31.10.09

LIVROS, ESCRITORES OU APENAS AQUILO?


«Os autores oitocentistas e novecentistas não usavam verbos nos títulos dos romances. Stendhal, Balzac, Flaubert, Zola? Zero. Dickens, Hardy, Conrad? Zero. Goethe, Thomas Mann? Nada. Dostoievski, Tolstoi? Idem. Nenhum em Eça. Em Camilo, há dois ou três entre dezenas: Onde Está a Felicidade? e O Que Fazem Mulheres. Mas Camilo está sempre perdoado. Aquilino tropeçou três vezes: no lamentável título Andam Faunos pelos Bosques, coisa do início da carreira, lá mais para a frente no aceitável O Homem Que Matou o Diabo e na excelente excepção à regra, no final da carreira, Quando os Lobos Uivam. Agustina? Zero. José Cardoso Pires, Carlos de Oliveira, Vergílio Ferreira, José Saramago? Zero. E os amaldiçoados Ferreira de Castro, Gaspar Simões, Alves Redol e Fernando Namora? Zero. Sim, Dinis Machado escreveu O Que Diz Molero, mas quando a forma verbal se segue a uma conjunção subordinativa "que" ou "quando" o verbo aceita-se melhor. Miguel Sousa Tavares escreveu qualquer coisa com David Crockett que dá vontade de deixar morrer a personagem sem mesmo começar a leitura. A minha desconfiança em Por Quem os Sinos Dobram, de Hemingway, vem de longe, mesmo sabendo que o filme tem Gary Cooper e Ingrid Bergman. Ainda menos gosto, à excepção da cena inicial, do filme E Tudo o Vento Levou, um épico de plástico americano. A tradução portuguesa tem mais "verbo" que o original Gone with the Wind. Que títulos com verbos são próprios de certa literatura não é um preconceito meu. Um título com verbo promete xarope. Consultei na Wikipédia os 145 títulos da espanhola Corín Tellado editados em 1972 e 1973 (sim, em apenas dois anos). Desses, 105 têm um verbo no título (72%). Em Barbara Cartland a percentagem é menor, mas facilmente encontrei dezenas. Contudo, até agora nunca tinha visto um título com dois verbos, ainda por cima com ponto de interrogação. Ia morrendo ao ler o título do novo António Lobo Antunes: Que Cavalos São Aqueles Que Fazem Sombra no Mar? Eu não sei que cavalos, nem nunca saberei.»

Eduardo Cintra Torres, Público

9 comentários:

fado alexandrino. disse...

veio com «a mente mais aberta», namora com outro actor, o desconhecido Ian Velloza, e aceitou pousar para a Playboy de Novembro. «Uma volta», como a própria diz, «de 360 graus».

Há pontos positivos nesta menina.

O primeiro vê-se facilmente no boneco que ilustra o post e que se espatifaram cerca de quatro euros poderão ver mais desenvolvido em papel couché.
O segundo é vir mais aberta.

A parte negativa, trigonometria, aritmética nada que um curso nas Novas Oportunidades não resolva.

Anónimo disse...

Pois, até compreendo e gostei da crítica porque tem acutilância, tem análise e tem lógica, mas o Lobo Antunes é lido por muita gente. Com certeza que, a essa gente, a sua escrita "diz algo". Um amigo meu disse-me que os Alemães o liam muito.É porque gostam. Admito que tenho lacunas na compreensão de determinda literatura e a de Lobo Antunes é uma delas. Por isso, também nunca saberei (de Sabedoria) que cavalos são aqueles que fazem sombra no Mar.

Anónimo disse...

Caro João,

Na leitura dos quase sempre excelentes trabalhos e artigos de Cintra Torres, tento neutralizar a aversão física que me ficou ao personagem numa série de colóquios do ICS, as únicas vezes onde, no decorrer de um ano, estive na sua presença física. Ainda que discorde do que ele escreve por vezes, o que publica é fruto de investigação laboriosa, de trabalho sério e dedicado,ou assim se presume porque, na sua área de especialidade, como noutras, o saber não cai do céu aos trambolhões.

Desdenhar, da forma que o faz, de livros pela escolha ou não de um verbo ostentado nos seus títulos, é uma fronteira que não deveria ultrapassar. Como autor, Cintra Torres sabe melhor que outros que o que vem no interior de uma capa, deu trabalho, custou sacrifício, risco, troco de horas de vida pela crença que o que temos a dizer ou escrever pode ser inspiração de outros. Mais importante, o que vem dentro da capa, mais do que o que traz escrito, é a possibilidade da leitura livre e individual, é a liberdade de ler, pela qual, honra lhe seja feita (a Cintra Torres) se tem batido à sua maneira em tanto do que escreve.

Cintra Torres devia ter presente, que nem tudo que recebemos (argumento de Burke no Coments…) nos pertence a bel-prazer; liberdade ou os livros dos outros.
Talvez fosse de lembrar a Cintra Torres aquelas linhas de Koestler de um dos ensaios de The Yogi and the Comissar, onde se lê que as estatísticas não sangram; são os detalhes que contam. Talvez não fosse mau lembrar a Cintra Torres alguns dos títulos que ostentam verbos:

Nem só de pão vive o homem, de Vladimir Dudintsev, que na tradução do título ganhou um verbo sem que isso diminuísse a importância da mensagem; http://www.alfarrabista.com/AUTOR/104358/Vladimir%20Dudintsev

Se isto é um homem, de Primo Levi: http://www.amazon.co.uk/gp/reader/0349100136/ref=sib_dp_pt#reader-link

Eu quero viver, de Oscar Magnusson; http://www.amazon.com/Ich-will-leben-Oscar-Magnusson/dp/3417247594/ref=sr_1_1?ie=UTF8&s=books&qid=1257002236&sr=8-1-spell

E, certamente, ainda se arranjariam por aí mais uns quantos, que não foram fruto de um stroll in the park domingueiro, ou da experiência descontraída e soalheira de ler em liberdade um artigo de jornal numa esplanada de café.

Em vez de desdenhar de títulos alheios, devia ter presente isto, que fala de uniformidades de «gosto»:

“For decades, while we were silent, our thoughts straggled in all possible and impossible directions, lost touch with each other, never learned to know each other, ceased to check and correct each other. While the stereotypes of required thought, or rather of dictated opinion, dinned into us daily from the electrified gullets of radio, endlessly reproduced in thousands of newspapers as like as peas, condensed in weekly surveys for political study groups, have made mental cripples of us and left very few minds undamaged.”

E que, por acaso (essa curiosa circunstância que põe filhoses ao alcance de gatos, o acaso) até aparece numa coisa que tem um verbo no título “as breathing and counsciousness returns”, by Soljenitsine lui-même, o tal que a imberbe deputada não conheceu mais gordo; falando aqui, e neste caso, ou acaso, já de ratos recentes, e não de gatos.

Até compreendo o «divertimento» de Cintra Torres, que nem é destituído de graça e leveza. Compreendo menos, que ele feche os olhos ao facto de o haver crónicas livres em jornais não ter caído de um céu radioso, nem nascido de um chão divertido. Mas a substância da crónica em si é uma parvoíce pegada, e é uma questão de justiça para com ele afirmá-lo. Porque Cintra Torres tem sido capaz de muito melhor que aquilo. Até eu que lhe dedico uma particular aversão física, me vejo obrigado a reconhecer que lhe devemos (por tanto de bom que tem escrito) muito melhor que o aplauso daquilo.

Um abraço, sempre amistoso, e as desculpas pela extendidura da prédica.

João Gonçalves disse...

Um texto destes, caro anónimo, merecia um nome porque, assim, nem fisicamente o podemos detestar. Digamos que o que me interessa no argumento do Eduardo é menos o verbo dos títulos - uma mania como outra qualquer - do que o final em Lobo Antunes. Esse é que nem fisicamente. Abraço virtual.

radical livre disse...

não sou pessoa qualificada para falar de literatura. aprendi latim e português, li e reli os clássicos. compreendo que qualquer coisa não vai. a culpa é de quem escreve e não leio mais que duas ou três páginas.
tal como escrevia Namora nos retalhos a literatura portuguesa dos últimos 100 anos está presa ao desastre cultural «pelo osso da rabadilha»

francisco disse...

Não são cavalos, são burros, majestade!


;D

fado alexandrino. disse...

Peço desculpa, o comentário que está aqui não tem nada que ver com o post.
Trata-se de uma entrada do meu blog que por lapso coloquei aqui.

josé ricardo disse...

desculpem lá, mas não percebi patavina do que escreveu Cintra Torres. a não ser que o homem não gosta de títulos com vebos. dê uma espreitadela aos romances de cavalaria... ele há cada um!...

cumprimentos

josé ricardo

maria disse...

O Marinheiro que PERDEU as graças do Mar

Mishima

Genial