28.6.09

«A MORTE VEM COMO NENHUMA CARTA»


Passaram cinco anos sobre a morte de Sophia de Mello Breyner Andresen. Os jornais dedicaram-lhe os usuais derrames feitos, salvo uma ou outra excepção, pelos usuais. A poetisa da política interessa-me pouco, salvo naquele lance magnífico do «dia inicial inteiro e limpo.» Prefiro o poeta do mar, das coisas, dos lugares certos e incertos, dos outros poetas. A "clássica", a enxuta. Agora que se preparam para "recuperar" Jorge de Sena, esta "Carta(s) a Jorge de Sena":

I
Não és navegador mas emigrante
Legítimo português de novecentos
Levaste contigo os teus e levaste
Sonhos fúrias trabalhos e saudade;
Moraste dia por dia a tua ausência
No mais profundo fundo das profundas
Cavernas altas onde o estar se esconde

II
E agora chega a notícia que morreste
E algo se desloca em nossa vida

III
Há muito estavas longe
Mas vinham cartas poemas e notícias
E pensávamos que sempre voltarias
Enquanto amigos teus aqui te esperassem -
E assim às vezes chegavas da terra estrangeira
Não como filho pródigo mas como irmão prudente
E ríamos e falávamos em redor da mesa
E tiniam talheres loiças e vidros
Como se tudo na chegada se alegrasse

Trazias contigo um certo ar de capitão de tempestades
- Grandioso vencedor e tão amargo vencido -
E havia avidez azáfama e pressa
No desejo de suprir anos de distância em horas de conversa
E havia uma veemente emoção em tua grave amizade
E em redor da mesa celebrávamos a festa
Do instante que brilhava entre frutos e rostos

IV
E agora chega a notícia que morreste
A morte vem como nenhuma carta

6 comentários:

radical livre disse...

maquele manicómio preferia ouvir o energúmeno tareco.
consta que havia ovnis ou pratos voadores

joshua disse...

Tenho uma paixão visceral pela Alma Torturada e Lúcida de Sena. Fora aquilo que grandes espíritos segregam e nos legam, o que nos resta amar?! Há escritas e biografias que nos arrebatam como murros no estômago e como espelhos onde mais a frio nos revemos.

Sophia, a poeta obrigatória dos programas da Língua, teve um engajamento social e político admirável, marca-me muito o conto literário, O Jantar do Bispo, numa colectânea com prefácio de D. António Ferreira Gomes, entre tanta escrita. Já não se vislumbra tal sensibilidade pelas simples gentes e pelas causas humanísticas básicas em mais lado nenhum. Banqueiros e abancados resumem o para lado nenhum de um País com grandes sonhos pré-revolucionários ante-aprilinos. O "Homem Importante" triunfa em toda a linha. Perde por grosso a "gente de Varzim".

Chloé disse...

O que eu gostei deste livro.

angelo ochoa disse...

Citando-me:

(Passe a imodéstia do anulado vate que sou eu):

-- Aqui ninguém vai a lado nenhum...
-- Que «isto» é mesmo muito bom!

(Português Paradoxo,
in
Loquaz Gratuitidade,
in
Sonhadas Palavras)

Anónimo disse...

Estamos sempre de partida e não de chegada.

Essa é A MENSAGEM que procuro transmitir aos meus mais novos.

Certamente que o serão, enquanto o quiserem ser, em terras e valores lusitanos de Corte Real.

A

Rui

Anónimo disse...

e' so' loucos a comentar isto...pena que as mentes mais lucidas atraiam sempre os mais enfermos.