A soberba saloia de alguns "escritores" portugueses manifestou-se este fim-de-semana na revista Actual do Expresso. O jornal dedicou um mini-dossiê ao livro de Dan Brown, O Código Da Vinci (Bertrand Editora). Não faço ideia em que edição é que o livro já vai, porém registo que, pelo menos na praia, em cada grupo de, digamos, cinco pessoas que liam um livro, três seguramente estavam a ler a obra de Brown. Esta vulgaridade "incomoda" os nosso literatos "intimistas". A amabilidade de um amigo, entusiasmado com a sua leitura, fez-me ler, de empréstimo e em três ou quatro dias, o tão procurado tomo. Presumo que o seu sucesso, a nível mundial, terá a ver com a circunstãncia de o livro combinar uma trama policial com uma série de "referências" culturais e espirituais, umas mais fantasiosas do que outras, mas todas destinadas a desenvolver o chamado "guessing instinct" do leitor, algo de que falava o filósofo americano Charles Peirce. O livro vive dessa intensa cavalgada percorrida através de pequenos capítulos cujas linhas finais "obrigam" a que a avidez curiosa do leitor passe imediatamente para o seguinte, praticamente sem parar. Não há, por isso, qualquer "densidade psicológica" nos principais personagens, criaturas que Brown torna puros reféns da sua "história" e do seu "suspense". Pelo meio há momentos em que a coisa "empastela" um bocado, particularmente quando se anda em torno das decifrações dos "sinais" que vão sendo deixados pelo caminho. E, em certo sentido, as páginas finais não deixam de ser um tanto ou quanto decepcionantes. Nada disto,porém, justifica o desdém altivo que os "escritores portugueses", inquiridos pelo Expresso, revelaram. Num país em que os índices de leitura são o que são e a "literatura portuguesa" é o que é, a circunstância de milhares de pessoas lerem este livro é, à partida, positiva. A imensa vaidade destes nossos "intelectuais" impede-os de reconhecer uma simples evidência. A obra de Dan Brown é uma mera fantasia histórico-espiritualista e pictórica, quase um "livro policial", em muitos aspectos irónico e amusant, que se lê de um fôlego. Pouco me interessa saber se há pormenores verdadeiros ou mentirosos na trama, a partir do momento em que parto para aquela leitura com o simples propósito de me divertir e não necessariamente de me "cultivar". As mediocridades brilhantes que constituem grande parte do nosso "universo" dito literário, não compreendem isto. Vivem, como sempre viveram, sobre um outro código, o seu pequeno código da paróquia.
«Somos poucos mas vale a pena construir cidades e morrer de pé.» Ruy Cinatti joaogoncalv@gmail.com
23.9.04
O CÓDIGO DA PARÓQUIA
A soberba saloia de alguns "escritores" portugueses manifestou-se este fim-de-semana na revista Actual do Expresso. O jornal dedicou um mini-dossiê ao livro de Dan Brown, O Código Da Vinci (Bertrand Editora). Não faço ideia em que edição é que o livro já vai, porém registo que, pelo menos na praia, em cada grupo de, digamos, cinco pessoas que liam um livro, três seguramente estavam a ler a obra de Brown. Esta vulgaridade "incomoda" os nosso literatos "intimistas". A amabilidade de um amigo, entusiasmado com a sua leitura, fez-me ler, de empréstimo e em três ou quatro dias, o tão procurado tomo. Presumo que o seu sucesso, a nível mundial, terá a ver com a circunstãncia de o livro combinar uma trama policial com uma série de "referências" culturais e espirituais, umas mais fantasiosas do que outras, mas todas destinadas a desenvolver o chamado "guessing instinct" do leitor, algo de que falava o filósofo americano Charles Peirce. O livro vive dessa intensa cavalgada percorrida através de pequenos capítulos cujas linhas finais "obrigam" a que a avidez curiosa do leitor passe imediatamente para o seguinte, praticamente sem parar. Não há, por isso, qualquer "densidade psicológica" nos principais personagens, criaturas que Brown torna puros reféns da sua "história" e do seu "suspense". Pelo meio há momentos em que a coisa "empastela" um bocado, particularmente quando se anda em torno das decifrações dos "sinais" que vão sendo deixados pelo caminho. E, em certo sentido, as páginas finais não deixam de ser um tanto ou quanto decepcionantes. Nada disto,porém, justifica o desdém altivo que os "escritores portugueses", inquiridos pelo Expresso, revelaram. Num país em que os índices de leitura são o que são e a "literatura portuguesa" é o que é, a circunstância de milhares de pessoas lerem este livro é, à partida, positiva. A imensa vaidade destes nossos "intelectuais" impede-os de reconhecer uma simples evidência. A obra de Dan Brown é uma mera fantasia histórico-espiritualista e pictórica, quase um "livro policial", em muitos aspectos irónico e amusant, que se lê de um fôlego. Pouco me interessa saber se há pormenores verdadeiros ou mentirosos na trama, a partir do momento em que parto para aquela leitura com o simples propósito de me divertir e não necessariamente de me "cultivar". As mediocridades brilhantes que constituem grande parte do nosso "universo" dito literário, não compreendem isto. Vivem, como sempre viveram, sobre um outro código, o seu pequeno código da paróquia.
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