27.8.11

UM POUCO DA MORTE


No Expresso, António Guerreiro chama a atenção para o futuro editorial da poesia. O mais recente "desenvolvimento" passou pela absorção da editora Assírio&Alvim pela "galáxia" Porto Editora. O termo é "protocolo de colaboração" mas a realidade é mais comezinha e infinitamente mais triste. A Assírio, como outras "assírios", «não consegue hoje sobreviver pelos seus próprios meios se o núcleo central do seu catálogo é a literatura portuguesa - mesmo que seja uma parte razoável do cânone do século XX.» E, ainda menos, quando esse núcleo central é a poesia geralmente vendida num catálogo a preços desmesurados. As afirmações de Vasco Teixeira, responsável editorial da Porto Editora, reproduzidas por Guerreiro são, nessa matéria, eloquentes: "se me perguntar se daqui a dez anos ainda se edita poesia em Portugal, dir-lhe-ei que não.» A poesia não se avalia ao quilo, ao metro ou na contabilidade de um editor. Mas, como escreveu Joaquim Manuel Magalhães em Rima Pobre, de 1999, a poesia enquanto "produto" está a sofrer o inevitável embate das "análises", das "classificações", dos "agrupamentos", de "tudo isso em que são sapientes as escolas, o cálculo dos críticos, os grupos de pressão, o manobrismo de alguns poetas afeitos a partidos e instituições que se pagam em autopromoções, o necessário comércio da editoras e, é claro, os jornais.» E a crise fatal. Chegou a hora de a Assírio&Alvim, uma das mais bonitas e inteligentes editoras nacionais. É um pouco da morte que, afinal, e no dizer de Magalhães, a poesia é.

5 comentários:

vasco disse...

No outro dia andei à procura da colectânea de Adília Lopes ("Dobra", creio que assim se chama). 40 e tal Euros. Repito: Qua-ren-ta e tal Eu-ros.

o tal leitor disse...

Tem toda a razão. E a Assírio não era só editora de excelente poesia,mas de obras de grande originalidade e certamente pouco populares,mas que mereciam edição portuguesa. Um desastre. Quanto à poesia,re-ouçamos o Charles Trenet,que as criaturas da "Porto Editora"evidentemente não sabem nem nunca saberão quem foi,cantar : "Longtemps,longtemps,longtemps / Après que les Poètes ont disparu". O longtemps é afinal agora,e cumpre ao dr. Gonçalves ir publicando peças como o excelente Raul de Carvalho de há dias,para que nem tudo fique perdido na estupidificação geral e metódica a que vamos assistindo.

floribundus disse...

há anos ao ler a Ilíada de Homero comprei
um livro que recomendo e que infelizmente perdi
H. Monsacré; Les larmes d'Achille

a poesia morreu de morte natural
ninguém se digna ler

Anónimo disse...

Com um milhão de euros de dívidas apesar de poetas e ensaístas da casa não verem um chavo de direitos de autor, saiu a sorte grande à Assírio ao ser comprada pela Porto Editora.

angelo ochoa disse...

...ESSA É QUE É A CAPA DA EDIÇÃO BILINGUE BRASILEIRA DOS 'CANTOS' DE EZRA QUE HEI FELIZMENTE E DE QUE EM TEMPO LHE FALEI, JOÃO GONÇALVES.