6.2.07

POLÍTICA E BIRRAS

Mal dormido da infeliz passeata chinesa, o eng.º Sócrates mergulhou de imediato numa sessão intimista do seu partido dedicada ao “sim”. Correram os habituais lugares-comuns sobre o aborto clandestino, a “humilhação” e a “condenação”. Nada de novo por aqui. Todavia, a parte mais interessante da peroração do secretário-geral do PS consistiu na subtil chantagem que quis deixar no ar, dirigida particularmente a criaturas que representam o seu partido no Parlamento e que estão do lado do “não”. Que disse ele? Se o “não” ganhar, a lei fica tal como está e o PS arremessará a sua maioria contra qualquer iniciativa casuística para a alterar, venha ela de onde vier. Para quem, como eu, entende que a lei em vigor é perfeitamente equilibrada - porque pondera, quer os interesses de uma vida por vir, quer os interesses e a saúde da progenitora - Sócrates chegou tarde à evidência. E, para além disso, entrou em contradição. Não foi ele que pediu “respeito” aos camaradas pelas posições internas em sentido contrário? Ou o seu absolutismo democrático só funciona quando lhe é favorável? O primeiro-ministro e o governo não ignoram que está em causa dotar o serviço nacional de saúde de condições humanas e materiais para servir as populações. Entre outras, incluem-se as medidas – até agora desprezadas pela “esquerda” e pela “direita” que alternaram no poder nos últimos vinte e tal anos – que permitam às mulheres que justificadamente recorrem à interrupção da gravidez, poder realizá-la em segurança e livres de estigmas de qualquer natureza. O resto é política e birras sem importância.
Nota: Publicado no Diário de Notícias. Entretanto, o mesmo eng.º Sócrates esteve hoje no Porto com a mesma conversa. Esta chantagem que o secretário-geral do PS anda a exercer sobre o eleitorado - ou votam "sim" ou nós não mexemos "uma palha" - é elucidativa do "estilo despotista democrático-esclarecido" do nosso primeiro-ministro. No "não" cabem muitos "sim's". Inclusivamente o "sim" à actual legislação. É a percepção que as pessoas têm disso que irrita o senhor engenheiro. É elas perceberam que se trata, não de despenalizar - diga lá ao eleitorado a verdade toda, a de que o aborto, para além das dez semanas da perguntinha, continua criminalizado com excepções - mas sim de liberalizar unilateralmente. Isso, senhor engenheiro, é que não.

13 comentários:

Anónimo disse...

Esta postura de Sócrates só prova que temos uma elite política desgraçada. É por essas e por outras que discordo com o automatismo pavloviano que faz de um chefe partidário (eleito sabe Deus como) um candidato a PM.

Anónimo disse...

Bem, hoje uma multidão ter descoberto os defeitos da pergunta parece-me um bocado ridículo.

Até porque é exactamente a mesma do outro referendo.

E que, apertado, o dr. Marques Guedes tenha vindo dizer que aprovaram a pergunta porque ou a pergunta era aquela ou não havia referendo é o cúmulo. Pior, só a proposta do Dia do Cão.

A altura de discutir a pergunta há muito que foi ultrapassada, agora é altura de dizer sim ou não a esta.

Anónimo disse...

Ó JG, deixe-se lá do senhor engenheiro! Ou, então, ponha-o entre aspas, como é devido.
Quanto ao anónimo anterior (6:01 PM), é de notar que não se discorda com, mas se discorda de...
Entendido?

Anónimo disse...

Chantagem?!...

Não: coerência e xeque-mate lógico ao NÃO.

FNV disse...

Ó João: não sei se reparou que o PM a certa altura diz: " a 5 dias das eleições..."
Quantos mais médicos mais moléstias...
( FNV)

Anónimo disse...

Sócrates, é porventura o lider do país mais popolista, demagógico, arrogante e incoerênte que este Portugal teve. No entanto, O que me preocupa é que as intenções de voto ainda lhe dão vitória! Temos o líder certo para o país certo (não votei nele, pois nunca me enganou).

Anónimo disse...

Pois, mas é a elite que temos e que foi produzida nos últimos 50 a 60 anos.

Mas o pior está para vir, dada a maneira como estamos a educar as novas gerações, a quem já chamamos Rasca (O espelho de nós próprios)!

PS- caso não tenham reparado, ele vão gerir as nossas Reformas.

José Gomes André disse...

O espectáculo de arrogância e despotismo continua, sem dúvida. Sinceramente, há quem veja nisto determinação, mas parece-me evidente que Sócrates convive mal com a crítica e a opinião alheia. E esse sinal de autismo político deve preocupar-nos a todos.

Bem Pelo Contrário

Jose Mexia disse...

Muito bom. Em cheio.
É evidente que este referendo é para Sócrates uma questão política, está-se nas tintas para a questão em si.

Anónimo disse...

...claro que se está nas tintas para a questão em si!
é TUDO SÓ POLÍTICA !!Pra se estar "na mó de cima" vale tudo!!!

Estou FARTINHO DESTES ABORTOS que vieram à luz do dia por engano!!

Anónimo disse...

Não está a ser razoável! Mesmo defendendo o Não esperava mais de si...

Anónimo disse...

«não se discorda com, mas se discorda de...».
Tá certo, sim senhor.

Em todo o caso os chefes partidários continuam sendo "candidatos automáticos" a PM.

Dizia eu que «não estou de acordo com, e discordo de. Assim é que é.

Anónimo disse...

Medeiros Ferreira e o "equilíbrio das finanças" :

«O SIM entre a esquerda e a direita

O SIM não é uma questão política só de esquerda.Há muita gente à direita, ou sem quadrante ideológico fixo,que pretende despenalizar o aborto durante as primeiras semanas de gravidez.Em França foi até um governo de direita que há mais de 30 anos resolveu o caso. Mas em Portugal a direita política é incapaz de resolver qualquer assunto que requeira um pouco de nervo.Não democratizaram, não descolonizaram,nem sequer conseguiram equilibrar as finanças em regime democrático.Fora o business as usual agarram-se às abas da esquerda quando é preciso mais do que intendência.Era bom que muitos dos seus eleitores fossem votar SIM no domingo.E dar uma lição aos seus representantes políticos».