Anteontem de manhã vi um cão castanho, labrador retriver, espojado na rua virado para a loja onde estava a dona. Olhei-o, levantou-se e, à sua maneira, sorriu-me abanando a cauda. Depois regressou à vigilância. Há muito tempo que não estava com uma pessoa assim, conversacional apesar de presa a uma árvore. A minha morreu-me há meses e nunca mais consegui conversar com alguém. De uma carta de Fernando Pessoa a Francisco Cabral Metello, datada de 31 de Agosto de 1923. «Espero que a paisagem com que v. presentemente conversa lhe arranje um diálogo que o entretenha. Nem sempre acontece, não é verdade? Há árvores, pedras, flores, rios que são tão estúpidos que parecem gente.»
10 comentários:
Deixem apenas que lhes transcreva duas coisinhas pequeninas que acabei de ler nas paredes de uma cidade deste país.
A primeira:
"O meu pai nasceu hoje
num país que está a morrer,
a minha mãe
é uma puta espacio-temporal
e eu... um artista de variedades"
A segunda(nem de propósito):
"Há umas criaturas que,
caminhando pela rua,
parecem mesmo pessoas"
Rita
Não sou grande apreciador de Pessoa, mas que ele tinha razão, lá isso tinha. Que saudades da minha "pessoa"!!!!!
E não é que Fernando Pessoa tinha razão?
Chegou o momento de abrires a porta da tua casa a um abandonado. As Ligas dos Animais arranjam-te logo companhia. A minha gataria veio toda da rua e não me arrependo nem por um momento.
Eu tenho uma cadela rafeira e um gato que vieram da rua e estou muito contente com eles, mete-me muita pena ver os bichos abandonados e quando tenho condições não consigo resistir.
Como eu o compreendo. Nunca me passou pela cabeça ser possível ganhar tanta estima por um animal...irracional.
Cumprimentos
D.O.
Nunca como agora está este ditado tão actual: " Quanto melhor conheço os homens, mais eu gosto de animais "
Cps
S. Guimarães
«I have known so many people, but it seems I have known nobody at all.» GORE VIDAL
Texto impressionante, com uma mensagem muito forte.
Literariamente só um génio como Pessoa podia ser o pai desta obra.
J. Costa
Genial ! Sem pinga de pose literária e bom, muito bom.
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