20.11.10

O GLORIOSO PAÍS DE EVENTOS


«Uma parte essencial da saloiice indígena é a mania do prestígio. Ontem o DN falava da cimeira da NATO, notando com grande satisfação que ela nos trazia grande prestígio. E porquê? Porque Portugal recebia os "chefes" (e que "chefes") dos 28 Estados membros, mais duas dezenas de "representantes" de outros desgraçados países, desde o afegão Karzai ao russo Medvedev. Esta festarola já tornou Lisboa num inferno e provocou o governo a dar o presente do costume ao grosso do funcionalismo: a sempre abençoada e nunca verdadeiramente merecida "tolerância de ponto". Mas parece - dizem os peritos - que o mundo pasma com a nossa "capacidade" de organização, ainda por cima de um "evento" que "mudará o futuro próximo da humanidade". Para dona-de-casa não estamos mal. A Expo-98 e o Europeu de Futebol de 2004, embora sem "mudar o futuro próximo da humanidade", o que foi uma pena, tinham a seu tempo mostrado essa nossa extraordinária vocação. E mesmo hoje Portugal continua ardorosamente à procura de um espectáculo qualquer que reforce e alargue a sua enorme fama de "receber bem", necessária como pão para a boca a um país que se preze. Consta, por exemplo, que vem aí o Mundial de Futebol e até, suponho que em homenagem à Comporta, a Ryder Cup (uma espécie de campeonato de golfe). Só falta agora o pingue-pongue e o ténis, que se escondeu, talvez por modéstia, no Estoril. A única coisa que espanta neste fulgurante currículo é que Portugal não use a sua "capacidade de organização" para se organizar a si próprio, uma coisa por que ninguém certamente o criticaria. De resto, há por aí gente, como a sra. Merkel, que é muitíssimo capaz de preferir Portugal com uma dívida externa mais pequena, um défice razoável e uma economia em crescimento. Sabemos que essa gente é mesquinha e má. E que nada paga a íntima alegria de ver Obama e os seus duzentos guarda-costas nas ruas de Lisboa. O brilho de uma boa "cimeira" não substitui a mediocridade de uma vida honesta e de uma sociedade um pouco menos miserável e caótica. Os pobres - é uma velha verdade - gostam de se roçar (figurativamente) pelos ricos. Como a insignificância gosta de se roçar pela grandeza e discutir a sério o "futuro próximo da humanidade", em especial do Afeganistão em que o interesse de Portugal é óbvio. Mas, de quando em quando, convinha que o governo descesse à realidade de que teoricamente se devia ocupar.»

Vasco Pulido Valente, Público

7 comentários:

joshua disse...

Descer à realidade é pedir de mais aos nefelibatismo socratinesco.

Anónimo disse...

VPV no seu melhor!

O sonho desta parolada toda, onde pontifica o já gastíssimo dito cujo, é ser "tiá de Cascais", sócia-gerente de uma empresa de catering unipessoal, limitada.

PC

Anónimo disse...

Quando houver outra cimeira da NATO todo este espectáculo do nacional parolismo jornalístico deslumbrado se resumirá a uns rodapés que passarão durante as reportagens sobre os treinos do benfica ou da selecção nacional, como quase sempre. Ainda não vi ninguém perguntar quanto nos custou esta aventura.

Mani Pulite disse...

O PRÓXIMO GRANDE EVENTO VAI SER A RECEPÇÃO AO BORGES DO FMI NA PORTELA.PASSADEIRA VERMELHA E 21 TIROS DE CANHÃO.

Anónimo disse...

«O programa da manhã... demonstração equestre em frente ao Mosteiro dos Jerónimos que captou a atenção de alguns curiosos»
Com um programa mais que suficiente para as ladies, ainda tinha de incluir esta demonstração de pobretes e alegretes.
A imaginação e desenrasca dos indígenas, como habitual.
Um grande tabuleiro frente a uma tribuna de honra, frente aos Jerónimos, para as mulheres dos chefes índios.
Depois de almoço, lá estavam alguns proletários a recolher as areias. A a seguramente que alguma trampa que ficou.
"Eventos, Portugal SA"
Uma nova indústria e Oportunidade para o futuro.
JB

Anónimo disse...

«que o governo descesse à realidade»
Impossível, absolutamente.
Quando uma classe política, se destacou pelo entusiasmo, pela grandiosidade e pelo sucesso dos 10 (dez) estádios do Euro 2004, não há salvação.
Um deles era o agora PM, bem acompanhado pelo PS e restantes clubes políticos das oposições de faz de conta.
Idealmente, teriam construído em estádio 'novo' em cada distrito (18), mostrando a sua simpatia para com a plebe e autarcas do regime.
O 'subversivo' VPV, deve ter sido o primeiro e dos poucos, a denunciar a estupidez. Numa coluna no DN de 2003 ou 2004, alvitrando seis estádios.
Portanto, nada de novo na frente.
Da banca rota em curso (BRC)
JB

Anónimo disse...

Parece que não foi caro:Pagámos a nato em natas. Portugal deu os pasteis de nata, uns portos e uns pateis de bacalhau. O resto foi por conta da propria nato.