21.12.06

FELICIDADE E FRACASSO


Só não concordo com a parte de me levar a sério e, muito menos, de levar quem quer que seja ou o que quer que seja a sério, João. De resto, tem razão. Falhei como ser humano. Sou amargo, incomoda-me a felicidade alheia sobretudo quando praticada em família, tenho inveja dos casalinhos cúmplices por mais primitivos que sejam, rejeito a dádiva desinteressada ou interesseira a uma causa, a um líder, a um partido, irritam-me as "namoradinhas de Portugal" que as televisões me impingem, dispenso o "Gato Fedorento/PT", não gosto de ser governado por ninguém, não percebo o jazz, recuso o Estado a que isto chegou, enfim, João, sou um triste que não consegue produzir um daqueles sorrisos instantâneos como os da sra. dra. Maria de Belém ou embrulhar o Advento num postalinho de natal ou num pacote colorido apelidado de "prenda". O momento verdadeiramente jubilatório do ano, imagine, foi, como não podia deixar de ser, passado fora daqui, em Roma. Uns belos dias de outono, solares, enredado entre ruínas e igrejas, igrejas e ruínas, por entre o esplendor de um tempo que passou. E, finalmente, o Santo Padre na célebre janelinha a recitar o Angelus. Com Ratzinger - outro infeliz, outro triste - tenho estado a apreender o fundamental, isto é, a não dar tanta importância ao visível, ao tangível (à "felicidade") e a prestar mais atenção àquilo que verdadeiramente me ajuda a viver. Não dei propriamente em beato - isso seria "felicidade" a mais - mas, a cada dia que passa, percebo a necessidade de Cristo na minha vida. Essa é - veja lá a tristeza da coisa - a minha certeza. Nunca nada do "homem" é outra, bem sedimentada no ano que felizmente está a acabar. Se eu fosse ler o "The Economist" para saciar por instantes a minha amargura, ficava rigorosamente no mesmo ponto de partida onde vegeto há muitos anos. Assim, fico-me pela palavra do Papa, a de que a esperança de Deus é maior que o meu fracasso.

13 comentários:

Rui Castro disse...

Está já uns passos à minha frente, João.
Um abraço

Anónimo disse...

Eu, leitora assídua me confesso: a coisa é, mutatis mutandis, a mesma.
Pior ainda, embrulho presentes, não conheço Cristo muito bem e o Papa ainda menos.
Boas viagens.

Anónimo disse...

Bem, o que não há dúvida é de que João Gonçalves é a prova viva de que, para ser feliz e ser boa pessoa, não basta ir a Roma e ver o Papa.

Anónimo disse...

Sr. Goncalves,

Concordo com tudo menos com o Jazz.,,,

Oh homem, então você entende Sua Eminencia e não entende Miles Davis, Coltrane e tantos outros ?

Pelo Amor de Deus...

:-)

Abracos

Anónimo disse...

Pense menos em si (digo-o sem ironia)e procure nos outros o bom que neles há, mas, para se gostar de alguém (experiência própria) é necessário conhecer-lhe não só as qualidades, mas, sobretudo, os defeitos. Depois, é só perceber se as primeiras compensam os segundos, porque, defeitos, todos temos, temos é de avaliar a parte boa de cada um e, finalmente, é só gostar e/ou amar! E, quando se gosta, gostamos também de DAR e já nem é por essa pessoa, mas por nós próprios! Sentimo-nos bem...faz-nos bem à alma....EXPERIMENTE.....
Gosto de si e gostaria de "vê-lo" menos amargo e mais doce...até porque o seu "ar" é bastante doce!

Anónimo disse...

ja esta dito acima, que coisa essa do jazz ...!

Anónimo disse...

1 - Queria felicitá-lo pelo artigo. Há que ser corajoso para abdicar da 'felicidade' tal como a concebem os modernos (ou pós-modernos, tanto faz). Louvo-o, portanto, pela sua falta de pragmatismo. O que implica habitualmente um crescendo espiritual

2 - Quanto ao Jazz, também lhe dou razão. embora seja difícil não gostar, penso que Julius Evola estava certo; o jazz está condenado a ser um estilo que favorece a técnica em deterimento da simplicidade (e, consequentemente, da harmonia). Mas, claro está, como em quase tudo, há excepções.

Cordialmente,

Rodrigo Almeida e Sousa

Anónimo disse...

"A bondade e o carácter são mais importantes do que a inteligêngia. Demorei muito tempo a perceber isto." (António Lobo Antunes em entrevista à TSF)
Caro João Gonçalves: um vizinho, uma colega, um amigo, uma sobrinha. Alguém. Garanto-lhe que vale a pena ter fé nos Homens.

Anónimo disse...

... pois é
... mas não será a verdadeira FELICIDADE a INVISÍVEL?

TUDO o que "visivelmente" surga de BOM será "um" acréscimo.

Ou NÃO?

Zé Maria Duque disse...

Caro João:

a blogoesfera é tendencialmente um mundo estúpido e superficial, onde nos costumamos dar mais importância do que aquela que realmente temos.

Contudo tenho visto aquilo que me parece ser a sua conversão e devo convfessar que foi a única coisa realmente bela e comovente que encontrei neste suposto "mundo".

Agradeço-lhe sinceramente o seu testemunho e desejo um Santo e Feliz Natal!

Anónimo disse...

É por causa de posts como este que não desisto de o visitar. É único na blogosfera.

Fez-me lembrar Mário de Sá Carneiro:

"Falhei-me entre os mais e falhei em mim,
asa que se enlaçou e não voou"

Também já me senti assim... e quase sem dar por isso, com o correr dos dias, as circunstâncias foram mudando.Tudo passou. A cada um o seu caminho.

Anónimo disse...

Mais uma vez muito obrigada pelo belíssimo testemunho. Extraordinária verdade esta: "a esperança de Deus é maior que o meu fracasso."

João Gonçalves disse...

Zé, eu já sou "convertido" há muito tempo, no sentido em que sou crente. Todavia, como costumo dizer, sou um crente que duvida e um céptico que crê. Ao contrário dos correctos, entendo que a igreja católica me permite ser assim. Como explicou o Papa, há tantos caminhos para Deus como existem homens. Boa continuação do Advento para si.