17.4.10

«E CREIO QUE ISTO BASTA»


Ontem, à saída de uma reunião, e quando me preparava para cumprimentar uma das circunstantes, a senhora fugiu esbaforida e indignada porta fora clamando ser mulher de não sei quem. O que é que a referida senhora não teria feito se alguém tivesse escrito, com todas as letras, que o não sei quem com quem é casada é um "filho da ...." como esse não sei quem escreveu acerca de quem apenas a pretendeu cumprimentar. Há mãos que, afinal, embalaram berços que não serviram para nada. A jovem afogueada e catolicíssima senhora que me perdoe a sugestão - ando muito com ele agora - mas leia, se puder, o prefácio de Jorge de Sena ao seu livro de contos Os Grão-Capitães. Dizem-me, alguns amigos, que sou (ando) muito amargo e, outros, que ressumo crueldade e veneno. Pois bem. Sena afirmava cruéis os ditos contos. E continuava. «Diz-se às vezes que há muito amor do mal no evocá-lo e referi-lo. E que é disso que ele se perpetua. O mal não se perpetua senão ao pretender-se que não existe, ou que, excessivo para a nossa delicadeza, há que deixá-lo num discreto limbo. É no silêncio e no calculado esquecimento dos delicados que o mal se apura e afina - tanto assim é, que é tradicional o amor das tiranias pelo silêncio, e que as Inquisições sempre só trouxeram à luz do dia as suas vítimas, para assassiná-las exemplarmente. Por outro lado, o que parece amor do mal é uma infinita piedade de que os "bondosos" e os "puros" se cortaram: uma compreensão e um apelo em favor de que o amor do "bem" não alimente nem justifique a monstruosidade do mal, tanto mais monstruoso quanto mais, a idealização desse "bem" o confinou a ser. Assim, se estes contos são cruéis, a crueldade não é deles, nem de quem os escreveu, mas do que fizeram à vida. E esta só é monstruosa, não porque algo o seja em si, e sim porque o repouso egoísta, a ignorância, a falsa inocência, são sempre feitas de um crescente juro de monstruosidade (...). Num dos meus contos, de que mais gosto, Mar de Pedras, fiz que um sábio que era um santo dissesse, compreendendo-os e perdoando-lhes, a ladrões e assassinos: «Nunca vos falaram como a filhos, nunca vos pagaram como a homens, nunca vos trataram como a anjos.» E creio que isto basta, minha senhora.

13 comentários:

Anónimo disse...

como todos sabemos, não há bela mão que não tenha limpo o cú à sua dona...
obrigado ao João Gonçalves por me relembrar "Os Grão-Capitães". Já tenho releitura para o fim-de-semana.

Wegie disse...

Voltas a dirigir a palavra à minha mulher e rebento-te o focinho cabrão!!!

Nuno Castelo-Branco disse...

Não era uma Senhora, mas sim uma simples mulher. As Senhoras cumprimentam e geralmente são magnânimas até para com os seus maiores inimigos. Na nossa história temos algumas e - aí vem ela -, avulta Dª Amélia que perdoou Teófilos, Bernardinos, Almeidas e até o Junqueiro - cujos poemas utilizava, ilustrando-os com belas aguarelas -, não se esquecendo do canalha do Lêndea (ou Miquéque), o autor do marquês da bacalhoa. Ela foi uma Senhora e este é um dos seus principais legados.

A tal mulher "catolicíssima" de que falas, que se limite a permanecer de joelhos.

Miguel mFroes disse...

Não me diga que era a dona Laura Cravo, esposa da pop star Joao Galamba?

Essa amostra de gente dá-se e desdá-se consoante as ondas. Pelos vistos, a maré agora não está a seu favor.

francisco disse...

Atitude cristã essa: estender a mão a quem a recusa. Já eu, lutando contra os resquícios de cristandade que me povoam, apetece-me é apontar a caçadeira ou apertar o pescoço. E diz o João que o dizem amargo e ressumando crueldade e veneno?! Hehehe... esses seus amigos que olhem em redor com mais atenção. o Sena tem razão, e não só quando fala de si.

Saúde.

M. Abrantes disse...

Confusões entre pessoas à parte, dá vontade de ler Jorge de Sena.

Anónimo disse...

você é pior que venenoso, vive mal consigo próprio e nós é que o aturamos!

saia duma vez desse armário gigante que o atrofia!

saudações monárquicas,

radical livre disse...

meu caro
somos ambos realistas até ao limite da crueldade.
não vivemos no oásis zé sapatilhas, mas no meio de gente que se localiza no patamar máximo do Inferno de Dante, que ando a reler. procuro comparar com textos pagãos (Odisseia, Eneida) e com as gravuras respeitantes a estes.
temos que encarar os outros dentro dos vários andares da condição humana.

Mani Pulite disse...

O QUE ME ESPANTA É A TAL CATOLICÍSSIMA SENHORA TER SIDO CONVIDADA PARA A TAL REUNIÃO.COM O PROPÓSITO DE HOJE O DIABO DO INGINHEIRO JÁ TER UM RELATÓRIO ACERCA DE TUDO O QUE LÁ SE PASSOU?MELHOR QUE ISSO PARA ELE SÓ A LEITURA DO EXPRESSO DESTE SÁBADO.

factory girl disse...

Eu se tivesse que lhe apertar a mão, João Gonçalves, também fugia a sete pés. a sua cara mete medo tal qual a do papa que tanto venera. o seu discurso é mnemónico, bolorento, bafiento. você só pode ser muiiiito infeliz.

João Gonçalves disse...

Alguns destes comentários provam - como se fosse preciso - que muita blogosfera, independentemente de se dizer da esquerda ou da direita, não passa de um mero refúgio de capelistas que funciona em petit comité em que todos são muito giros, leves e frescos. Para peditórios de capelistas de meia-tijela que se imaginam com pedigree, não dou.

Javali disse...

Eu não percebi nada, verdade seja dita. Vocês, "bloggers" (ou lá que raio é isso) vivem disto agora? Fugi de Lisboa há 10 anos e cada vez que volto e escuto tudo me parece mais absurdo. Ou sou eu, que de viver no campo, perdi qualidades? Por afinidades com as árvores. Eu achei que as estava a ganhar.

(Estava aqui a tentar imitar Jorge de Sena, que nunca gramei, verdade seja dita).

Agora a sério, nunca vi um post tão críptico.

Anónimo disse...

Ó João Gonçalves, escusava de se expor aos comentários acima... Se eu fosse a si, não so publicava. Afinal, está na sua casa!

Apesar de não conhecer a gente de que fala, a ligação umbilical ao dito cujo não augura nada de bom em eventual opinião que eu venha a ter sobre essas pessoas...

PC