5.9.10

AS HORAS E OS LOCAIS DE RIGOLETTO




Está em curso - começou ontem, na rtp2 - a transmissão de um Rigoletto, de Verdi, «transmissão directa e ao vivo a partir de Mântua, cantado e representado em cenários naturais históricos como algumas das salas do Palácio dos Gonzaga, ruas e outros locais ainda a ver, isto porque a transmissão é descontinuada, ou seja, para realçar a acção o seguimento cronológico dos factos nos seus diferentes horários faz com que esta concretização se passe na hora do dia de acordo com cada cena.» Começou ontem e prossegue hoje, às 13h e às 22:30. A experiência não é original. Em 1992, o mesmo maestro deste fim de semana, Zubin Metha, dirigiu a Tosca, de Puccini, em Roma, nos locais e à hora da trama. As novidades são o realizador - Marco Bellochio - e Plácido Domingo no papel titular (para barítono). Domingo iniciou a carreira justamente como barítono e, pelos vistos, tenciona acabá-la no mesmo registo vocal. Não fiquei entusiasmado com o bocado de ontem até porque Domingo está muito associado ao papel de Duque de Mântua (nesta produção, interpretado pelo bonitão Vittorio Grigolo) - que fez abundantemente em palco e gravou com Claudio Abbado em 1979 - mas o momento musical proporcionado é, nestes tempos de deprimente mau gosto em tudo, de grande qualidade. Julia Novikova, Ruggero Raimondi, Nino Surguladze e Gianfranco Montresor constituem o restante elenco.

5 comentários:

joshua disse...

Fantástico. Não quero perder.

Xico disse...

Não gostei de Plácido Domingo. Isto é, falta "sombra" na voz, que eu associo ao papel. De resto é muito bom, embora um pouco incómodo a andança pelas horas.

Xico disse...

Acabei de ver o 2º acto. Domingo não é fadado para aquele papel. Foi um pouco confrangedor. O cansaço foi visível (a cena é particularmente difícil para Rigolleto)e o timbre é demasiado "claro". As imagens, o cenário, a iluminação e toda a encenação, são magníficas.

Bartolomeu disse...

Caro Xico,

a transmissão de hoje pautou por uma baixa de energia global do elenco e da sinergia do grupo. O que viu, e que foi normal acontecer foi uma maior descontracção de certo condicionada pelo sucesso da transmissão de ontem e excesso de confiança. Repare que não foram apenas questões vocais: desencontros musicais, um homem a passear nas galerias opostas, uma placa de iluminação filmada e o "bravi a tutti" final, só demonstram que o à vontade desprimorou a excelência que ontem foi implacável.

De resto, o "Parmi veder le lagrime", o "Possente amor mi chiama" e o "Cortiggiani" foram momentos únicos de vocalidade e interpretação. A partir da entrada de Gilda, a prestação do Domingo ficou um pouco aquém da primeira parte deste acto, sobretudo pelos desencontros com a Orquestra. Há pouco ao falar A.P.Russo, a comentadora da transmissão, disse-me que toda esta parte foi diferente dos ensaios e da cópia de segurança. Segundo ela, justificando as alterações cénicas, algo condicionou o Domingo vocalmente, um catarro como pareceu. Sénior nestas coisas, e lembre-se que o todo o artista escutado em directo é falível e vocalmente muito diferente das gravações, continuou. Sentimos nos desencontros, um apressar dos tempos, bem regidos nas inconstâncias dos atrasos de Gilda, mais segura da sua prestação. O final da "Si, la vendetta" resultou assim pouco atabalhoado para ambos os cantores mas também é certo que este final é sempre confuso e é raro ouvir-se num espectáculo ao vivo, num broadcasting ou na gravação comercial de um live grande perfeição na execução.

Por fim, gostaria de evidenciar o seguinte. Na minha opinião nada há de confrangedor. P. Domingo é um homem de uma certa idade e é visível que não pretende mudar a sua vocalidade, imitar barítonos nem se afirmar como tal. Simplesmente canta com a sua voz, porque pode, os seus papeis preferidos. Não podemos esquecer isso.

Bem haja

Xico disse...

caro Bartolomeu
Muito obrigado pela esplêndida análise. Não me atreveria, pois sou um simples ouvinte sem conhecimentos técnicos.
Apesar das falhas, que as houve e compreensíveis dadas as circunstâncias, não pretendo criticar Domingo na sua interpretação. Mas eu gostaria de ter ouvido outro timbre. É só uma opinião. Não gostei de o ouvir. Porquê? Não o saberia explicar tão bem como o fez. Senti que Rigoletto não estava lá, nem na emoção nem na voz.Embora estivesse um Placido Domingo a cantar muito bem. O quarteto na taberna foi excelente, mesmo que falhas tenham havido.
Quanto ao homem a passar na galeria, não me pareceu falha. Julguei ver o próprio Rigoletto o que faz sentido.