ONZE
É o número médio de livros lidos no País, por ano, e por cabeça, segundo um estudo citado no Diário de Notícias e encomendado pela APEL. O desprezo indígena pela leitura já não é um dado novo. Os nossos índices de iliteracia também não. A profunda incultura e, em muitos casos, a imensa ignorância da nossa população universtária, é um dado infeliz, praticamente pacífico. O facto de não sermos propriamente nem ricos nem muito desenvolvidos, não tinha fatalmente de nos conduzir à indigência cultural. O êxito de vendas que conhece a "literatura das tias", tipo não sei quê Lopo de Carvalho ou Rebelo Pinto, diz quase tudo acerca da questão. É pedagógico, por exemplo, que todos os domingos Marcelo Rebelo de Sousa incite à leitura com uma mão cheia de livros. O problema é que mistura, às vezes, livros com lixo, indistintamente, e isso não ajuda nada ao caso. O prazer da leitura exige uma aprendizagem e uma vontade, é um gosto e um gozo que se adquirem, ou não. Saudando a tradução de Pedro Tamen do primeiro tomo da "Recherche" de Proust, aqui deixo um excerto das "Journées de Lecture" do mesmo Proust, numa tradução da Editorial Teorema:
"A amizade, a amizade que diz respeito aos indivíduos, é sem dúvida uma coisa frívola, e a leitura é uma amizade. Mas pelo menos é uma amizade sincera, e o facto de ela se dirigir a um morto, a uma pessoa ausente, confere-lhe algo de desinteressado, de quase tocante. É além disso uma amizade liberta de tudo quanto constitui a fealdade dos outros. Como não passamos todos, nós os vivos, de mortos que ainda não entraram em funções, todas essas delicadezas, todos esses cumprimentos no vestíbulo a que chamamos deferência, gratidão, dedicação e a que misturamos tantas mentiras, são estéreis e cansativas. (...) Na leitura, a amizade ésubitamente reduzida à sua primeira pureza. Com os livros, não há amabilidade. Estes amigos, se passarmos o serãocom eles, é porque realmente temos vontade disso. A eles, pelo menos, muitas vezes só os deixamos a contagosto."
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