6.1.08

LUIZ PACHECO (1925-2008): SEM RESPEITOS HUMANOS NEM SILÊNCIOS FALACIOSOS

Era no tempo em que a Feira do Livro de Lisboa estava viva. O Pacheco deambulava entre os pavilhões com um saco de plástico de onde tirava exemplares de uma edição - com um erro que ele fazia questão de emendar à mão - do seu Libertino que vendia directamente a quem quisesse. Descemos - eu, ele e o Vicente Batalha - até ao Marquês de Pombal onde ele desapareceu tão depressa como tinha aparecido. À medida que o tempo passa, e salvo duas ou três honrosas excepções, os meus mortos são os meus melhores vivos. Pacheco tem a vantagem, sobre outros mortos-vivos, dos livros e da polémica. Com o seu desaparecimento, contudo, é um pouco mais do conformismo, da complacência e da mediocridade do "meio" que avança. Toda a morte é uma inutilidade. Com a do Pacheco, num país entregue ao pior postiço em todos os lados, a sensação de inutilidade aumenta. Ficamos só um pouco mais bovinos do que já estávamos.

«Eu não te vou ensinar, eu ensino-te é a combater o meio... o pá, um tipo que quer fazer carreira, se não for parvo de todo e for um bocadinho filho da puta... é facílimo... O meio literário é de cortar à faca, é muito fácil de penetrar. Eu, que nasci em Lisboa, via-os chegar da província, os Namoras, os Amândios César, os Paço d’Arcos, etc., andavam por aí a borbulhar, a deslizar, a ver quem chega primeiro. É como os espermatozóides. Agora combater o meio, isso é que é difícil, é o mais difícil... a questão é esta, estúpidos, conformistas, cobardes, é a maioria da malta...»

«O autêntico convívio resulta de nos pronunciarmos como somos, rigorosamente pessoais, cruelmente duros para os hesitantes e para os oportunistas (que são a maioria), sem respeitos humanos nem silêncios falaciosos.»

«...do velho Salazar, que também não era tão mal como isso... não era tão mal como isso... era péssimo, mas enfim... era péssimo, mas também não era como estes merdas que há agora...»

1 comentário:

ochoa disse...

Duro e frontal era como o Pacheco era. Conheci-o do convívio com livros pela uni verso ao nº 13 da rua do concelho em Setúbal. E sem medo de desancar cambadas. O Cândido Franco que publicou uns preciosos postalecos endereçados ao Raposão como ele chamava ao Raposo Nunes o mimou de «menino jesus»... Faz falta quem abane com acomodados escrivães «periodistas» como ele, Pacheco, os designava...
Encomenda após encomenda e romance após romance os novos júlios dantas da praça tudo têm e bem pagos são. Quem viva a escrita com ganas e raivosamente, morre. Paz, amigo!