24.12.06

OS DIAS DE AMANHÃ - 1


A prosa que vai seguir-se é da autoria do Victor Cunha Rego. Já contei que, por alturas de fim de curso, o João Amaral (por indicação do hoje cónego João Seabra - riam-se lá um bocadinho, grandes servidores laico-republicanos da democracia) me colocou a escrever no "cultura&espectáculos" do Semanário. O jornal estava então sediado na Avenida Duque de Loulé. A redacção era no 1º andar. Durante o tempo em que andei por lá - normalmente para "fechar" páginas - surgia-me, do corredor ou no corredor, e de vez em quando, essa figura misteriosa do director. Sabia que o director, por volta do meio dia, ia até à Igreja do Sagrado Coração de Jesus, à Rua Camilo Castelo Branco, e que não largava o Cioran. Outro mistério. Vindo das aventuras de onde veio, esse raríssimo português - como lhe chamou Vasco Pulido Valente - era dotado de uma fina ironia e de uma amargura intelectual que muitos nunca souberam compreender. Cunha Rego era, ele sim, um jornalista de causas. Foi-o no Brasil, no exílio, e foi aqui. Nunca, aliás, foi outra coisa a vida inteira. A sua escrita é uma lição permanente para todos os pseudo-jornalistas que enchem as televisões e as páginas dos jornais com a sua soberba ignorância e o seu atrevimento anão. As escolas de comunicação social produzem anualmente resmas de idiotas e de parvinhas dispostos a tudo para "aparecerem". Não têm, nem terão jamais uma "biografia". Cunha Rego combateu Salazar com o mesmo fervor com que defendeu Soares, com que o ajudou a derrubar quando foi preciso, como "apoiou" a "direita" e como "voltou" a Soares contra Cavaco perto do fim. Victor já acreditava em Deus quando o conheci. Provavelmente sempre acreditou. Nunca, da sua pena, brotou uma prosa deselegante ou "bárbara". Pelo contrário. A sua lucidez permanente e angustiada deixou-nos pequenas maravilhas em apenas dois ou três parágrafos. A Quasi, em breve, vai editar algumas delas que se juntam ao livro Os dias de amanhã, da Contexto. Já não peço aos seus actuais camaradas de profissão que por aí pululam em textos entre o histérico e cómico que escrevam como ele. Seria uma impossibilidade intelectual. Pelo menos, leiam-no e aprendam qualquer coisinha.

2 comentários:

Anónimo disse...

AH!VOCÊ É AMIGO DO SEABRA. TUDO DITO!!!!!!!!!!!!!

Pedro da Cunha Rego disse...

Ler a respeito do Victor é um mistério. Bonito, porém um mistério.