“É pena que os jornais, como a literatura, sejam uma estrebaria de porta aberta: devia ser reservada aos profissionais sérios, como os nomes de que há pouco falei, e que decerto existem.” - escreveu Lobo Antunes no editorial com que o PÚBLICO assinalou o seu 19º aniversário. Gostaria de perceber como seria controlado esse direito de admissão: por um grupo de amigos? Uma comissão de avaliadores de textos? Uma entidade reguladora com poderes de saneamento? Infelizmente o jornal não perguntou a Lobo Antunes, seu director em dia de aniversário, como faria essa triagem, logo a mim só me ocorre a forma habitual. Ou seja, o visto prévio que, como todos os vistos prévios em todos os lugares e regimes do mundo que o tiveram ou têm, nasceria e sobreviveria em nome da qualidade e da decência. E da luta contra a estrebaria. Não conheço ideia ou fé mais perigosa e falsa do que aquela que afiança que se os governos incluíssem mais artistas seriam mais tolerantes. Escritores de língua portuguesa como os angolanos Agostinho Neto, Rui Monteiro e Pepetela provam-no numa sangrenta evidência. Outra das boas certezas sobre a gente da cultura, que a prática infelizmente não demonstra, prende-se com a ideia de que um executivo que integre artistas ou criadores - como agora soe dizer-se - não só legislaria com mais acerto como apoiaria muito mais a cultura. Esquece quem assim pensa que não é necessário ser culto para ser artista. Infelizmente muitos daqueles que se identificam como tal apenas se interessam pela sua obra, fazendo gala do seu desinteresse pelo saber e sobretudo por aquilo que os outros criam, fazem e produzem. Por fim e baixando destas alturas executivas às questões do dia a dia, defrontamo-nos com declarações como as de Lobo Antunes que para bem de todos nós nunca teve poderes executivos para impedir que a literatura e o jornalismo sejam uma estrebaria de porta aberta. Em matéria de informação e criação antes estrebaria de porta aberta que salão de porta fechada.»
Helena Matos, Blasfémias
5 comentários:
Confesso que nunca li nada do Lobo Antunes, mas li o editorial e... bem, realmente continuo sem nada para dizer...
Esta "fisgada" de Lobo Antunes deve levar-nos a reflectir acerca do "status" da nossas elítes: pobres no espírito, na literatura e até não arte.
Gerámos élites, desde Camões a Saramago e Lobo Antunes, colocando-se a seguinte questão: serão elas ou não o produto do povo que somos?
Penso bem que sim!
Mas a fisgada de Lobo Antunes é isso mesmo, uma simples e inofensiva fisgada, porque, no fundo, no fundo, vai dizendo algumas verdades.
Se as devia dizer, a resposta é que bem poderia ser negativa, atendendo a que não se devem fazer juízos de valor em sede de causa própria.
Mas como o Escritor tenciona fazer um retiro, entendo que será perdoado pela "fisgada"...
E não é esta a forma de sermos portugueses?
Concordo que muito de estes 'nomes (imper)feitos' da Literatura são incapazes de se encantarem com qualquer outro ou outra coisa que eles mesmos. Nisso é que se deixam morrer. Adoraria que o Lobo Antunes me descobrisse e, com isso, ou se escangalhasse a rir ou desatasse a encantar-se com outros todos os dias. O salão dos 'nomes (imper)feitos' definitivamente está muito vazio com uma triste e infinita solidão.
Isso e o alheamento nefelibata de esta gente insuflada do metano de si mesma.
Não se esqueçam que essa treta do Lobo Antunes é como a funcionava a D. Quixote antes de ser comprada pelos hermanos de al lado. Eles lá tinham a mania de que eram todos uma elite, e a publicação de um novo autor nacional ficava condicionada à aprovação unâmine das outras luminárias como esse deserdado da inteligência.
Curioso é que esse que agora manda fisgadas ande vez e outra a anunciar que sai da D. Quixote se começar a publicar lixo (e não tem sido pouco o que tem publicado), que sai se a Teresa Coelho sair (e ela já patinou) e ele continua lá agarrado porque lhe continuam a chover as notas nos bolsos. De malta com os princípios desse, estão as casas de putas cheias.
tenho muito respeito por esse senhor, sim, senhor verdadeiramente dito. e ele foi extremamente cívico ao referir-se à escumalha que as editoras têm publicado. Incluindo-me nessa lista, que com menos de vinte anos ganhei um concurso para o qual nem deveria ter concorrido. Não procuramos mais qualidade, mas sim quantidade. somos uma geração de várias gerações de "Paulos Coelho" o que é verdadeiramente vergonhoso. É com imensa tristeza que vejo o nome desse senhor, sim, senhor, um verdadeiro senhor, ser difamado. Ainda por cima por pessoas com menos capacidades do que ele. Quando as críticas são projectadas do topo são mais susceptiveis de serem apunhadas, deveria ser ao contrário. Pessoas sem capacidades nenhumas de escreverem o que quer que sejam, deveriam restringir-se à sua ignorância. E caso não concorde, não tem de fazer disso notícia, os blogs não foram criados com o intuito de difamar. Ou estarei então muito enganada.
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