23.4.10

«CABEÇA PARA BAIXO, RABINHO PARA O AR»


Dantes era por carta. Agora o mail electrónico torma tudo mais fácil o que nem sempre quer dizer melhor. Um amigo que, para felicidade dele, está bem longe e que vai lendo o que por aqui fica - e deste que, para vitalício azar dele, ficou -, remeteu-me prosa que, descontada a parte pessoal, merece ser post. E o "pessoal" da parte serve para nós e para quem lá vem mencionado já que não rasuro nomes a não ser que o "pessoal" da coisa seja mesmo pessoal e não um "pessoal" que decorre do notoriamente público. Quem ler, por exemplo, a correspondência editada de Jorge de Sena com os seus contemporâneos, perceberá o que quero dizer.

(...) Vou lendo o Portugal dos Pequeninos e acompanhando as tuas hortaliças. Como não estar atento a um país tão catita como o nosso, que paga ao fémur da Medeiros as suas estiradas até Paris e ao papa-figos da PT para bater punhetas ao capadócio que nos governa, esse que assina casas que parecem enchovias (...), para não falar da canzoada da oposição, do louro Coelho (porra, mas quantos Coelhos há nesse país?), dos pistoleiros do PP... Também vou lendo o Massagista Pitta, o nosso glande clítico litelálio, para me informar e por graça, e o Peixe-Cão Viegas... É tudo malta que não pode ser levada a sério, é para levar na desportiva, cantarolando e rindo: «todos os patinhos sabem bem nadar, cabeça para baixo, rabinho para o ar». Porque enrabados por enrabados, pelo menos que seja achincalhando.»
Adenda: Filipe, não seja piegas. O mal da nossa chamada literatura (e actividades comerciais adjacentes, prolongáveis em jornais, revistas, rádios e televisões) é este excesso de lamechice autocomplacente. Lá por sermos amigos deste ou daquela - mesmo até por isso - não devemos tratá-los como atrasados mentais ou criancinhas desprotegidas da sorte. A ironia e a polémica nunca fizeram mal a ninguém. Pelo contrário, à conta da "bondade", aceitamos sempre qualquer dedo enfiado onde menos se devia esperar acomodá-lo. É tempo de passarmos a ferro estes preconceitos respeitosos, atentos e veneradores e de evitar viajar em circuito fechado. Senão temos de ir buscar ao baú o poeminha da Natália Correia, destinado aos venerandos do tribunal plenário que lhe proibiram a Antologia, e relembrar que a poesia (leia-se, a blogosfera) é para comer.

6 comentários:

Anónimo disse...

pois, mas os cães ladram ou achincalham e a caravana passa. o que fazer quando o rei vai nú e já ninguém se importa? ficamo-nos pelo achincalhar? já é qualquer coisa, mas fica sempre um sabor amargo na boca. pelo menos para quem ainda se "escandaliza"...
já agora, eu leitor inveterado do Portugal dos Pequeninos me confesso também. tem estilo, pelo menos no sentido em que falava o Céline.

Anónimo disse...

Dr. João Gonçalves; este verdejante oculus-ab-anulus in lactuca sativa que nos apresenta é soberbo...

atentamente, seu

Besta Imunda

Anónimo disse...

Não resisto a este naco prosa.
E em português técnico, ajuntaria esta pérola de um dos eméritos membros da elite:
«pimenta no rabinho dos outros é refreco» (Vara dixit, num momento de inspiração e revelação universitária independente)
E hoje no perigoso Sol:
«O chefe tem da dar um conforto», para custear o Elefante Autódromo Branco do Allgarbe.
Outra Varada, a entender como solução nacionalizar o disparate.
Como é que é possível, 36 anos depois, um sítio destes nas mãos de tantos filhos... delas.
Na falta de um "Nova Democracia" à direita, começo a ter a tentação de me oferecer ao PCP.
JB

FNV disse...

Nada piegas. Uma coisa é a crítica outra é adjectivação permanente consoante a pessoa diz, ou não, o que gostamos. V: já põs a , por ex., a Constança Cunha e Sá em 50 elevadores.
E a crítica não é necessariamente o insulto ou a chalaça fácil. Isso é coisa não de piegas, talvez, mas de miúdos e velhos,certamente.
Falámos disso no caso João Constancio, se bem me lembro.

Anónimo disse...

Esta foto é chocante e devia ser retirada.

João Gonçalves disse...

Filipe: insulto, e não chalaça fácil, é chamar filho da puta a título de "crítica" política. E os altos e baixos são coisas da vida. Nossa e dos outros, meus e da CCS, por ex. O que vem no mail que reproduzi, repito, é uma opinião sobre o notoriamente público (actividades profissionais públicas) daquelas pessoas feita (e aqui sou só eu que ajuízo) com graça. O episódio que citou acabou por entronizar o autor dele que não foi o J. Constâncio. Até na revista onde o Filipe escreve regularmente já debitou em forma de entrevista a um bibelot "giro" e inovador que importa ao país conhecer. Importará?