13.6.03

O BASTONÁRIO EXCELENTÍSSIMO

José Miguel Júdice, em tempos, escrevia sobre a coisa pública com alguma elegância, e nela participou com relativa intensidade enquanto membro do PSD, chegando mesmo, por amizade a Marcelo Rebelo de Sousa, a fazer parte da Comissão Política Nacional da agremiação. Há dois ou três anos, decidiu concorrer a bastonário da Ordem dos Advogados, e lá está. Os seu artigos, desde então, passaram a tratar em exclusivo a maçadora questão da justiça e do justo, vista naturalmente, pela óptica dos advogados (sobre estas coisas da justiça, recomenda-se a leitura de dois livrinhos de Paul Ricoeur, um já traduzido entre nós, sob o título genérico de "Le Juste" ). Devo confessar a minha alergia a corporações profissionais, particularmente a esta à qual, numa fase ainda ingénua da minha existência, fui obrigado a pertencer. Júdice, pelos vistos, entrou decidido a fazer da seita uma muito agitada e "conspicuous" instituição, com lugar quase diariamente cativo nas televisões. Nada de extraordinário, se pensarmos que, se há coisa que o País tem em demasia, é "juridicidade" , pelo que se compreende a mediatização da Ordem levada a efeito pela actual direcção, se bem que o antecessor de Júdice, Pires de Lima, no mínimo, tivesse mais graça. Esta gente, porém, leva a coisa a peito, como se viu pela forma respeitosa, veneranda e obrigada como José Miguel Júdice resolveu há dias o incidente António Marinho Pinto. Este senhor advogado era o presidente da Comissão dos Direitos do Homem da Ordem até ao dia em que "ousou" dizer numa comissão parlamentar o que pensava acerca da magistratura judicial. Parece que tal desaforo podia colocar em causa a realização de um tal "congresso da justiça", pois ilustres representantes da sobredita magistratura ameaçaram logo amuar e não aparecer no dito congresso. Pressuroso, Júdice demitiu o senhor advogado de presidente da comissão para salvar a "honra do convento", apesar de ter esperado que o colega tivesse saído pelo seu próprio pé ( a que título ?), como revelou numa conferência de imprensa, colocando-se a ele próprio no lugar de Marinho Pinto. Eis como, num simples gesto, Júdice desfez a imagem que dele tinha: a de um liberal esclarecido e livre.

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