14.7.08

QUANDO O FERRO NOS TOCA NA GARGANTA


Querem um bom escritor "contemporâneo" e um bom livro? J.M. Coetzee e Disgrace (Desgraça, tradução na Dom Quixote), relido por causa disto: «O moinho das bisbilhotices, pensa, trabalhando noite e dia, moendo reputações. A comunidade dos virtuosos, à conversa pelas esquinas, ao telefone, à porta fechada. Murmúrios exaltantes. Schadenfreude. Primeiro a sentença, depois o julgamento.» E disto: «O seu prazer em viver foi apagado. Tal como uma folha na corrente do rio, tal como uma bufa-de-lobo na aragem, ele começou a caminhar em direcção ao fim. Compreende-o muito bem e isso enche-o de (a palavra não o larga) desespero. O sangue da vida está a abandonar o seu corpo e o desespero a tomar o seu lugar, desespero esse que é como um gás, sem odor, sem sabor, sem sustento. Inspira-se, os membros relaxam, perde-se o interesse, mesmo quando o ferro nos toca na garganta.» Fim de citação.

4 comentários:

Aladdin Sane disse...

Terei lido "schadenfreude"?

"Ainda estás a ler? A alimentar o teu ódio por nós? A saborear em pequenos goles a schadenfreude, como quem saboreia um whisky caro? Se assim for, é melhor é deixar de te espicaçar e falar do Boaz."

Amos Oz, A Caixa Negra, (também da) D. Quixote, p.12.

Anónimo disse...

quadra do sector de física da fac ciências de coimbra
"fui fodido pela vida
enrrabado pela sorte.
já tenho a lingua de fora
pra fazer minete à morte"

radical livre

Anónimo disse...

Inteiramente de acordo contigo no elogio a este grande romance, João.
Abraço

Pedro Correia

JonDays disse...

Li esse livro em 2001, numa viagem que fiz ao Porto Santo, e achei que tinha encontrado uma mina de ouro! Nunca li nada tão bem escrito em toda a minha vida...