Inês Pedrosa não pára de nos surpreender com a sua inconfundível propensão para a mediocridade inteligente. Pobre Fernandinho, o que fizeram de ti!....
«Somos poucos mas vale a pena construir cidades e morrer de pé.» Ruy Cinatti joaogoncalv@gmail.com
30.11.11
TEMOS PENA, 2
Mário Soares, em 2011, não arranjou melhor para apresentar o seu ensaio de memórias do que dois paineleiros televisivos de recente extracção mas que têm em comum o desvelo socrático tardio e fanático. A biografia do antigo pai da pátria merecia melhor. Temos pena.
TEMOS PENA
Chega ao fim a saga do orçamento. Foi um mês de "generalidade" e de "especialidade". O mais revelador do exercício foi a qualidade geral das prestações parlamentares. A primeira vez que votei, faz depois de amanhã 32 anos, foi eleita uma Câmara que dificilmente se reconheceria na actual. E se andarmos para trás - constituinte e a resultante das legislativas de 1976, as primeiras - a nuance é ainda mais impressiva. Temos pena.
A CALAMIDADE DE AMADO
O dr. Amado, MNE de Sócrates, disse ontem no Porto que o país vive qualquer coisa comparável a um verdadeiro estado de calamidade nacional. O dr. Amado - que chegou a deslumbrar alguma "direita" durante breves dias pese embora os seis anos de presença consecutiva no anterior consulado - deve saber do que fala.
29.11.11
O BAÚ DA CULTURA
O único elogio que devo ter feito ao consulado de Gabriela Canavilhas como ministra da Cultura foi este. Por outro lado, não me cansei de tentar explicar o embuste que constituiu a OPART (uma coisa que juntou o São Carlos e a Companhia Nacional de Bailado) em boa hora extinta pelo actual Governo. Sucede que o baú da OPART, ao contrário do que eu supunha, ainda não estava bem fechado. Depois de uma excelente escolha na pessoa de João Mota para a direcção artística do D. Maria, o referido baú vai aparentemente fornecer um administrador ao teatro nacional. Esta auditoria do Tribunal de Contas não serviu para nada?
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SOMAR ANOS
«A nossa vida é uma vida de relações com muitas pessoas que pode acontecer termos encontrado no nosso percurso, por exemplo na vida escolar, e que findo esse encontro não mais voltámos a encontrar. Estas relações formam um todo de relacionamentos que nos estruturam a vida. Falo de pessoas conhecidas. Mas há as milhentas pessoas que nunca encontrámos mas sabemos que existem - actores, políticos, artistas, pensadores, cientistas. Mas a morte sucessiva dessas ligações dá-nos o choque do efémero e irrepetível dessa estrutura. O acaso, a contingência destes múltiplos encontros agravam a contingência da nossa própria vida. Cada elemento era um ponto de referência que tornava forte, consistente o nosso estar no mundo. E dia a dia vamos sabendo que essas referências vão desaparecendo - os professores que tivemos, os colegas que realizaram connosco um percurso da vida, os amigos com quem convivemos. E então explode num estampido a revelação de que estamos mais sós, de que o nosso estar no mundo é provisório, de que o mundo que construímos com os outros não tem consistência nenhuma e não tem por isso significação.»
Vergílio Ferreira, Conta-Corrente 3, 29 de Novembro de 1981
Vergílio Ferreira, Conta-Corrente 3, 29 de Novembro de 1981
28.11.11
O FERIADO DA ROTUNDA
Boa ideia a de acabar com o feriado do 5 de Outubro. Para que é que se há-de continuar a consagrar uma ditadura urbano-depressiva que teve de esperar para ser derrubada por outra?
27.11.11
O FADO NASCEU UM DIA
De Bali, na Indonésia, chegaram imagens de António Costa - num inglês miserável - a defender o fado. Costa apoderou-se habilmente desta campanha e apareceu como grande paladino do evento (o tal país de eventos, uma canga de que não nos conseguimos livrar), juntamente com o voluntarioso Vieira Nery. Mas estas coisas têm uma "história" e um princípio. E não foi Costa que o gizou. Seis anos depois, o Pedro Santana Lopes está de parabéns.
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26.11.11
O CORAÇÃO DE OTELO
Mário Soares aludiu ao "bom coração" que Otelo possui apesar da pesada propensão para a "asneira", património mais recentemente comum a ambos. Até Ramalho Eanes se referiu ao mesmo Otelo como alguém com o "coração ao pé da boca". O mal de Otelo é, como se tem visto nos últimos dias, um mal genérico da pátria - exibir o coração, talvez bom, demasiado perto da boca. O país anda embotado em opiniões, quase tantas como o dinheiro que não tem. Desde a suprema magistratura ao último articulista, são muitos os que nos têm brindado com o seu "solucionismo" compulsivo para a crise. Sucede que a crise - no país e na Europa - não se resolve por a opinião pública ter sido tomada por uma espécie de imenso coração de Otelo colectivo, pronto a derramar na primeira palestra, na primeira emissão televisiva, no primeiro artigo ou manifesto de jornal. Muitos estiveram calados, ou em palavrosas intermitências de circunstância, durante os últimos seis anos mas, em apenas cinco meses, descobriram, como Otelo, que tinham, afinal, um "coração" ao pé da boca. Um país com "corações" assim dificilmente chega a lado algum.
FARTO FADO
Felizmente termina hoje, em Bali, a saga do fado. Até eu, que gosto de fado, já estou farto de tanto fado e de uma candidatura cuja "história" ainda um dia será convenientemente contada.
LAXISMOS, EGOÍSMOS
Enquanto por cá a "massa crítica" socialista anda pelas ruas da amargura (até a aparentemente mais lúcida o que não quer dizer que outras sejam melhores), vale a pena ler o antigo conselheiro de Mitterrand, Jacques Attali sobre a Europa. «C'est à nouveau au tour de l'Allemagne de tenir dans sa main l'arme du suicide collectif du continent le plus avancé du monde.Si elle refuse d'accepter la voie étroite qui passe par le rachat par la BCE desobligations arrivées à maturité, suivi de l'émission d'une dette souveraine européenne, remboursée par deux points de TVA européenne, et d'une réforme des traités permettant de mieux contrôler les laxismes des uns et les égoïsmes des autres, la catastrophe aura lieu.»
25.11.11
O LADO DA DECÊNCIA
«Uma atitude decente é assumirmos todos as nossas responsabilidades. Não tenho ilusões: quem está de fora (a esquerda parlamentar) vai comportar-se como se tivesse chegado agora de Madagáscar; senadores e oportunistas vão comportar-se como sempre se têm comportado- cuidando dos seus interesses pessoais em nome "do povo". Os revolucionários quererão fazer o que sabem fazer: escolher pelos outros. Escolher um lado não significa escolher uma facção. Significa não fazer a escolha fácil, a que as circunstâncias sugerem como melhor para o nosso futuro individual. Escolher um lado significa ter dúvidas e esperar que essa escolha as possa resolver - o contrário é o fanatismo egoísta. Na perigosa situação actual, como não sei o que o actual governo poderia estar a fazer de diferente, escolho o lado da opção actual. Não é o lado do partido ou do governo, é o lado da decência.»
Filipe Nunes Vicente, Lathe Biosas
Filipe Nunes Vicente, Lathe Biosas
É SÓ ISTO
O José Paulo Fafe decerto não se importa que lhe furte tudo.
«NO DIA em que se cumprem trinta e seis anos após o "25 de Novembro" e antes que surja o inefável Lourenço a tentar colher os louros que não lhe pertencem, aqui fica a homenagem devida a um homem a quem o País muito deve: António Ramalho Eanes.»
Adenda: Mais logo
«NO DIA em que se cumprem trinta e seis anos após o "25 de Novembro" e antes que surja o inefável Lourenço a tentar colher os louros que não lhe pertencem, aqui fica a homenagem devida a um homem a quem o País muito deve: António Ramalho Eanes.»
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24.11.11
OS MANDARINS
As direcções partidárias mudam e tornam a mudar. Os governos mudam e tornam a mudar. Mas os mandarins sindicais Carvalho da Silva e Proença ficam. Ficam e teorizam abundantemente. E as televisões dão-lhes corda um dia inteiro. Ouvimos as criaturas exibir o seu extraordinário dom da ubiquidade juntas e separadas, separadas e juntas. Finalmente acabaram por ter o "enquadramento intelectual" da vetusta Quadratura do Círculo, o programa de comentarismo político mais chato do mundo. Estão, aliás, adequados uns para os outros. Ruben Andresen Leitão, porventura um dos escritores portugueses do século XX que melhor nos conheceu e ilustrou, escreve no seu D. Pedro V que «em Portugal a teoria abafa qualquer tentativa prática e todo o nosso condicionamento político, educacional, etc. não nos dá a possibilidade de acção de que carecemos; teorizar de mais é o nosso grande defeito e é aquilo que sempre nos perdeu.» Mas vale a pena tentar explicar isto a um doutorado do ISCTE como da Silva ou a um soba socialista como Proença? Não vale.
MADE GLORIOUS SUMMER
Now is the winter of our discontent
Made glorious summer by this sun of York;
And all the clouds that lour'd upon our house
In the deep bosom of the ocean buried.
Now are our brows bound with victorious wreaths;
Our bruised arms hung up for monuments;
Our stern alarums chang'd to merry meetings,
Our dreadful marches to delightful measures.
Grim-visag'd war hath smooth'd his wrinkled front.
Shakespeare, Richard III
23.11.11
SEI LÁ
A Joaninha Amaral Dias tem tanto de bonita como de politicamente frívola. Ornamenta muito bem tanto uma mesa quanto um manifesto ou um "novo paradigma".
SÁBIOS CONSELHOS
«O principal para que o Governo tenha êxito é saber persistir. Ter a coragem de não mudar de rumo, independentemente dos acidentes de percurso. Recomeçar, pacientemente, quantas vezes forem necessárias. Tomar decisões. Não se deixar perturbar por agressões verbais, por incompreensões ou por injustiças. Aguentar de pé. Para os homens de convicção e de recta consciência, o que conta é sempre - e só - o futuro.»
Mário Soares, Primeiro-Ministro, 15 de Maio de 1984 (in A Árvore e a Floresta, Perspectivas & Realidades, 1984)
O MANIFESTO ANTI-REFORMADOR
Parece que foi lançado um "manifesto". À cabeça dele está o patriarca da igreja ortodoxa do regime, o glorioso dr. Mário Soares. Fora o Medeiros Ferreira - meu Amigo e com quem assinei o Manifesto Reformador de 1979 - os outros oficiantes não me inspiram grande consideração. Para não dizer nenhuma.
Foto: Ephemera
Adenda: A "fase" do "pensamento mágico" à conta de um "novo paradigma" (agora não há praticamente ninguém que não queira sugerir novos paradigmas nem que seja na confecção de saladas de frango). Não há pachorra.
Foto: Ephemera
Adenda: A "fase" do "pensamento mágico" à conta de um "novo paradigma" (agora não há praticamente ninguém que não queira sugerir novos paradigmas nem que seja na confecção de saladas de frango). Não há pachorra.
22.11.11
"CIRCENSES" SEM "PANEM"
Não acompanho a Suzana Toscano nisto. E não, não é «a prova provada de que aquilo na Madeira é tudo um disparate de despesa deitada à rua». Ou que não se trata de um «investimento» no turismo local. Será despesa e porventura de investimento. Mas a circunstância favorece a manifesta obscenidade da dita despesa e do dito investimento (arrematado pela maravilhosa via do ajuste directo) dado o que espera (e se espera da) Madeira no curto e no médio prazo. A Suzana imagina o que se diria e escreveria se, por exemplo, o primeiro-ministro decidisse mandar erguer uma árvore de natal de 30 metros de altura, em São Bento, toda iluminada, ou sugerisse 15 minutos de fogo de artifício a partir do Jardim da Estrela para consolo dos turistas amantes da Lisboa do eléctrico 28?
HUBRIS
Há quarenta e oito anos, neste dia, um bonito casal americano, nada convencional, chegava a Dallas. Era a última viagem presidencial de John F. Kennedy. Gore Vidal, vagamente "aparentado" com Jackie, conta que, uma vez, numa festa onde estava com Tennessee Williams passou por eles o jovem senador Kennedy cuja visão inspirou ao dramaturgo o seguinte comentário: "que belo traseiro!". No filme homónimo de Oliver Stone, Nixon (Anthony Hopkins) às tantas afirma que JFK representava o que os americanos gostariam de ser, e ele, Nixon, o que eles eram na realidade. Jack era novo, bonito, libertino, inteligente e rico. Levou para a Casa Branca o glamour e a alegria trágica da sua vida pessoal - a oficial e a outra - ao lado de uma jovem e bela primeira-dama. Os filhos filhos eram igualmente belos e fotogénicos. Nunca o conseguimos imaginar velho.
QUEM BEBE PELO GARGALO COMPRA A GARRAFA
«Jung escreveu que aquilo que não é querido nem desejado não precisa de ser interdito. Bom, mas saberemos nós aquilo que queremos e desejamos? A noção de «inconsciente» não passa precisamente pela ideia de que não sabemos? Proibir aquilo que desconhecemos pode ser excesso de zelo, mas não é totalmente absurdo. Por outro lado, um interdito provoca necessariamente um desejo daquilo que foi interditado. Será esse desejo «genuíno»? Mas quem é que decide quais são os desejos genuínos e quais os fictícios? Nos tempos da Lei Seca é que havia aquela grande frase: Antes a lei seca do que não haver álcool.»
Pedro Mexia
Pedro Mexia
21.11.11
UMA OBSCENIDADE
Deus sabe como gosto da Madeira e do Porto Santo. Mas três milhões de euros para fogo de artifício e decorações de natal é, nas actuais circunstâncias do país e da Região Autónoma em especial, pura obscenidade.
SETENTA ANOS
«E a coragem? -É dizer o que se pensa. Se não disser o que pensa, não é interessante. As pessoas vão à procura de uma diferença. Não se trata de fazer uma diferença. Há uns tontaços a fazer isso pelos jornais. Ninguém os leva a sério. O grande problema de se tentar ser original — não estou a falar dos que são mesmo — inventar coisas para ser diferente e depois ter um mínimo de coerência. As coisas têm de ligar umas com as outras. Não têm que inventar discordâncias para se fazerem originais. Mas também não devem fazer o contrário. E o contacto com aqueles sobre que se escreve? - Não vejo por que é que um colunista deva ser capado politicamente. O que acho é que não se pode ser as duas coisas ao mesmo tempo. Sempre que estive dentro de alguma coisa, parei — tanto durante o Sá Carneiro, como durante o MASP. Não escrevi. Nem isso era possível com nenhum dos dois. Deixei de escrever em 1979, um ano antes de estar no Governo. Mas quando voltou teve de escrever sobre pessoas com quem tinha estado. Isto é uma máquina de acumulação de inimigos? - Definitivamente não. Há um tempo de irritação, que as pessoas têm, mas aquelas que têm algum carácter, liberdade de espírito, 15 dias, dois meses depois, digerem e não pensam mais nisso. Até acham graça.»
Vasco Pulido Valente em entrevista a Pedro Lomba, Público
Vasco Pulido Valente em entrevista a Pedro Lomba, Público
20.11.11
A INFORMAÇÃO SEGUE DENTRO DE MOMENTOS
Parece esdrúxula qualquer "recomendação" para diminuir o espaço de informação nas televisões. Elas praticam-na diariamente. Quanto à tvi, só falta acrescentar ao post do Zé Mendonça da Cruz que Júlio Magalhães foi para intervalo... aos cinco (5) minutos.
MENOS UM
Os espanhóis acabaram, através do voto, com o derradeiro abencerragem que ainda governava na Europa em nome da "esquerda moderna". Tal coisa foi inventada nos anos 90, em Inglaterra, pelo inenarrável e rapace Blair. Teve seguidores em Portugal (Guterres e Sócrates) e em Espanha, Zapatero. Guterres, em 2002, e Zapatero, agora, não se apresentaram ao eleitorado depois do malogrado exercício. Sócrates foi o único que aceitou dar a cara, em Junho, no fim. Os socialistas europeus, com a possibilidade de François Hollande chegar ao Eliseu em 2012, devem fechar definitivamente esta página infeliz da sua história marcada pelo arrivismo, pela demagogia e pelo "plástico". Como escreveu o João Pereira Coutinho, «enquanto a economia afocinhava com uma bolha imobiliária que toda a gente via crescer e rebentar, Zapatero entretinha-se a ser ‘moderno'. Casava homossexuais; ressuscitava os fantasmas do franquismo; alimentava a fogueira autonómica dos nacionalismos; e etc. etc. Hoje, quando os espanhóis se livrarem da criatura, ficarão com um país economicamente destroçado, onde metade da população jovem não tem emprego. Mas ficarão sem Zapatero. É um começo. Aliás, se a crise servir para afastar estes comediantes da arena, nem tudo terá sido em vão.»
UM CHEFE DE ESTADO MODERNO
Tinha apenas vinte e quatro anos quando morreu. A sabedoria nem sempre chega na última idade como defendia Gide.
A INGENUIDADE OCIDENTAL
Lembram-se da "primavera" e dos amanhãs que iam cantar no Egipto, especialmente a partir da "mítica" praça Tahir que se converteu numa espécie de santuário da ingenuidade ocidental que vê brotar democracias inverosímeis em países inverosímeis para a democracia? Pois bem. Depois da exibição de Mubarak numa jaula, moribundo, a ser "julgado", o Egipto persiste em dar provas da sua disposição "primaveril" para tudo menos para a democracia. A mania que se pode exportar a dita cuja para todo o lado (os EUA fomentam democracias e ditaduras à vez) releva da mais pura ignorância, aquela que, aos poucos, vai enterrando uma certa "ideia de ocidente" à custa da tolice multicultural.
19.11.11
NÃO SÃO ROSAS, SENHOR
Esta semana foi fértil em prosas inflamadas, em entrevistas disparatadas e em opiniões mais e menos respeitáveis sobre serviço público de comunicação social, com particular realce para a televisão. Provavelmente consegue-se a partir disso tudo, e pelo respigar de uma frase ou outra retirada de diferentes autores, uma "redacção" equilibrada acerca do tema. Nem uns têm toda a razão do seu lado, nem os outros têm toda a desrazão do seu. A coisa serviu para que o "sistema" (sim, em torno disto existe uma ecologia muito específica quase sempre reservada aos mesmos) reagisse e para que velhos porta-vozes de velhas "teorias" saltassem dos jazigos de família para apanhar um pouco de ar fresco. Ou para que novos porta-vozes de novas "teorias" se exibissem à conta de dois ou três equívocos. Ora as coisas são como são. Como diz o autor do livro ali à direita, convém frequentar a escola da realidade. E quem decide vai a votos e anda nessa escola que, ainda por cima, está longe de ser gratuita. Não são rosas, senhor, mas é a democracia. Com todas as suas imperfeições e jubilações.
18.11.11
OUTRO TEMPO, OUTRA GENTE
Tenho andado a ler este livro. António Barreto chegou à Suiça em 1963, com 20 anos. Não havia "zonas de conforto". Nem no Portugal de chumbo de Salazar, nem no país de exílio. Barreto fez de tudo um pouco. Até estudar apesar da "falta de tempo". Foi «vendedor de móveis no Grand Passage, mudanças de casas e de escritórios, carregador nos correios ou nos caminhos de ferro, modelo para pintores, distribuição de jornais, criado de café e restaurante, porteiro de hotel, recepcionista de noite, ajudante de tipógrafo e impressor de offset...» Outro tempo. Outra gente.
A QUALIDADE DA DEMOCRACIA
Numa semana em que tanto se falou de "serviço público" de televisão, tivemos ontem (e, presumo, que continue hoje) fartos exemplos do que ele, na vertente "informação", não deve ser. Por razões insondáveis da acção e da investigação criminais portuguesas, as televisões acompanharam, praticamente ao ritmo da "secret house", o trabalho da PJ, de um juiz de instrução criminal, de um procurador da República e de um delegado da Ordem dos Advogados que andaram a recolher indícios nas casas de um arguido, uma em Lisboa e a outra no Algarve. Não falharam nas horas, nos sítios, nos circuitos. Isto quer dizer que sabiam. E se sabiam, foi porque alguém os informou com pormenor. Fez-me lembrar os noticiários a que assisti diariamente, durante um mês, em dois países contíguos da América Latina, a Guatemala e o Salvador, há para aí uns dez anos. Mas esses países tinham saído de guerras civis, estavam desprovidos de uma sociedade civil minimamente estruturada e tinham instituições frágeis e corruptas. No meio disto tudo, não sei quem esteve pior no referido "momento secret house". Se a "vociferante matilha do espectáculo", se a "justiça". Esta promiscuidade doentia e tropical revela a qualidade de uma democracia. Ou a falta dela.
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ACABAR COM UMA RIDÍCULA ILUSÃO
«Em 37 anos não apareceu uma única obra decente de dramaturgia portuguesa. Apareceram romances em grande quantidade, apareceu poesia, apareceram livros de história ou de memórias. Não apareceu uma única peça digna desse nome. Até o Teatro Nacional D. Maria II, na impossibilidade de se ficar eternamente no Frei Luís de Sousa, apresenta geralmente traduções. De resto, não lhe falta só dramaturgia portuguesa. Também lhe falta público. Uma noite no D. Maria é uma noite soturna. Francisco José Viegas cortou o orçamento (um milhão de euros) deste longo equívoco. Foi inteiramente justo. E, quando Diogo Infante resolveu recorrer à intimidação, não hesitou em o demitir. Chegou a altura de acabar com esta ridícula ilusão que em Portugal se chama "teatro".»
Vasco Pulido Valente, Público
17.11.11
UMA BOA ESCOLHA
O João Mota é um grande nome do teatro português, discreto e competente. Se aceitar, o D. Maria fica bem entregue.
16.11.11
A PORTA DE SAÍDA
Quando Diogo Infante acedeu à direcção do D. Maria, escrevi aqui que a criatura «deixou o Maria Matos supostamente porque a CML não lhe dava dinheiro. A CML na altura desmentiu e deu a entender que o actor tinha uma "agenda". Tinha, de facto. Era o Teatro Nacional D. Maria. Infante é agora, de direito, o director artístico da vetusta instituição. E concedeu uma entrevista ao Expresso em que, justamente, volta a queixar-se da mesmíssima falta de dinheiro. Dão-lhe um milhão e meio (mais quinhentos mil euros que davam a António Lagarto antes do episódio Fragateiro e não consta que a casa tivesse ido abaixo ou sequer se ouviram suspiros melancólicos como este) mas sobre programação (por que ele é responsável), nada. O Estado, aliás, não lhe paga mais de sete mil euros brutos para vir a público proferir banalidades ou sublimes tiradas sobre o "futuro" do Teatro como quando afirma que pretende "mudar os estofos dos sofás e que o Sr. 1º Ministro vai oferecer uma carpete nova para o Salão Nobre."» Ignoro se Infante chegou a mudar os estofos dos sofás ou se Sócrates - era esse o primeiro-ministro a quem ele aludia - lhe ofereceu uma carpete nova para o Salão Nobre. Sei, no entanto, que Infante voltou ao queixume e que, desta vez, obteve a indicaçao que estava há muito a pedir. A da porta de saída.
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UMA COISA GRAVE
Que pessoas não excessivamente informadas pensem ou formulem que os recursos públicos são ilimitados, é uma coisa. Que pessoas com responsabilidades políticas, designadamente deputados, pensem e formulem o mesmo, é outra coisa. Uma coisa grave.
FAZER O QUE É PRECISO FAZER
Com um abraço especial para o trabalhador incansável e para o patriota que é o Carlos Moedas.
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15.11.11
O REGRESSO DO EMPLASTRO
O grande momento da noite televisiva transmitida a partir de Benfica foi, sem dúvida, o regresso do "emplastro". Lá andava ele a rondar todas as câmaras de todas as televisões, silencioso e estático, antes da coisa começar. Os adeptos ruidosos que aparecem a pular no fim, sem conseguir dizer coisa com coisa, têm algo a aprender com o nosso homem.
COMO SE TIVÉSSEMOS TODO O TEMPO DO MUNDO
«Embora tenha asseverado que a UEM necessita de uma dimensão política, Merkel fala como se tivéssemos todo o tempo do mundo, quando a situação do mercado financeiro se esfarela a cada dia, a cada hora. Ontem, a dívida italiana de referência manteve-se perto dos 7%, (mesmo com Mario Monti indigitado para PM), e a dívida espanhola rompeu para cima dos 6%, entrando na zona vermelha. Em França, aguarda-se apenas o dia em que o lapso da Standard & Poor's se torne realidade, e o país perca a classificação AAA. O mercado financeiro é global. Nele se transmitem, sem barreiras, as esperanças, mas sobretudo os pânicos. No ponto em que estamos só uma resposta global e unida da Europa, que passe pela intervenção ilimitada do BCE, ou variantes como as propostas por Soros ou Münchau, poderão acalmar a crise, dando tempo para os Eurobonds e a reforma dos Tratados no sentido do federalismo económico e político. Mas sem a concordância alemã, estas decisões nunca poderão ser tomadas. Só Berlim poderá impedir uma reacção em cadeia que fira duramente o sistema financeiro internacional, e as perspectivas de um futuro decente para todos os europeus, e muitos outros milhões no resto do mundo.»
Viriato Soromenho-Marques, DN
14.11.11
O CASO CAMPOS
Ao passar pela RTP Informação, deparo com Manuel Maria Carrilho a falar de responsabilidade a propósito do deputado do seu partido, Paulo Campos, como se todas as pessoas soubessem o que significa assumi-la. Dá ideia que Campos rasurou o passado recente, retirando-se dele, e que aterrou no parlamento vindo directamente de Marte num imaginário tgv voador. Um caso a seguir.
Adenda: E depois há isto.
Adenda: E depois há isto.
UM LIVRO E UMA GERAÇÃO
Mais tarde, alguma desta gente, como Salazar previu, estava no poder. Uns mais iludidos do que outros. Barreto e Medeiros "iniciaram-se" logo em 1975. A seguir integraram o 1º governo de Mário Soares. Barreto provoca o primeiro corte epistemológico-político do novo regime com a chamada "lei Barreto". É derrotado pela ideologia. Saem ele e Medeiros, então MNE, depois deste ter solicitado formalmente a adesão à Europa. Em 1979 estão de novo juntos no Manifesto Reformador. Querem maior flexibilidade do regime e da economia. Reclamam a liderança institucional do Presidente da República. Medeiros compromete-se com Eanes. Barreto afasta-se. O PS de Guterres volta a uni-los ainda que brevemente. A recusa do "socratismo" também, Benavente incluída. O resto da história - e dos outros - é mais ou menos conhecida. Não fizeram "história" partidária porque os partidos foram capturados por outras coisas onde não havia lugar para "pátrias utópicas" ou biografias. Mas é seguramente da história de uma geração diferente que este livro fala. E de amigos meus.
13.11.11
OUTRA COISA QUALQUER
Quando frequentei as fileiras militares, não me passava pela cabeça que, encerrados o PREC, os SUV ("soldados unidos vencerão") e os juramentos de bandeira de punho erguido, os militares voltariam a desfiles e a manifestações. E, muito menos, que terminassem a bravata com uma vaia ao seu Comandante Supremo. Nesse exacto momento deixaram a condição militar e passaram a ser outra coisa qualquer. Militares é que não.
Adenda (do leitor Alves Pimenta): «Viu o Vasco Lourenço a ser "entrevistado" na TVI24? A "entrevistadora" conseguiu a proeza de não perguntar:
- qual o objectivo concreto da manifestação?
- que perseguições está o Governo a mover aos militares?
- por que motivo os militares têm o direito de passar ao lado da situação económica do país? Quanto ao "entrevistado", esteve sempre à altura do QI que lhe é geralmente reconhecido, fazendo jus à eternização como presidente da A25A. Que país, este! »
- qual o objectivo concreto da manifestação?
- que perseguições está o Governo a mover aos militares?
- por que motivo os militares têm o direito de passar ao lado da situação económica do país? Quanto ao "entrevistado", esteve sempre à altura do QI que lhe é geralmente reconhecido, fazendo jus à eternização como presidente da A25A. Que país, este! »
SERVIÇO PÚBLICO DE TELEVISÃO
É, por exemplo, isto. A propósito, a Gulbenkian começou a editar as Obras Completas do homem. Já vi por lá a Heterodoxia, um dos meus preferidos. «O homem é uma realidade dividida. O respeito pela sua divisão é Heterodoxia.» (1949)
12.11.11
UM MAU PRECEDENTE
O EXPERIENTE BASÍLIO
Contaram-me outro dia que, numa comissão parlamentar, o deputado Basílio Horta se terá referido ao partido por que é deputado por "o nosso PS". E não se riu. Basílio é uma figura truculenta que a "cota Sócrates" impingiu a Leiria como cabeça de lista. Basílio conviveu várias vezes com o PS. Foi, até, membro de governos do PS e com o PS pela "cota CDS". Só em 1991 decidiu aborreceu-se na televisão com o recandidato presidencial Mário Soares e atirou-lhe, delicadamente, com o epíteto de "padrinho". Agora ornamenta as primeiras filas da bancada parlamentar do PS ao lado de dois ou três novatos que andam a estagiar para Basílio quando e se crescerem. Teve direito a intervenções "de fundo" e a insultar um membro do governo à conta da sua "vasta experiência". Tanta como a pudicícia política que não tem.
TEM DIAS
José Medeiros Ferreira intitula a sua crónica de hoje no Correio da Manhã com um satisfeito «a Igreja não se abstém». A Igreja é a portuguesa e os "heróis" circunstanciais de Medeiros são D. José Policarpo - por causa dos feriados, matéria acerca da qual o prelado terá "ensinado" algo ao Governo - e a Conferência Episcopal Portuguesa por causa da sua mais recente, e passo a citar, «substantiva crítica ao neoliberalismo». Ao contrário de Medeiros, sou católico "não progressista" e desconfio de qualquer político de qualquer obediência com "excesso de zelo". Dos laicos nem se fala. É uma boa desculpa para praticamente tudo. Tal como não deixa de ser curioso Medeiros louvar a pretensa não abstenção da Igreja o que, traduzido para português dos dias que correm, quer dizer que a Igreja não se abstém de atacar, mesmo em nome da beatitude, o Governo. Como não sou adepto de pensamentos únicos, julgo que a Igreja portuguesa tem o direito aos seus momentos de proselitismo mesmo que Ratzinger o não recomende. Todavia, gostava de a ter visto assim, não abstencionista, nos idos do apogeu do socratismo absolutista. Mas aí todo o cuidado era pouco por muito grande que fosse a fé. A Igreja portuguesa tem dias.
11.11.11
OS NOVOS NIBELUNGOS
«A União Europeia parece hoje uma ópera de Wagner, de onde foram retirados todos os deuses, todas as ninfas, todos os heróis, todos os gigantes, e apenas restaram os anões. Dia 9, quando a Itália atravessou o Rubicão dos 7% da dívida a dez anos, ficou patente o fracasso absoluto da estratégia que foi imposta, com disciplina e método, pelo Governo alemão, com a cumplicidade do Eliseu: a) esvaziar as instituições europeias, em especial os Presidentes da Comissão e do Eurogrupo; b) levar a cabo medidas de quarentena para evitar o "contágio" do vírus da dívida soberana, começado na Grécia; c) violentar todas as regras da lógica formal, da ciência económica, e do bom senso, ao acreditar que é pela austeridade recessiva que a Europa poderá reequilibrar-se; d) recusar qualquer reforma estrutural dos Tratados, como se o problema sistémico da Zona Euro não tivesse origem no carácter monstruoso da UEM, como obra imperfeita e inacabada. Se a Itália cair, a crise europeia entrará num buraco negro. Numa fase de turbulência total, como ocorre num metal que entra em colapso sob uma pressão térmica insuportável. Ontem, o BCE fez saber que ia ajudar a Itália, e de imediato os juros da dívida de Roma recuaram. Depois veio Klaas Knot, o Presidente do Banco Central holandês, dizer que, afinal, o BCE pouco pode fazer, lançando sombra sobre a única esperança que nos resta... Reina a cacofonia. Em Berlim já se fala de mutualização da dívida europeia, perante uma chanceler inamovível. Sarkozy sonha com uma Europa quase só franco-alemã. Ao evocarmos, hoje, os dez milhões de jovens europeus sacrificados na Grande Guerra, talvez seja preciso recordar ao Presidente francês que entre a França e a Alemanha há o Reno. Um rio onde jaz o anel de sangue, de uma violenta história. Prestes a regressar, pelo desvario dos anões nibelungos que nos desgovernam.»
Viriato Soromenho-Marques
Viriato Soromenho-Marques
10.11.11
RESPONSABILIDADE
O ministro da economia teve hoje uma excelente prestação parlamentar. Álvaro Santos Pereira enfrentou politicamente - não existe outra forma de o fazer porque é de política que se trata - as interpelações de alguns deputados até há poucos meses directamente responsáveis pela perigosa ilusão em que caímos. Seguro não tem grande culpa nisso porque não escolheu as criaturas. Mas Santos Pereira esteve à altura das suas pesadas responsabilidades até quando apontou àqueles as deles.
LER E OUVIR OS OUTROS
Gratificante a inteligência, a acutilância, a liberdade de espírito e a coragem cívica reveladas por Viriato Soromenho-Marques na apresentação deste livro. Cada vez mais precisamos de gente desta, preocupada genuinamente em reflectir sobre a coisa pública e não em servir-se dela para falar de si ou tratar da vidinha - a mesquinhice intelectual é uma contradição nos termos.
9.11.11
«YES, I HAVE BEEN THERE TOO»
«And what have I learned along the way? Three things, closely related. The first is that people are often in pain; their lives are shadowed by memories and anticipations of inadequacy, and they are always afraid that the next moment will bring disaster or exposure. You can see it in their faces, and that is especially true of children who have not yet learned how to pretend that everything is all right and who are acutely aware of the precariousness of their situations. The second thing I have learned is that the people who are most in pain are the people who act most badly; the worse people behave, the more they are in pain. They’re asking for help, although the form of the request is such that they are likely never to get it. The third thing I have learned follows from the other two. It is the necessity of generosity. I suppose it is a form of the golden rule: if you want them to be generous to you, be generous to them. The rule acknowledges the fellowship of fragility we all share. In your worst moments — which may appear superficially to be your best moments — what you need most of all is the sympathetic recognition of someone who says, if only in a small smile or half-nod, yes, I have been there too, and I too have tried to shore up my insecurity with exhibitions of pettiness, bluster, overconfidence, petulance and impatience. It’s not, “But for the grace of God that could be me”; it’s, “Even with the grace of God, that will be, and has been, me.”»
Stanley Fish, NYT
8.11.11
A RAZÃO DO MINISTRO
Há dias exprimi aqui a minha preocupação pela hipótese de o Metro de Lisboa encerrar a horas estapafúrdias. Percebi entretanto que se tratava de uma de várias hipóteses em estudo e que nenhuma decisão definitiva fora tomada a esse respeito. Por isso congratulo-me com esta posição do ministro da Economia. «Nenhuma capital europeia fecha o metro as 11 da noite. À partida, não faz sentido.» Tem razão. Não faz.
7.11.11
A ÚLTIMA DA SÉRIE
Gabriela Canavilhas foi a última de uma absurda série de três ministros da cultura do eng.º Sócrates. Dotada de uma invulgar incontinência verbal, a senhora - eminentemente esquecível no posto que ocupou como, aliás, os colegas da série - não cumpriu um módico de nojo e debitou um artiguinho no jornal Público alegadamente sobre a cultura e o actual governo. Há dias, Manuel Maria Carrilho escrevia, a propósito do PS, que, «como já dizia Montaigne, a integridade é a capacidade de se assumir a responsabilidade pelos actos. E a responsabilidade, por sua vez, é o vínculo que liga a nossa palavra e os nossos actos, bem como as nossas opções e as suas consequências. Sem responsabilidade não há integridade e, sem esta, a credibilidade esfuma-se. Sabe-se bem que não há futuro para quem foge do seu passado. E que o ressentimento tanto bloqueia a lucidez como distorce a ética.» Qual é a parte que Canavilhas não percebe?
A "TEMPESTADE PERFEITA"
Itália, França. Em breve a "tempestade perfeita" com o epicentro bem no centro da Europa.
Clip: Charles Gounod, Faust - "Le veau d'or". Orchestre de l'Opéra de Paris. George Prêtre. Ruggero Raimondi, 1989, abertura da Ópera da Bastilha.
6.11.11
WOTAN E A EUROPA
O sr. Papandreou, o derradeiro herói da "esquerda moderna" e dos ingénuos, custa a perceber que deve sair. Faz lembrar outro também ex-herói da "esquerda moderna" doméstica que teve de encarar a luz das urnas para perceber. A pusilanimidade revelada por Papandreou em apenas meia dúzia de dias seria o suficiente para não aparecer em público tão cedo. Se a Europa está no estado em que está, a esta parafernália de pusilânimes o deve e quanto mais depressa eleições ou outra coisa qualquer os varrer de cena, melhor. O "romântico" Berlusconi começa a ceder na sua diletante demagogia. Merkel e Sarkozy, infelizmente, ainda ficam mais uns tempos para desgraça de uma "casa europeia" que exibe como mordomos Barroso e Rompuy, ou seja, pouco mais que nada. A "Europa" é hoje um animal moribundo e acossado graças a esta trupe de ineptos que só agora, tarde, acordou para a política. Os G20 não são melhor. O mundo - que já não é nem "ocidental" nem "de leste" porque a argamassa dos seus principais dirigentes é de fabrico "único" - tal como o conhecíamos, previsível e em módico equilíbrio, despareceu para dar lugar a maus apresentadores de televisão arvorados em estadistas. E por cá? Bem, por cá é como escreve Pulido Valente no Público. Por cá, «o Bloco e o sumo da esquerda bem pensante também contam com um milagre de fora. Uns recomendam, prometem ou profetizam a famigerada "saída" do euro, sem perceber que essa "saída" destruiria rapidamente a classe média e poria a pão e água a maioria dos portugueses. Outros lamentam que a Alemanha e o BCE não se ponham por aí a imprimir dinheiro e provoquem uma inflação descomunal capaz de absorver a dívida, qualquer que ela fosse, e de caminho devastar a Europa. E outros, que se distinguem pela sua particular ingenuidade e espessura, persistem em pensar no tio do Brasil, isto é, em eurobonds generosamente concedidos, por razão nenhuma, à indigência universal. Como os sarilhos da direita, a absoluta nulidade da esquerda é um sinal de morte.» Wotan, o Viajante, anda por aí.
ESTAMOS SEMPRE A APRENDER
Um tipo chega a casa depois de mais de cinco horas de excelente Wagner, liga a televisão e o que é que vê? Jerónimo de Sousa, um homem até há pouco aparentemente cordato, a apelidar governantes de "carrascos" e a compará-los a Augusto Pinochet. Atrás dele Ruben de Carvalho, que está longe de ser um burgesso, aplaudia. Jerónimo parecia um anão nibelungo: ressabiado, vingativo, cheio de ódio. Decerto não ignora que só em democracia (e mesmo numa como a nossa, cheia de defeitos instintuais) ele pode ser assim e exibir tranquilamente a sua flatulência partidária, rasca e primitiva, sem desaparecer de um dia para o outro como era costume no regime de Pinochet. Não esperava de Jerónimo tamanha tacanhez e tanta demagogia ordinária. Estamos sempre a aprender.
WAGNER/SINOPOLI
Richard Wagner: Os Mestres Cantores de Nuremberga - Abertura. Staatskapelle Dresden. Giuseppe Sinopoli. 1998, Tokyo (do leitor Joaquim Costa)
5.11.11
O PRINCÍPIO DO FIM
Prossegue esta tarde, a partir das 16 horas, na Gulbenkian, a saga dos Nibelungos transmitida directamente do Met de Nova Iorque. Depois de O Ouro do Reno e de A Valquíria, Siegfried, a terceira jornada do Anel do Nibelungo de Wagner fornece cerca de cinco horas de espectáculo. Siegfried é o herói forjado no amor incestuoso de Siegmund e Siegfried, aquele que vai despertar a valquíria adormecida e protegida pelas chamas a quem Wotan retirou todos os poderes no final da jornada anterior. Siegfried é um estarola frívolo que só é herói graças à espada Notung e à vigilância dos deuses. Os verdadeiros "heróis" desta terceira jornada são Wotan/ o Viajante, o ressentido Alberich e Brühnhilde, a valquíria que, coitada, vai experimentar os equívocos do amor. Erde regressa do seu sono eterno para, com Wotan, o viajante, discutirem o crepúsculo dos deuses que se vai seguir uma vez quebrada a lança protectora do deus pelo rapazola Siegfried. Está tudo resumido nessa quebra voluntária da lança por parte de Wotan. É o princípio do fim.
A "AGENDA IDEOLÓGICA"
Alguns escrevinhadores e outros tantos pensadores de televisão andam muito preocupados com a "agenda ideológica" do Governo. Segundo esta gente atormentada, o Governo possui uma perigosa "agenda liberal" ou "neoliberal", quando não "conservadora" ou "neoconservadora", destinada a acabar com o extraordinário "estado" a que isto tudo chegou. Não nego que o Governo tem forçosamente de fazer qualquer coisa de profundo e duradouro no Estado de maneira a que, nas suas funções essenciais, não soçobre de vez. E por Estado quero dizer o propriamente dito, central, local e regional, o seu aberrante sector empresarial e as participações ruinosas nas gloriosas PPP's que comprometem gerações inteiras. Mas a "agenda ideológica", em si mesma, não interessa nada a não ser a académicos com pouca relação com a chamada vida material ou a pessoas que precisam de encher colunas em jornais. Quando assinei e ajudei a divulgar o Manifesto Reformador de 1979, com dezoito anos, praticamente defini a minha "agenda ideológica" para o resto da vida. Estava lá o essencial: evolução do regime político, flexibilização do sistema económico e exercício da cidadania para além dos partidos. Não sou "liberal" nem "conservador" ou "neo" isto ou aquilo. Prefiro a toda essa tralha (e à contra-tralha das esquerdas apoquentadas) o pragmatismo do insuspeito Mário Soares numa entrevista de 1984. «Nunca dei uma excessiva importância aos debates ideológicos e sempre condicionei muito mais a minha acção pelas relações políticas e tácticas no terreno, por forma a, pragmaticamente, levar a água ao meu moinho.»
CINCO CHEGA
«Oficialmente, temos 14 feriados por ano em Portugal. De facto, temos mais e, até agora muito mais. Temos, primeiro, os feriados nacionais e, ao contrário de toda a gente, logo dois: o 1º de Dezembro e 10 de Junho. Tanto um como outro são meio inventados. O 1º de Dezembro supostamente comemora o fim do domínio espanhol, que na realidade não foi um "domínio", mas só uma união de Estados que continuaram independentes, sob o mesmo rei. O 10 de Junho, que para efeitos cerimoniais se chama "Dia de Camões, de Portugal e das Comunidades" (e dantes se chamava "Dia da Raça") é em princípio no dia da morte de Camões (que ninguém sabe quando morreu) e parece que se destina a exaltar disfarçadamente o Império, que já acabou e de que, num tempo de correcção política, se não pode falar. A seguir, temos feriados políticos: que são três. Como era inevitável o 25 de Abril, a data da "revolução dos cravos", em que o regime celebra o fim da Ditadura e a presuntiva glória da sua obra; o 5 de Outubro, que introduziu uma República jacobina em Portugal e promoveu 15 anos de perseguição e violência; e, finalmente, o 1º de Maio, uma velha festa internacional dos trabalhadores, quando os trabalhadores eram "o proletariado". O resto dos feriados - nove - são feriados religiosos, por vezes misturados com um pouco de nacionalismo, que seguem o calendário da Igreja Católica (mesmo o Carnaval, que, não por acaso, precede a Quaresma). Nenhum destes 14 feriados, excepto o Natal, suscita ainda qualquer espécie de fervor: nem os nacionais, nem os políticos, nem os religiosos. Servem só - em combinação com sábados, domingos, feriados municipais (que nada impede um qualquer município de estabelecer) e "pontes" - para aumentar o recreio e repouso da população em várias semanas por ano. Com o compreensível propósito de acabar com isto, o Governo anunciou que iria diminuir o número de feriados; e a Igreja Católica, percebendo a sua fraqueza, ofereceu quatro. Ignoro o que o Governo pensa sobre o assunto, se pensa alguma coisa. Mas, razoavelmente, num Estado laico não devia haver mais do que três feriados religiosos (Natal, Ano Novo e Sexta-Feira Santa). Como num Estado pequeno e indigente não devia haver mais do que dois feriados, por assim dizer, civis: o 25 de Abril, fatalmente, e, para não pôr muito nervosa a esquerda, o 1º de Maio. Cívica e espiritualmente passávamos muito bem com estes cinco.»
Vasco Pulido Valente, Público
4.11.11
REGRESSAR AO DR. DESTOUCHES
METER NOJO
O socialista grego Papandreou é, afinal, apenas mais um farsante. Numa entrevista à CBS sugeriu que estava "a reinar" quando lhe ocorreu o referendo que tantos delíquios provocou nos mais crédulos. Bem andou a D. Dilma quando, de visita à irrelevante cimeira dos G20, disse com a maior das naturalidades que não tencionava investir um real no FEEF, o fictício "fundo europeu" - que pouco passou do papel e da retórica exibidos no já remoto conselho europeu de 21 de Julho -, uma vez que nem os próprios europeus acreditavam nele. É a vexames destes que a Europa está sujeita enquanto decorrerem os números circenses a que se tem assistido de Atenas a Bruxelas, passando por Cannes, Berlim e Paris. Tudo isto mete nojo.
AQUI É QUE SE ESTAVA BEM
3.11.11
PAPANDREOU E A ÁGUIA
INTEGRIDADE E RESPONSABILIDADE
«A prolongada negação da crise e das suas consequências, em 2008, e a total desvalorização do endividamento do País e dos seus efeitos, em 2009 e 2010, fizeram o País perder tempo precioso. Foram erros nacionais, que a crise internacional não explica. E os portugueses não esquecerão tão cedo estas opções - nem o líder que as tomou, nem o Partido em nome do qual governava. Não há como contornar ou relativizar esta questão. Ela exige um sério exame de consciência e uma tão humilde como clara assunção de responsabilidades perante o País. Como já dizia Montaigne, a integridade é a capacidade de se assumir a responsabilidade pelos actos. E a responsabilidade, por sua vez, é o vínculo que liga a nossa palavra e os nossos actos, bem como as nossas opções e as suas consequências. Sem responsabilidade não há integridade e, sem esta, a credibilidade esfuma-se. Sabe-se bem que não há futuro para quem foge do seu passado. E que o ressentimento tanto bloqueia a lucidez como distorce a ética. Mais do que apontar o dedo a quem quer que seja, para dentro ou para fora (deixemos isso para a História), o que é hoje vital para o PS é um gesto de desassombrada integridade política e ética, que abra caminho a uma (certamente longa e difícil) reconquista da credibilidade perdida. Sem este gesto, o PS continuará indefinidamente na posição em que o deixaram: encurralado. Para começar um "novo ciclo", é preciso fechar o anterior. O que os portugueses exigem, mais do que o milagroso aparecimento de um "novo PS", é simplesmente isto: um PS responsável. E a votação do Orçamento é (pense-se o que se pensar deste Orçamento) o momento ideal para fazer esse gesto, que só pode ser o da abstenção.»
M. M. Carrilho, DN
2.11.11
A FALÁCIA
O extraordinário Tratado de Lisboa - esse, sim, é que devia ter sido referendado pelo "povo europeu" - prevê tudo menos o que fazer em caso da saída de algum país do euro ou do euro de algum país da respectiva "zona". Como se isto não bastasse, o não menos extraordinário Papandreou sugere que se pergunte ao seu povo se quer ou não ficar no euro sem lhe explicar que a pergunta esconde uma falácia por causa de um Tratado que a Grécia assinou de cruz. Até um cego já viu que o sr. Papandreou quer muito legitimamente livrar-se do cargo que ocupa à custa da referida falácia. E o que é que nós temos a ver com isso?
DO GÉNIO
Sem dúvida, professor. E em que parte da "genialidade" socialista grega é que nós entramos? Nós, portugueses?
1.11.11
«WHY SHOULD WE CELEBRATE THESE DEAD MEN MORE THAN THE DYING?»
There are three conditions which often look alike
Yet differ completely, flourish in the same hedgerow:
Attachment to self and to things and to persons, detachment
From self and from things and from persons; and, growing between them, indifference
Which resembles the others as death resembles life,
Being between two lives—unflowering, between
The live and the dead nettle. This is the use of memory:
For liberation—not less of love but expanding
Of love beyond desire, and so liberation
From the future as well as the past. Thus, love of a country
Begins as attachment to our own field of action
And comes to find that action of little importance
Though never indifferent. History may be servitude,
History may be freedom. See, now they vanish,
The faces and places, with the self which, as it could, loved them,
To become renewed, transfigured, in another pattern.
Sin is Behovely, but
All shall be well, and
All manner of thing shall be well.
If I think, again, of this place,
And of people, not wholly commendable,
Of no immediate kin or kindness,
But of some peculiar genius,
All touched by a common genius,
United in the strife which divided them;
If I think of a king at nightfall,
Of three men, and more, on the scaffold
And a few who died forgotten
In other places, here and abroad,
And of one who died blind and quiet
Why should we celebrate
These dead men more than the dying?
It is not to ring the bell backward
Nor is it an incantation
To summon the spectre of a Rose.
We cannot revive old factions
We cannot restore old policies
Or follow an antique drum.
These men, and those who opposed them
And those whom they opposed
Accept the constitution of silence
And are folded in a single party.
Whatever we inherit from the fortunate
We have taken from the defeated
What they had to leave us—a symbol:
A symbol perfected in death.
And all shall be well and
All manner of thing shall be well
By the purification of the motive
In the ground of our beseeching.
T.S.Eliot, Four Quartets (Little Gidding, III)
DIA DE FINADOS
O sr. Rompuy e o nosso dr. Barroso escreveram uma cartinha patética aos G20 a, por um lado, pedir que dêem a sua mãozinha a uma Europa destrambelhada e, por outro, a exibirem o putativo "sucesso" do conselho europeu da semana passada como penhor (político?) para essa "ajuda". Entretanto, os sinais são muito claros: bolsas de rastos, bancos de rastos, a zona euro quase de rastos depois do sr. Papandreou - que proclamou o conselho de quarta-feira passada como "um novo dia para a Grécia" - decidir referendar o mencionado "novo dia" por não saber mais o que fazer. Em suma, uma mediocridade financeira e política europeia geral a abrir Novembro depois da "alegria breve" do último encontro de Bruxelas, à espera do próximo e do próximo até ao último. Pobre Europa.
Adenda: Em que parte remota do mundo ou da Europa viverão o sr. Feliz e o sr. Contente?
Adenda2 (de um leitor): «(...) Gostei da decisão do senhor Papandreou: este também não sabe o que é a verdade. E deixa-a nas mãos do povão. Aguardemos ansiosamente pelo "referendo grego" então (faço já a aposta que este será "O" novo termo para a comunicação social se lambuzar de hoje em diante, depois da carroça russa puxada por três cavalos).» Tem razão. Já há para aí umas almas, entre simples e complexas mas que foram sempre contrárias a referendos, a falar do dito "referendo grego" com a típica alegria da necedade. Não lhes ocorre que "o referendo grego" não teria lugar antes de Janeiro o que, traduzido em euros e Europa, ressuma a fim de festividades. Quando a "Europa" do tratado de Lisboa, dos Jerónimos, de Bruxelas et al. se urinou de alegria há para aí uns quatro anos atrás, houve uns loucos do Restelo que avisaram enquanto os do "referendo grego" aplaudiam de pé e de joelhos o "porreirismo, pá" que deu nisto. Razão tinha o outro. Um cretino é um cretino e um vintém é um vintém. E, pelo andar da carruagem, nem vintém. Só cretinos.
Adenda: Em que parte remota do mundo ou da Europa viverão o sr. Feliz e o sr. Contente?
Adenda2 (de um leitor): «(...) Gostei da decisão do senhor Papandreou: este também não sabe o que é a verdade. E deixa-a nas mãos do povão. Aguardemos ansiosamente pelo "referendo grego" então (faço já a aposta que este será "O" novo termo para a comunicação social se lambuzar de hoje em diante, depois da carroça russa puxada por três cavalos).» Tem razão. Já há para aí umas almas, entre simples e complexas mas que foram sempre contrárias a referendos, a falar do dito "referendo grego" com a típica alegria da necedade. Não lhes ocorre que "o referendo grego" não teria lugar antes de Janeiro o que, traduzido em euros e Europa, ressuma a fim de festividades. Quando a "Europa" do tratado de Lisboa, dos Jerónimos, de Bruxelas et al. se urinou de alegria há para aí uns quatro anos atrás, houve uns loucos do Restelo que avisaram enquanto os do "referendo grego" aplaudiam de pé e de joelhos o "porreirismo, pá" que deu nisto. Razão tinha o outro. Um cretino é um cretino e um vintém é um vintém. E, pelo andar da carruagem, nem vintém. Só cretinos.
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