31.7.10

A GRAVURA

Depois da conversa nula que marcou a inauguração do museu do Côa, atravancada por uma verdadeira comitiva de bobos chefiada pela "vítima" mais famosa de Portugal e alhures, espera-se o pior dos fiascos. Ninguém faz seriamente a menor ideia acerca do que se vai passar a seguir por causa das "parcerias" que ainda não existem. Mas, segundo o "está em toda a parte", o museu é «a gravura que nós deixamos às gerações futuras.» Um especialista em deixar coisas às "gerações futuras". A verdadeira "gravura".

UMA RESERVA NATURAL DE BURROS


"Escudada" no que se passa na Europa do norte - mais uma convencida que vive em Marte -, Isabel Alçada quer acabar com os chumbos. Aquele servil presidente das associações de pais, já acenou com a cabeça. A menos que Alçada e o governo dela pretendam estender a reserva de gado asinino (embora este seja genuíno) às escolas tão prenhes de verdadeiros burros de duas pernas, não se vislumbra o porquê deste disparate pegado a não ser que seja mais um iluminado passo no caminho certeiro da derrota do pensamento. "Acompanhamentos paralelos" de quê, como ouvi a madame a dizer no rádio do carro? De calões embrutecidos? Por amor de Deus.

MAR


De todos os cantos do mundo
Amo com um amor mais forte e mais profundo
Aquela praia extasiada e nua
Onde me uni ao mar, ao vento e à lua.


Sophia de Mello Breyner Andresen

WITTGENSTEIN NÃO PASSOU POR ALCOCHETE


Na noite em que "Deus Nosso Senhor" desceu à Terra para jurar ser a última vez que ia falar sobre Alcochete (isto de "Deus" estar em toda a parte inclui rincons improváveis como Alcochete), não se apercebeu de uma coisa óbvia que, em artigo no Expresso, Rui Ramos explica. Sócrates não devia ter dito nada sobre o Freeport. Porquê? Porque não foi ouvido, «foi apenas falado.» Ao descer à Terra, mais precisamente em São Bento, um lugar inverosímil para falar da "vida comum", o nosso "Deus", «com esta exibição pública de alívio (...) voltou a fazer do Freeport um caso seu.» Aliás, é o que querem dizer os procuradores com o seu ambíguo despacho das perguntas que ficaram por fazer. Quem tenha alguma vez na vida feito inquéritos - penais ou administrativos que podem ter consequências disciplinares ou penais - sabe que, a partir de um determinado "nível", as coisas complicam-se. Em 2001, fiz um relacionado com a "fundação para a prevenção e segurança" que tinha custado a cabeça política a dois então membros do governo Guterres: Vara e Luís Patrão. Os vasculhadores de arquivos experimentem arranjar o Expresso, mas de 4 de Agosto de 2001. Vem lá transcrito - porque o inquérito foi pedido por uma comissão parlamentar e passou por muitas mãos - o meu pedido de escusa e de substituição por outro inquiridor quando o relatório final que apresentei não foi aceite e o processo continuou. Nesse texto, se bem me lembro, também deixei umas perguntas bem como no dito relatório. Propunha então um processo disciplinar a um director-geral que não foi aceite superiormente. O director-geral chamava-se António Morais, engenheiro, à altura director de uma coisa chamada "gabinete de estudos e planeamento de instalações" do MAI. Antes do fim desse mês de Agosto de 2001, e já sem mim a conduzi-lo, o processo foi arquivado. Morais acabou por ser removido daquele "gabinete" pelo governo seguinte após uma auditoria realizada pelo mesmo organismo que, ano e meio antes, não viu razões para lhe instaurar um processo disciplinar. Só voltei a ouvir falar de António Morais em 2005 ou 2006 quando o primeiro governo do nosso "Deus", pela mão de Alberto Costa, da Justiça, o colocou à frente de um departamento homólogo àquele onde o encontrara anteriormente. E de onde saiu a correr por causa de uma capa do falecido Independente. Finalmente, em 2007, soube que, antes de o ter conhecido, Morais tinha sido professor de Sócrates num estabelecimento dito universitário que encerrou. "Deus", afinal, já estava em toda a parte. Regresso ao despacho das perguntas por fazer. Que revela ele? Impotência, algo que Rui Ramos identifica exemplarmente. «Depois da perda de soberania ocasional por sucessivos maus governos, o Estado que temos em Portugal já só serve para pequenos projectos de poder pessoal, como algumas Câmaras Municipais de província.» Na sua pusilanimidade congénita e no seu inaceitável temor reverencial, a justiça, seja ela qual for, acaba por fazer parte deste "paradigma" permitindo a recuperação da "dúvida metódica", cartesiana, da primazia da primeira pessoa. Primeira pessoa que, no caso, não soube escolher o conselho "analítico" do primeiro Wittgenstein - «acerca daquilo que se não pode falar, tem que se ficar em silêncio.»

(foto: Ludwig Wittgenstein, "furtad0" ao Tiago que hoje acordou analítico)


Adenda: Ler este post de Artur Costa e este de Eduardo Maia Costa.

VOO SEM PÁSSARO DENTRO

A poesia não é voz – é uma inflexão.
Dizer, diz tudo a prosa. No verso
nada se acrescenta a nada, somente
um jeito impalpável dá figura
ao sonho da cada um, a expectativa
das formas por achar. No verso nasce
à palavra uma verdade que não acha
entre os escombros da prosa o seu caminho.
E aos homens um sentido que não há
nos gestos nem nas coisas:
voo sem pássaro dentro.

Adolfo Casais Monteiro

30.7.10

MERECIAM-SE


Chamam-lhe a silly season como se não fossem todas assim. Mas quando na televisão aparece o sobrinho do tio, o Barroso, Alfredo, a coisa agrava-se. O dito Alfredo, com uma delicadeza que deve ter recolhido do tio em momentos de fúria, referiu-se a um jornalista como "medíocre" e "abaixo de cão" porque investigou coisas onde aparece o "Deus Nosso Senhor" originário de Vilar de Maçada. Com opiniões destas, Alfredo ainda sobe a presidente da ERC. Mereciam-se. E perdi este.

Adenda (do leitor Aires Varela):«O que se passou ontem no programa "Expresso da Meia-Noite" da SICn é simplesmente inconcebível. Ricardo Costa agiu como se os seus quatro convidados fossem atrasados mentais e ele um iluminado: não os deixava falar, repreendia-os a torto e direito e permitia-se observações inaceitáveis como a de chamar cobardes a pessoas que, ausentes, não se podiam defender. Como é possível que, depois deste programa, Costa mantenha responsabilidades editoriais na SIC e no Expresso? Como é que, depois de visionar tal coisa, alguém vai, no futuro, aceitar ir ao programa? E a administração da SIC não terá nada a dizer?» Só uma nota. Ricardo Santos é dado a oscilar, alarve e esquizofrenicamente, entre a passagem de atestados de besta a bestial, e vice-versa, a quem quer que seja. É outro "tudólogo" a pedir dois tabefes.

POBRES IDIOTAS

Um "barómetro" deixou em estado de esfuziante idiotia os idiotas do costume. Tudo porque Passos "baixou" em relação ao derradeiro "barómetro" e "Deus Nosso Senhor" Sócrates "subiu". Todavia, os mesmo idiotas - e valha isso o que valer, Passos segue à frente do outro - omitem o resto do "barómetro" na parte da "popularidade". «Na lista de popularidade, Cavaco Silva continua a ser o único com uma imagem positiva: 56,4 por cento dos portugueses avaliam de forma favorável o trabalho do Presidente da República», diz o "barómetro" que remete o subido Sócrates para «líder político mais impopular» onde «60 por cento dos portugueses têm uma opinião negativa sobre o líder do Governo, contra 26,5 por cento dos que têm uma ideia positiva.» Passos empata - «32,3 por cento dizem ter uma opinião positiva, enquanto que 32,2 por cento têm uma ideia negativa sobre o líder do PSD.» Pobres idiotas.

DAS FÉRIAS ENQUANTO PAÍS


Fora a parte em que Medeiros Ferreira pressupõe que este ambulatório em forma aparentemente humana que nos aparece como elite nacional o é - um filósofo analítico veria aqui uma falácia -, o artigo sugere uma pequena dose de reflexão sobre o que aí vem depois da passagem mitológica das "férias". Vendo bem, o português é alguém posto no mundo, então dito de Cristo, que desapareceu logo para férias intelectuais nas naus do Gama, porventura já em regime de low cost. E, como acontece com o low cost, tais aventuras costumam sair sempre mais caras do que constava do "programa" inicial. Andamos há séculos nisto. De férias.

QUATRO A ZERO


O artigo que se se segue é de Eduardo Cintra Torres e está hoje publicado no jornal Público. É, em certo sentido, edificante. Comprova-se que o poder - na altura absoluto, da "esquerda moderna", protagonizado em "Deus Nosso Senhor" ou o "Está em Toda a Parte" Sócrates - fez o que pôde para silenciar quem o chateava com essa coisa horrorosa que é a verdade. Depois, evidencia-se que a ERC é uma aberração que deve, à semelhança de tantas outras, ser pura e simplesmente removida (como um tumor maligno) da constituição porque, pelos vistos, nem sequer se preocupa excessivamente em a cumprir. Finalmente, lamenta-se que colegas de profissão do "réu" (recordo que Cintra Torres quase que foi obrigado, um dia, a mostrar a sua carteira profissional na tv a instâncias de um dos citados no texto, salvo erro) se tivessem prestado a actos da mais reles vassalagem e do mais cobarde temor reverencial contra jornalistas. Só prova que não têm nem respeito por eles mesmos nem tão pouco pela profissão que escolheram. E que se comportam, para se manterem à tona da "respeitabilidade", como ténias e não como homens livres que deviam ser.

«No dia 20 de Julho, o Tribunal Criminal de Lisboa absolveu-me num dos processos que a RTP e a sua Direcção de Informação me moveram por causa do artigo "Como se Faz Censura em Portugal" (PÚBLICO, 20/8/06). A sentença, que abaixo cito, é uma excelente peça a favor da liberdade e do dever de informar e criticar e um aviso aos que pretendem usar a justiça para calar a opinião livre e a investigação independente dos factos. Entre 2006 e 2007, o aparelho de Estado processou-me quatro vezes: a RTP três e a Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC) uma. Hoje, como então, considero que se tratou de uma acção do interesse do Governo, destinada a intimidar-me e a calar-me. O Governo estava num prolongado "estado de graça" proporcionado pela opinião pública e pela opinião publicada. A imprensa incensava o primeiro-ministro como um génio de extraordinárias qualidades nacionais e internacionais. Por isso, quando analisei naquele artigo a cobertura dos incêndios no Telejornal da RTP1 de 12 de Agosto de 2006, o Governo temeu a abertura de uma pequena brecha no consenso de que beneficiava. O artigo afirmava: "As informações de que disponho indicam que o gabinete do primeiro-ministro deu instruções directas à RTP para se fazer censura à cobertura dos incêndios: são ordens directas do gabinete de Sócrates." Era preciso calar-me, e depressa. O presidente da ERC, José Alberto Lopes, no dia seguinte ao artigo, antes de reunir a ERC, condenou-o e condenou-me. No mesmo dia, a RTP fez um comunicado sobre o meu artigo, o que é raríssimo, se não único, anunciando um processo judicial. A imprensa dedicou páginas ao "caso Cintra Torres". Deveria ter-se dedicado à acção ilegítima do Governo nos media, mas só o veio a fazer três anos depois. E o Parlamento quatro anos depois. O processo da ERC originou a sua primeira deliberação (1-I/2006) e a Recomendação 7/2006, documentos que ficarão como página negra na história da liberdade de imprensa. Além do absurdo de dedicarem mais de 200 páginas à demolição de um artigo de opinião (prática a que nunca mais recorreram), os reguladores tomaram uma decisão que os envergonhará para sempre: declararam que o director do PÚBLICO deveria ter censurado o meu artigo. O processo da ERC visava constranger-me e ao PÚBLICO e absolver a RTP e o Governo de qualquer interferência nos canais do Estado. Quatro anos depois, aqui fica o resumo do estado em que estão os quatro processos movidos pelo Estado contra mim. Processo ERC: O Tribunal Fiscal e Administrativo, única instância que pode apreciar juridicamente as decisões da ERC, anulou em Maio a Deliberação e a Recomendação, por ausência de audição prévia dos visados (PÚBLICO e eu). A ERC recorreu da sentença. Processo incêndios n.º 1: a administração da RTP, de Almerindo Marques e Luís Marques, e a Direcção de Informação - Luís Marinho, J. Alberto Carvalho, Carlos Daniel, J. Manuel Portugal e Miguel Barroso - apresentaram queixa-crime contra mim, o PÚBLICO e o seu director por causa do referido artigo. A 1.ª instância arquivou em 2007. A RTP recorreu. A Relação achou que o caso deveria ser julgado, mas apenas contra mim. O julgamento terminou com a minha absolvição. Assiste à RTP o direito de recorrer. O juiz escreveu: "A crítica à RTP não pode ser considerada ilícita por se referir à permeabilidade à pressão governamental a que se mostra recorrente" na sua história; no artigo, exprimi "uma opinião absolutamente legítima", tanto mais que é "notório" ser "sistematicamente" referida a "governamentalização da informação da RTP"; as afirmações que escrevi não foram ofensivas e foram "justificadas", pois procurei "criticar uma cobertura jornalística e uma interferência sempre recorrente do poder governamental no serviço público" de TV; cumpri o dever de informar, e actuei "no âmbito do interesse legítimo de informar, de criticar e de ter fundamento para, em boa-fé, reputar verdadeiras as informações veiculadas". O tribunal considerou ainda "totalmente improcedente" o pedido de indemnização que a RTP e os cinco directores de Informação me exigiam, de 180 mil euros. Processo incêndios n.º 2: a RTP e os mesmos indivíduos apresentaram queixa-crime contra mim por ter reiterado o teor do artigo num programa da RTP, a convite da RTP e para debater na RTP o artigo com um membro da ERC e outro convidado. O juiz arquivou. A RTP recorreu. A Relação confirmou o arquivamento. Processo governamentalização na RTP-Porto: a RTP e J.M. Portugal apresentaram queixa-crime por ter escrito que a ida de J.M. Portugal para a RTP-Porto visava "partir a espinha" à independência de que gozava o Jornal da Tarde, feito a partir dali. O processo foi arquivado. A RTP, como sempre, usando dinheiro público e uma sociedade de advogados privada, recorreu. A Relação confirmou o arquivamento. Em resumo: todas as decisões dos tribunais foram favoráveis às liberdades de expressão, de informação e de opinião. Quatro a zero a favor da liberdade e da nossa maturidade democrática.»

29.7.10

ABOBORAR

O Estado, através da suas duas golden shares na bola - os srs. eterno Madaíl e Laurentino Dias -, decidiu "vetar" de cernelha o "prof." Queiroz. O método é velhíssimo. Vai buscar-se uma coisa que estava a aboborar para o que desse e viesse. De seguida, aboborada, abre-se um processo e, finalmente, despede-se com justa causa e uma choruda indemnização. Se o desempenho vuvuzelense tivesse sido outro, alguma vez teria sido conhecido o episódio aboborado?

GRANDES ENTREVISTAS






Agora que está na moda apresentar "grandes entrevistas" diárias com a pequenina gente caseira - e quase sempre a mesma gente basbaque, por sinal - atente-se na sagacidade irónica deste extraordinário escritor. Para quem confunde escritores com palermas que se imaginam escritores, a altíssima exigência intelectual de Céline não serve. É, tipicamente, outra coisa.

OCUPAÇÃO DOS TEMPOS LIVRES - 2ª PARTE


Eu não disse? Cá está ele. A PGR do senhor conselheiro Pinto Monteiro arrisca tornar-se num inerme edifício de "assuntos internos" cada vez mais afastado da realidade. Não estará na hora de Passos Coelho, tão imaginativo por estes dias, voltar a colocar em cima da mesa a eventual substituição de Pinto Monteiro, algo que sugeriu aquando da campanha para presidente do PSD - que ganhou - contra a opinião respeitosa do seu principal opositor Rangel?

MAIS CURTO-TEMPISMO

No "regresso" de Pacheco Pereira aos grandes posts e às frases certeiras. «Difícil arranjar algum lugar dourado para um antigo primeiro-ministro pouco qualificado» que "ameaça" fazer a legislatura inteira como sempre suspeitei que acabará por fazer. Até porque a "direita", tanto quanto sei, é para o "curto-tempismo" que se prepara. Mas isso fica para outro dia.

A VIDA É CRUEL


O Jansenista é um belíssimo blogue lamentavelmente arrastado pela facilidade do anonimato. Todavia, isso em nada diminui o seu conteúdo. Esta sucessão de imagens "kim-il-jongianas", tão inspiradoras do "estilo" do homólogo português da "esquerda moderna", ou esta acerca da barbaridade "cultural" da tourada, valem todas as visitas do mundo. Como escreve o autor noutro post, a vida é cruel. Permito-me parafrasear - nós somos cruéis de tanto pretendermos ser justos com a estupidez alheia.

DO CURTO-TERMISMO DOS DINOSSÁURIOS


1. «É a aceleração que conduz à consagração do curto-termismo, como se ela fosse na verdade, na bela expressão de Milan Kundera, o único êxtase do homem moderno. A aceleração dilui a percepção do tempo, condenando-nos a viver num presente perpétuo em que os acontecimentos se multiplicam na razão inversa da compreensão do seu sentido. A torrencial multiplicação dos pontos de vista tem como único efeito seguro o de privar o homem contemporâneo de qualquer perspectiva consistente sobre o quer que seja.O curto-termismo, que decorre automaticamente desta aceleração e se impõe em todas as vertentes da vida contemporânea, é o que melhor define a mutação radical que ocorreu na nossa relação com o tempo. É ele que nos priva de qualquer horizonte onde se possam instalar verdadeiros projectos de vida, individuais ou colectivos.»


Manuel Maria Carrilho, DN

DESFAZER EQUÍVOCOS


Esta Priscila - que não é seguramente a rainha do deserto - faz bem o seu "ponto" acerca de Henrique Raposo e da sua "alergia" liberal (meu Deus, se fosse pelo número dos que se intitulam "liberais", hoje éramos uma magnífica província dos EUA para banhos longínquos desses obesos devoradores de big mac's). Se eu quisesse ser mau, perguntava ao Henrique quem são os "liberais" que financiam os seus estudos e as suas investigações. Com não sou, apenas lhe recomendo que pondere o seguinte. Quem beneficia da ADSE, não o faz de borla. "Desconta" mensalmente de 1 a 1,5% para o efeito, esteja no activo ou esteja aposentado. Para além disso, "desconta" brutalmente em IRS para, entre outras coisas, o SNS onde, quando a ele recorre, torna a pagar as respectivas "taxas moderadoras". Feitas as contas, o repelente funcionário público que estraga o liberalismo caseiro, "desconta" três vezes e paga, fora a ADSE, do seu bolso, o que não é comparticipado quando vela pela sua saúde. Qualquer razoável economista da saúde explicaria de bom grado ao Henrique que o Estado poupava mais se o SNS adoptasse um regime tipo ADSE do que mantendo o "ideológico" Serviço da bandeirinha, esse sim, um poço sem fundo. Por exemplo, o autor do livro da foto.

OCUPAÇÃO DOS TEMPOS LIVRES

Deve estar para breve a abertura de mais um inquérito desta feita sobre os atl's dos senhores procuradores.

CONTAGENS



Deve haver por aí uns "especialistas", estilo "rambinhos", que entendem dos meandros informáticos e que entram desavergonhadamente nos sitemeters dos outros para os manipular. Não é a primeira vez que reparo na "paralisia" do dito sitemeter ou na sua inexplicável alteração (para baixo, evidentemente) nos registos num espaço de horas. Se se atentar nesta listagem - que vale o que vale e que é elaborada a partir do dito sitemeter - no meio de uma série de cocós na fralda, de sexo na banheira, de as mais belas do hi5, ou dos meus contos eróticos, surgem alguns blogues ditos mais políticos. À excepção de um - este -, os outros cinco ou seis correspondem a verdadeiros "exércitos" blogosféricos em que debita uma quantidade de gente. O que quer dizer que, até prova em contrário, o Portugal dos Pequeninos é o blogue solitário, ferozmente individual e individualista, mais lido em matérias políticas e afins. A manipulação do sitemeter não altera a natureza das coisas e, muito menos, a do autor do blogue. Que penhoradamente agradece aos leitores que nele confiam mesmo sabendo que o dito autor não confia em ninguém.

SARAVÁ

Naquele linguarejar parecido com o português que é o do senhor Lula da Silva - "autor moral" confesso, juntamente com Sócrates, do grande negócio tríptico luso-brasileiro-espanhol (disse-o Granadeiro) - ficou a saber-se que a Oi (outra designação de elevado teor estupidificante) está mais "brasileira da Silva" do que nunca. Pode fazer-se uma extensão disto e afirmar, sem margem para grandes dúvidas, que Portugal também caminha, a passos gigantes e "estratégicos", para ficar "brasileiro da Silva" ou da "Silva brasileiro" o que vai dar no mesmo. O "brasileiro" era uma figura recorrente na prosa de Eça. Hoje aparece todos os dias nas televisões sob as mais imaginativas quanto apalhaçadas formas. Lula está em nós e nós estamos em Lula. Saravá.

PATRIMÓNIO IMATERIAL



João Belchior Viegas deu-me, em vinil, o disco que trazia este fado. Era o 1º volume de uma colectânea de fados de Amália. Não havia telemóveis e, por ter de falar com Joaquim Manuel Magalhães ao telefone enquanto o disco girava, disse-me este para reparar no poema do fado. É a segunda vez que o ponho cá. Tanta fadista pernóstica e ka(th)ias vanessas amarisadas a cantar "poesia" palermóide ou bandas rock no metro a guinchar e a lambuzar o que outrora Amália tornou definitivo quando, afinal, está tudo aqui, nestas três singelas estrofes de Luís de Macedo.

Por trás do espelho quem está
De olhos fixados no meus?
Alguém que passou por cá
E seguiu ao Deus dará
Deixando os olhos nos meus.

Quem dorme na minha cama
E tenta sonhar meus sonhos?
Alguém morreu nesta cama
E lá de longe me chama
Misturado nos meus sonhos.

Tudo o que faço ou não faço
Outros fizeram assim
Daí este meu cansaço
De sentir que quanto faço
Não é feito só por mim.

(letra: Luís de Macedo; fado de Joaquim Campos)

28.7.10

GRANDEZA



Jamais se poderia aplicar a Birgit Nilsson aquilo que a escritora Mary McCarthy disse a propósito de um scholar seu conhecido e que assenta perfeitamente em dezenas de pessoas que conhecemos. «Na realidade não o consigo imaginar como sendo má pessoa excepto naquele sentido em que dizemos que um adolescente é má pessoa, isto é, alguém que é dado a mentiras, a evasivas, a fantasias, à ambição - em suma, alguém de plástico, sem forma.»

TAMBÉM?


«Os paradigmas vão-se conquistando aos poucos», disse Gabriela Canavilhas a um surpreendido Mário Crespo que queria saber de onde vinha o dinheiro para o afamado museu do Côa a abrir sexta-feira. Ele é teleférico, ele é turismo, ele é economia, ele é o abraço da ministra Pássaro, ele é energia dos gestores "do projecto", ele é "sinergias" (dá vontade de puxar da pistola cada vez que se ouve a palavra "sinergias") ele é isto, ele é aquilo. São os "paradigmas" de uma ministra que, ainda não há muito tempo, afagava paternalmente a mão a Manoel de Oliveira, sossegando-o, porque, disse, "eu também sou uma mulher de cultura". Também?

ACTO DE CIVILIZAÇÃO



A Catalunha, depois das Canárias, foi a segunda região autónoma da Espanha a decretar, no parlamento, o fim das touradas. É um acto de civilização que merece ser saudado daqui, por mais que isso custe ao inesperado cavaleiro tauromáquico Paulo Portas e ao seu grupo de forcados.

LIÇÕES DE VIDA


Tudo, afinal, tem um preço desde que seja "estratégico", um termo que as meninas do Intendente desconhecem mas que as não impede de excluir a honra do preço. Nunca imaginaram as lições de vida que podiam dar.

O "INTERESSE NACIONAL" FOI A BANHOS


Em apenas um mês, o "interesse nacional" foi uma coisa e o seu contrário graças ao lacrimejante Lula, um dos "modelos" emergentes da derrota do pensamento. As carpideiras da golden share, das esquerdas e das direitas, onde andam? No Ancão, na praia dos Tomates ou na de Paço de Arcos onde o risco de mergulhar e sair da água com uma coisa daquelas na tola é elevado?

A PRAÇA E O PREÇO


«Estar ao lado do inimigo é uma atitude que tem um nome», afirma um ex-responsável militar acerca de um candidato presidencial que, a ser eleito, acumularia a presidência com o Comando Supremo da FA's. Mas terá realmente um nome essa "atitude" hoje em dia? Haverá, na linguagem pública do regime, lugar para o sentido denotado pelo senhor vice-almirante? Julgo que não. E nem sequer é isso que "limita" esse candidato. Trata-se de alguém sem a menor estatura política - a literária fica para outra ocasião mas é tão ou mais pequena que a política - para tal cargo. Uma vida de bravatas, umas consequentes, outras nem tanto, não faz um currículo. Basta a menor questão "concreta" para todo aquele monobloco, sobre ela, trivializar tudo e o seu oposto. Ele é o maior inimigo de si próprio. Quanto mais fala, mais se revela. É, afinal, a praça da canção. E o preço dela.

A AVE DE MINERVA


Adriano Moreira alterna com Mário Soares no lugar cativo das entrevistas de Constança Cunha e Sá na tvi24. Para satisfação de alguns prebostes que imaginam que não simpatizo com o dito professor, fica estabelecido, de uma vez por todas, que não e que isso não tem a menor relevância cósmica. Detestava Marcello Caetano - Moreira aspiraria a "delfim" do seu antigo Presidente do Conselho - e Caetano devolvia-lhe a "graça". Nas "confidências do exílio" feitas a Joaquim Veríssimo Serrão, Marcello classificou o teórico do "Estado exíguo" como «o filósofo da traição» venerado, já então, como «reserva nacional». E continuava. «Nunca se consolou de, após tanta manobra para vir a suceder ao Doutor Salazar, ter sido unanimemente rejeitado pelas pessoas ouvidas acerca da sucessão.» Já nas suas "Memórias de Salazar", Marcello fora impiedoso na única referência a Moreira - «antigo aluno meu da Faculdade de Direito, rapaz esperto embora não muito brilhante.» Moreira tornou-se lamentavelmente em apenas mais um "senador" tagarela deste regime. No dia em que passavam 40 anos sobre a morte de Salazar, Constança entendeu não questionar o seu guru acerca do "antigamente" porventura para não o maçar. Pelo contrário, deixou-o falar como se ele estivesse em lição numa universidade de verão de um híbrido do Bloco, do PC, do PS, do PSD e do CDS. Uma verdadeira ave de Minerva, este sr. prof. Moreira.

27.7.10

TIRO CERTEIRO

Parece que o dr. Soares sugeriu que Passos Coelho deu "dois tiros nos pés" - podia ser só um, mas foram dois - por causa da malfadada constituição. O dr. Soares, até há oito dias atrás, achava Passos praticamente sublime. Se agora descortinou "tiros" dados nos pés dele, Passos, é sinal que Passos disparou certeiro a um regime mitológico onde Soares é rei e o outro, pelos vistos, "príncipe".

O INQUÉRITO QUE FALTA

Depois de ouvir o "príncipe da democracia" - e a razão que lhe assiste - pergunto-me por que é que não "processa" a PGR. É esse o inquérito que falta.

«SALAZAR NA HISTÓRIA»


Segue-se, editado por mim, o artigo de Rui Ramos publicado no Expresso (suplemento Actual) do passado sábado. Não na versão "lulizada" a que o Expresso agora se entregou (com a excepção de dois ou três articulistas), mas no português original do R. Ramos que, amavelmente, me cedeu o texto a minha instância. As fotos de Salazar datam de 1962 e foram feitas para a revista Life por Paul Schutzer.

SALAZAR NA HISTÓRIA

POR RUI RAMOS

No dia 27 de Julho, passam quarenta anos desde a morte de Salazar: tanto tempo como o que ele esteve no poder (1928-1968). Hoje, é preciso ter mais de 60 anos de idade para ter sido adulto sob o seu governo. Já lhe podemos dar a devida sepultura histórica? E como?

Os quarenta anos de governo de Salazar deixaram um rasto bibliográfico de apenas seis volumes de discursos -- Mário Soares, em apenas uma década de presidência da república, produziu dez. Salazar não falava muito. Nós, em contrapartida, falamos muito de Salazar. Um site livreiro oferece cerca de 60 livros, saídos ou reeditados nos últimos três anos, com o nome de Salazar no título. Salazar “vende”. Dedicamos-lhe mais atenção do que a qualquer outra figura histórica. Mas já é apenas isso que ele é, história?

O atraso.
Salazar foi ditador de um país rural e pobre. E nas características deste país esteve sempre a maneira mais fácil de o despachar historicamente. Eduardo Lourenço, num texto da década de 1960, chamou-lhe “camponês letrado”. De facto, quem melhor do que o filho de “pobres” de Santa Comba Dão, ex-seminarista com sotaque provinciano, que quase não viajou para fora do país, que escrevia como um frade do século XVIII e levava a vida de um pároco rural do século XIX, com governanta, quintal e galinheiro -- quem melhor do que ele para corporizar o “atraso” e carregar a respectiva culpa?

O problema está em que, se quisermos ser exactos, teremos de admitir que foi precisamente com Salazar que Portugal começou a ser menos pobre, menos analfabeto e mais europeu. É verdade que mesmo alguns salazaristas se mostraram impacientes com a sua obsessão financeira. No entanto, os seus orçamentos equilibrados e inflação baixa, se adiaram gratificações, pouparam os portugueses às crises fiscais e da balança de pagamentos que, antes dele e depois dele, destruíram riqueza e frustraram expectativas. A partir da década de 1950 e até 1974, Portugal conheceu as taxas de crescimento mais altas da sua história. A estrutura da economia portuguesa mudou. E não, Salazar não tratou apenas de conter as reivindicações dos empregados e favorecer alguns empresários. Foram os seus governos que estabeleceram os primeiros sistemas de protecção social efectivos e que conseguiram escolarizar pela primeira vez uma geração inteira.
O Estado Social em Portugal foi salazarista antes de ser democrático. Tal como a integração atlântica e europeia, começada com as adesões à OECE (1948), à NATO (1949) e à EFTA (1960). Sem estes sucessos, Salazar não teria durado. Para muitos, o salazarismo viabilizara uma transformação económica e social que outros regimes tinham proposto, mas falhado. É isso que Salazar significa -- Um instrumento brutal de modernização? Mas é um erro reduzi-lo a um fenómeno sócio-económico.



A ditadura.

Quando comparamos a ditadura salazarista com as suas contemporâneas, quer na década de 1930, quer na década de 1960, a contabilidade repressiva é modesta. Não dispôs do “gulag” de Estaline, nem do “paredón” de fuzilamento de Fidel Castro. Nunca teve mais presos políticos do que a I República (2382 no ano de 1912), e no fim tinha até muito menos (128) do que viria a haver nas prisões do PREC em 1975 (cerca de 1000).

Mas não nos devemos enganar. A ditadura de que Salazar esteve à frente desde 1932, quando assumiu a chefia do Governo, foi mesmo uma ditadura, com censura, tortura nas prisões, penas indefinidas e discriminações políticas. Pareceu “moderada”, porque, como explicou Manuel de Lucena, era meticulosamente “preventiva”. Todos em Portugal estavam à mercê do poder, sem real protecção jurídica. Num país pequeno e pobre, com um Estado centralizado e dirigista e uma sociedade civil fraca, não era difícil fomentar o respeito pelos “poderes constituídos”. Salazar não se propôs fundar, como outros ditadores, uma sociedade racialmente pura ou sem classes. Pôde assim aproveitar o efeito disciplinador das hierarquias estabelecidas. Aos eventuais revolucionários, faltou sempre as habituais massas de manobra: nem grandes populações operárias, nem camponeses sedentos de terras.

O Estado Novo era, como Salazar gostava de dizer, um regime suficientemente “forte” para não precisar de ser violento. Mas nunca houve dúvidas de que podia ser implacável. Deixou morrer três dezenas de anarquistas e comunistas no campo do Tarrafal, em Cabo Verde, entre 1936 e 1945. Perseguiu e exilou o bispo do Porto, D. António Ferreira Gomes, em 1958-1959. E pelo menos encobriu ou não investigou o assassinato do general Humberto Delgado por agentes da PIDE em 1965. Salazar fazia ideia do que tudo isto significava. Quando o ministro dos negócios estrangeiros, a 27 de Abril de 1965, lhe comunicou a descoberta do cadáver de Delgado em Espanha, Salazar disse-lhe “em tom ciciado, como se alguém na sala nos pudesse ouvir”: “este assassínio é o tipo de coisas que pode desmantelar um regime”. Foi então o salazarismo simplesmente um intervalo ditatorial da história portuguesa? A história é mais complicada.


Um mal menor.

Salazar foi o primeiro chefe de governo, desde 1834, que não era liberal ou republicano. Era um conservador de tipo tradicionalista. Ora, Portugal, antes de Salazar, não parecia um país para conservadores. As instituições tradicionais, da nobreza à igreja, tinham sido liquidadas ou reduzidas. As maiores forças políticas organizadas eram de esquerda. Salazar subiu ao poder graças à Ditadura Militar, estabelecida em 1926, mas essa ditadura só foi possível pelo colapso político das esquerdas na década de 1920, divididas pelo radicalismo jacobino, desacreditadas pelo descontrole financeiro e confundidas pelo advento do comunismo soviético. Os velhos generais republicanos e maçons que dirigiram a Ditadura Militar entre 1926 e 1932 sobreviveram no poder porque encontraram defensores determinados em jovens oficiais direitistas e aliados compreensivos no clero, mas também porque muitos liberais e republicanos acabaram por optar pela neutralidade ou encostar-se à ditadura. O que lhes trouxe Salazar?

A última impressão que deixou, a do velho de 1968, faz esquecer a primeira impressão, que explica o seu sucesso: a do jovem de 1928, o professor universitário de 39 anos, disciplinado, trabalhador, realista, que não se parecia com ninguém na classe política. Muito magro, com uma voz ciciada, o ministro das finanças não era uma figura imponente, mas fez embasbacar toda a gente com o orçamento sem défice e a moeda estável. Os portugueses votaram com o dinheiro: na década de 1930, voltaram a pô-lo no país, donde o estavam a tirar desde 1910.
Salazar propôs-se “baixar a febre politica”, ensinar os portugueses a “viver habitualmente”. O seu poder assentou na garantia que, com ele, o governo nunca tomaria opções que compelissem todo um sector dos que apoiavam a ditadura a passar à oposição. O cepticismo que o impedia de acreditar nas piedades progressistas, também o coibia de fantasiar a possibilidade de restaurações de qualquer passado. Não haveria domínio da esquerda, nem da direita, mas um equilíbrio flutuante. Teve assim geralmente a seu favor, o presidente da república, o general Carmona, isto é, a hierarquia das forças armadas. Com a guerra civil de Espanha ao lado e depois a II Guerra Mundial em todo o continente, muitos portugueses apreciaram esta paz salazarista

As linhas de confronto nunca foram tão simples como em Espanha, onde a ditadura de Franco emergiu de três anos de guerra civil. Sobre o ministro Duarte Pacheco, o próprio Salazar comentava na década de 1960: “Bastante das esquerdas, mas como tinha grande ambição de poder, adaptou-se com facilidade”. Não por acaso, o Estado Novo proporcionou pessoal a todos os partidos da nova democracia depois de 1974. E isso foi possível porque Salazar teve em seu redor católicos e monárquicos, mas também republicanos e maçons. Até o V Governo Provisório de Vasco Gonçalves, em Agosto de 1975, teve direito a um representante do Estado Novo, na pessoa do professor José Joaquim Teixeira Ribeiro, vice-primeiro ministro.

E a liberdade? Não havia saudade de partidos, de eleições, de imprensa sem censura? Acontece que como Salazar explicou num discurso de 18 de Maio de 1945, “antes de nós e por dezenas de anos --- reconhecemo-lo com tristeza – as ditaduras foram a forma corrente da vida política e vimo-las alternar-se ou suceder-se quase ininterruptamente, sob formas diversas”. Em 1945, Salazar podia confiar em que os seus ouvintes se lembrassem do tempo em que, embora houvesse vários partidos, a rotação no poder só podia ser efectuada pelo Chefe de Estado (como no tempo da monarquia constitucional, antes de 1910) ou em que as oposições eram violentamente perseguidas (como durante o domínio do Partido Republicano, depois de 1910). Nunca, antes de 1926, as eleições, envolvendo apenas eleitorados restritos e tutelados, haviam sido consideradas genuínas ou livres. Ou seja, a separação entre o Estado Novo e os regimes seus antecessores não tinha a clareza da separação entre o Estado Novo e a actual democracia.

Durante a maior parte do regime salazarista também não foi claro que uma democracia como a de hoje fosse a alternativa. Numa exposição de 30 de Maio de 1944, o líder do PCP Álvaro Cunhal reconheceu que as oposições, se vencessem, não estavam em condições de garantir mais liberdade aos seus adversários. O salazarismo não existiu no mundo “pós-histórico” de Francis Fukuyama. Mesmo no ano da morte de Salazar, em 1970, a maior parte do mundo vivia sujeita a autocracias mais ou menos violentas, a começar pela vizinha Espanha.

E havia, para a elite portuguesa, coisas mais importantes do que a liberdade. Ezequiel de Campos, deputado republicano e colaborador da Seara Nova, foi outro dos que se juntou a Salazar. Um dia, confessou ao seu amigo João Sarmento Pimentel, exilado, que sacrificara a sua “ideia de liberdade” para realizar os seus projectos de desenvolvimento. Salazar insistiu em apelar a “todos os homens, independentemente da sua origem e categoria, do seu credo religioso, de suas preferências de regime, de suas antigas filiações partidárias, para um trabalho de conjunto a bem da Nação”. Para dar cobertura a essa colaboração, o regime dispensou outras profissões de fé que não o “repúdio do comunismo” e apropriou-se eficazmente da cultura do patriotismo moderno desenvolvida por liberais e republicanos no século XIX. Utilizou a prioridade que todos atribuíam à tarefa de inverter o processo de suposta “decadência” nacional para pedir que o julgassem pelos resultados, não pelos meios. A cultura política das elites portuguesas, para quem a liberdade se tornara secundária em relação ao desenvolvimento, estava desarmada de argumentos, tanto à direita como à esquerda, perante uma ditadura bem sucedida. Significativamente, os momentos de maior contestação e incerteza do regime coincidiram com dificuldades financeiras, quando pareceu incapaz de proporcionar a prosperidade que prometia (em 1945-1949, por exemplo).



Entre 1928 e 1968, o poder de Salazar não foi sempre o mesmo, nem o pessoal que o rodeou. Mas o salazarismo conseguiu parecer, em vários épocas, simplesmente a organização das elites sociais e intelectuais portuguesas – baseadas numa administração autocrática e centralizada, secundada pela Igreja e pelas Forças Armadas, e na subalternização política da população, já praticada por todos os regimes anteriores – para administrar e desenvolver o país. É verdade que a decisão do regime se manter pela força fazia dele a via única para quem queria exercer influência ou fazer carreira. Mas contou também a habilidade de Salazar. Soube usar as máximas da Antiguidade clássica: o tirano podia ser suportável se desse ideia de que não dominava para interesse pessoal. O “bom tirano” era, em primeiro lugar, um tirano sobre si próprio. E foi assim que Salazar se apresentou – sacrificado ao bem público, privado de ócios, de prazeres, de liberdade ... Nunca ninguém contestou a sua honestidade pessoal. Ouvia muita gente. Fez do “equilíbrio de correntes” um princípio fundamental. Evitou sempre definir-se claramente em relação às questões que sabia serem fracturantes (por exemplo, a forma do regime).

Para muitos, neste contexto, o Estado Novo foi o que Marcelo Caetano disse francamente a Salazar em 1948: “um mal menor que se suporta, mas a que não se adere”. O salazarismo gerou mais colaboração agnóstica do que adesão entusiasmada ou oposição intransigente. Só que, para desespero de Caetano, Salazar comportava-se como se isso lhe bastasse.


Um equívoco.

Alguns dos líderes democráticos europeus ou americanos desculpavam Salazar, admitindo que talvez Portugal não pudesse produzir, em democracia, uma maioria anti-comunista, como os outros países da Europa ocidental. Era mesmo assim? A verdade é que, em 1975, nas primeiras eleições livres e com sufrágio universal, o país começou a provar o contrário. Mas Salazar nunca pensou recorrer à população em pé de igualdade com os seus adversários. Por um lado, como explicou em Fevereiro de 1946, a exigência de liberdade pela oposição de esquerda parecia-lhe um truque de guerra: “sabemos bem que a exigem para vencer e a dispensam para governar”. Por outro, descreu doutrinariamente das vantagens de submeter o poder à competição entre partidos num mercado eleitoral. Os interesses podiam ser representados por corporações e o bem comum melhor defendido por uma autoridade executiva independente. Anunciou ter descoberto uma fórmula política original, salvaguardando em simultâneo a direcção do Estado e a autonomia da sociedade. A verdade, porém, é que nunca acabou de instalar este regime, supostamente alternativo tanto ao comunismo russo, como à democracia liberal de tipo inglês e francês.

O salazarismo viveu de durar. Mas para durar, num século de grandes sobressaltos e deslocações súbitas e num país em mudança, nunca pôde definir-se e estabilizar-se. O tempo foi de transições rápidas. A constituição de 1933 poderia ter servido para vários regimes. E, de facto, foi servindo. Ao longo da década de 1930, perante os triunfos de Hitler e de Mussolini, Salazar fez o Estado Novo lembrar o regime fascista italiano, com milícias, saudações romanas e uma retórica “revolucionária”, embora rejeitando sempre o modelo do “Estado Totalitário” e mantendo-se aliado da Inglaterra. Durante a II Guerra Mundial, aproveitou o facto de os beligerantes terem deixado a península fora da guerra e procurou servir ambos os lados, com lucro. Em 1945, com a vitória das democracias ocidentais, aliadas à União Soviética, enalteceu o seu auxílio à causa anglo-americana, reviu leis, fez logo novas eleições, e começou a falar de “democracia”, embora “orgânica”. Conservou-se, porém, intransigente com a renascida oposição de esquerda.



Enquanto regime, o Estado Novo nunca perdeu o ar de algo inacabado e impreciso, próximo do “começo” – e, portanto, também de um possível fim. Ao longo de décadas, foi mais uma “situação” (como aliás se dizia), um governo, do que propriamente um regime. O corporativismo, por exemplo, nunca saiu completamente do papel. Tudo, de facto, se resumia à “chefia personalizada” de Salazar, que fundamentalmente conservou a estrutura de poder inicial: uma ditadura militar com um chefe de Governo civil que dirigia directamente a censura e a polícia política. Ao passar pela direcção da União Nacional na década de 1950, Marcelo Caetano descobriu que o Governo era “a única realidade política activa, apoiado no aparelho administrativo e nas polícias” (a administração expandir-se-ia de 30-40 mil funcionários na década de 1930 para cerca de 200 mil na de 1960). Adriano Moreira viu o Estado Novo como um edifício de presidências, conselhos, assembleias e outros “órgãos que não tinham funcionado nunca com responsabilidade própria, e apenas estavam apontados na Constituição”. Em 1951, no congresso de Coimbra da União Nacional, Caetano perguntou abertamente: “O Estado Novo será verdadeiramente um regime, ou não será mais do que o conjunto das condições adequadas ao exercício do Poder por um homem de excepcional capacidade governativa?”

A resposta era óbvia. Ao longo do tempo, desenvolveu-se à volta de Salazar uma espécie de vida de corte, cujas intrigas ele próprio alimentava, com o sangue frio que lhe dava a convicção da sua própria superioridade. Em Setembro de 1966, observou a Franco Nogueira que em Espanha “o Franco está fazendo uma experiência, criando um princípio de caos, para depois ter fundamento para fazer regressar tudo ao começo e à sua autoridade”. E quanto a ele próprio, “não se me dava de um bocado de caos e confusão cá dentro, acho divertido”. O poder pessoal, exercido com tanta dureza como malícia, começou a parecer a muitos o motivo egoísta da ditadura. Significativamente, nenhum dos possíveis sucessores – e portanto, potenciais rivais -- do “chefe” alguma vez escapou ao saneamento. Em 1965, numa carta particular, Caetano, uma das vítimas, concluiu: “o Dr. Salazar não queria instaurar um regime, mas sustentar um equívoco que lhe permitisse governar, dividindo”. Isto tinha uma implicação: a aglomeração de facções divididas poderia não sobreviver ao seu manipulador-em-chefe.

E o tempo começava a não lhe perdoar. A 12 de Junho de 1968, “muito pálido, esmorecido”, Salazar repetiu num conselho de ministros a exposição que fizera no do dia anterior. Nenhum dos ministros lhe chamou a atenção. Tinha então 79 anos de vida e 40 de poder. Queixava-se já muitas vezes. Em Abril de 1966, desabafara com Franco Nogueira: “Estou perdendo faculdades. Não posso trabalhar como dantes. Já não acompanho os ministérios, e os ministros fazem o que querem”. No país, a transformação económica e social, de que o regime precisou para se legitimar, fazia desaparecer a velha sociedade rural e hierarquizada. Uma população escolar em expansão (o número de estudantes universitários duplicou então) protagonizou uma ruptura geracional de valores. O Vaticano II minou o clero mais conservador. Em 1970, 75% da população tinha nascido depois da subida de Salazar ao poder: a comparação que para essa gente tinha sentido não era com os regimes anteriores, mas com outros regimes europeus. O crescimento da inflação, depois de 1965, prenunciou desequilíbrios. Tudo começava a precisar de ser refundado, como Marcelo Caetano tentou fazer depois de 1968.

Mas Salazar na década de 1960 não estava preparado para sair de cena. Inventou mesmo, com a opção de manter a administração portuguesa em África, uma última razão para o seu poder. O colonialismo não começou com Salazar. O que ele fez, aliás, foi até acabar com os seus aspectos mais bárbaros. Liberais e republicanos tinham viabilizado as colónias submetendo as populações ao trabalho forçado administrado pelo Estado. Em 1961, Salazar consentiu que Adriano Moreira pusesse fim à sujeição dos “pretitos”, como dizia. Mas decidiu que Portugal seria a excepção entre as potências coloniais europeias. Muitos opositores republicanos fizeram questão, pela primeira vez em trinta anos, de aplaudir o regime. Salazar tomou o partido da resistência à descolonização porque no caso português, com colónias pouco povoadas e subdesenvolvidas, era possível fazê-lo (foi sempre um realista). Mas acima de tudo, porque terá calculado que a “defesa do ultramar” cancelaria a perspectiva de uma “normalização” à maneira ocidental que, em 1961, perante a pressão anticolonial dos EUA, seduziu a hierarquia do exército.

O homem creditado com ter poupado o país à II Guerra Mundial envolveu-o agora no maior esforço militar de uma nação ocidental desde 1945. Salazar explorou então uma mística histórica, assente na presumida actualidade da expansão ultramarina, que levou Eduardo Lourenço a admitir que “o Portugal de Salazar foi o último que se assumiu e viveu como um destino”. Mas era o destino de um beco sem saída, que reduziu de vez o regime a um enorme castelo no ar. A guerra pôde ser feita, mas acabou por tornar-se insuportável. Por isso, o salazarismo, se bem que tivesse sido capaz de organizar uma sucessão interna em 1968, já não conseguiu, ao contrário do franquismo em Espanha, enquadrar uma transição democrática. Terminou num enorme fracasso, como acontecera aos regimes anteriores.

Numa quinta-feira de céu cinzento, a 25 de Abril de 1974, tudo foi derrubado como um cenário de papelão. Nenhum movimento político importante reivindicou, desde então, as ideias de Salazar. Em 2007, a sua vitória num concurso televisivo foi mais um sinal de iconoclastia, contra o velho antifascismo oficial, do que de saudosismo. Valem-lhe os antifascistas para o conservar ameaçadoramente “vivo”. Terá ele imaginado este fiasco final? Nos seus últimos anos de vida, entre 1968 e 1970, não lhe disseram que fora substituído no governo, mas, como notou Adriano Moreira, ele também não perguntou. Nunca quis saber o resto da história.

OS SALAZARINHOS DITOS PRÍNCIPES DA DEMOCRACIA


Jaime Nogueira Pinto: «Há três características que levam os portugueses a admirá-lo, mesmo quando não gostam dele: era patriota - o bem do país, como o entendia, foi sempre o objectivo número um; era doentiamente escrupuloso com os dinheiros do Estado e seu uso; e tomava decisões, boas ou más, mas assumidas. Talvez a sua popularidade post mortem venha precisamente do contraste com a classe política desta III República de hoje, onde, curiosamente, alguns dos políticos bem sucedidos têm traços "salazaristas". Como ele, chegaram ao poder de repente, sem ter de fazer longa carreira, via-sacra ou caminho das pedras que vai do jantar com os banqueiros à romagem às bases da província; da revista dos notáveis ao cumprimentar, comprometer, negociar.

40 ANOS SEM SALAZAR

Depois disto, e feita a "triagem" porque o Rodrigo da Fonseca tinha razão, estas opiniões de leitores aparentemente com um nome.

Manuel Pessanha: «Como já uma vez aqui disse tenho 72 anos. Os 73 chegam em Novembro. Nascido em 1937, de pai sapador bombeiro e mãe camponesa reciclada em costureira a dias, vivi a infância e a adolescência no 2º período do Estado Novo. O 1º, para mim é o que vai da sua fundação, no plebiscito da Constituição de 1933, até ao apogeu da Exposição do Mundo Português de 1940, de que tenho a memória vaga e confusa de andar no meio de muita gente ao colo de meu pai. O 2º período, aquele que me marcou, começa com as memórias da guerra e terminará em 1961, comigo já homem feito e curso acabado, com o começo da guerra de África. Foi esse período, com a vivência que nele tive, em casa, na escola, no liceu e finalmente no IST, que me formou para o resto da vida. A casa era casa de pobres que se esforçavam por viver um pouco melhor. Como não era de classe média fui poupado aos problemas de consciência da classe média, nunca tive essa piedade criadora de remorso político que gerou Cunhal e Soares e, mais tarde, Sampaio e Guterres. Todos eles se sentiram culpados por haver uma classe operária, sofredora e explorada, que criava as mais valias de que eles gozavam. Pertencendo ao mundo do sub proletariado, eu não podia ter pena de mim mesmo e muito menos remorsos de explorador. Os amigos lá de casa não eram burgueses envergonhados nem burgueses politicamente ambiciosos: eram bombeiros, polícias, pedreiros, padeiros, criadas de servir. As conversas não eram sobre liberdades políticas nem opções de classe. Eram sobre o preço das sardinhas e das batatas e a única ambição comum a todos eles era a de viver melhor. Numa casa, mesmo pequena, em vez de um quarto com serventia de cozinha. De comprar uns sapatos novos quando os velhos já não aguentassem mais as meias solas. De vestir os filhos sem ser sempre com a roupa do pai, virada e encurtada. Mas, estranhamente, não me lembro de os ouvir culpar o governo pelas suas carências. Antes pelo contrário, quando comparavam com os anos passados, eles viviam melhor. Sobretudo, eles viviam tranquilos. Comentava-se às vezes a desordem "do tempo da Republica" e agora era melhor: podia-se andar na rua sem medo dos tiros, havia trabalho, havia segurança. A minha mãe rezava todos os dias e todos os dias agradecia a Salazar poder criar o seu filho fora da guerra e da política - para ela a política era a desordem. E todos estavam de acordo em que o Salazar nos tinha safado da guerra - ao contrário do Afonso Costa que eu, na altura, nem sabia quem era ou tinha sido. A escola era a escola pública, no meu caso a 72 da Calçada da Estrela. E a escola era o Professor Romão. Nesses anos de 1944 a 1948 o Professor Romão teria 50 e poucos anos. Ou seja, teria nascido na década de '90 do século XIX e teria estado em idade de ser chamado a servir o Exército em 1916 - quando se formou o C.E.P. e o enterraram nas trincheiras da Flandres. E seria homem na casa dos 30 quando Gomes da Costa desceu de Braga. O Professor Romão era um homem de aspecto severo, exigente e de poucas palavras. Não soube nunca a sua cor política, se é que a tinha. Mas todo o seu ensino cumpria com zelo - seria até entusiasmo? - o programa nacionalista do ensino primário do Estado Novo. A escola 72 ficava numa área que hoje seria chamada de pluralidade inter social, com alunos que vinham da aristocracia da vizinha Lapa até aos proletários das transversais à Calçada da Estrela, entre os quais eu. Todos recebemos a mesma atenção e, quando considerado necessário, as mesmas reguadas. Todos fizemos o temido exame da 4ª classe. Todos éramos alunos do mesmo ensino primário oficial - o Estado Novo não fechava a ninguém a porta da escola primária. E quando eu me preparava para seguir para a Escola Comercial o Professor Romão chamou a minha mãe e teve com ela uma séria conversa que desembocou num exame de admissão ao Liceu Normal de Pedro Nunes. Porque o Professor Romão tinha a certeza que o mérito era recompensado no ensino oficial e que eu nunca pagaria propinas porque teria sempre direito à sua isenção, com base na legislação do Estado Novo que assegurava ensino secundário grátis a alunos de Quadro de Honra provenientes de famílias economicamente desfavorecidas. Não desiludi o Professor Romão. O liceu fez de mim a pessoa que fui para o resto da vida. Por influência dos professores, do reitor, da disciplina e hábitos de estudo a que me obrigou. E por influência dos colegas que ali encontrei e cuja amizade, nalguns casos, dura até hoje. Não direi os seus nomes porque alguns são ainda hoje gente conhecida, mas conhecida pelas suas capacidades profissionais e académicas. Os que se tentaram pela política depois de 1974 já se afastaram - o mundo de arrivistas e oportunistas que os partidos criaram não é para eles. Faço excepção da excepção: um Jorge Sampaio todo fardado com a blusa verde da MP e que depois sentiu a necessidade de se justificar - não sei se perante ele se perante outros. Mas esse ensino virado para o reconhecimento do mérito e do esforço era o ensino salazarista - que produziu do melhor que houve na elite portuguesa do século XX e a partir de todas as classes sociais e não, como hoje se mente descaradamente, só com os filhos dos ricos. Salazar criou o Estado Novo. E com ele um país também novo onde a ascensão social era não só possível mas acarinhada pelo Estado. Estatísticas e números que hoje se começa a ter a coragem de citar provam que o período do Salazarismo foi um dos períodos de toda a vida histórica do País em que Portugal mais cresceu. Falta começar a dizer que, ao contrário da propaganda esquerdista, foi também durante o Salazarismo que Portugal teve um dos seus melhores períodos para ascensão social das classes trabalhadoras. Pela via do estudo e da recompensa ao mérito.»

José Sequeira: «
Corria o ano de 1950, mais precisamente a 9 de Fevereiro, em pleno Inverno. O Doutor Salazar, após uma qualquer ausência, regressava, já a altas horas, ao Palácio de S. Bento. No exterior da residência oficial do Presidente do Conselho, olhos bem abertos, um guarda da P.S.P., provavelmente batendo os pés para afastar o frio que se infiltrava pelas aberturas do grosso capote, aguardava com ansiedade a chegada do importante inquilino daquela casa. Só após isso poderia descansar um pouco. É que os tempos eram de grande tensão e o receio de atentados contra o Doutor Salazar estavam sempre presentes nos briefings diários com que eram contemplados os elementos que habitualmente compunham a guarda do Palácio. Com efeito desde que, menos de um ano antes, diversos elementos da direcção do P.C.P., entre eles Álvaro Cunhal, tinham sido presos, a segurança pessoal do efectivamente máximo dirigente da Nação, não era descurada em nenhum pormenor. Acrescia ainda o facto de um desses dirigentes – Militão Ribeiro – ter morrido, no mês anterior, na Penitenciária de Lisboa. De repente, quase sem aviso, a viatura oficial deu a volta, vinda da Calçada da Estrela e, detendo-se apenas um pouco, enquanto o portão, já previamente entreaberto, completava o quarto de círculo, quase sem dar tempo ao nosso Guarda para uma rápida continência, desapareceu, no interior do Palácio, acompanhada com os olhos pelos restantes polícias, presentes em diversos locais do frondoso jardim. Poucos segundos depois, vindo da mesma direcção, aparece um táxi, completamente cheio, que tenta entrar pelo portão, ainda aberto. Segundo reza o auto de corpo de delito, posteriormente instaurado, o guarda mandou parar o táxi e, perante a recusa deste, alvejou-o com várias rajadas de pistola-metralhadora, ao nível dos pneus, atingindo também o próprio motor e faróis, provocando a sua imobilização, não tendo no entanto atingido nenhum dos ocupantes. Ora o Chefe do Governo vinha precisamente nesse simples táxi, numa manobra de diversão montada pela sua segurança pessoal, para assim o salvaguardar de um qualquer atentado contra a viatura oficial. A ignorância do Guarda, provavelmente associada às comunicações deficientes, a um qualquer excesso de segredo, ou a uma troca de viaturas decidida em cima da hora, poderia, ter custado a vida ao grande estadista que ainda governou o país mais dezoito anos. Apenas para terminar, o Guarda foi ilibado, por intervenção do próprio Doutor Salazar, embora o processo, que só acabou por ser completamente arquivado em 1979, dez anos após a sua morte, ocorrida um ano antes do outro involuntário protagonista, lhe tenha provocado muita angústia e enormes problemas do foro psicológico, uma vez que se tratava de um indefectível salazarista. Se o desfecho do infeliz incidente tivesse sido outro, provavelmente nem eu poderia estar aqui a descrevê-lo, uma vez que este guarda foi o meu saudoso Pai, de seu nome Custódio Sequeira e que, após ter entrado em Lisboa, em 1926, como soldado do Regimento de Infantaria de Vila Real, integrado nas forças militares que derrubaram a 1ª República, serviu na P.S.P. entre 1928 e 1957.»

M. Abrantes: «Não foi, com toda a certeza, à custa dos saneamentos de professores universitários nas décadas de 30 e 40 que Portugal se tornou menos analfabeto. Portugal tinha, em 1974, uma das mais elevadas taxas de analfabetismo da Europa (cerca de 30%). Não deve também ter sido à custa do saneamento de alguns médicos de renome, na década de 40, que Portugal viu melhorada a saúde pública. Em 1970 morriam em Portugal à nascença cerca de 53 crianças em cada mil, ao passo que na europa dos 27 esse número era inferior a 30 por mil - http://www.ffms.pt/pt/actividades/mortalidade-infantil.php - isto é um indicador de subdesenvolvimento de um país que tinha colónias ricas como Angola, e que tinha em S.Tomé um dos principais produtores de cacau no mundo. Parece que Salazar foi um bom ministro das finanças. É pena que não se tenha ficado por aí. »

Fátima Duarte: «Como bloger jovem (apesar de já ser avó)ao ler este t/blog s/Salazar, em 1ºlugar,congratulo-me verdadeiramente s/a censura q anuncias previamente p/ñ haver disparates a conspurcarem o "portugaldospequeninos": bem visto!Em 2ºlugar,só quero recordar a diferença abissal entre 2governantes(ñ pbstante ambos provincianos)separados p/40 anos de História:
-O Presidente do Conselho era inteligente,competente,SÉRIO no s/trabalho e nunca se lhe conheceram actos de ganância ou assaltos ao Tesouro Público muito menos d corrupção;
-o actual 1ºMinistro é um "xico-esperto",incompetente,um "aldrabão da pior espécie"(sic:Pires de Lima) e vendilhão de politiquices q só destroem as Finanças da NAÇÃO! Esta é "history in the making" e não precisamos de esperar 40 anos p/julgar este imbecil que nos desgoverna!Está à vista de tds que não presta... e até o PS já anda embaraçado com a esta palhaçada!»

26.7.10

UM PROGRESSO


O dossiê flamingo, mais conhecido por caso Freeport, tem dois "bibis". Sempre é um progresso.

QUEM É QUE "DESENCALHA" A CAROCHINHA?

Mário Crespo entrevistou o conhecido cavaleiro tauromáquico Paulo Portas. Portas continua a insistir naquela curiosa tecla de ir para um governo sem eleições. Com o PS e com o PSD, sem Sócrates. Consabidamente aqui não se estima Sócrates. Mas o "povo", em Setembro, escolheu-o para formar governo. Por consequência, apenas o dito "povo" tem legitimidade para o apear. Portas ainda pode dedicar-se às touradas por algum tempo.

FAÇA FAVOR

Os jornais anunciam que a sra. D. Pilar del Rio solicitou a nacionalidade portuguesa e que vem viver para cá em Setembro. O que estava a fazer mais falta a Portugal era esta nova portuguesa aparentemente farta de securas. Ou a "notícia" (há milhares de anónimas que pretendem o mesmo). Mas faça favor.

HAVER DEUS



É haver esta voz. O resto, repito, é facultativo.

40 ANOS SEM SALAZAR



Amanhã, aqui.

A FORÇA DO DESTINO



Verdi, La Forza del Destino. José Carreras. Teatro alla Scala.1978

O MINISTRO QUE VIA PASSAR OS CACILHEIROS


O dr. Martins, ministro da justiça, é mais um na circunstância a ver passar os cacilheiros da janela do seu gabinete ao Tejo. É mais um, quero eu dizer com isto, a praticar o "eterno retorno" como guião de desempenho de funções governativas no actual executivo. Há quem consiga isso em menos de 24 horas - a importada Helena André ou o académico Mendonça - mas Martins vai lá por outra via: comissões e, algumas, "altamente especializadas" bem como os inevitáveis "grupos de trabalho". A "ideia" é colocar tudo como estava dantes sendo aqui o "dantes" o governo que o precedeu, o dele em versão absoluta ou o dele mesmo, o desencontrado minoritário. A taxa da justiça é um mero exemplo e, lá está, ele tem um "grupo de trabalho muito qualificado" a desfazer o feito. Martins não é mau tipo, porém entrou para o lugar errado à hora errada. A entrevista está cheia do termo "credibilidade". Este, assim como a "transparência", quando usados em doses cavalares não querem dizer nada. Alberto Martins - sejamos realistas -bem como o governo de que faz parte também já não tem nada para dizer.

25.7.10

O SUBTRACTOR

Esta sondagem - à semelhança de outras posteriores ao apoio do PS "socrático" a Alegre - evidencia que o bardo não ganhou grande coisa com o imprimatur de Sócrates. E dá razão ao que Medeiros Ferreira já explicou com meridiana clareza. Enquanto o dito cujo for 1º ministro não há candidato presidencial apoiado por ele que floresça.

MELHORES TEMPOS

DIRECTAMENTE DO NINHO DE CUCOS


Numa entrevista qualquer, o vetusto Almeida Santos sugeriu que Sócrates é como "Deus Nosso Senhor" porque "está em toda a parte". Este funesto ancião, com tiradas destas, onde estará internado?

40 ANOS SEM SALAZAR


Até terça, 27, data em que passam quarenta anos sobre a morte de Salazar, gostava de poder abrir o blogue à colaboração dos leitores*. Não para virem aqui debitar parvoíces sobre o defunto - sejam as parvoíces favoráveis a ele ou contra ele - mas, atendendo à "juventude" da blogosfera e à idade média dos utilizadores da chamada blogosfera "política", para se ter uma pequena noção do que é que sobra de Salazar para além dos lugares-comuns que invariavelmente se lhe colam. Ninguém o diz com clareza, mas o famigerado "património genético" do actual regime é o Estado Novo de Salazar, sem a PIDE, as prisões e a censura óbvia. Nem podia ser de outra maneira. À excepção dos que já morreram, todos os "fundadores" da 3ª República vieram de lá. Ou porque eram de lá ou porque eram contra. Até o MFA é um produto do Estado Novo na sua derradeira versão guerreiro-colonial à qual, aliás, Salazar não atribuia assim tanta importância como a que se supõe. A direita deste regime nunca fez o luto de Salazar porque pretendeu ver-se livre do seu cadáver político o mais rapidamente possível. A 26 de Abril de 1974 já eram todos "liberais" e alguns, como Adriano Moreira, até presidiram a partidos do "arco" da presente constituição onde o dito Moreira encontra agora "motivos de esperança". A pusilanimidade e a ambiguidade face à herança político-ideológica de Salazar deixou a sua memória cativa de um irrelevante folclore dito de extrema-direita que certamente lhe repugnaria. No fundo, a direita portuguesa deste regime do que gosta mesmo é de imitar a esquerda e de lhe copiar os tiques azeiteiros. Perdeu-se, assim, pelo caminho um lastro de autoridade proba e de noção de serviço público - que é o melhor penhor de Salazar - e emergiram "salazarinhos" autoritários e precários que, aos poucos, seduziram as concupiscentes "elites" democráticas, sempre com um preço na testa. Sócrates conta pouco nesta "história" porque nem para lhe limpar o pó dos sapatos serviria. É impossível escrever uma história política séria do século XX português - e dos primeiros anos deste - sem ter Salazar em conta. Pessoal e politicamente Salazar podia ser execrável. Em compensação, temos por aí uma mão cheia de execráveis pilantras sem biografia e não há meio de os sentarmos em cadeiras de lonas com as pernas quebradas. Culpa deles?

*esta "colaboração" exclui comentários anónimos ou sob pseudónimos - que serão objecto de censura prévia - e pressupõe textos enviados por email. Os aproveitáveis serão editados na íntegra no dia 27 de Julho.