30.9.11

AS COISAS SÃO O QUE SÃO


«A informação hoje conhecida [desvio nas contas do primeiro semestre] é afectada de forma significativa, mas não determinante, pelas questões relativas às contas da Região Autónoma da Madeira. “A revisão [tendo em conta a Madeira] é da ordem dos 100 milhões de euros”, referiu, salientando que “o contributo da Região Autónoma da Madeira para esta informação nova do segundo trimestre é muito pequena”.» Em suma, «o problema da Execução orçamental em 2011 não se resume à Madeira, sendo que 80% do problema identificado tem uma origem diferente, como seja o aumento das despesas em remunerações certas e permanentes, despesas em bens e serviços e outras rubricas.»

Vítor Gaspar, 30.9.11

A CORAGEM NÃO É SELECTIVA

António José Seguro quer "coragem de ir ao fundo” e quer “apurar responsabilidades”. Concordo. Mas só se for para ir "ao fundo" de tudo e para apurar todas as responsabilidades. Não há coragem selectiva.

OS FORMADORES

Os mesmos patetas que vêm agora falar de "abismo" são exactamente os mesmos que "formaram", anos a fio, o abismo. Não adianta agora exibi-lo (está à vista de todos aqueles que não são intelectualmente desonestos ou simplesmente burros) mas, sim, tirar o país dele.

EXACTAMENTE

O que diz Manuela Ferreira Leite.

GALA, A OUTRA


«A RTP1 fez no domingo mais uma "gala". Chamou-se Amigos para Sempre. Foi mais ou menos assim: num ecrã gigante passavam bocadinhos, já vistos cinco mil vezes, de artistas e actores, dos anos 50 até ao passado recente; na sala, a plateia aplaudia os artistas nestes pedacinhos; um artista ou personalidade entrava em palco e recordava maravilhosos momentos e qualidades dos artistas ou actores mostrados no ecrã gigante; a plateia aplaudia a homenagem dos presentes aos passados; as intervenções eram entremeadas e interactivadas por duas grandes figuras da RTP actual, o apresentador de concursos e talk shows José Carlos Malato e a apresentadora de talk shows e concursos Sónia Araújo; cada um elogiava o outro; houve efusões de cloreto de sódio de uma ou outra lágrima furtiva. E assim começou e assim acabou a "gala". A "gala" intentava fazer a ponte das "novas gerações" para as antigas. Grupos de jovens na plateia, coitados, fizeram de cenário humano aplaudente. O programa exibiu a concepção de cultura vigente na RTP1. Só existe quem passou pela RTP, em programas ou em filmes canónicos dos anos dourados da comédia no tempo da ditadura. O mundo cultural, popular ou não, exterior a este paradigma cultural da RTP ficou oculto. A cultura RTP1 começa em João Villaret e acaba em Mariza. Tem os seus máximos expoentes nuns cinco segundos, de uma peça de teatro de hora e meia, em que Palmira Bastos diz que morre de pé, como as árvores, noutros tantos segundos de Villaret declamando/cantando "tocam os sinos na torre da igreja", Amália num fado, Ivone Silva num quadro de revista. Não vai mais longe do que onde chega a memória mais singela de qualquer pessoa que visse televisão nas últimas décadas. Sempre o mesmo modelo de cultura popular. Veio de Itália nos anos 60 para a RTP - e o modelo RAI vinga até hoje. Trouxe-o Luís Andrade, realizador que foi mais de uma vez director de Programas da RTP1, pai de Hugo Andrade, o actual director de Programas da RTP1, pai de Serenela Andrade, apresentadora da RTP, pai de Ricardo Andrade, responsável do canal RTP Memória, e irmão de Francisco Andrade, que foi também realizador da RTP. A "gala" convocou os jovens de hoje para uma evocação sem sentido, fora de contexto e sem qualquer substância, embrulhando-a num vazio absoluto, mais Malato do que Amélia Rey Colaço, mais Sónia Araújo do que Mário Viegas. Pelo palco do Tivoli passaram, como vultos, pessoas amáveis, uma ou outra comunicando em directo com o reino dos mortos congelados por trás de si no ecrã gigante. Eunice Muñoz, percebendo a natureza profunda da "gala", disse que em breve ela mesma juntar-se-á aos homenageados evocados a preto e branco. Ela sabe que haverá uma "gala". Um dos convocados a recordar os falecidos foi António Pedro Vasconcelos, cineasta e agora ex-comentador num desses programas de "serviço público" em que falam ou gritam adeptos de três dos clubes de futebol portugueses. Vasconcelos aproveitou o momento em que recordou Milu para defender a RTP contra "a privatização", a RTP que, disse, faz "galas" maravilhosas como aquela. Dias depois, o mesmo Vasconcelos anunciou que deixava o programa Trio de Ataque (RTPN), onde altos valores de "serviço público" ao seu clube o levaram a insultar o representante de outro clube, Rui Moreira, que abandonou de imediato e ao vivo o programa. Razões que adiantou para sair? Não quer que o acusem de defender o "tacho", agora que se prepara para uma cruzada nas ruas em defesa da RTP, EP, ameaçada de "privatização". Promete, se necessário, qual Martim Moniz, lançar as suas secas carnes e altura imensa para impedir que os mouros fechem o portão da RTP! Ora, antecipando-se ao Governo, que anunciou a privatização da concessão de um canal (e não da RTP), quem faz uns ameaços de fechar a RTP1 são as audiências. A "gala" em que Vasconcelos já anunciava o seu automartírio teve um share de 14,0%, num dia que foi para a RTP1 o segundo pior do ano. Em Setembro, a RTP1 está com a menor audiência do ano. O modelo Andrade & Andrade vai de "gala" em "gala" até ao dia em que terá mesmo um grande "galo".»

Eduardo Cintra Torres, Público

O PAÍS DAS ROLHAS


Ouvi esta manhã na rádio que há pelo menos um sector exportador onde as coisas correm bem. É na cortiça. Bate certo. Um país como este, capaz de produzir e manter tanta rolha em circulação, merece tamanho sucesso. Força.

O ESTADO, O CCB E O SR. COMENDADOR

Há mais de cinco anos, escrevi aqui o seguinte:

Homens da cepa do sr. comendador Berardo não são propriamente filantropos. Após anos a "ameaçar" levar a sua colecção privada daqui para fora, Berardo negociou com o actual governo a melhor forma - para ele, naturalmente - de isso não acontecer. Para tal, a ministra Pires de Lima teve de passar por sumários vexames públicos produzidos pelo sr. comendador - recordo, entre outros, o mimo de "saloia" - e sujeitar-se à intervenção directa do primeiro-ministro, presumivelmente através de Alexandre Melo, seu assessor para a cultura, para que o famoso "acordo" fosse assinado há dias. O Estado abjurou perante o sr. comendador e obrigou-se a "entrar" com cerca de 500 mil euros/ano para poder exibir as 863 peças que fazem parte da colecção, sem nenhuma certeza de que daqui a dez anos o sr. comendador não lhe apeteça, com a colecção já devidamente valorizada, desaparecer com ela para onde lhe aprouver. Mega Ferreira, o presidente do CCB, hipotecou, com o habitual gosto e alegria de bem servir que o caracteriza, parte significativa da estrutura do Centro para a instalação do "museu/fundação de arte moderna e contemporânea- colecção Berardo" de que este será presidente, com o óbvio direito a nomear e a despedir o respectivo director. Os argumentos utilizados pelo Estado para justificar este "acordo" seriam risíveis se não fossem trágicos. É evidente que não estão em causa, nem a qualidade da colecção Berardo, nem o seu "interesse" cultural. O que parece ser discutível são os termos do "acordo" para o "parceiro" Estado, ou seja, para os contribuintes que supostamente devem usufruir do acervo. Apesar dos beijinhos e abraços, não tenho a certeza de que o "interesse nacional" se tenha sobreposto aos interesses privados e legítimos do sr. comendador. Pelo contrário, penso até que Berardo conseguiu "meter" o governo no seu já vasto espólio, como um vulgar troféu de caça. O sr. comendador só dá um chouriço a quem lhe der um porco.

Parece que o Estado, finalmente, decidiu dar-se ao respeito e recolher o porco. Entretanto. entre 2007 e 2010. a coisa custou-lhe alegadamente cerca de 26 milhões de euros e só 2 ao comendador. Mas será apenas Berardo quem deve ser "encostado à parede"?

29.9.11

PRIMÁRIAS À DISTÂNCIA


Guterres aparentemente não disputará as "primárias" da esquerda para Belém, em 2016. António Costa e José Sócrates (sim, ele mesmo, aquele que está paulatinamente a "transitar em julgado" sem mexer uma palha) porventura estarão lá. À direita, Marcelo, Santana Lopes e Durão Barroso com certeza não falharão. Mais do que os nomes, seria bom que entretanto os vários pretendentes clarificassem o que pensam sobre o exercício político que a Constituição confere ao titular do cargo presidencial. Querem que o regime evolua ou não? Querem Belém para coroar a "carreira" e basta-lhes, por isso, o lado ornamental da coisa? O que é que pretendem de Belém?

MAIS VALE

Após a entrevista do PR de ontem, as televisões fizeram avançar um autêntico batalhão de comentadores (quando é que renovam o stock?). O narrador de Ravelstein, de Bellow, a páginas tantas afirma que gosta de dizer,«quando me perguntam se li o Finnegan, que o estou a guardar para a casa de repouso. Mais vale entrar na eternidade com Anna Livia Plurabelle do que com os Simpsons a asneirar no ecrã de TV.» Mais vale.

Adenda: Há, evidentemente, boas excepções. Quem tem métier, tem métier.

28.9.11

UMA NOITE COM O PRESIDENTE



O Chefe de Estado decidiu conceder uma entrevista a Judite de Sousa seis meses após o início do seu segundo mandato. Fez bem e fê-la bem. Explicou, como aliás tinha explicado perfeitamente em alocuções anteriores, o "estado da arte". Apesar de continuar a afirmar que os poderes do PR são os suficientes, Cavaco demonstrou, para lá da "palavra", que acompanha o sentimento político nacional. Quando a jornalista lhe perguntou se tinha contribuído para a mudança da situação política, o Presidente esclareceu que quem mudou a situação, em 5 de Junho, foi o eleitorado e não ele. É verdade. Como é verdade o que disse sobre a economia, as finanças, a emergência social, o difícil ano de 2012 e a Europa. Ou até sobre a Madeira, sem ter de se armar em "mata-mouros". Os tagarelas responsáveis ou cúmplices pelo "estado da arte" que levou o eleitorado a procurar a mudança de Junho presumivelmente não apreciaram. Zorrinho, esse confrangedor erro de casting de Seguro para o parlamento, sugeriu consonância do teor da entrevista com a maioria que elegeu Cavaco. Não ouviu o que o Presidente disse quanto à necessidade de o PS - que assinou, em nome de Portugal, o acordo com a Comissão Europeia e FMI - não se alhear das suas responsabilidades políticas nem ser afastado delas. Em suma, e depois dos Açores, Cavaco regressou em boa forma política à realidade independentemente da "opinião" das carpideiras que nunca o suportaram. Bem vindo.

O "CONTINENTE"

MRS. CLINTON


Foi sempre a minha preferida para a Casa Branca. E continua a ser.

VEMOS, OUVIMOS E LEMOS, NÃO PODEMOS IGNORAR

Leio na blogosfera - e não só - coisas deliciosas sobre a RTP. Régio: «há, nos olhos meus, ironias e cansaços.» E também as leio acertadas. Enquanto contribuinte, naturalmente.

27.9.11

ENQUANTO A ANA CRISTINA SE DELICIA COM PROFITEROLES*


A MÃO NO ARADO

Feliz aquele que administra sabiamente
a tristeza e aprende a distribuí-la pelos dias
Podem passar os meses e os anos nunca lhe faltará

Oh! como é triste envelhecer à porta
entretecer nas mãos um coração tardio
Oh! como é triste arriscar em humanos regressos
o equilíbrio azul das extremas manhãs do verão
ao longo do mar transbordante de nós
no demorado adeus da nossa condição
É triste no jardim a solidão do sol
vê-lo desde o rumor e as casas da cidade
até uma vaga promessa de rio
e a pequenina vida que se concede às unhas
Mais triste é termos de nascer e morrer
e haver árvores ao fim da rua

É triste ir pela vida como quem
regressa e entrar humildemente por engano pela morte dentro
É triste no outono concluir
que era o verão a única estação
Passou o solidário vento e não o conhecemos
e não soubemos ir até ao fundo da verdura
como rios que sabem onde encontrar o mar
e com que pontes com que ruas com que gentes com que montes conviver
através de palavras de uma água para sempre dita
Mas o mais triste é recordar os gestos de amanhã
Triste é comprar castanhas depois da tourada
entre o fumo e o domingo na tarde de novembro
e ter como futuro o asfalto e muita gente
e atrás a vida sem nenhuma infância
revendo tudo isto algum tempo depois
A tarde morre pelos dias fora
É muito triste andar por entre Deus ausente

Mas, ó poeta, administra a tristeza sabiamente


Ruy Belo

26.9.11

DOS GRAÚDOS AOS MAIS MIÚDOS


«Secret Story, jogos de futebol, as novelas Remédio Santo e Laços de Sangue, telejornais e a entrevista a Pedro Passos Coelho (28,3% de share, nono lugar da semana), ocuparam a lista dos dez programas mais visto, numa semana em que 80% dos portugueses seguiram nalgum momento emissões de televisão. No cabo a SIC Notícias continua sistematicamente o canal mais visto – os outros canais de informação estão longe – a RTP N vem em 8º lugar no top do cabo e a TVI 24 surge em 10º lugar. A seguir à SIC Notícias os mais vistos na semana passada foram AXN, Hollywood, Sport TV e Fox – os cinco magníficos do cabo que conquistam a atenção de mais portugueses – o sexto é o Panda, para os mais miúdos.»

Manuel Falcão, Lugares-Comuns

GRANDES PROSADORES DO SÉCULO XX PORTUGUÊS


Cardeal Cerejeira a António de Oliveira Salazar, no dia 27.4.61, dia de anos deste último (fonte: 1961 - O Ano Horrível de Salazar, de António Luís Marinho): «Escrevo-te neste dia, escolhido de Deus, para o teu grande destino. E não esqueço que há pouco tomaste resoluções de tal grandeza que excedem, me parece a mim, todas as que nestes trinta e três anos tens tomado. É Portugal que tomaste nas tuas mãos, contra o mundo.»

REVISÃO DA MATÉRIA

Boa medida, esta, de reestruturação do funcionamento dos serviços de finanças, mais conhecidos na opinião pública por repartições de finanças. Como é possível ter abertos serviços de finanças com apenas o chefe e o antigo tesoureiro, por exemplo? Ou manter um serviço, onde a segregação de funções é indispensável, com um só responsável pelo sector de cobrança, justamente o antigo tesoureiro?

FREQUENTAR OS ANTIGOS


«O problema com os gregos é que quase tudo o que se pode pensar, eles pensaram-no primeiro e muitas vezes melhor. É por isso que quem os frequenta, ou quem "vive" com eles (como a grande professora Maria Helena Rocha Pereira disse um dia), quase que não precisa de sair desses séculos de milagre, para poder pensar os atribulados dias de hoje. »

José Pacheco Pereira, Abrupto

NETREBKO



A Netrebko é a prova viva - o clip é do mês passado, em Berlim - que as melhores intérpretes de ópera não têm necessariamente de ser uns estafermos. O mesmo se diga de Kaufmann que recuperou, com sucesso, de uma intervenção cirúrgica recentíssima e delicada. Netrebko, aliás, abre hoje a temporada do Met de Nova Iorque com a sua extraordinária Anna Bolena. Passa cá, na Gulbenkian, a partir de lá, a 15 de Outubro.

25.9.11

AS COISAS SÃO O QUE SÃO

É por causa de títulos como o deste post que o Henrique Raposo nem sempre consegue ultrapassar o seuil das coisas e acaba ultrapassado por elas.

UM PESSIMISTA É UM OPTIMISTA BEM INFORMADO


«Optimismo e utopia em excesso geralmente acabam em nada ou, pior, dão em totalitarismo.»

Roger Scruton (via Pedro Correia no Forte Apache)

TRÂNSITO EM JULGADO

Marcelo, na tvi, lembrou - e bem - que a "semana madeirense" (e as que se vão seguir) como que fez transitar em julgado, aos olhos da opinião pública, as maleitas "socráticas". Em breve, se não já, Sócrates figurará na história política deste regime como mais um dos seus "heróis" porque foi descoberto, algures no Atlântico, um novo "vilão" sob o alto patrocínio de praticamente toda a gente e do gado vacum dos Açores. Se calhar está tudo bem assim e não podia ser de outra forma.

A CULPA DE UMA GERAÇÃO


«Perto dos 70 anos, no fim de um Verão em que Portugal deu de si um espectáculo triste, é a altura de perguntar o que a minha geração, que chegou à idade adulta com o "25 de Abril", fez da famosa liberdade tão esperada durante Salazar e Caetano. Para começar, e de acordo com alguns militares sem letras, tentou tudo para a suprimir. Com poucas excepções assistiu calada, ou mesmo se juntou, à louca procissão do PREC, em nome de uma doutrina que não percebia e de uma sociedade em que nunca aceitaria viver. Esta demissão e esta vergonha ficaram para sempre. A ausência do que tinha sido o movimento estudantil entre 1960 e 1974 no Governo e nos partidos entregou o poder a uma série de arrivistas, que não o tornaram a largar. Quem se perdera pelo grotesco labirinto da esquerda bem pensante por uns tempos desapareceu. O "cavaquismo", aliás, dispensava um pessoal democrático e até a política. Um vago resto do PS sobrevivia (bastante mal) à volta de Soares, que se conseguira eleger Presidente da República, e o que sobrava, disperso e desmoralizado, caíra numa absoluta irrelevância. Muita gente (de esquerda e de direita) emigrou, às vezes definitivamente, para a vida privada ou para a máxima sinecura da "Europa". O "novo" Portugal acabou por nascer e crescer à revelia da minha geração: no Estado, nos partidos, na sociedade. Não era o Portugal que tínhamos querido, nem sequer um Portugal de que pudéssemos gostar. A "história" passara por nós, confusamente, deixando uma prosperidade duvidosa e uma desordem íntima e eufórica, que nos repelia e a que, de qualquer maneira, não pertencíamos. O que veio a seguir - Guterres, Barroso, Santana - não melhorou as coisas. Fora dos partidos não havia nada e ninguém aos 50 ou 60 anos se iria meter na guerra sectária em que eles se gastavam. A posição "decente", e quase unânime, estava em não se meter nessa trapalhada, fosse sob que pretexto fosse. Até porque, no intervalo, uma invasão de oportunistas, com mais força e muitíssimo mais zelo, tapava a boca e o caminho ao mínimo sinal de responsabilidade ou de inteligência. O regime de Sócrates não emergiu por acaso; emergiu desta terra já bem preparada para a corrupção e o arbítrio. Nessa altura, a minha geração só servia para propósitos decorativos. Via e lamentava o desastre que se ia preparando. Mas raramente lhe ocorreu que ela própria também era culpada.»
Vasco Pulido Valente, Público

24.9.11

GRANDES RELEITURAS


Lido no original, na altura em que saiu, há mais de dez anos quando Bellow tinha oitenta e muitos. Altura para o reler, na tradução de Rui Zink para a Quetzal.

PORQUÊ?

«O Partido Socialista votou isolado na AR contra a iniciativa de criminalizar o enriquecimento ilícito dos titulares de cargos públicos. Porquê?»

Lourdes Féria, With Bubbles

AS REAIS POSSIBILIDADES

«O ex-director do FMI afirmou o óbvio, uma das artes contemporâneas mais esquecidas: a Grécia só honrará a parte da dívida que puder pagar.(...) Até aqui todo o mundo partia do axioma segundo o qual os credores sairiam plenamente ressarcidos dos seus empréstimos nos prazos e nas taxas de juro contratadas, e ninguém referia as reais possibilidades de pagamento dos países devedores. Strauss-Kahn deu esse passo. Esse foi o maior testemunho de que um dia voltará aos ‘affaires’.»

Medeiros Ferreia, CM

O IMPERFEITO DO PRESENTE

A visita aos Açores não vai ficar seguramente para a história como um dos melhores momentos do segundo mandato de Cavaco Silva. Poderia, aliás, ser uma frase de um livro que provavelmente não escreverei - na versão de Wittgenstein corresponderia mais ou menos a "tudo o que não escrevi" - e que usurparia o título a Alain Finkielkraut, o imperfeito do presente. Outras frases desse não livro irão, com toda a probabilidade da incerteza, continuar a aparecer.

23.9.11

RUÍNAS


Estava a ler este post de José Paulo Fafe sobre a ruína do Savoy do Funchal e ocorreu-me que tinha estado numa daquelas varandas de um daqueles quartos. E que tinha jantado no Savoy, antes, com um grupo de amigos, no final dos anos 90, altura em que éramos todos vivos. De corpo e alma. A cupidez bronca tudo destruiu entretanto: amizades, corpos, almas, vidas, o hotel. À ruína puramente física, junta-se agora a ruína de tudo. Henry Miller tinha de facto razão ao falar de Proust assim: «Proust, no seu clássico afastamento da vida, é o próprio símbolo do artista moderno - o gigante doente que se encerra numa cela revestida de cortiça para separar os seus miolos.» De vez em quando é preciso parar, mesmo sem génio ou gigantismo alguns, para "separar os miolos". Ou seja, para afastar da vida.

«A DECADÊNCIA DO OCIDENTE»


«Medina Carreira, uma das pessoas que hoje vale a pena ouvir em Portugal, anunciou na TVI a decadência económica do Ocidente (ou seja, da Europa e da América). A decadência do Ocidente tem sido anunciada muitas vezes, mas Medina Carreira foi inquietante. O retrato de um velho mundo, que progressivamente produz menos, gasta mais e, ainda por cima, se endividou sem peso nem medida para conforto e sossego de uma população indiferente, não é reconfortante e não autoriza uma visão muito optimista do futuro. Quando se olham as coisas de longe, os pequenos problemas portugueses parecem, como de resto são, parte de uma mudança histórica radical e fica o sentimento de que nada nos poupará a uma catástrofe inevitável e merecida. Não vale a pena discutir, ou "explicar", os números de Medina Carreira. Vale a pena pensar se, além dos números, não há outros sintomas das desgraças que ele nos profetiza. O colapso do império soviético mudou um equilíbrio de 30 anos. Verdade que esse equilíbrio assentava no condomínio quase universal da América e da URSS. De qualquer maneira, a Guerra Fria, embora com um ou outro sobressalto, e milhões de vítimas "passivas", permitiu o estabelecimento de uma certa "ordem" e uma previsibilidade, que não existia desde o fim do século XVIII. A Inglaterra desaparecera como potência hegemónica e, excepto pela aventura napoleónica, a França também. A Alemanha, do princípio agressiva, tinha ambições para que não tinha meios. Quanto à Rússia, a fraqueza interna não lhe permitia uma intervenção externa decisiva. E a América, como se constatou, persistiu, de facto, no seu isolacionismo até 1941. Restava o "concerto das nações", como se dizia, um jogo frágil, sempre em risco de acabar mal, se um dos parceiros resolvesse não respeitar as regras. A situação de hoje, a que se chama "globalização", é uma espécie de regresso ao "concerto das nações". Na ausência de um "centro" e de uma autoridade indiscutível (como, por exemplo, a América e a URSS, cada uma na sua "esfera"), o mundo está dividido em potências de vário porte e alcance, que tentam adquirir vantagens próprias, sem forma de restrição ou responsabilidade global. A Europa, com união ou sem união, deixou de contar. A América, crescentemente mais débil, tenta dissolver com mansidão o seu antigo papel de polícia ideológico e militar de uma democracia imaginária. Longe da sua velha superioridade, e da sua velha arrogância, o Ocidente, que se refugiou em palavras, está em decadência. Politicamente, em decadência. »

Vasco Pulido Valente, Público

O PAU QUE BATE

«Não haja dúvidas de que aquilo que se verificou nas contas públicas da Madeira é reprovável. Vale no entanto a pena perguntar se é muito diferente do que se faz no país em geral. No essencial, o que o Governo regional fez foi gastar sem orçamentar. Mas, vendo bem, o que significa então a sistemática suborçamentação do Serviço Nacional de Saúde? No início de todos os anos é-lhe atribuído um orçamento. No final, esse orçamento é ultrapassado em muito, tendo de ser coberto com receita futura. O que representam as Parcerias Público-Privadas senão gastos não orçamentados que terão de ser pagos depois? O que é a miríade de empresas públicas e fundações cujo único propósito é desorçamentar, isto é, retirar gastos do orçamento agora, reaparecendo mais tarde sob outras formas? Acresce que Alberto João Jardim governou como toda a gente governou em Portugal: grandes projectos, muitas estradas e despesa social - a Madeira tem bons serviços de Educação e Saúde. Este pau que bate na Madeira é, afinal, muito carunchoso.»

Luciano Amaral, CM

22.9.11

COISA DE BÁRBAROS

É mais ou menos isto.

UM BOCADINHO DE DECORO

Pelas contas do DN, trinta "figuras de topo" do regime foram a seu tempo, e sucessivamente, informadas sobre a Madeira, a pira conveniente para onde - desde a última vaca dos Açores ao primeiro taxista especado no aeroporto de Lisboa - se tem estado agora a atirar todo o lixo acumulado em décadas de incúria colectiva e de impunidade cúmplice. Confesso que sou pouco dado a espíritos de manada sobretudo quando ela integra muitos dos responsáveis morais ou materiais pela referida impunidade. Aliás, gostava de ver a mesma "indignação" manifestar-se a propósito de coisas como as PPP's, as empresas públicas, as fundações, os institutos, as "agências", etc., etc. ou das próximas "surpresas", É só, de facto, fazer as contas e rezar menos o terço do moralismo de ocasião. É fácil atirar a honra das pessoas aos cães, como afirmou Mitterrand num outro contexto. Aliás, isto funciona mais ou menos como uma declinação da "trama" da Os Maias, de Eça. Não era tanto a circunstância de os irmãos dormirem um com o outro como o facto de se saber que dormiam que importava. Ou seja, podiam dormir desde que não se soubesse. Não venham depois dizer, na noite de 9 de Outubro, aquando da derradeira vitória de Jardim, que afinal somos todos madeirenses. Haja então, já que ululantemente o exigem, um bocadinho de decoro.

ORAÇÃO DA NOITE* PELA EUROPA

«Na contramão dos nacionalismos, o recrudescer dos acenos centrípetos quanto a um federalismo inconsistente e artificial de mera matriz financeira só pode ser inquietante. A Europa não está preparada para ser federal a curto ou médio prazo. Não se pode querer impor um federalismo que acarretaria inevitavelmente a hegemonia política, económica e financeira dos países mais fortes sobre os mais fracos.Uma onda de pessimismo abate-se sobre a opinião pública com grande violência e tem uma inevitável repercussão inibitória. Não sabemos para onde vamos. Dir-se-ia que a Europa já não acredita em si mesma, que os estados membros já não acreditam nem nela, nem uns nos outros, que o mundo já não acredita na Europa, que ninguém confia em ninguém e que todos se vão reciprocamente entravando e paralisando, já que não conseguem fazer mais nada. Para tornar as coisas ainda piores, os estados pequenos não conseguem concertar-se para tomar iniciativas próprias e ficam na dependência mais ou menos servil daquilo que resolverem os grandes. Ora não nos convém mesmo nada que uma Europa à beira do falhanço se torne desde já uma Europa da descrença. Como diria Victor Hugo, "ceci tuera cela".»

Vasco Graça Moura, DN


*Poema de Rimbaud:

Vivo sentado, como um anjo nas mãos de um barbeiro,
Empunhando uma caneca de estrias profundas,
Com o hipogastro e o colarinho arqueados, um Gambrier
Entre dentes, numa atmosfera prenhe de impalpáveis veleiros.

Como se fossem excrementos quentes de um velho pombal,
Mil Sonhos cavam em mim doces queimaduras:
Logo depois o meu coração triste fica como um alburno
Que o ouro jovem e sombrio das cores ensanguenta.

Em seguida, quando já engoli meus sonhos cuidadosamente,
Volto-me, com trinta ou quarenta cervejas no papo,
E concentro-me para fazer as minhas necessidades ásperas:

Doce como o Senhor do cedro e do hissopo,
Mijo para os céus castanhos, muito alto e muito longe,
Com a concordância dos grandes heliotrópios.

(trad. de Maria Gabriela Llansol, tão discutível como, por exemplo, as de Cesariny: agora é preciso explicar tudo porque, até na poesia, a patrulhice não falha)

21.9.11

O CADÁVER EM FÉRIAS


Francisco José Viegas apresentou o "plano" para a secretaria de Estado que dirige, a da Cultura. O antigo ministério há muitos anos que pouco mais era do que um cadáver em férias. Um cadáver que albergava uma ruidosa burocracia que praticamente todos os ministros, depois de Carrilho, não souberam ou não quiseram atalhar. O tempo, esse grande escultor, dará ou não razão a este "plano". Ao que estava - nenhum - de certeza não deu.

POR OUTRO LADO

O Miguel Castelo-Branco, no Combustões.

PARA AS NÃO SENHORAS QUE SABEM PERFEITAMENTE QUEM SÃO

«Certa vez, uma senhora criticou severamente Evelyn Waugh: acusou-o de dizer «coisas horríveis», coisas que ela achava incompatíveis com o catolicismo que ele professava. Waugh respondeu: «Madam, I may be all the things you say. But believe me, were it not for my religion, I would scarcely be a human being».»

Pedro Mexia

20.9.11

«SOMOS RAPARIGAS DO CAMPO»


«Cada día convivimos más con el ruido de fondo de crisis económicas, invasiones de países árabes, sorpresas de grandes gigantes farmacéuticos, reclamos de la industria del automóvil, tortugas Ninja, crímenes horrendos, pavorosos terremotos devastadores, bolsas europeas que caen y caen y vuelven a caer, episodios de estupidez humana transmitidos día tras día como si fueran una serie televisiva sin guionista. En semejante ambiente nuestra agitada vida de víctimas de lo mediático nos recuerda a un fragmento irónico de El caballero inexistente de Italo Calvino: “Debéis disculpar: somos muchachas del campo (...) fuera de funciones religiosas, triduos, novenas, trabajos en el campo, trillas, vendimias, fustigaciones de siervos, incestos, incendios, ahorcamientos, invasiones de ejércitos, saqueos, violaciones, pestilencias, no hemos visto nada.”

Enrique Vila-Matas

19.9.11

INSUSPEITA

Contrariamente à minha pessoa, a Lourdes Féria.

AS COISAS SÃO O QUE SÃO

No meio do ruído, um post sereno do Fernando Martins. «Nada pior poderá acontecer (embora já esteja a acontecer), económica e politicamente, para a Madeira, para Portugal, para Europa e, já agora para o mundo, do que andar por aí a fomentar egoísmos mascarados de seriedade, de eficiência e até de xenofobia, mas que na verdade não passam de estrénuos sintomas de esperteza saloia típicos de cabeças que estão convencidas que o mundo não só começou ontem, como, e sobretudo, não é como é mas sim como devia ser.»

FALTA-ME VER PARIS CONTIGO DENTRO


Vi Roma a arder, e neros vários
bronzeados à luz da califórnia
guardar em naftalina nos armários
timidamente, a lira babilónia;
as capitais da terra, uma a uma,
desfeitas em nuvem e negra espuma,
atingidas de noite no seu centro;
mas nunca vi paris contigo dentro.
E falta-me esta imagem para ter
inteiro o álbum que me coube em sorte
como um cinema onde passava «a morte»;
solene imperador, abrindo o manto
onde ocultei a cólera e o pranto,
falta-me ver paris contigo dentro.


António Franco Alexandre

Não ficava mal a Woddy Allen conhecer estes versos de AFA. Midnight in Paris é um curto repositório de referências literárias e pictóricas à conta de um protagonista literato com cara de parvo e, sabe-se no fim, vagamente corno. Quem gosta de Paris, gostará de a rever na versão Allen. Quem gosta dos autores e dos pintores que "aparecem" invariavelmente depois da meia-noite ao imberbe literato decerto não ficará satisfeito. Mas é como reza o verso de Franco Alexandre (e, creiam-me, sou um "especialista" contumaz em parafrasear o verso), «falta-me ver paris contigo dentro.»

A BRUTA EVIDÊNCIA

18.9.11

JÁ NÃO TER VINTE ANOS



Sérgio Godinho é um dos poucos cantores (e letristas) nacionais que está no meu "gosto" musical desde muito cedo. Tenho, em vinil, o seu primeiro disco, Os Sobreviventes. E tenho, por exemplo, a memória do "disseram-me um dia, Rita (põe-te em guarda)" do Kilas, de Fonseca e Costa, e de outras canções à volta de Lisboa. Godinho é um momento especial da história da chamada "música popular portuguesesa" por causa da inteligente e irónica aristocracia da sua música e dos seus versos. «Quando se tem 60 e tantos anos, dois ou três anos não têm importância. O que tem importância é já não ter os 20», diz ele numa entrevista a propósito do último trabalho, Mútuo Consentimento. Mas todos os seus versos - e grande parte da sua música - não serão, afinal, o lastro vital dessa infâmia infinita que «é já não ter vinte anos»?

A GRAÇA SOCIAL

O dr. Paulo Pedroso tem todo o direito do mundo à sua privativa "indignação" relativamente ao senhor reitor da UCP. Presumo que se refere a Manuel Braga da Cruz. No meu tempo era reitor o agora D. José Policarpo que, em certo sentido, também pode suscitar "indignações" em alguns católicos opostos às crenças do dr. Pedroso (crenças aqui no sentido que lhe atribui a filosofia pragmatista). Mas, como escreve hoje no Público o antigo docente da referida Universidade Católica, Vasco Pulido Valente, «a gente que, em 1975, destruiu alegremente a economia não sofreu o menor incómodo pessoal ou profissional; e a gente que proclamava pelas ruas a necessidade de "fuzilar a reacção" e de estabelecer rapidamente uma ditadura do PC acabou em Belém a receber a Ordem da "Liberdade" das mãos de Soares» pelo que «mesmo hoje, um passado "revolucionário" se considera uma recomendação e até uma espécie de graça social.» Considere a coisa assim e fica mais consolado.

EVIDÊNCIA



«Desde o PREC que a impunidade tem distinguido a política portuguesa» (VPV, Público). O resto é como diz a Helena Matos, uma falta generalizada de "vergonha sem perdão."

17.9.11

MUDANÇA DE VIDA OU NÃO

«Valerá a pena ir contra o pensamento mágico e explicar, mais uma vez, que não há maneiras fáceis de evitar o empobrecimento, nem alternativa à mudança de vida? »

Rui Ramos, Expresso

TESTE DE MASCULINIDADE



Passa no canal Hollywood, às 21.30, este filme de Frank Oz, de 1997, In & Out. Imperdíveis o do clip, Kevin Kline, Joan Cusack, Tom Selleck e Debbie Reynolds. E o texto.

«ANNOUNCER:
Welcome to our series... on exploring your masculinity. This is audio tape number one...
"Getting a Grip. Are you dressed in suitably masculine attire?
HOWARD: Very.
- Are you in control?
- Yes.
ANNOUNCER: Are you ready to take charge? Are you a man?
HOWARD: Yes!
ANNOUNCER: Stand up. Stand straight and tall. Excuse me, are we a little teapot? Untuck your shirt. Just one side.
HOWARD: Ohh.
ANNOUNCER: You hate this, don't you?
HOWARD: Look at it!
ANNOUNCER: You want to be neat. You want to be tidy. Adjust yourself. Not there. The package, sissy man. The family jewels.Grab 'em.
HOWARD: Mmm.
- You're in a barroom.
- OK.
ANNOUNCER: Repeat after me.
- "Yo."
- Yo!
- "Hot damn."
- Hot damn!
ANNOUNCER: "What a fabulous window treatment."
- What a fabulous...
- That was a trick.
HOWARD: Oh! Damn!
ANNOUNCER: We've come to the most critical area... of masculine behavior.
HOWARD: What?
ANNOUNCER: Dancing.
HOWARD: Dancing.
ANNOUNCER: Truly manly men do not dance.
HOWARD: Oh, come on!
ANNOUNCER: Under any circumstances. This will be your ultimate test. At all costs avoid rhythm, grace and pleasure. Whatever you do, do not dance.
HOWARD: I won't!
ANNOUNCER: Can you hear it?
HOWARD: Yes.
ANNOUNCER: Can you hear the demon? "Dance," the demon whispers. Everyone else is dancing. They're getting down. They're getting funky now. They're having fun!
- Not you!
- No.
ANNOUNCER: Catch the fever. Feel the heat of the disco beat. It's calling to you. Do not listen! Men do not dance. They work, they drink, they have bad backs. They do not dance. Hold still. Hold tight. Whatever you do, do not dance!
ANNOUNCER: What are you doing?! Stop dancing, you big ballerina! Stop waving those hands! Aren't you listening, you pantywaist? Stop it! Stop shaking that booty! Be a man! Kick someone! Punch someone! Bite someone's ear! Stop it! Get a grip! Think about John Wayne. Arnold Schwarzenegger. Arnold doesn't dance! He can barely walk! Stop it! Stop it! Just stop dancing! So how did you do, pussy boy?»

UM ROSSINI POUCO CONHECIDO




Rossini, L'Assedio Di Corinto. Montserrat Caballé e Katia Ricciarelli.

DO TEIXEIRISMO AO GARCISMO


Percebe-se o argumentário mas, quer num caso quer no outro, não há grande margem de tolerância. Aquela trivialidade de não haver dinheiro é mesmo e só não haver dinheiro. Não há "contabilidade" mais ou menos criativa que escape a esta bruta evidência, venha ela de professores universitários do Porto ou de antigos funcionários dos impostos regionais.

16.9.11

EM POUCAS PALAVRAS

«Não deixa de ser pertinente que seja um Governo do PSD a revelar o descalabro financeiro escondido da Madeira. Revela uma independência rara neste país.»

Maria Teixeira Alves, Corta-Fitas

SER OU NÃO SER

Uma boa notícia. Não tem nada a ver com ser mais ou menos "liberal". Tem a ver apenas com ser sério ou em optar por não ser: ambas as hipóteses respeitam adequadamente a "liberdade de escolha". Perante si e diante da sociedade, coisa de deveres e de direitos de cidadania. E o ónus da prova, dr. Pacheco, fica por conta de quem detém a acção penal, sem ambiguidades legais ou constitucionais.

A FALÁCIA


Independentemente das atitudes oficiais, este blogue (o seu autor) tem uma opinião acerca do Acordo Ortográfico. Não tenciona escrever uma linha que seja ao seu abrigo (em caso de extrema necessidade, procuro quem "traduza"). E encontra num texto de Fernando Venâncio, publicado na revista Ler, basta e criteriosa informação técnica e histórica para fundamentar a sua oposição a esta falácia. Um leitor, Octávio Santos, enviou-me ontem um mail do qual extraí o seguinte: «Hoje tive a primeira reunião de turma da minha filha mais nova, e disse à professora... aquilo que ela já sabia: o que ela ensinar à Adriana pela «via acordista» eu, depois, corrijo. O que, aliás, já aconteceu hoje, primeiro dia de aulas: ela disse às crianças que agora os meses e as estações do ano se escrevem (primeira letra) em minúsculas... e eu instruí a minha garota quanto à forma correcta. Practicamente* todos os outros pais e EE's concordam comigo. Ficou a ideia de marcar uma outra reunião, com outras professoras, incluindo a responsável principal, do agrupamento em que a escola dela se insere. Mas esta é uma guerra que se afigura muito difícil...» É, de facto, difícil. Porque, como escreve Venâncio, «mesmo que agora, sensatamente, os políticos portugueses desactivem um processo ainda perfeitamente reversível, o primado da «pronúncia» (que ninguém questionou) está doravante firmado nos juízos e procedimentos da nossa grafia.» E continua. «No Brasil, uma nova geração de linguistas apresta-se a tomar as rédeas. Ela vai já quebrando tabus morfológicos e sintácticos, e quebrará os ortográficos também. As várias pronúncias "cultas" em território brasileiro não escondem um vasto âmbito de uniformidade sonora, mormente em contraste com Portugal. Um dia, essa considerável uniformidade vai, sobretudo no âmbito das consoantes, reclamar a adequação gráfica que a etimologia e a tradição lhe sonegaram, e não é a pronúncia portuguesa, mesmo culta, que irá estorvar tal anseio. os portugueses e outros "irmãos de língua" encontrarão aí um venturoso estímulo. E pronto. Lançada esta promissora semente, e devidamente agradecidos os nossos aprendizes de feiticeiro, pode o infeliz e falacioso Acordo entrar agora, tranquilo, no esquecimento.»

*no original

A PESADÍSSIMA CARGA

«O congresso do PS e a intervenção na Assembleia da República de quinta-feira passada mostraram o verdadeiro Seguro. Um homem que repete de cor uma cartilha programática obsoleta; que não pára de garantir a unidade de um partido que ninguém pensa em dividir; que berra e estica o dedo para se fazer importante; e que não convence o mais plástico português. Claro que Seguro (e seu PS) se dispensaram de abrir a boca sobre o consulado de Sócrates, que os compromete pessoal e colectivamente. Mas não compreenderam que, se não se aliviarem dessa pesadíssima carga, só lhes fica o vácuo.»

Vasco Pulido Valente, Público

DESVENTURAS DE BOAVENTURA

«"Só o Estado garante direitos", defendeu recentemente um dos "papas" de serviço, o sociólogo Boaventura Sousa Santos, numa entrevista ao PÚBLICO. Se o Estado se ausenta, ou se distancia, deixamos de ter "direitos" para ter meramente "carências": "Os agentes privados não actuam com base em critérios de cidadania", proclamou Sousa Santos, "actuam com base em critérios de carência". Devo dizer que me escapa a subtileza da diferença. Pior: olho para as organizações que, no terreno, com muitos voluntários, se empenham para acudir às aflições dos seus concidadãos e vejo nelas uma manifestação superior de cidadania. Os seus dirigentes, os seus trabalhadores, os que a elas dedicam os tempos que roubam a outras actividades, não olham para a cidadania como uma obrigação que se exerce apenas quando se deposita o voto, mas fazem questão de participar e ajudar. Claro que o fazem da melhor forma que sabem e podem, porventura sem tomarem antes conhecimento do último decreto-lei, e isso será, para o douto professor de Coimbra, algo lamentável: afinal essas organizações não estão sujeitas "ao controlo democrático dos cidadãos e do Parlamento." Boaventura teve, porém, a frontalidade de confessar o que lhe dói realmente: "a presença maciça da Igreja Católica nas IPSS", algo que, não podendo proibir ou evitar, constitui para ele "um factor adicional de anticidadania". Não tivesse eu lido estas palavras, assim tal e qual, e não acreditaria. Ao lê-las, compreendo melhor a fúria dos que, no Parlamento, se afirmam de esquerda. O problema deles não são os pobres, com que tantas vezes enchem a boca: o problema deles é que não concebem outra forma de promover o bem comum que não seja através do Estado. Os cidadãos, para eles, não existem, a não ser como eleitores ou manifestantes, pois é-lhes inconcebível a ideia de que as pessoas se possam juntar para resolver problemas de todos sem a supervisão de um qualquer "comissário político."»

José Manuel Fernandes, Público

15.9.11

O ÍMPETO DA LIBERDADE QUE TUDO ARRASA


A um preço bastante inferior ao que a edição mais recente custa, o Público lançou hoje O Físico Prodigioso, de Jorge de Sena, obra em prosa "em estrutura de novela", cuja emergência é contada na "pequena nota introdutória" do Autor. «O Físico Prodigioso, ao que posso deduzir da fé que tenho nele e que outros igualmente têm tido, sabe perfeitamente viver ou morrer (para mais viver) inteiramente por si mesmo, sustentado pela força do amor que tudo manda, e pelo ímpeto da liberdade que tudo arrasa.»

O CONGREGADOR FIRME


Joseph Ratzinger é, cada vez mais, uma das personagens internacionais mais estimulantes deste ainda tão precário século XXI tão parco delas.

14.9.11

MATTILA



Canta sábado no Grande Auditório da Gulbenkian em Lisboa. No clip, Karita Mattila no Teatro Colón de Buenos Aires. Verdi, Simon Boccanegra.

UMA LIÇÃO E UM AVISO CUMPRIDOS


Sei perfeitamente que isto é de uma incorrecção política a toda a prova. Mas há muito tempo que não via a zona de Benfica tão "cercada" por automóveis estacionados nos locais mais inverosímeis por causa da bola. E, sobretudo, por tantos automóveis. Em Março de 1995, Pulido Valente prodigalizava - precisamente numa medonha quarta-feira "europeia" (que ironia, esta adjectivação) - «sob a ameaça de ser cercado por uns milhares de fanáticos e não poder sair para um jantar irresponsavelmente combinado para esta noite (eu regressava pacatamente para o meu, em casa)». Terminava com uma "lição"e um "aviso". Lição: «o futebol anuncia o futuro.» Aviso: «a «Europa» e o mundo levarão a nata e nós ficaremos com as sobras.» Anunciou. E levaram.

DISPONIBILIDADE SOCIAL

GATO POR LEBRE

Pessoas com o currículo político e académico de Medeiros Ferreira não deviam acreditar no Pai Natal. E então com origens "revolucionárias institucionais" ainda menos.

13.9.11

DA MEDITAÇÃO EUROPEIA OU DA FALTA DELA

Retire-se do texto o que exclusivamente - como se agora, na Europa, houvesse o "exclusivamente" - diz respeito à França, e medite-se. Julgo que não se medita o suficiente sobre isto que, no fundo, é o fundamental: «personne ne réfléchit assez au scénario du pire; comme s’il suffisait, pour le conjurer, de ne pas y penser.»

A PRIORIDADE

O dr. Jardim não terá mais nada que o apoquente?

GOODBYE

Uma boa notícia.

ME TOO

Fonte: Lei Seca

O EFEITO

Gato por lebre.

12.9.11

SERVIÇO PÚBLICO



Às segundas, no canal Foxlife. Oito episódios. «It's not what you are - it's what people think you are.»

RECOMEÇAR

Do Torquato da Luz, um querido Amigo e "velho" Reformador dos idos de 79, a quem não consigo arrancar as memórias. E que memória.

Vontade de partir, de largar tudo,
de acordar amanhã num hotel em Veneza,
de esquecer o passado, o futuro, o mundo
e baralhar as cartas expostas na mesa.

Vontade de zarpar, de abandonar
as mínimas coisas algum dia amadas
e procurar no mapa das estradas
o que teima em faltar.

Vontade de abalar sem um aceno
sequer de despedida
e de um modo expedito mas sereno
recomeçar a vida.

O GRÃO E A MISTURA

Sou católico. Até por isso, esta mistura de betão, política e religião irrita-me. O mais pequeno grão de que fala Ratzinger com certeza não precisava do "apoio" de 2,6 milhões de euros dos contribuintes para florescer. Por natureza, floresce em qualquer lado onde haja fé.

O "RESPALDO"


Li num blogue de um nostálgico da Rua da Sofia que o governo não tem o "respaldo dos intelectuais". Para a criatura, o imprimatur tremido ou nulo de determinadas eminências do PSD é uma fraqueza lamentável que se traduz, precisamente, na ausência do dito "respaldo". Esta tese assenta num equívoco antigo. Para não irmos mais longe, começou com a emergência do "camponês de Boliqueime" - o "tipo" ou o "gajo" na versão socialista, laica, republicana e ternurenta do dr. Soares - que nunca passou no "crivo" de algumas "elites" do regime, quase todas invariavelmente filhas espúrias da "extremo-esquerdice" que atacou muito filho da média e grande burguesias a partir, sobretudo, dos anos 60. A sobranceria esquerdina propriamente dita teve o seu apogeu naquele inesquecível friso de perninhas a dar a dar, sentadas no muro da cidade universitária de Lisboa em 1962, do qual brotou, por exemplo, o sempre extraordinário Jorge Sampaio. Sá Carneiro, aliás, foi logo desprezado em 1975, no congresso de Aveiro, pelos mesmos que, pelo caminho, se aliaram ao PS ou ficaram pelo então PPD a ressumar ser de "esquerda" ou de "esperanças" velhas ou novas, acabando todos por se diluir na mesma e uma amálgama mediática. De facto, o regime, graças às televisões, deu visibilidade a esta vastíssima parafernália de "intelectuais", reais ou fraudulentos. E eles passaram a ditar as regras da "selecção natural" e a passar "atestados". Salvo raras excepções, quando alguns desses "intelectuais" foram a votos, o desastre surpreendeu-os invariavelmente. Em trinta e muitos anos de regime, tivemos - e temos - "intelectuais" para todos os gostos e feitios. Tal como temos políticos que ganharam eleições apesar de muitos desses "intelectuais" os fadarem à desgraça e à humilhação. Foi assim com Sá Carneiro em 75 e 79, com Soares em 75, 83 e 86, com Eanes em 80, com Cavaco anos a fio, com Sócrates em 2009 ou com Passos em Junho último. As elites deste regime são uma coisa que passa pelos rodapés das televisões e pouco mais. Como "respaldo", chega e sobra.

11.9.11

UM CRETINO É UM CRETINO


Para não passar tantas vezes por basbaque, o dr. Barroso, presidente da Comissão Europeia, devia convidar o cretino da foto a pedir a demissão.

A COISA NÃO ACABOU


«Na própria noite de 11 algumas vozes sugeriram que se aproveitasse a "oportunidade" para uma limpeza drástica aos países que apoiavam, ou pareciam apoiar o islamismo radical; e um grupo no Governo que o vice-presidente e o secretário da Defesa apoiavam conseguiu impor esta catastrófica tese. Daqui nasceu a invasão do Iraque, sem um objectivo claro e com o propósito confuso de converter à democracia uma sociedade (se merece o nome) tribal, que não se via como nação e que, ainda por cima, quase tudo dividia: a religião, a origem étnica, a cultura, as ligações com regiões limítrofes. Com a cumplicidade de Tony Blair, Bush (um homem pouco dado à geografia e à história) inventou um perigo onde não havia naquela altura perigo algum e marchou triunfante para o desastre. Hoje, a aventura do Iraque alastrou, com a ajuda de Obama, para o Afeganistão e o Paquistão (e não tardará também para a Índia) e a Al-Qaeda, embora com menos liberdade de movimentos, permanece uma ameaça para o Ocidente inteiro. O 11 de Setembro não acabou.»

Vasco Pulido Valente, Público

10.9.11

NÃO ANDAMOS MAIS FELIZES


«Algo me escapa: o fascínio pela legislação da Esquerda. O Estado que tudo controla. O que se come, o que se bebe, o que se fuma… A vida privada cada vez mais enredada em regras, normas, artigos, regulamentos e adendas. Algures pelo mundo, burocratas paranóicos vão ajustando a realidade aos seus delírios — dos babás ao rum que já não podem levar rum, às colheres de pau que passaram a ser de plástico. Interrogamo-nos: que raio de tipos serão estes que se lembram de criar leis sobre tais coisas? O resultado está à vista: não andamos mais felizes.»

Ana Cristina Leonardo, Meditação na Pastelaria

NOUTROS LUGARES


Não é que ser possível ser feliz acabe,
quando se aprende a sê-lo com bem pouco.
Ou que não mais saibamos repetir o gesto
que mais prazer nos dá, ou que daria
a outrem um prazer irresistível. Não:
o tempo nos afina e nos apura:
faríamos o gesto com infinda ciência.
Não é que passem as pessoas, quando
o nosso pouco é feito da passagem delas.
Nem é também que ao jovem seja dado
o que a mais velhos se recusa. Não.

É que os lugares acabam. Ou ainda antes
de serem destruídos, as pessoas somem,
e não mais voltam onde parecia
que elas ou outras voltariam sempre
por toda a eternidade. Mas não voltam,
desviadas por razões ou por razão nenhuma.

É que as maneiras, modos, circunstâncias
mudam. Desertas ficam praias que brilhavam
não de água ou sol mas solta juventude.
As ruas rasgam casas onde leitos
já frios e lavados não rangiam mais.
E portas encostadas só se abrem sobre
a treva que nenhuma sombra aquece.

O modo como tínhamos ou víamos,
em que com tempo o gesto sempre o mesmo
faríamos com ciência refinada e sábia
(o mesmo gesto que seria útil,
se o modo e a circunstância persistissem),
tornou-se sem sentido e sem lugar.

Os outros passam, tocam-se, separam-se,
exactamente como dantes. Mas
aonde e como? Aonde e como? Quando?
Em que praias, que ruas, casas, e quais leitos,
a que horas do dia ou da noite, não sei.
Apenas sei que as circunstâncias mudam
e que os lugares acabam. E que a gente
não volta ou não repete, e sem razão, o que
só por acaso era a razão dos outros.

Se do que vi ou tive uma saudade sinto,
feita de raiva e do vazio gélido,
não é saudade, não. Mas muito apenas
o horror de não saber como se sabe agora
o mesmo que aprendi. E a solidão
de tudo ser igual doutra maneira.
E o medo de que a vida seja isto:
um hábito quebrado que se não reata,
senão noutros lugares que não conheço.

Jorge de Sena, Poesia - III

SERVE-SE FRIA

O secretário-geral do partido "obrigou" o camarada comentador - que na tertúlia familiar das quintas à noite na sicn afirmou não o conhecer - a dar-lhe o lugar. É a vida.

RENÉE



Puccini, Gianni Schicchi. Renée Fleming, Berliner Philarmoniker, 2010.

POBRE DR. FERRO

O dr. Ferro Rodrigues - que enquanto foi embaixador de Portugal na OCDE esteve respeitosamente calado em Paris mesmo quando quem o nomeou cometia as maiores tropelias, até contra outro seu colega embaixador e de partido - é agora vice-presidente do Parlamento e anda a fazer prova de vida no talkshow de Braga. Todavia dá ideia que pouco se lucrou com o seu regresso ao jazigo de família. Ao afirmar que a Alemanha quer expulsar-nos do euro, o dr. Ferro dá sinais de uma enorme irresponsabilidade política. E logo no dia em que a Alemanha diz o que diz a nosso respeito. Pobre dr. Ferro. Se Sampaio não o compreendeu, como é que o País o há-de compreender?

Adenda: Quanto ao peregrino Assis - um "socrático" de todos e dos últimos dias em especial, cuja "lista" para não sei quê é uma espécie de Madame Tussauds do dito "socratismo" -, está tudo razoavelmente resumido aqui.

A NOVA BOAZINHA

Um "retrato", escrito (julgo) a partir de Moçambique, da nova responsável pela "magistratura moral" do PS.

ÀS AVESSAS

Vasco Pulido Valente aparece muitas vezes nestas páginas. É quase um hábito de leitura com mais de trinta anos. Por isso custa-me emendá-lo. A crónica deste sábado, no Público, é mais um pedaço de acrimónia simples contra o funcionalismo público. O argumentário é conhecido: os setecentos funcionários públicos, das contas de VPV, têm um vínculo perpétuo com o Estado que nenhum partido tem coragem de cortar. VPV, que numa entrevista recente referia que "ainda hoje telefonei para o ICS [Instituto de Ciências Sociais] a lembrar que estou quase a atingir a reforma", de certeza não estava a pedir ao ICS, ou seja, ao Estado, que lhe cortassse abruptamente o dito "vínculo" e o privasse da sua legítima aposentação. Depois, o governo anterior deixou o "vínculo" apenas para determinadas funções do Estado. A maioria dos funcionários são agora contratados em regimes jurídicos - de contratação em funções públicas - que variam. Finalmente não é verdade que «este governo já contratou à volta de 5 mil pessoas (parte, fatalmente, "com vínculo")». Um pouco mais de minúcia e VPV facilmente perceberia que esses contratos ocorreram entre Janeiro e Junho de 2011, sob a égide do governo anterior. Tudo, pois, às avessas,

O TALKSHOW DE BRAGA


O congresso do PS teria porventura um átomo de interesse para o País se algum dos que, pelo silêncio cúmplice ou pela adesão entusiástica, mantiveram o partido refém da nomenclatura que reinou até 5 de Junho, se explicasse. Agora é fácil exibir "músculo" contra a Madeira, por exemplo, quando, no "continente", se chegou onde chegou em virtude da teimosia obsessiva daquela nomenclatura. Sobem ao púlpito para exprimir a sua "indignação" com a "direita" muitos dos que, ainda há escassos meses, aplaudiam histericamente o unaninismo acéfalo do partido. Andam nos corredores e a derramar para as televisões outros tantos que teriam a obrigação moral e política de ir lá dentro explicar corajosamente o que custou ao partido e ao País a cobardia e a mistificação apascentada pelos primeiros. Sócrates pelos vistos nunca existiu mas Portugal tem mais que fazer. Dispensa este talkshow contentinho e ensimesmado.

9.9.11

DA TRIVIALIDADE

A pergunta mais irritante dos últimos dias e a que toda a gente anda, afadigada, a responder é "onde é que estava no 11 de Setembro".

O PRIMEIRO CONGRESSO

Começa hoje, em Braga, o primeiro congresso do PS após o interregno "kim-il-socrático". Só posso desejar que a referida agremiação não transforme o evento em mais uma sessão albanesa e que regresse rapidamente à "normalidade" democrática. Ganha o PS e ganha o país.

A ALEMANHA E A PRODIGALIDADE ALHEIA


«A.J.P. Taylor disse num livro sobre a II Guerra Mundial que o mal da Alemanha era ela ser grande de mais e forte de mais para a Europa. Depois de 1945, a efectiva anulação da Europa perante a hegemonia americana e russa não deixou sentir a força alemã, senão ocasionalmente e de formas suaves. A guerra e a paz não dependiam dela. Nem sequer a economia, quando de facto a América garantia a defesa contra a URSS e era um último recurso sempre disponível. O colapso do comunismo mudou radicalmente as coisas. Quase de um dia para o outro, a Europa ficou entregue a si mesma: como estivera em 1914 e 1939, com os catastróficos resultados que se viram. Já não existia uma potência dominante a oriente ou a ocidente. A América enfraqueceu e perdeu o interesse nesta pequena parte do mundo. O novo império russo atrasado e periclitante só tinha a ambição regional de se refazer. A Alemanha ficou assim livre de resolver por si própria o seu destino. E o seu destino não estava com certeza nos países do Mediterrâneo de que tudo a separava. A Grécia, a Itália, a Espanha e Portugal não tinham, nem algum dia viriam a ter, qualquer importância ou influência na saúde e prosperidade de um Estado, agora unido, que precisava antes de mais nada de afirmar a sua presença no Báltico e de organizar o que dantes se chamava "Europa Central", segundo as suas conveniências. As sucessivas derrotas da sra. Merkel (a última no domingo passado) indicam essa firme verdade; e são o manifesto sinal do regresso da Alemanha a si mesma e ao seu tradicional papel político no continente. O contribuinte de Düsseldorf ou da Pomerânia vende com o maior prazer um automóvel a um espanhol ou um grego e até gosta de se passear ao sol na Costa Brava ou no Algarve. Mas não compreende (como compreenderia?) que lhe tirem dinheiro para pagar as dívidas de uma gente remota, desorganizada e pródiga. Os problemas dele não são a estabilidade da Grécia, de Portugal ou de Espanha. Os problemas dele são a estabilidade da Polónia, da Ucrânia, da Hungria ou da Sérvia e por detrás delas, como de costume, a da Rússia. Claro que a Alemanha não quer por enquanto hostilizar a França e gostaria de se livrar da UE gradualmente e com a necessária doçura. Mas não contem com a velha protecção da Alemanha submissa e americanizada de antigamente. Essa Alemanha acabou; e a de hoje manda.»

Vasco Pulido Valente, Público