16.12.06

DO MEC AO MNE



1. Há pessoas que imaginamos infantis uma vida inteira e que, num lance inesperado, desfazem essa suposição. Pelo contrário, existe uma estirpe que temos por adulta e que, irremediavelmente, subsiste infantil ao crepúsculo. No primeiro caso está o Miguel Esteves Cardoso. Nunca fui um "MECista" convicto como quase toda a geração a que pertenço foi. Nunca li os seus livros mas devo ter lido quase todas as suas crónicas de jornal dos "melhores tempos". A sua formação inglesa apurou-lhe o gosto pelo português - ao arrepio da escrita eternamente maricas de Frederico Lourenço - e MEC revelou-se um dos nossos grandes prosadores contemporâneos (prosador, não escritor, Carla). E irritou-me sempre, um pouco, a sua "oralidade", sobretudo a televisiva, em programas "moderados" pela voz mais insuportável da tv portuguesa, a Júlia Pinheiro. Foi, pois, com uma imensa ternura que li ontem à noite, na cama, a sua entrevista no suplemento 6ª do Diário de Notícias. MEC chegou aos cinquenta adulto e lúcido como nunca e, ao olhar para trás, constrói um auto-retrato agridoce que me impressionou. Aqueles para quem MEC era uma espécie de estátua viva à precocidade sobredotada e à graça inteligente de sapatilhas, poderão ver nesta entrevista o derrube dessa estátua pelo seu autor. Enganam-se. Nunca MEC foi tão azul, tão humano e tão bonito como nesta entrevista, qual ave de Minerva feita andorinha. A vida é fodida.
2. O caso oposto ao MEC é o de Freitas do Amaral. As suas primeiras memórias - "O antigo regime a e revolução" - são confrangedoramente infantis e politicamente nulas. Raramente percebeu - em toda a sua curta vida política, cuja "consciência" só adquiriu aos trinta e um anos, como revelou num famoso debate em 1986 contra Soares, percebeu pouca coisa - o que lhe ia acontecendo. Pelos vistos, e agora com este livrinho de "MNEmemórias", continua sem perceber. Freitas vive num planeta distante e Sócrates enganou-se quando o escolheu por ele ter cabelos brancos. As "revelações" cândidas e adolescentes que perpetra no livro, mostram-nos um político-homem que nunca amadureceu. Só neste país em diminutivo é que esta criança grande pôde ter estado a um passo de ter sido eleito presidente da República. Como diria o seu Mestre, o "Diogo" não foi feito para isto.

3 comentários:

Anónimo disse...

Gostei !

Anónimo disse...

Nunca tinha observado o personagem por este prisma.
Mas condiz com aquilo que dele conheci, há uns bons 20 anos.
Bem observado.

Anónimo disse...

Tem razão...´Tem tanto de BOM como Advogado...como de MAU em Política.....Mas, sendo inteligente, ainda não se terá apercebido do seu lado MAU???....

Neste caso, o "querer não significa poder..."