30.12.06

O ANO QUE PASSA - 4


Dos primeiros vinte e dois dias do ano que passa, fica a derrota de Mário Soares e a vitória de Cavaco Silva. Desta já me ocupei aqui. Fiquei com a sensação, depois de correr algumas livrarias, que o livro de Filipe Santos Costa, A Última Campanha, tinha sido comprado a resmas por alguém. Talvez o PS, talvez o visado e a sua Fundação, não sei. Foi graças à amizade e à gentileza de um dos principais protagonistas desse livro que o pude ler, em apenas duas noites, devidamente emprestado e pronto a ser devolvido. Lido com alguma atenção - e já que é do futuro, tal como o ex-"pai da pátria", que me interessa falar - o texto de Santos Costa permite algumas conclusões interessantes. A primeira, é que Soares nunca foi acompanhado no seu atabalhoado regresso pelo PS. É claro que houve ministros, secretários de Estado e o "aparelho" dos drs. Coelho e Perestrello a puxar pelo impuxável. Só que, já nessa altura, a prioridade de Sócrates era a preciosa estabilidade da sua maioria e do seu executivo. Cada vez que uma luminária do governo aparecia ao lado de Soares a falar em "estabilidade", Cavaco ganhava mais uns votos. As declarações e os silêncios dos profissionais do PS na campanha, feitos on e off ao autor do livro, mostram a enorme cautela daqueles em "explicar" a ligação do partido e do governo com o desastre anunciado. Leiam-se os depoimentos do "socrático" Marcos Perestrello e do "socrático convertido" José Manuel dos Santos. E percebam-se os afastamentos e a prudência analítica de um inesperado António Campos, de um "realista" e livre Medeiros Ferreira ou de um António Pedro Vasconcellos. Alfredo Barroso já tinha perdido o passo no métier e no PS quando se enfiou e desenfiou na campanha. Vitor Ramalho fazia ora o papel do cego, ora o papel principal na tragédia - foi o primeiro a querer Soares e o primeiro a querer que ele desistisse - e Vasco Vieira de Almeida, advogado de negócios e uma nulidade política, foi sempre o mandatário errado. Mega Ferreira não conta. Nessa altura já tinha o CCB "prometido". Em suma, Soares, sem dar por isso, e logo a seguir ao único momento verdadeiramente apoteótico da candidatura - o seu anúncio histérico no Altis -, passou a gerir sozinho um "saco de gatos" de que Sócrates se afastou prudentemente já a pensar na "cooperação estratégica" e no PS albanês que construiu a seguir. Deixou lá os "homens das pontes" como rendimento mínimo garantido. O resto eram amizades que não podiam dizer "não" e uns tolinhos de circunstância agarrados a "teorias da conspiração". Em segundo lugar, e como consequência disto, Sócrates e os seus acólitos mais próximos, muitos deles sem nenhuma tradição partidária, desfizeram-se do PS fundado por Soares em 2006, acto consumado num congresso recente. Na sua irresponsabilidade "poética", o bardo Alegre ajudou à festa e presentemente não interessa nada. A derrota de Soares sossegou e "socratizou" definitivamente um partido agastado pelas autárquicas e pelas "reformas" incompreendidas. Soares nunca percebeu que a "estabilidade" de que eles falavam e que berravam nos comícios, não passava por ele. Sócrates e Soares, segundo crónicas e íntimos comuns, dão-se muito bem e o "primeiro" telefona-lhe muitas vezes e ouve-o amiúde. Não custa nada ser cínico. Em terceiro e último lugar, olhando para diante, a derrota de Soares só aproveitou a uma pessoa, ao primeiro-ministro. Este foi o ano da sua "popularidade" absoluta nos estudos de opinião, tal como em 86/87, Cavaco, então chefe do governo, "cresceu" de uma situação minoritária para duas maiorias seguidas, após a derrota do seu candidato presidencial, Freitas do Amaral. Soares presidente "ajudou" e o Presidente Cavaco está a "ajudar". O precipitado elogio presidencial de 2006 ao alegado "reformismo governativo", pode vir a estatelar-se aos pés de Cavaco Silva mais brevemente do que ele imagina. O PS não pode correr o risco de afrontar até ao fim a classe média que o sustenta eleitoralmente e de andar a receber os elogios hipócritas das "esquerdas e das direitas dos interesses" que se andam a servir de um governo que faz por elas o "trabalho sujo". O recente episódio do "regulador" das energias, com a escolha de um homem de Pina Moura para o cargo, é só mais um frete que Cavaco, espera-se, deve ter registado. "Eu debati essa estratégia de colagem ao governo e ao PS nas primeiras reuniões, mas depois calei-me. Acho que já não valia a pena". Palavras de Medeiros Ferreira ao autor do livro que deu o mote a este escrito. É claro que já não valia a pena. O tempo se encarregará, feliz ou infelizmente, de lhe dar razão.

4 comentários:

Anónimo disse...

Isto é, o dr. Soares não teve a mínima culpa na própria derrota.
Notável.

João Gonçalves disse...

Acha que foi isso que eu disse?

Anónimo disse...

Boa análise. Bom texto.
rui Perdigão

Anónimo disse...

FINALMENTE, soares teve aquilo que sempre mereceu!!!!
Mesmo assim, não lhe passou a arrogância que sempre demonstrou ter sobre toda a gente, sobre todos os Portugueses! Fez sempre o quis e que entendeu, enganando os incautos, sorrindo aos tolos e alimentando os Egos aos incompetentes e subservientes !!

Finalmente, LIVREI-ME DELE!!!!