28.10.11

A DECADÊNCIA DO HOMEM


«Queria falar da «decadência» do homem, em consequência da qual se realiza, de modo silencioso, e por conseguinte mais perigoso, uma alteração do clima espiritual. A adoração do dinheiro, do ter e do poder, revela-se uma contra-religião, na qual já não importa o homem, mas só o lucro pessoal. O desejo de felicidade degenera num anseio desenfreado e desumano como se manifesta, por exemplo, no domínio da droga com as suas formas diversas. Aí estão os grandes que com ela fazem os seus negócios, e depois tantos que acabam seduzidos e arruinados por ela tanto no corpo como na alma. A violência torna-se uma coisa normal e, em algumas partes do mundo, ameaça destruir a nossa juventude. Uma vez que a violência se torna uma coisa normal, a paz fica destruída e, nesta falta de paz, o homem destrói-se a si mesmo. A ausência de Deus leva à decadência do homem e do humanismo. Mas, onde está Deus? Temos nós possibilidades de O conhecer e mostrar novamente à humanidade, para fundar uma verdadeira paz? Antes de mais nada, sintetizemos brevemente as nossas reflexões feitas até agora. Disse que existe uma concepção e um uso da religião através dos quais esta se torna fonte de violência, enquanto que a orientação do homem para Deus, vivida rectamente, é uma força de paz. Neste contexto, recordei a necessidade de diálogo e falei da purificação, sempre necessária, da vivência da religião. Por outro lado, afirmei que a negação de Deus corrompe o homem, priva-o de medidas e leva-o à violência. Ao lado destas duas realidades, religião e anti-religião, existe, no mundo do agnosticismo em expansão, outra orientação de fundo: pessoas às quais não foi concedido o dom de poder crer e todavia procuram a verdade, estão à procura de Deus. Tais pessoas não se limitam a afirmar «Não existe nenhum Deus», mas elas sofrem devido à sua ausência e, procurando a verdade e o bem, estão, intimamente estão a caminho d’Ele. São «peregrinos da verdade, peregrinos da paz». Colocam questões tanto a uma parte como à outra. Aos ateus combativos, tiram-lhes aquela falsa certeza com que pretendem saber que não existe um Deus, e convidam-nos a tornar-se, em lugar de polémicos, pessoas à procura, que não perdem a esperança de que a verdade exista e que nós podemos e devemos viver em função dela. Mas, tais pessoas chamam em causa também os membros das religiões, para que não considerem Deus como uma propriedade que de tal modo lhes pertence que se sintam autorizados à violência contra os demais. Estas pessoas procuram a verdade, procuram o verdadeiro Deus, cuja imagem não raramente fica escondida nas religiões, devido ao modo como eventualmente são praticadas. Que os agnósticos não consigam encontrar a Deus depende também dos que crêem, com a sua imagem diminuída ou mesmo deturpada de Deus. Assim, a sua luta interior e o seu interrogar-se constituem para os que crêem também um apelo a purificarem a sua fé, para que Deus – o verdadeiro Deus – se torne acessível.»

Bento XVI, Assis, 27.10.11

5 comentários:

MJMatos disse...

Amen. Obrigado pela partilha, JG.

Isabel disse...

Um Papa tolerante, clarividente, brilhante.

Anónimo disse...

Muito bom.
Merkwürdig

o tal leitor disse...

Não me parece acertar no título,pois o excelente texto não é tão pessimista como parece à primeira vista. Há por ali a inspiração da passagem de Lucas,"Haverá mais alegria no Céu por um pecador que se arrepende que por 99 justos,etc." Os agnósticos são aqui tratados como potenciais filhos pródigos,o que é uma mensagem de esperança e não de repúdio pelo mundo e pelo homem,afinal criaturas de Deus,com todas as suas imperfeições e desvios. Estas passagens de Lucas são para mim das mais importantes,desde a menção das críticas dos fariseus ao verem que Ele andava com publicanos e até com prostitutas, até desembocar num dos mais belos e significativos episódios neo-testamentários,a parábola do Filho Pródigo,onde se encontra em estado puro o pecado,o perdão,a reconciliação,e a imcompreensão de tudo isso por alguns. Texto magnífico,que Rilke tranformou genialmente. Mas que talvez estivesse no espírito de Bento,ao dizer o que disse.

Anónimo disse...

No meu humilde juizo, sempre entendi que o então cardeal e agora Papa, Bento XVI, era e é um homem iluminado pela divindade. Creio mesmo que sempre esteve a iluminar as palavras e intenções do Papa João Paulo II ajudando-o no seu testemunho que a todos comoveu.