Este pequeno texto de Eduardo Cintra Torres, no Público de hoje, serve para o Chile como para o circo (observo-o neste momento) montado à porta do "campus" da justiça para o "processo Casa Pia". Esborrachar um microfone no focinho de alguns dos "jornalistas-palhaços" que andam ali como piranhas acéfalas, é pouco. «Na sétima e última parte de Germinal (1884-5), Émile Zola criou um desastre numa mina. Como Moloch, a mina engole máquinas e mineiros numa catástrofe de tremor e de fogo. A vingar-se, a terra engole a terra. O romance, primeiro publicado em folhetim, descreve e narra a tentativa de sobrevivência dos mineiros, nomeadamente de Étienne e Catherine, que têm no fundo do poço as suas bodas de sangue. Os romances actuais prescindiram de descrições realistas do mundo do trabalho e das suas desgraças, entregando-as aos media audiovisuais. Uma pequena câmara desceu a 700 metros algures no Chile e trouxe ao mundo as imagens de 33 mineiros encurralados, imagens impressionantes porque se agarram à vida no fundo da terra, tremendas porque não sabemos se serão salvos como todos queremos. À superfície, vemos equipas de salvamento, famílias, políticos, bandas de música - e mais câmaras substituindo Zola. Já não é preciso um escritor para escrever, como ele: "Toda a gente mostrava também uma grande piedade pelas vítimas, organizavam-se passeios à mina destruída, acorria-se ali em família para se apreciar o espectáculo do horror dos escombros, pesando tanto sobre a cabeça dos miseráveis soterrados." A televisão substitui o desejo de lá ir e omite a reflexão sobre a espectacularidade da desgraça e da esperança.»
4 comentários:
Este post/tema lembrou-me o filme de Billy Wilder na década de 50 do século passado "The Big Carnival" (não sei o nome da tradução portuguesa) com Kirk Douglas, que retrata a manobra manipulatória de um jornalista que utiliza a desgraça alheia, alguém que ficou ferido e preso numa gruta, para engrandecer profissionalmente e todo o espectáculo em redor da tentativa de salvar a vida da pessoa.
Os filmes clássicos deviam ser vistos mais vezes.
Curioso como a ficção imita a realidade.
Sobre este caso dos mineiros e respectivo folclore a não perder este filme
http://www.imdb.com/title/tt0043338/
Aplica-se também como uma luva aos "scoops" que os jornalistas procuram como de pão para a boca.
Depois, além de todo o circo da jornalice-de-campo, temos a riquíssima moldura - muito humana - de mirones errantes, reformados barrigudos que usam boné e camisas baratas, e basbaques de ocasião; todos prontos a gritar "Palhaço! Filhadapúuuta!" mal vislumbrem um arguído (que termo tão limpo...). A polícia - fardada ou cospicuamente paisana - limitar-se-á a controlar bovinamente a reduzida turba. A grande excitação provirá apenas do tom afogueado e de alarme que as kátias-reporteres imprimirem aos seus directos, onde se repetem vezes sem contam e dão pontapés na gramática. E lá, em Mesão-Frio, ficará a ideia de todo um salssifré mediático "mais real que a vida". A arguidagem, depois de empatar anos a fio com recursos e mil testemunhas cada, irão recorrer. Tudo ficará adiado. E pior. Haverá tempo (até se chegar ao Supremo) para socorrer 10 acidentes com mineiros em 5 continentes. O que vale é que, no próximo directo na Relação, o factor novidade já não existirá e tudo será encarada com um mais doce vagar jornalístico.
Ass.: Besta Imunda
Já vimos tantas vezes este espectáculo vergonhoso das televisões que o melhor é o zapping, para mim uma das maiores invenções dos últimos tempos.
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