1.10.11

OS DOUTORES DULCAMARA




«Os economistas e espécies análogas, com a sua incerta ciência e a sua prática de explicar o inexplicável, têm feito muito mal ao mundo. A crise, infelizmente, multiplicou a espécie ou, pelo menos, fê-la sair dos buracos universitários e outros por onde andava escondida, escrevendo livros e artigos que ninguém lia ou a que ninguém ligava. Agora, pontifica pela televisão e pelos jornais, onde vende opiniões com a convicção com que antigamente os boticários e os médicos vendiam ervas para doenças incuráveis. O público, aterrorizado, ouve e acredita e não pergunta por que razão aqueles sábios dizem isto em vez daquilo ou, mais precisamente, porque ainda se atrevem a dizer seja o que for, quando, com toda a sua erudição e importância, nos levaram a um enorme desastre, que era seu dever evitar. O único que nos preveniu, durante anos e com a força que as circunstâncias mereciam, acabou por ser o dr. Medina Carreira. Ora, Medina Carreira, para a gente que se acumulava nos bancos, nas universidades e no Estado (quando não nos três sítios ao mesmo tempo), era um excêntrico e um desequilibrado e não se devia manifestamente tomar a sério. Não que os números que ele mostrava e tornava a mostrar à populaça estivessem errados ou que os sarilhos que ele anunciava não se começassem a aproximar a olhos vistos. De maneira nenhuma. Só que os srs. economistas achavam, e continuam a achar, que não se deve perturbar, e menos assustar, uma entidade angélica a que chamam os "mercados". Até ao dia em que os "mercados" os perturbam e assustam a eles, querem "confiança" e mais "confiança". Mas como ir buscar essa tão recomendada confiança a génios que deixaram um país pobre e desgovernado como Portugal acumular milhares de milhões de dívidas, que jamais poderá pagar? Não existia lá nos livros um capítulo sobre o assunto?»

Vasco Pulido Valente, Público

4 comentários:

Anónimo disse...

VPV bem; sobretudo devido à sua maneira de escrever - caracterizando sumária mas violentamente os 'economistas' e o seu mundo académico, sem se tornar excessivo. Sintético e irónico. No entanto há que referir que a maior parte dos males e da penúria a que estamos agora submetidos provem do facto de não terem sido economistas e sim POLÍTICOS a tomar as decisões. Os economistas - sim - não se organizaram, nada defenderam e os seus avisos foram tímidos; o que teria acontecido se o tivessem feito mais aguerridamente? Teriam sido acusados - quais Cassandras-Medinas-Carreiras - de meter o bedelho onde não eram chamados: na política, na bendita políticazinha - território só próprio e reservado aos benfeitores eleitos (que, como sabemos, dizem sempre a verdade). Se algum economista colaborou passiva ou activamente com os grandes embustes da política do endividamento frenético, deixou de ser economista para passar logo à categoria de político. Assim como um general deixa de ser um militar quando faz um golpe de estado ou toma o poder - legitima ou ilegitimamente. O tempo, o 'rítmo' e o século de Salazar já lá vão; mas Salazar, homem de inteligência e sagacidade superiores, soube ser Político sendo economista e financeiro; e soube manipular generais, embaixadores, fascistas e exaltados extremistas e conduzir este carro-de-bois como ninguém, até que no fim o carro já quase se equiparava a pelo menos um Ford de média gama. Se é de esperar que em ditadura os povos sofram e sejam enganados, é ainda mais certo - no "presente estado da arte" - que sabemos em primeira mão que em democracia os povos são enganados diariamente e sofrem, a espaços, às mãos de incompetentes e de corruptos. Parece não haver solução.

Ass.: Besta Imunda

Anónimo disse...

Ai os economistas é que nos levaram ao desastre ?! Então e o Sócrates ? E os economistas travestidos de políticos que estiveram 35 anos na governação ? E os opinadores, como VPV, que pontificam nos jornais e televisões, historiadores ainda por cima, conhecedores das asneiras do passado, não tinham obrigação de evitar asneiras semelhantes ? Enfim, uma crónica onde mistura tudo ao molho e seja o que Deus quiser, confundindo economistas que há muitos anos alertavam para o perigo que o país corria, com outros, keynesianos, que apoiavam o aumento da despesa pública, foram estes últimos que sempre governaram e botaram faladura nas TV's e pasquins tugas !!! Esta infeliz crónica de VPV é um auto-retrato, a que poderíamos juntar os polítólogos, sociólogos, psicólogos e demais comentaristas e paineleiros ...

Cáustico disse...

Medina Carreira e outros, de há muito que vêm alertando para a situação do país. VPV aceitou esses avisos e actuou e conformidade com eles?

JSP disse...

Por que será que , ao ser sugerido num (certeiro) comentário o binómio economista / político , me saltou imediatamente o nome de Vítor Constâncio?...