24.10.09

UMA FRASE DE GARRETT


Em Dezembro de 1909 ocorreu o 1º Congresso das Juventudes Católicas. O Centro Académico de Democracia Cristã (CADC) já estava criado mas foi esse impulso federador que o estabilizou. A ditadura iniciada em 1910 viria, em breve, a colocar um termo às actividades do Centro, encerrando-o, depois do competente assalto às respectivas instalações. Todavia, o Centro prosseguiu a sua actividade de outra maneira, através do "semanário dos estudantes católicos de Coimbra", O Imparcial", onde, com apenas vinte e poucos anos, António de Oliveira Salazar e Manuel Gonçalves Cerejeira escreviam. Noutro Dezembro, de 1912, o CADC reabriu com cerca de cem sócios. A 8 de Dezembro é Salazar quem profere a conferência de reabertura. Levou vinte anos a começar a colocá-la em prática. Os resto da história é dispensável para o caso. O CADC recebeu-me e ao Pedro Mexia para falarmos do regime. O Pedro defendeu o parlamentarismo e eu defendi o presidencialismo. O Pedro é filo-monárquico e eu sou republicano. O Pedro gosta de consensos. Eu aprecio rupturas. Debate participado do qual destaco a lúcida intervenção de um antigo constituinte e presidente da AR, Barbosa de Melo, que chamou a atenção para uma opinião pública cada vez mais acrítica e manipulada pelos "comentadores" e "politólogos". Sugeri ao prof. João Caetano, o presidente do CADC, que promovesse uma qualquer comemoração do centenário do 1º Congresso. Porquê? Porque a peripécia política que enche jornais, televisões e blogues não só não chega como distorce, maça e embota a inteligência.«Portugal tem hoje com certeza a sua república mas apenas julga ser uma democracia. A nossa acção individual é esta - vasta, grandiosa, mas precisa, urgente. Portugal necessita de uma reforma profunda, não duvideis disso. A frase de Garrett é mais verdadeira hoje do que no seu tempo: - «a sociedade já não é o que foi, não pode tornar a ser o que era, mas muito menos ainda pode ser o que é.» Isto é Salazar, em 1912, a citar o das Viagens. Não têm ambos razão?

7 comentários:

joshua disse...

Garrett está morto. Salazar está morto. Por isso terem razão não nos serve de nada: argumentar com excelência não nos serve de nada. Apoiar Santana não nos serviu de nada. Apoiar MFL não nos serviu de nada. O Portugal dos Pequeninos não nos serve de nada, apenas para a sicuta de todas as derrotas que teimamos em afrontar.

Só o discurso do dinheiro serve a quem o canaliza para esses desígnios contrários à dignidade dos portugueses: comprá-los com subsídios e toda a espécie de dependências labirínticas do Estado que se esgotam em ocasião eleitoral. O voto português decide-se em Nova Iorque, Berlim ou Paris porque tudo é economia e a planificação económica mundial imensamente capciosa, com mentiras, com nuances de onde temos saído sempre a perder sem força para resistir.

Um país sem memória de caserna ou de sacristia efemina-se e decai num sirigaitismo palreiro como o de Garrett e de Salazar: o cristianismo musculado de Salazar morreu. A memória histório- identitária de Portugal é uma farsa e dilui-se. É preciso fazer o luto a uma derrota mais alargada e durável por décadas futuras a não ser que a Monarquia se imponha, conforme a meu ver urge, como saída de recurso a fim de nos reavermos e reatarmos um passado que tinha Desígnios, Oportunidades, Objectivos, Finalidades Claras a concitar-nos o Esforço baldado, na maior parte dos casos.

radical livre disse...

de 1952 a 55 andei em Coimbra. minha mãe pagava-me os estudos com sacrificio da sua saúde.
para lhe fazer a vontade fui sócio do cadc na couraça de lisboa.
a minha acividade limitava-se às conferências de S. Vicente de Paulo.contactei com os que nada tinham (nem saúde nem dinheiro).

era social democrata pró sueco numa altura em que a academia se dividia entre fascistas e sociais-fascistas ou comunas. eramos poucos e tratados a baixo de cão.

verifico com mágua que muita coisa piorou com a III revolução. a liberdade é de muito pior qualidade. a igualdade só existe no cemitério. a fraternidade é mera utopia.

porra para isto

João Caetano disse...

Caro João Gonçalves:

Apreciei muito a sua presença ontem em Coimbra. A sua intervenção foi notável, assim como a do Pedro Mexia, num espaço de liberdade e de natural divergência, como se comprovou também pelas perguntas. Portugal precisa disso, para viver com honra e dignidade. Entre nós, portugueses, não há, as mais das vezes, divergências, mas apenas ciúmes mesquinhos e espertezas que são tudo menos espartaos, por falta de cordura.
Aceito o seu desafio, com a certeza de que o vamos cumprir, embora saiba que nós, portugueses, falando agora do seu magnífico artigo de hoje no jornal i, não sabemos resistir. Não falo de resistir à mudança, porque não só não a temo como a desejo (é um erro não a querer, quando ela é um facto objectivo), mas de resistir ao cerceamento da liberdade. Acomodamo-nos, de facto, a servir quem manda, incluindo a televisão, na esperança de que nos sobrará alguma coisa, nem que seja apenas alguns minutos de vã glória. "Qui cherche dans la liberté autre chose que'elle-même est fait pour servir", disse Tocqueville. Recuso-me a levar a potencial inutilidade de mim mesmo a passear, dizendo agora não e fazendo o meu próprio caminho. Não tenho dúvidas de que os dois que referiu têm efectivamente razão no que dizem.

Abraço,
João

João Caetano disse...

Caro Radical Livre:

Escrevia o meu comentário enquanto o senhor escrevia o seu. E não é que, no essencial, coincidem?
Gostaria muito de, na qualidade de presidente do CADC, o conhecer, ou saber mais de si, se achar bem.

Cordialmente,
João Caetano

www.angeloochoa.net disse...

Parabéns a João Gonçalves pela defesa do que serão amanhã os ideais da democracia cristã.
Não concordo com Joaquim que a luta vã lhe seja.
Outro nobelístico assunto:
Público hoje Domingo 25 e ficamos sabendo que o escritor tem impostos em dia -louvado seja disso- aderiria a uma internacional da bondade, mau grado como comunista que se preza mais materialista do que comunista que não nenhum Jesus Cristo de nossos dias viva à grande e à espanhola em grande forma capitalista. Bento Domingues frei de amores o benze e abençoa-lhe a «bondade» de escriba acocorado ao cifrão. Seu negócio é números! A travesseirinha Pilar boa freira que ele preza com bondade lhe aconchegará pezinhos de frios a vir.

www.angeloochoa.net disse...

Também passei pelo CADC que sei formado sempre por gente de sólidos e consistentes ideais.

Chloé disse...

Gostei imenso de assistir ao encontro de sexta feira na Almedina. E de o escutar em pessoa. Como lhe disse, o seu discurso ganha em ser ouvido fora da blogosfera... - Terá sido por não haver provocadores de serviço? Mesmo assim, às tantas apeteceu-me atirar sal e pimenta para (vos) testar os limites..
Foi um debate pós-prandial notável, pena que tivesse começado a horas :-)
Parabéns aos oradores convidados e ao João Caetano, que merece o destaque pelas 'pedradas no charco'.