-se àquele nestes termos: "manequim de Boliqueime, babado de bolo-rei pelos cantos da boca...". Tudo indica que os "índices" de civilidade da blogosfera, mesmo da que, em princípio, se poderia considerar intelectualmente séria, irão descer abruptamente nos próximos tempos, raiando mesmo a sarjeta. E o pior ainda está para vir.

FERNANDA BOTELHO

No Da Literatura, João Paulo Sousa lembra Fernanda Botelho, "vista" num documentário televisivo. Trata-se de uma escritora - deveria dizer escritor? - cuja discrição não nos deve fazer esquecer a sua obra, parece que por aí reeditada com umas "capas" de gosto duvidoso. Durante anos, Fernanda Botelho morou perto de mim e retenho a imagem dessa mulher elegante, passeando com um pequeno cesto de vime no braço, que usava para as compras, e cuja "obra não é extensa, mas intensa, livre na forma e nos temas".

A CULPA NÃO É DELE

O secretário geral do PS, exactamente nesta qualidade, vai andar - já andou - pelas secções e pelas federações do partido "a vender" o dr. Mário Soares às bases, na perspectiva de amortecer previsíveis defecções para Manuel Alegre. Tem, e porque já o repetiu, um argumentário curto e curioso. Soares já foi presidente, "em bom", Soares é "útil para o país" e Soares tem "prestígio internacional" pelo que, supôe-se, "vende-nos" melhor lá fora do que os seus putativos concorrentes. Medeiros Ferreira, que partilha o candidato com Sócrates, já pensa de outra maneira. Se atentarmos ao que escreveu sobre o apoio de Ramalho Eanes a Cavaco Silva, temos de concluir que Soares "devia manter-se neutral, porque a República precisa de reservas sérias", arriscando-se "a ficar subalternizado por subalternos". Voltando à visão "soarista" do primeiro-ministro, apenas uns vagos comentários. Soares foi, de facto, presidente, mas com dois mandatos politicamente distintos, como, aliás, os de Eanes. Se lhe "saísse" o Soares do segundo mandato, será que Sócrates continuava a achá-lo "útil" para o país? Quanto ao "prestígio internacional", Soares já tinha algum antes de ser presidente e, por exemplo, Sampaio não tinha nenhum antes de lá chegar. Por esta ordem de ideias, só ex-presidentes poderiam suceder a presidentes, o que nos esgotaria, rapidamente e por exaustão, as tais "reservas sérias" a que alude M. Ferreira, provavelmente já a pensar nos setenta e tal anos de Sampaio e nos oitenta e tal de Eanes. Sócrates tem, de facto, um problema. Desconhece o "efeito" Alegre e, mais preocupante do que esse, conhece o não-efeito Soares. Sócrates pressente - e bem - que o partido não está excitado com Soares e que, desta vez, não vale a pena "teatralizar" excessivamente a coisa. Estes "elogios" ao candidato - perfeitinhos, triviais e muito enxutos - são a consequência deste pathos e um gesto de inteligência política do primeiro-ministro. Sócrates cede a "logística" mas quer deixar tudo nas mãos de Soares. Para o efeito, recorda-lhe todos os dias o "prestígio" que ele tem. Se falhar, a culpa não é dele.

O DIA BANANA

O domingo é um dia particularmente angustiante na época "outono/inverno". O sol eventual não chega para aquecer e o mar começa a ter de ser visto à distância. Para quem não cultiva "a família", como eu, ou para quem a vida e as circunstâncias o foram tornando cada vez mais misantropo, o domingo é o verdadeiro dia banana da semana. Devem evitar-se prudentemente desportistas furtivos, pessoas em fato-de-treino, as ruas, os jardins, os centros comerciais e os restaurantes. Tento, por isso, ler e escrever mais. E leio, em abundância, misantropos como eu, como, por exemplo, Philip Roth. Este livro - The Plot Against America - parece que vai aparecer entre nós em Novembro. Entretanto, na Feira de Frankfurt, já foi apresentado o novo, a sair em Maio do próximo ano, Everyman. Pelo que percebo, trata-se, na "linha escatológica" de A Mancha Humana, de uma obra sobre o "arrependimento e a perda". Fugir à angústia do dia banana só com uma "angústia maior do que a vida", como aquela que se encontra na subtileza desencantada e ironista dos livros de Roth.

22.10.05

CUMPRIR A PALAVRA

Em Fevereiro, quando votámos - eu votei - no Partido Socialista, aceitámos por boas as propostas de Sócrates, independentemente do patriótico dever de remover Santana Lopes. Por outro lado, também achámos - eu achei - que uma maioria absoluta, para "fazer o que devia ser feito", também seria recomendável. Acontece que, nalgumas matérias, a "maioria" não acerta decididamente o passo. A campanha - Sócrates - prometeu um referendo sobre a interrupção voluntária da gravidez para a nova legislatura. Como se não houvesse nada de mais premente para resolver, o PS decidiu avançar com uma proposta de referendo logo no Verão, o que Sampaio rejeitou. Depois, tentou de novo a sorte na abertura do parlamento em Setembro- contando com a "abertura", desta vez, de Sampaio e de Jaime Gama -, o que gerou um imbróglio jurídico que, pelos vistos, o Tribunal Constitucional vai decidir "contra" os referidos PS, Sampaio e Jaime Gama. Não contente com esta sublime trapalhada - na qual o líder parlamentar socialista tem tido um papel inesquecível -, o PS prepara-se agora para "dar o dito por não dito", esquecendo a "promessa" do referendo, para aprovar na Assembleia o que jurou colocar à consideração da cidadania. Se isto avançar, Sócrates presta um mau serviço a si próprio e à sua credibilidade enquanto dirigente político. Este assunto não é tratável administrativamente, nas secretarias político-partidárias, apesar do conformismo embaraçado de Jorge Sampaio. Aliás, foi Socrátes quem, com toda a clareza, sempre disse que só o mesmo método - o referendo - poderia ser utilizado para decidir, de novo, o problema. Ninguém tem culpa, a não ser o PS, da forma errática e incompetente como a questão tem vindo a ser tratada, desde as eleições, a benefício de uma inexplicável "pressa". Tenho Sócrates por um homem de palavra. Espero, por isso, que a cumpra.

PÁSSAROS



A notícia de hoje é a morte de um pobre papagaio em Inglaterra. O bicho estava de quarentena desde que chegou, vindo do Suriname, num lote de mais de uma centena, também proveniente de Taiwan. Na Croácia, foram descobertos doze cisnes vitimados aparentemente pelo famoso vírus, o que levou a Comissão do dr. Barroso a embargar a importação de "aves de capoeira" croatas. Aos poucos, vai-se instalando um pequeno e surdo pânico que é o pior que pode acontecer. Por cá, as "autoridades" descansam os indígenas com um argumentário "light" para esconder a habitual miséria e o endémico "logo se vê". Não faço ideia se vem aí alguma ameaça séria ou se tudo não passa de uma contingência controlável. O que parece, isso sim, cá e lá fora, é que pouca gente tem uma ideia clara sobre o que se pode efectivamente passar. Só podemos, por isso, desejar que o pesadelo metafórico de Hitchcock não se transforme, nem na imaginação, nem "no terreno", numa realidade.

LIXO

Outra "zona de intervenção" para as eleições presidenciais são os blogues. Para infantilizar um pouco mais a recandidatura de Mário Soares, alguns apoiantes criaram uma coisa chamada "super-Mário", onde, a avaliar pelos primeiros posts, convivem pessoas sérias com vulgares engraçadinhos, estes mais apostados em promover, pela negativa, os "adversários" e o "inimigo". Depois, existe esta abstrusidade, em boa hora denunciada por Paulo Pinto Mascarenhas, e que o blogue da mandatária juvenil de Soares, não por acaso, rapidamente "divulgou". A blogosfera é um espaço de liberdade, e, como tal, aproveitável para tudo. Julgo que os blogues mais "crescidinhos" e não anónimos exprimem suficientemente as suas posições para que seja necessário "criar" ficções de "apoio" a quem quer que seja. É preferível, a bem da sanidade cívica, que nos mantenhamos assim. A "debater" uns com os outros e a deitar o lixo fora.

CHEGA E SOBRA

O Paulo Gorjão reflectiu - bem - sobre a realização de "debates" televisivos nesta campanha presidencial, lembrando posições recentes sobre a matéria de alguns protagonistas políticos. Mário Soares, por exemplo, até com o porteiro do prédio dele aceitaria um debate se visse nisso alguma vantagem. Acontece que, nesta altura do campeonato, não existe nenhum motivo "objectivo" para distinguir quem deve debater com quem. A eventual formação de "duetos" não faria qualquer sentido, a menos que se realizassem tantos debates quantos os "duetos" possíveis, o que seria insensato, desmesurado e inútil. Assim, o que parece realista é a haver um único debate entre todos os candidatos, em "sinal aberto". Chega e sobra.

21.10.05

UM LIVRO...

... para ler no fim-de-semana, longe da chuva.

CAVACO...

... "visto" por "Neptuno" no Mar Salgado: "Tem muitas características cinzentonas, saloias e desajeitadas que o tornam num pequeno ódio de estimação dos media iluminados e modernos. Mas, o que realmente o tornará insuportável será mesmo a competência e a seriedade."

"AMIGOS"

A SIC Notícias e a SIC, aparentando fazer do anúncio da candidatura de Cavaco um "espectáculo" a benefício deste, acabaram por "denunciar" o objectivo "escondido" do exercício: "puxar" por Mário Soares. Este - e bem - não caiu na esparrela de aparecer prostado diante do televisor a "beber" as palavras do professor, como o fizeram solicitamente Alegre, Jerónimo e Louçã. Mandou o porta-voz dizer apenas umas amabilidades de circunstância. De qualquer forma, toda a emissão - debate na SIC Notícias incluído, com Delgado, Ricardo Costa, Rogeiro e Henrique Monteiro - se destinou a promover indirectamente aquele que, pelos vistos, eles acham que deve "debater" de "igual para igual" com Cavaco e, eventualmente, estar presente numa 2ª volta. Não sei se a realidade acompanha este "pensamento complexo", quer o do candidato Soares, quer o dos "comentadores". Em primeiro lugar, a campanha de Cavaco Silva deverá ser dirigida para uma única volta eleitoral e, nesse sentido, para ele todos os candidatos valem precisamente o mesmo. Depois, não é líquido, como o era antes de Alegre aparecer - e daí a "ajuda" - que seja Soares o candidato "melhor colocado" dos quatro à "esquerda". Os próximos dias, com o "estimulante" Cavaco já em cena, serão decisivos para a recandidatura de Soares encontrar o rasgo que até agora lhe tem faltado para lá chegar. Não digo que seja necessariamente para "passar" a uma incerta 2ª volta. Mas para que um honroso resultado lhe não falte, como, pelos vistos, não lhe faltam "amigos".

DO "RESPEITO"

No período de "perguntas e respostas" da apresentação da sua candidatura, Cavaco Silva demonstrou o "respeito" que tem por M. Soares e pelos restantes candidatos. Acontece que "respeito" não pode ser confundido com "temor reverencial", particularmente por Soares. Cavaco não pode ter ilusões sobre o tipo de "prosa" que o espera. E deve estar preparado para combater politicamente isso. Porque vai ser "combatido", sem dó nem piedade, e através dos mais extraordinários argumentos. Cavaco deve saber que Deus nos manda ser bons, mas não nos manda ser parvos.

20.10.05

O PORTA-VOZ DE SI PRÓPRIO

Não dou mais do que umas vagas semanas para que Mário Soares fique "farto" do seu porta-voz, o amavél prof. Severiano Teixeira. A partir de agora, só ele, naturalmente, vai querer falar e "explicar" ao país a sua candidatura "negativa". Pelo contrário, Cavaco Silva, igualmente com a maior naturalidade, explicou que não se candidata contra ninguém. E que é, obviamente, o porta-voz de si próprio.

LER

De Francisco José Viegas, "A Propaganda de Cavaco". "O medo de Cavaco gera monstros entre os traumatizados de várias origens. Se Cavaco Silva ganhar, eles sabem, interromper-se-á um ciclo político que manda conceber Belém como um centro de conspiração contra São Bento. O desejo de intervenção desse frentismo ainda não se manifestou, apenas porque os resultados eleitorais de Fevereiro são absolutamente sui generis: eles recolocaram o país na normalidade, recusando a deriva populista de Direita e castigando a mediocridade de um primeiro-ministro que devia ter saído de eleições e acabou por ser decidido em Belém. O aviso está nas entrelinhas desse discurso. E qualquer governo, mesmo o de Sócrates, sabe que terá mais hipóteses de prolongar a sua vida útil com um Cavaco que resistiu a "presidências abertas" do que com a "magistratura de influência" de Soares."

"IT'S POLITICS, STUPID"

Há dias, uma amiga "soarista", convicta e militante da recandidatura deste nosso amigo comum, "avisou-me" que eu tinha para aí uns "cinquenta olhos" em cima do que vou escrevendo - presumi que os "olhos" são todos das bandas daquela candidatura - e "recomendava" prudência nas prosas dedicadas particularmente a Soares, vá-se lá saber porquê. Eu "recomendei-lhe" que ela "recomendasse" a explicação de algumas coisas, como o famoso "basta", coisa que "saiu" toscamente da boca do próprio candidato, hoje, em Viseu. Um fraco "foram as circunstâncias..." foi, até agora, o melhor que se conseguiu ouvir. De qualquer forma, parece que algumas leituras mais analfabetas do que eu tenho vindo a dizer nesta matéria, reconduziram-na parvamente ao "ataque pessoal". Se estas almas perdessem algum tempo a prestar efectiva atenção ao que por aqui, ou em O Independente, tem passado desde Julho último - está tudo ali ao lado, nos arquivos -, veriam que eu me tenho limitado a "criticar" politicamente a aventura presidencial de M. Soares, com a mesma tranquilidade de espírito com que apoiei as pretéritas duas. Eu e muitos outros, bem mais "notáveis" do que eu, como se irá vendo. Por outro lado, - e os arquivos também o confirmam -, sempre defendi uma candidatura de Cavaco Silva nas eleições de 2006. Até no texto de "parabéns" a Soares, por ocasião do seus oitenta anos, isso lá vem implícito. Por consequência, não me tenciono desviar um milímetro desta "linha", confiando obviamente na leitura inteligente de quem por aqui passa. Em suma, nada "de pessoal" está em causa. Só e apenas a política. Estamos entendidos?

BEM-VINDO

19.10.05

A FALHA

Outra eterna promessa da "esquerda" portuguesa, Ivan Nunes, brinda-nos com uma prosa justificativa do seu apoio a Soares. Começa por, delicadamente, me considerar um "blogue de direita", num daqueles típicos juízos apressados de quem se acha - por ser de "esquerda" - subtil. Ainda mal deu os primeiros passos na recente conversão "soarista", e já Ivan aprendeu a cartilha da superioridade "moral"... Depois, explica por que é que no passado foi um crítico feroz de Soares - pelo menos uma vez em "letra de forma", num jornal -, ao ponto de o considerar "titubeante", uma coisa que não lembraria a ninguém dizer de Soares. Na altura, não gostava da ideia de que ele possuia um "estatuto de quase impunidade, uma condição de pai-da-pátria, dono-da-república, que quase o punha acima de qualquer crítica". "Esse estatuto era pernicioso", diz o Ivan, "era doentio - e, no entanto, quem não se lembrar dele não pode hoje imaginá-lo, olhando para a imprensa portuguesa dos dias que correm." E conclui melancolicamente que "bastantes soaristas de então estão hoje na primeira fila do cavaquismo." Aqui Ivan Nunes devia interrogar-se por que é assim. Com toda a consideração e estima, eu lembro-lhe que Soares se "lançou" precisamente por achar que é o "pai-da-pátria" e o "dono-da-república" e que goza, por isso mesmo, de um "estatuto de quase impunidade" que, entre outras coisas, lhe permite dizer tudo. Reconheço que no seu gesto, para além da vaidade pessoal, existe um espírito de combate e uma "vertigem de risco" notáveis que devem ser aplaudidos. Agora impôr esta teima a um partido, ficando ambos - o partido e o candidato - reféns um do outro, isso já é uma novidade desagradável. Soares foi duas vezes um brioso chefe de Estado e custa-me, como custa certamente a tantos "soaristas" repartidos por outras candidaturas, vê-lo metido nesta aventura reducionista. Basta ver a "comissão política", onde Ivan Nunes se senta, para perceber a falha.

DÚVIDA

Em cada post sibilino que destila sobre o governo e José Sócrates, Medeiros Ferreira não consegue esconder o que pensa verdadeiramente destes dois. Será que, na comissão política da candidatura de M. Soares a que pertence, e onde se senta o partido "oficial" com o "partido" esquerdino, também se pensa assim? Ou trata-se de uma "manobra de diversão" para nós pensarmos que M. Soares é "nacional" e, porque é "nacional", é "bom" como a bolacha?

LER

No Mar Salgado, "Tempo Perdido".

O PRIMEIRO

O ministro das Finanças deu uma entrevista à SIC Notícias. Além de "técnico" - parece que bom -, Teixeira dos Santos é fundamentalmente um agente político e manifesta a devida consciência disso. Foi - e é essa - a sua vantagem em relação a Campos e Cunha, cuja "gramática da demissão" jamais será explicada. À semelhança de Bagão Félix, também Teixeira dos Santos tem andado a explicar "politicamente" o seu orçamento, contando com a ajuda do secretário de Estado dos Assuntos Fiscais que parece falar de um sistema fiscal "ideal", digamos, do tipo do Chile moderno, e não da realidade que tutela. Quanto aos benefícios fiscais, por exemplo, deve perguntar-se se o influente "parque bancário" não terá ficado satisfeito e se, pelo contrário, os pensionistas remediados não terão razões para desconfiar do primeiro orçamento socialista. E, depois, os impostos - indirectos, sobre o consumo - aumentam, de facto. O automóvel andará menos e com mais gasolina em 2006. Houve, no entanto, um detalhe curioso na entrevista de Teixeira dos Santos. Ao arrepio do que José Sócrates tem andado a dizer - mal -, este ministro admite - e bem - introduzir portagens nalgumas SCUTS. Não é a primeira vez que Sócrates e os seus ministros das Finanças não acertam completamente o passo. Aparentemente este ministro dispôe de uma força política - e político-partidária, sobretudo - que escapava por inteiro a Campos e Cunha. Se ele falou nas SCUTS, não o fez inocentemente, nem deve estar à espera que não se solidarizem com ele. As autarquias, as regiões autónomas, mesmo as afectas ao PS, torceram-se todas com este Orçamento. Esta amável sugestão de Teixeira dos Santos sobre as portagens não deve agradar a muito nababo local. A seu tempo, alguém quebrará. Resta saber quem será o primeiro.

18.10.05

MELHORES TEMPOS



David Hockney, Pool with two figures

COM QUEM...

... eles não estão.

SE...

... eu sou mau, o que será este insuspeito olhar crítico?

DE QUEM?

O meu amigo Medeiros Ferreira está incomodado pelo facto de as televisões terem trocado a primeira reunião da comissão política do candidato Mário Soares por galinhas assustadas com a gripe. Também achou que não foi dada a devida nota às declarações de Severiano Teixeira, "jovem professsor universitário", nas suas palavras, e porta-voz do candidato. Eu ouvi o "jovem" porta-voz e ele comportou-se à altura da sua habitual irrelevância. Aliás, a sua simpática "brancura" podia fazer dele, com facilidade, porta-voz de uma outra candidatura qualquer. Não faz qualquer diferença. M. Ferreira recorda - muito se "recorda" nestes meios -, a propósito do "manifesto eleitoral" de Soares, um outro, de 1965, sobre a auto-determinação da colónias, o que seguramente não passará despercebido ao eleitorado de 2006. Acontece que o "problema", a haver algum, não é da comunicação social. Esta deu ao evento a importância que ele merece. Pouca. O problema é mesmo a candidatura de Mário Soares. Se o país não se interessa, não se comove, não se entusiasma e não se espreme por ela, de que quem é a culpa? De quem?

COMO UM CHARRO

Parece que o governo tem a intenção de criar uma cadeira de "Educação Cívica" nas escolas. A ideia, segundo Jorge Lacão, é "despertar" os meninos e as meninas, mas principalmente os primeiros, para questões "profundas" e "sérias" como a igualdade entre os homens e as mulheres. Salvo o devido respeito, se o cerne da cadeirinha é esta matéria, não vale a pena. Aos púberes em idade escolar basta-lhes olhar para o lado e intuem imediatamente o mundo em que vivem. Da "primária" aos mestrados, existe hoje uma avassaladora preeminência do sexo feminino e, nas empresas e no Estado, o gineceu é igualmente confortável. Há, claro, excepções que as contingências sociais e a iliteracia confirmam. Não é o mesmo "ser mulher" na Lapa ou em Fornos de Algodres, ou adolescente na escola primária do Corvo ou na Universidade Católica em Lisboa. Por outro lado, os meninos e as meninas há muito que perceberam as "diferenças" sexuais entre ambos, coisa que, desde cedo, se dedicam a explorar mutuamente sem necessidade nenhuma de "educação". O Estado sempre teve esta mania de pastorear "civicamente" as suas ovelhas. Com Salazar, havia a "organização política e administrativa da nação", ginástica para os meninos e "lavores femininos" para as garotas. O 25 de Abril acabou com a noção "doméstica" das criaturas do sexo feminino, deu ginástica e "actividades circum-escolares " a todos e meteu-lhes na cabeça uma "introdução à política" marxizante. Mais valia que a "educação cívica" "ensinasse" a não escarrar ou a deitar papéis para o chão, a não dizer palavrões a torto e a direito no meio da rua e aos berros, a não mexer ostensivamente nas partes pudibundas, a cultivar hábitos de leitura geral, a desenvolver o "sentimento estético da existência", a não ver televisão, a não ser "formatado", a não ser frívolo, etc, etc. Quanto ao resto, às chamadas questões "profundas", dos costumes e da democracia, é perda de tempo e pura demagogia. O Estado "finge" que lhes "ensina" e eles apenas "fingem" que absorvem. Como se fosse um charro.

17.10.05

SE

Estava a ver e a ouvir Teixeira dos Santos, ministro das Finanças, a apresentar o Orçamento de Estado para 2006 e perguntei-me: se o ministro ainda fosse Campos e Cunha, seria este o "seu" Orçamento?

TENHAM MEDO

Se isto for verdade, percebe-se onde é que os que "andam por aí", afinal, vão estar. E o "estilo" com que se pode contar. Seria muito mau para alguém que foi chefe de Estado, e que tem um indiscutível prestígio político, "entregar-se" nas mãos de aventureiros. Mas, afinal, não é para isso que eles servem e já serviram? Para "aventuras"?

A SÉRIO?

Com uma candura que não lhe é peculiar, o eng. º João Cravinho acredita que Mário Soares, versão III, seria o "presidente da mudança possível e desejável". Em primeiro lugar, ignoro por completo a que "mudança possível e desejável" o sr. eng.º se refere. Estará a pensar em "mudar" o eng. º Sócrates, ele mesmo ou o rumo que ele escolheu para o governo? Ou estará a prever uma reedição da famosa "magistratura de influência" de Soares que possa "entrar", uma vez mais, pelo Largo do Rato adentro e, sempre que necessário, em São Bento? Contrapõe, depois, este conceito ao de "continuidade". Com o devido respeito, o sr. eng. º quer mais "continuidade" do que aquela que Soares vem tentar garantir com a sua divertida aventura presidencial? Até Manuel Alegre, que o sr. engº apoiou, está mais virado para a "ruptura" e para a "mudança" do que o candidato oficial do partido. Este sumário argumentário mostra a que ponto é hoje difícil sustentar politicamente a recandidatura de M. Soares. Será que qualquer pessoa minimamente informada pode olhar para ela e dizer, sem ironia, que Soares seria, em 2006, o "presidente da mudança possível e desejável"? Acredita mesmo nisso, sr. engº? A sério?

16.10.05

LER...

...nos Sentidos Percebidos, "Vale tudo". E, no Origem das Espécies, "Presidenciais-2": (...) é preciso saber quem duvidou dos poderes presidenciais para mencionar, a propósito de tudo e de nada, a «magistratura de influência» (ainda não percebi como o país não desata a rir de cada vez que alguém faz pose, levanta o dedo, endireita as costas e pronuncia «magistratura de influência») e, ao mesmo tempo, se esquece do objectivo das presidências abertas do segundo mandato de Soares."

ISSO MESMO

NADA MAIS

Recebi uns "comentários" enervados sobre este post. Normalmente são quase sempre os mesmos "enervados" e quase sempre os mesmos argumentos. Falam-me de uma entrevista de Morais Sarmento - que eu eu não li, nem me interessa ler - e partem dela para a estafada "conclusão" da "presidencialização" do regime com Cavaco. Eu lembro a estes beneméritos que Morais Sarmento não chega a estar para Cavaco nem sequer como, por exemplo, Vitor Ramalho está para Soares. Cavaco - acho eu - não precisa de epígonos para falar directamente com o país, nem me parece que tenha encomendado nada a ninguém, muito menos àquela criatura. Sarmento, embora às vezes não o pareça, já é suficientemente crescidinho para falar por si e para dizer o que lhe apetecer. Por isso, vale o que vale, e nada mais.

"CHEIOS DE OUTRAS COISAS"

"O apóstolo [Paulo] pode dizer "gaudete" porque o Senhor está perto de cada um de nós. E assim, este imperativo, na realidade, é um convite para sentir a presença do Senhor que está perto de nós. É uma sensibilização pela presença do Senhor. O Apóstolo pretende chamar a nossa atenção para essa presença escondida, mas muito real, de Cristo perto de cada um de nós. Para cada um de nós são verdadeiras as palavras do Apocalipse: "eu bato à tua porta, escuta-me, abre-me". É, portanto, também um convite para ser sensível a esta presença do Senhor que bate à minha porta. Não sermos surdos a Ele, pois os ouvidos do nosso coração estão de tal modo cheios de rumores do mundo que não podemos ouvir esta silenciosa presença que bate às nossas portas. Reflictamos, ao mesmo tempo, se estamos realmente disponíveis para abrir as portas do nosso coração; ou talvez neste coração, cheio de tantas outras coisas, não haja espaço para o Senhor e, por enquanto, não temos tempo para o Senhor. E assim, insensíveis, surdos à sua presença, cheios de outras coisas, não ouvimos o essencial: Ele bate à porta, está perto de nós e assim está perto a verdadeira alegria, que é mais forte do que todas as tristezas do mundo e da nossa vida."

Meditação do Papa Bento XVI após o "Canto da Hora Tércia" na "Abertura da Congregação Geral da XI Assembleia Geral Ordinária do Sínodo dos Bispos"

"NADA DURA PARA SEMPRE"...

"Nothing is forever and the time comes when we all must say goodbye to the world we knew. Goodbye to everything we had taken for granted. Goodbye to those we thought would never abandon us. And when these changes finally do occur, when the familiar has departed and the unfamiliar has taken its place, all any of us can really do is to say hello and welcome."

15.10.05

LER OS OUTROS

No Bloguítica, "A fantasia I" e "A fantasia II". Sem link, no 1º Caderno do Expresso, o artigo de José Cutileiro, "O novo presidente", onde se explica, com a clareza e a lucidez habituais do autor, por que é que Cavaco Silva deve ser escolhido em Janeiro. "Quando votarmos para eleger o novo Presidente da República, a escolha deverá ser a seguinte: qual dos candidatos nos ajudará melhor a sair do buraco em que metemos Portugal?"

QUASE TUDO

1. Se olharmos à composição da "comissão política" da recandidatura presidencial de Mário Soares, onde nem sequer falta o inefável Ivan Nunes, vemos que ela é nitidamente desequilibrada para a "esquerda". Os empresários que vão aparecer na "de honra" não são novos e fazem parte da nomenclatura habitual que tem acompanhado a vida política do candidato. Pelo PS, é também a "ala" esquerdina que aparece destacada - com João Cravinho, Medeiros Ferreira, Sérgio Sousa Pinto ou Alfredo Barroso, por exemplo -, incluindo, provavelmente a contre coeur "soarista", Jorge Coelho. Este, aliás, parece que terá já "avisado" para não contarem com ele para "dizer mal" de Manuel Alegre, o que diz praticamente tudo.
2. Estar com o PS e com o governo, e deixar o PS e o governo estar com ele, sem que, com isso, se prejudiquem demasiado uns aos outros, é o oxímoro fundamental do candidato Mário Soares. Lateralmente é preciso aplacar, com alguma suavidade, os danos "alegristas". Nada que Soares - ele, sozinho - não consiga contornar em campanha. Chega? Não chega. Em primeiro lugar, não é líquido que a opinião pública aprecie, entusiasmada, este regresso. Todos os sinais disponíveis mostram precisamente o contrário. E Soares, por enquanto, não explicou por que "bastava" de vida política activa há uns meses e, agora, é o que se vê. Em segundo lugar, e contrariamente ao que aconteceu há vinte anos, Soares fez questão ligar o seu destino ao do PS e vice-versa. A sua candidatura de 85/86 "cresceu" do partido para o país. Era "útil" e era "necessária", como se viu na 1ª volta e, depois, na vitória. Esta, de 2005, pura e simplesmente não "cresce" porque o país, afinal, não suspira nem aparentemente precisa dela para nada. Finalmente, parece pacífico que, desta vez, Soares não poderá contar com o apoio da "não esquerda", como contou, em 85/86, para a derrota de Zenha e de Pintasilgo. A sua imensa biografia foi consagrada, em nome da liberdade e da "correcção" social-democrata da "revolução", com a eleição presidencial de 1986. Não é repetível.
3. Vital Moreira está na "comissão política" de Soares. À falta de melhores ideias, tudo indica que, pelo menos ele, irá insistir no "perigo" da "presidencialização" do regime e, por consequência, no perigo de um "golpe constitucional" a partir de Belém, com Cavaco lá dentro. Eu lembro-lhe que não foi preciso nenhum "golpe" para M. Soares ter feito dois mandatos perfeitamente distintos, com a mesma Constituição. O primeiro, manso e apaziguador, destinou-se a garantir a reeleição e a não hostilizar um primeiro-ministro bem sucedido. O segundo, o do "moderador e árbitro" - uma tirada puramente retórica -, destinou-se exclusivamente a garantir a efectiva remoção de Cavaco Silva, nem que para isso fosse preciso "atropelar" o PS de Guterres. Mais do que a "lei", como se alcança deste exemplo, as personalidades e as circunstâncias fazem o "órgão". Nada autoriza V. Moreira a retirar, das posições conhecidas de Cavaco Silva sobre a matéria, qualquer tentação "presidencialista" ao arrepio da Constituição. Pelo contrário, e muito brandamente, Cavaco, no livro-entrevista "A agenda de Cavaco Silva", de Vítor Gonçalves (Oficina do Livro), esclarece que conhece "muito bem os limites dos poderes do Presidente da República previstos na nossa Constituição, que aceito integralmente". E acrescenta: "sei bem que as competências para a definição e execução das políticas e a aprovação de medidas legislativas pertencem ao Governo e à Assembleia da República" e que "a magistratura do Presidente da República pode ser exercida em cooperação estratégica com os outros órgãos de soberania, de modo a contribuir activamente para vencer a grave situação em que o país se encontra, principalmente no domínio económico e social, e inverter o ciclo de estagnação em que está mergulhado". Cavaco é, apenas, rigoroso. O que, nos dias que correm, já é quase tudo.

14.10.05

UM LIVRO

Os Poemas, de Konstandinos Kavafis, tradução, prefácio e notas de Joaquim Manuel Magalhães e Nikos Pratsinis, Relógio D'Água, 2005

"Quanto Puderes"

E se não podes fazer a tua vida como a queres,
pelo menos procura isto
quanto puderes: não a aviltes
na muita afinidade com o mundo,
nos muitos movimentos e conversas.

Não a aviltes levando-a,
passeando-a frequentemente e expondo-a
em relações e convívios
da parvoíce do dia-a-dia,
até se tornar como uma estranha pesada.

LER

No Tomar Partido, do Jorge Ferreira, "Do clientelismo ao mau gosto".

13.10.05

O APÓSTOLO LOUÇÃ

O dr. Louçã apresentou a sua candidatura presidencial. Trata-se, em versão "esclarecida" e urbano-depressiva, de uma espécie de "santa da Ladeira" de uma coisa a que chamou "movimento socialista popular". Ele, o apóstolo, "convoca" todo esse estranho "movimento" e, mais benignamente, proclama que "é toda a esquerda plural que é chamada". Para além disso, também nos promete, em cinco anos, uma "revolução ambiental" e um "levantamento cultural". Finalmente, ele "não desiste". Esta é uma pequena amostra do que podemos esperar da língua populista de Louça nos próximos três meses. Apesar desta arenga, não nos devemos esquecer que Louçã também tem, nestas eleições, as funções de batedor. Inicialmente, o exclusivo pertencia a M. Soares, mas a emergência de Alegre "obrigou" o profeta da "energia alternativa" a referir-se com aspereza aos seus dois "amigos" nestas eleições. "Os ajustes de contas, as quezílias, as pequenas divisões não merecem o respeito dos eleitores", disse o nosso justiceiro. Presumo que Louçã, à semelhança de Jerónimo, não esteja excessivamente preocupado com uma segunda volta em que não deve acreditar. Só lhe interessa esta. Por isso, fará todo o mal que puder e a toda a gente. Há uma semana, o país não o levou a sério. É importante que continue assim.

NÃO DEVIA?

Mais uma vez no carro, via Antena Um, fiquei a saber que o Serviço Nacional de Bombeiros e Protecção Civil - aquele que nos "defende", com enorme sucesso, das calamidades públicas- emprestou uma "tenda de campanha" desmontável, com os respectivos adereços, a um país vítima do "tsunami" de Dezembro passado. Foi devolvida há seis meses, jazendo na Alfândega de Lisboa à espera que a vão buscar. Tirando este "kit" do SNBPC, só existe outro idêntico afecto ao INEM. Acontece que o dito Serviço se "esqueceu" ou não se interessou em ir "levantar" o material e foi a Alfândega que teve de "avisar" o SNBPC que a presença do material, sem ser "desalfandegado", já está a custar cinco mil euros à Protecção Civil. Também na área da Administração Interna, foi "ressuscitado" um relatório, com cinco anos de idade, para efeitos meramente políticos e demagógicos, sobre o consumo de álcool e de droga dentro das forças de segurança. Isto já para não falar do célebre "descontentamento" permanente de polícias e "gnr's" - que se manifesta quase sempre de uma forma grotesca e inaceitável - e das greves intermitentes do SEF. Ou da moribunda IGAI que foi votada ao abandono político desde que Rodrigues Maximiano se foi embora. Ainda não percebi como é que, com tantos secretários de Estado - um dos quais o "iluminado" José Magalhães - e um subsecretário de Estado, não é possível introduzir um mínimo de racionalidade nos diversos departamentos directamente responsáveis pela segurança interna. A única excepção consiste nas alterações nas chefias máximas dos serviços de informações, como não podia deixar de ser, não se sabendo se ocorreram pelas melhores razões. Não sei se falta autoridade política ao "super-ministro" António Costa ou se lhe falta outra coisa qualquer. Sei, porém, que a sensação que se transmite para a opinião pública é a de uma anarquia larvar que atravessa praticamente todos os sectores por que ele é directamente responsável, sendo certo que não se trata propriamente da agricultura ou das pescas, por exemplo. Isto devia preocupar alguém. Ou não devia?

HIER ENCORE

Hier encore
J'avais vingt ans
Je caressais le temps
Et jouais de la vie
Comme on joue de l'amour
Et je vivais la nuit
Sans compter sur mes jours
Qui fuyaient dans le temps

J'ai fait tant de projets
Qui sont restés en l'air
J'ai fondé tant d'espoirs
Qui se sont envolés
Que je reste perdu
Ne sachant où aller
Les yeux cherchant le ciel
Mais le cœur mis en terre

Hier encore
J'avais vingt ans
Je gaspillais le temps
En croyant l'arrêter
Et pour le retenir
Même le devancer
Je n'ai fait que courir
Et me suis essoufflé

Ignorant le passé
Conjuguant au futur
Je précédais de moi
Toute conversation
Et donnais mon avis
Que je voulais le bon
Pour critiquer le monde
Avec désinvolture

Hier encore
J'avais vingt ans
Mais j'ai perdu mon temps
A faire des folies
Qui ne me laissent au fond
Rien de vraiment précis
Que quelques rides au front
Et la peur de l'ennui

Car mes amours sont mortes
Avant que d'exister
Mes amis sont partis
Et ne reviendront pas
Par ma faute j'ai fait
Le vide autour de moi
Et j'ai gâché ma vie
Et mes jeunes années

Du meilleur et du pire
En jetant le meilleur
J'ai figé mes sourires
Et j'ai glacé mes pleurs
Où sont-ils à présent
A présent mes vingt ans?


Charles Aznavour

SINAIS...

... preocupantes do país (ir)real.

FÁTIMA EM OUTUBRO



A RTP forneceu, por instantes, imagens de Fátima. De um lado e do outro da alameda do Santuário, milhares de peregrinos assistiam à chuva à passagem da imagem da Senhora em direcção ao altar. "Não matarás", percebi pela locução, é o tema desta celebração. Simultaneamente, em Roma, está reunido o Sínodo dos Bispos, com o Papa Bento XVI, para discutir a eucaristia. A presença habitual de uma multidão nestas celebrações de Maio e de Outubro, indistinta na sua composição social, política ou cultural, corresponde a uma atracção aparentemente inexplicável. Confere, no entanto, um sentido permanente às primeiras palavras do pontificado de João Paulo II: "não tenhais medo, abri o vosso coração a Cristo". E Ratzinger, de uma outra maneira, também "explica" o "mistério" repetido e renovado de Fátima: "Desse lugar foi lançado um sinal severo, que investe contra a falta de reflexão reinante, um apelo à seriedade da vida e da história, uma recordação dos perigos que pairam sobre a humanidade. É o que o próprio Jesus lembra muitíssimas vezes, não temendo dizer: "Se não vos converterdes, perecereis todos" (Lc 13,3). A conversão - e Fátima recorda-o plenamente - é uma exigência perene da vida cristã". Custa assim tanto a entender?

12.10.05

LER OS OUTROS

Rui Ramos, no Diário Económico: "a democracia vista de baixo".

PRIMEIROS E SEGUNDOS

O Diário de Notícias "conta" alegadamente a "história" da reunião de Sócrates com as "federações" do PS destinada ao "balanço" das autárquicas e ao "lançamento" definitivo de Mário Soares às ditas "federações" e das ditas "federações" a Mário Soares. Pelo caminho, parece, houve uns murmúrios sobre o governo e o voto "de castigo" - nos quais Joaquim Raposo, um "modelo" político altamente recomendável, teve destaque - e um "esclarecimento" acerca de Manuel Alegre. De acordo com Sócrates, a primeira e única escolha teria sido sempre Guterres, mas como este não quis, e tendo-lhe "chegado aos ouvidos" que Soares estava "disponível", "decidiu-se" por este. Alegre foi por ele "avisado" que ia apoiar Soares, pedindo-lhe que fizesse o mesmo. Alegre ter-se-á calado e, uns dias depois, foi dizer ao Público que estava, ele sim, "disponível", o que terá "obrigado" Sócrates a oficiar publicamente por Soares. Este episódio de "primeiros e segundos" merece uns breves comentários. Alegre tem, no "terreno", uma candidatura aparentemente irreversível. Esta "história" apenas visa "obrigar" Alegre a vir a terreiro discutir questões "de carácter" para esconder a pobreza franciscana da "política" presidencial do PS. Depois, toda a gente sabe que foi Soares quem se impôs a Sócrates e ao PS por achar, com alguma razão, que o partido não sabia o que fazer com Belém. Limitou-se a ocupar, mesmo que sem o rasgo de outros tempos, um vazio. Na sua cabeça, Alegre também fazia parte desse vazio, razão pela qual o considera desprezível. Finalmente, e para efeitos meramente domésticos, Sócrates quis "segurar" o aparelho para servir Soares, tentando que ninguém se distraia com Alegre. Com o devido respeito, não me parece que estes jogos florais partidários interessem ao país. Quem é que, no meio desta balbúrdia, pode sinceramente achar que alguma destas candidaturas presidenciais é a "útil" e a "necessária" ? Quem?

O CANDIDATO JERÓNIMO

Jerónimo de Sousa fez um "balanço" dos resultados autárquicos e lançou-se na sua candidatura. Tem razões para estar satisfeito. Ao contrário do profeta Louçã, capitalizou razoavelmente o "desconcerto" face ao governo e confirmou o PC como uma entidade com alguma audiência local. Depois - e isto foi a parte mais interessante da mensagem - avisou o PS que tenciona explorar o filão do "descontentamento" nas eleições presidenciais, "filão" esse que, bem espremido, pode inviabilizar a "derrota" da "direita" cuja "história" ele recordará. O que é que Jerónimo quis dizer com isto tudo? Três coisas simples. Em primeiro lugar, que, ao contrário do que aconteceu há dez anos com Sampaio, o PC tem uma "agenda" própria para as presidenciais, apesar de Soares, e que se destina fundamentalmente a combater o PS e o governo. Em segundo lugar, que não acredita na vitória de Soares em nenhum "cenário", preferindo "fixar" o seu eleitorado - para o "dia seguinte" - na provavelmente única "volta" das eleições. E, por fim, que não deixará de cumprir o seu papel "contra" Cavaco, sem hostilizar excessivamente alguma opinião pública de "esquerda" que, sem hesitações, vai votar naquele sem precisar de lhe tapar o rosto. Jerónimo e o PC já foram demasiado longe no confronto com o PS e o governo para recuarem ou para pedirem ao "seu povo" para recuar em nome de uma incerta batalha. Jogam, desta vez, pelo seguro.

O REMORSO

EL REMORDIMIENTO

He cometido el peor de los pecados
que un hombre puede cometer. No he sido
feliz. Que los glaciares del olvido
me arrastren y me pierdan, despiadados.

Mis padres me engendraron para el juego
arriesgado y hermoso de la vida,
para la tierra, el agua, el aire, el fuego.
Los defraudé. No fui feliz. Cumplida

no fue su joven voluntad. Mi mente
se aplicó a las simétricas porfías
del arte, que entreteje naderías.

Me legaron valor. No fui valiente.
No me abandona. Siempre está a mi lado
La sombra de haber sido un desdichado

Jorge Luis Borges

11.10.05

UM SENHOR



Calhou-me outro dia rever o magnífico filme de Joseph Mankiewicz, All about Eve, Eva, na tradução portuguesa. Bette Davis, Anne Baxter e George Sanders completam o "trio" que, de alguma maneira, imortaliza esta película sobre o espectáculo que é a vida e a vida que, verdadeiramente, raramente passa de um teatro, e do mau. Sanders compôe uma personagem tremenda, cínica e manipuladora de um crítico teatral, Addison De Witt. É, julgo, porventura o seu maior papel e que lhe valeu um "academy award" para "o melhor actor secundário" em 1950. Tratava-se de um sujeito curioso. Casou-se e divorciou-se "n" vezes, gastou tudo numa mal sucedida fábrica de molhos e, a dada altura, chegou a recorrer a sete psiquiatras ao mesmo tempo. Não lhe serviu de muito. Em 1972, em Barcelona, tomou (também) sete frascos de "Nembutal" e partiu tranquilamente. Deixou uma famosa nota de suicídio. Não fosse o momento que lhe deu azo, quase me dá vontade de escrever isto todos os dias. "Dear World: I am leaving because I am bored. I am leaving you with your worries in this sweet cesspool". Numa tradução rasteira, qualquer coisa como isto: "Querido Mundo. Vou-me embora porque estou aborrecido. Deixo-te com as tuas preocupações nesta doce estrumeira". Um senhor.

"CEUX QUI M' AIMENT, PRENDRONT LE TRAIN"

A "bloquista" Joana Amaral Dias, a mandatária "trintona" de M. Soares para a juventude , "suspira" por Paulo Portas. Já o seu "mandante" fez discretamente o mesmo a semana passada, apesar do episódio familiar humilhante da Cruz Vermelha, há dois anos. Não tenho nada contra uma candidaturazinha "à direita" de Cavaco, mesmo que apascentada a partir do MASP III ou às cavalitas de quem quer que seja. Nada impede nada, como se vê por Alegre, Louçã, Jerónimo, Carmelinda Pereira, Garcia Pereira e o advogado do sr. Carlos Silvino. Nada mesmo, como o prova supremamente Soares. Quanto à candidatura de Cavaco, com que alguns plumitivos sonham "negociar" não se percebe bem o quê, quem quiser que apanhe pura e simplesmente o comboio. Ceux qui m'aiment, prendront le train.

10.10.05

POPULISMOS

Depois da desastrada passagem de Almeida Santos por Felgueiras, durante a campanha eleitoral - parecia, aliás, que "estava morto" por encontrar Fátima Felgueiras e por ir tomar chá com ela -, e, sobretudo, depois da vitória desta, esta micro-causa continua a fazer sentido. Fátima "sugou" o eleitorado do PS ao ponto de o "prof. Campos", o candidato oficial, mal conseguir disfarçar o seu desânimo perante um "povo" que manifestamente não compreendia. O populismo é uma vertente perversa da democracia. Umas vezes resulta - Fátima, Isaltino, Valentim e outros anónimos-, outra vezes não - Ferreira Torres, Louçã e outros anónimos.

DAY AFTER

1. O PS ainda não percebeu o que lhe aconteceu nas eleições de 20 de Fevereiro. Não percebeu que não ganhou a "esquerda", nem percebeu que ganhou, sim, um aliado meramente circunstancial chamado "centro". Toda a "esquerda", nesse dia, subiu, como ontem, pelo menos o PC, subiu. Um PC que subiu, aliás, "à conta" da sua bem orquestrada campanha contra o PS e contra o governo. O Bloco contou pouco nestas autárquicas, apesar de todo o folclore. Em Lisboa, na hora da despedida, Carrilho esteve quase tão mal como durante toda a campanha. Mais do que ter perdido, ele próprio acabou perdendo-se pelo caminho, encarnando a candidatura indesculpavelmente mais pífia de todas. A Jorge Coelho, o "coordenador" derrotado, teria ficado bem ter aparecido ao lado de um duplamente abandonado João Soares, em Sintra: à sua pouca sorte e à sua condição de "menino grande" que o pai não deixa "crescer".
2. O eleitorado, uma vez resolvida tranquilamente a crise governativa há cerca de seis meses, "recompôs-se" com naturalidade e sem dramas, nas autárquicas, sobretudo em redor dos chamados grandes centros urbanos e decisores. Nada, em geral, que deva perturbar a "estabilidade socrática", recomendada, entre outros, por Cavaco Silva. Nem mesmo o sucesso claro de Marques Mendes. As vitórias dos "independentes" populistas - lamentáveis e democraticamente sombrias - vêm no "pacote" democrático, pelo seu lado perverso e malsão.
3. A "esquerda" que escapou à supervisão do PS, logo em Fevereiro e ontem reforçada, veio para ficar. O pretexto vai ser a eleição presidencial que hoje começa. Há dois dias, no Diário de Notícias, Vitor Ramalho, um valente apoiante de Mário Soares, publicava um risível artigo encomiástico que deve ter feito corar de vergonha o seu candidato. Soares, no lastro do lançamento precipitado e tosco da sua recandidatura, por um lado, e do resultado das autárquicas, por outro - alguém lembrou outro dia que M. Soares pediu ao partido para "lhe ganhar" Lisboa e Sintra, pelo menos -, passa a precisar da "esquerda" como de pão para a boca. Acontece que, nem Louçã, o pregador eterno, nem Jerónimo de Sousa, o combatente feroz pelo seu "território", estão interessados na escolástica soarista. Quem sabe se Manuel Alegre não se vem a revelar mais "tentador" para esta gente do que o "fundador". Ou mesmo, sabendo de antemão que muito do seu eleitorado poderá "perder-se" para Cavaco, apostar apenas na "luta que continua" e que, pelos vistos, dá votos.
4. Voltando ao início da conversa, a "não esquerda" que votou PS para se livrar de Santana Lopes, quer basicamente duas coisas. Que o governo, em estabilidade, governe, entre o "razoavelmente" e o "bem". E que, governando, o faça com crediblidade, sem desvios paroquiais ou incontinências "familiares". O resto virá por si.