31.7.06

A SÁBIA

Nas notas de rodapé dos telejornais, fica-se a saber que a UE enviou uns "sábios" (sic) para o acompanhamento das eleições no Congo. Um desses "sábios" é a dra. Ana Gomes, parlamentar europeia conhecida pela sua extrema lucidez, entre outras inúmeras qualidades. O mundo está mesmo perigoso.

A DEVASSA

Parece que a DCGI publicou na net a lista dos relapsos em IRS e IRC, com dívidas superiores a determinados montantes. Seguir-se-á a Segurança Social com os "seus" devedores e, em ambos os casos, presume-se que o valor da dívida, para efeitos de pública exposição, irá descendo. Eu entendo que quem não cumpre as suas obrigações tributárias, ou torpedeia as coisas de maneira a não cumprir, é um vígaro. Sobretudo quando se analisa a "qualidade" do devedor, individual ou empresa. Por isso o "sistema" continua a ser suportado fundamentalmente pelos chamados "trabalhadores por conta de outrem" e pelo IVA. Dito isto, parece-me uma falácia este alegado exercício de "combate à fuga e à evasão fiscal". Não será pela via da devassa - um método medieval apenas "actualizado" pelo processamento electrónico de dados - e da pretensa humilhação pública dos devedores - que só serve para excitar o "voyeurismo" alarve que nos é peculiar- que se lá vai. Depois disto, exige-se que, a seu tempo, o Estado dê notícia de quanto é que conseguiu "arrecadar", dos cento e trinta milhões de euros em dívida, à conta desta frivolidade. É o mínimo.

A FARSA

Marcelo Rebelo de Sousa, com a habitual displicência domingueira, afirmou que todos nós, portugueses, gostamos muito da Maria João Pires. Mais um bocadinho e Marcelo tricotava um cachecol com as iniciais da pianista para usar ao pescoço: ainda não se livrou completamente do tropismo nacionalista que o atacou aquando do mundial de futebol. Adiante. De facto, não sei se "todos gostamos" de Maria João Pires ou se muitos dos nossos concidadãos sabem sequer de quem se trata. Entre ela e a "escritora" Fátima Lopes, suspeito que a notoriedade estaria encontrada de imediato. Facto é que a Pires não gosta decididamente de nós o que, em parte, revela o seu bom gosto. Já do dinheiro que "nós", contribuintes, lhe fazemos intermitentemente chegar, talvez já goste mais. Mas este é um comentário de mercearia, indigno de uma artista como a Pires. Aqueles apressados que caíram de joelhos aos pés dela e tocaram a rebate contra a afronta que a dita estaria a "sofrer" - a "tortura" - tiveram a resposta pela mão da própria: "Portugal... preocupa-se com sensacionalismo, mentira, intriga, conflito e consumismo". Na realidade e no Público, Pires tentou repôr as coisas numa dimensão de onde elas nunca deveriam ter saído. E, para gáudio de Marcelo e dos exautorados "piristas", Maria João garantiu que "pode trabalhar e colaborar no projecto de Belgais sem gostar de Portugal". Falo apenas por mim. Continuarei a gostar da Pires como sempre gostei - a minha modesta discoteca aí está para o provar - mesmo sabendo que ela não gosta de mim, naquela parte em que também sou, por força das circunstâncias, português. Todo o artista, sobretudo o bom artista, tem algo de farsante. Maria João Pires encerrou, lá do seu Brasil descansativo, a sua pequena farsa doméstica. Ainda bem.

Adenda: Sem link, porém vale a pena ler o "Fio do Horizonte" de hoje, segunda-feira, 31, do Eduardo Prado Coelho no Público: "A pianista". Desta vez acertou.

A GUERRA DE LAPTOP


Ouvi no carro que Israel está a fazer um "intervalo" no seu ataque indiscriminado ao Líbano para "tentar perceber" o que se passou em Qana. Miss Rice, entretanto, regressou a casa à espera de melhores dias. E o Conselho Europeu reune-se amanhã para pensar no assunto. Ou seja, o foguetório deverá seguir dentro de momentos. Sem complexos, nem de "esquerda", nem de "direita", continuo a pensar o mesmo deste "conflito". Israel não pode parar de atacar para se defender, mesmo à custa de gente que nada tem a ver com actividades terroristas. E o Hezbollah fará exactamente o mesmo, de forma mais vesga e aleatória, no território judaico. A desculpa extraordinária de que foram lançados panfletos sobre regiões libanesas a avisar os "civis" que o melhor que tinham a fazer era mudar de sítio, como se se tratasse de uma trivialidade ou de uma obrigação, não justifica o que está a acontecer ao País do Cedro. Sobretudo quando se percebe que o "núcleo duro" do Hezbollah está vivo e de boa saúde. Os tolinhos que por aí andam a "tomar partido" - supostamente em nome da "Estátua da Liberdade", passando atestados de "terrorista" e de anti-semita a quem quer que pense de outra maneira -, pretendendo dar lições de superioridade democrática, mais valia estarem calados. Ao perder a cabeça, Israel corre o risco de perder, mais do que a guerra, o processo político que precede a guerra. E isso, contrariamente ao que pensam os " guerrrilheiros de laptop", é que constituiria uma verdadeira tragédia para a região e para o "ocidente" que eles imaginam "acarinhar" com o seu "israelismo" primário.

30.7.06

PERTURBAÇÕES

1. "BARBÁRIE. Na Cisjordânia, um médico israelita foi esquartejado e colocado na mala do seu próprio carro antes de este ser incendiado. As Brigadas dos Mártires de Al-Aqsa já assumiram a autoria deste assassinato. Perturbador." Digo eu e o Tiago Barbosa Ribeiro.

LER NA AREIA


1. Costumo levar para a praia "partes" de jornais. Do Expresso, por exemplo, só levei o suplemento Actual e do Público, o Mil Folhas. O Actual "escolhia" os livros que os portugueses deviam levar para férias, assentando o exercício em dois pressupostos errados. Em primeiro lugar, que os portugueses lêem. Ler, lêem, como pude ver no Algarve, mas oscilam quase exclusivamente entre Dan Brown, Paulo Coelho, Madame Rebelo Pinto e esse naco literário que dá pelo nome de José Rodrigues dos Santos. O resto são jornais desportivos e revistas rosa. Em segundo lugar, parece que é obrigatório ler durante as férias, seja porque não se lê durante todo o ano, seja porque o acto de leitura se pode confundir com um mergulho ou uma sardinhada. Não pode. Para não irmos mais longe, basta consultar as obras de Harold Bloom ou de George Steiner sobre "a leitura" para se perceber a seriedade da coisa. Verdade seja dita que, na realidade, muitos dos livros "aconselhados" só por piedade se podem considerar "literatura". Também, no meio da areia, quem é que verdadeiramente se importa?
2. Ainda no Actual, dou por mim a ler a crónica do meu querido amigo José Manuel dos Santos. Com a "história" que ele tem, com as "histórias" que ele sabe, com o talento memorialístico e de escrita que felizmente possui, não vejo necessidade para prosas como a de ontem, sobre Joana Vasconcelos, que ressumava a um misto de João Miguel Fernandes Jorge com Eduardo Prado Coelho, ambos ligeiramente ainda a meio da faculdade."A fusão do kitsch "ready-made" com o kitsch acrescentado (pelo tricot e pelo crochet, por exemplo) interroga, como diria um semiólogo, o significante e provoca uma erupção de significados. O significante implode e os significados explodem". Zé, tu és bem melhor do que isto.
3. Por falar em Prado Coelho, a sua crónica no Mil Folhas firma esta espantosa doutrina: "Rui Chafes é um dos grandes escritores portugueses". O Chafes é filho de dois professores do meu antigo liceu, a dra. Ondina, da matemática, e o prof. João Chafes, de música e maestro do saudoso coro do D. Pedro V. Quando o Chafes começou a "criar", lembro-me de ter falado com ele para o Semanário. As suas esculturas e as suas instalações revelam, de facto, um artista, porém não fazem desse artista "um grande escritor português", e nem tudo o que dele brota é, como exageradamente refere Prado Coelho, "música". É que depois deixa de ser "crítica" ou "ensaística", e parece mais "encomenda" ou pura divagação de circunstância.
4. Finalmente o Eduardo Pitta, também no Mil Folhas e aqui, coloca uma questão que eu coloco muitas vezes a mim mesmo: "nós por cá não temos termo de comparação, porque, como muitos dos nossos escritores “sérios” fazem questão de sublinhar, o mundo à nossa volta é coisa indigna de literatura. Mas isso é uma originalidade portuguesa. Em que outro país do mundo Rui Nunes e Mafalda Ivo Cruz seriam considerados romancistas?" Ainda se fossem só estes dois.

29.7.06

O SR. COMENDADOR A DOIS TEMPOS


1. Homens da cepa do sr. comendador Berardo não são propriamente filantropos. Após anos a "ameaçar" levar a sua colecção privada daqui para fora, Berardo negociou com o actual governo a melhor forma - para ele, naturalmente - de isso não acontecer. Para tal, a ministra Pires de Lima teve de passar por sumários vexames públicos produzidos pelo sr. comendador - recordo, entre outros, o mimo de "saloia" - e sujeitar-se à intervenção directa do primeiro-ministro, presumivelmente através de Alexandre Melo, seu assessor para a cultura, para que o famoso "acordo" fosse assinado há dias. O Estado abjurou perante o sr. comendador e obrigou-se a "entrar" com cerca de 500 mil euros/ano para poder exibir as 863 peças que fazem parte da colecção, sem nenhuma certeza de que daqui a dez anos o sr. comendador não lhe apeteça, com a colecção já devidamente valorizada, desaparecer com ela para onde lhe aprouver. Mega Ferreira, o presidente do CCB, hipotecou, com o habitual gosto e alegria de bem servir que o caracteriza, parte significativa da estrutura do Centro para a instalação do "museu/fundação de arte moderna e contemporânea- colecção Berardo" de que este será presidente, com o óbvio direito a nomear e a despedir o respectivo director. Os argumentos utilizados pelo Estado para justificar este "acordo" seriam risíveis se não fossem trágicos. É evidente que não estão em causa, nem a qualidade da colecção Berardo, nem o seu "interesse" cultural. O que parece ser discutível são os termos do "acordo" para o "parceiro" Estado, ou seja, para os contribuintes que supostamente devem usufruir do acervo. Apesar dos beijinhos e abraços, não tenho a certeza de que o "interesse nacional" se tenha sobreposto aos interesses privados e legítimos do sr. comendador. Pelo contrário, penso até que Berardo conseguiu "meter" o governo no seu já vasto espólio, como um vulgar troféu de caça. O sr. comendador só dá um chouriço a quem lhe der um porco.

2. “O acto de promulgação de um diploma legal não significa necessariamente a adesão do Presidente da República às opções políticas a ele subjacentes, nem implica o seu comprometimento institucional com todas as soluções normativas nele inscritas”, refere uma nota da Presidência da República. Cavaco Silva manifestou dúvidas, nomeadamente, quanto à “distribuição de poderes entre o Estado e o coleccionador”, no caso de o Estado Português efectuar a opção de compra da Colecção Berardo."

TORTURADA - 2


O coro de carpideiras que se formou em torno do episódio Maria João Pires é revelador da imensa fantasia que é o nosso país. Na sua leviandade, não perceberam que jamais esteve em causa a artista, a grande artista, que a Pires é. Belgais é um "projecto" nobre, sem dúvida, numa terra onde quase nada existe, que tem uma gestão para a qual foi canalizado dinheiro público, cerca de dois milhões de euros. A própria Maria João Pires deve ter reparado no exagero da expressão "tortura" - que supostamente o país lhe andava a infligir - e moderou para a ideia de ir "descansar" de Portugal para o Brasil, sem largar a orientação pedagógica e artística de Belgais. Entre nós, por causa da "cultura" salazarenta que vigora em muito boa alma de "esquerda" iluminada e pretensiosa, confunde-se amiúde o respeito pelo temor reverencial. Depois, se se juntar a isso um crónico provincianismo que tanto se baba de gozo por poder exibir um Figo lá fora, como uma pianista genial, sem fazer grandes distinções, e temos o fermento para o "caldo" de uma das raças mais estúpidas da Europa. Ou julgam os seus "defensores" que a Pires os tem em grande conta? Por amor de Deus.

Adenda: Ler, sobre isto, o Eduardo Pitta, presumo que mais "insuspeito" do que eu.

SENTIDO DO RIDÍCULO


Se houver "força internacional", designadamente patrocinada pela UE, o governo gostava que as nossas gloriosas forças armadas participassem. Sobre isto, Cavaco Silva - cuja palavra é decisiva - ainda não disse nada. Todavia há militares que já disseram qualquer coisa ao abrigo do anonimato. O "grau de prontidão" do nosso material "bélico" anda perto da idade da pedra lascada. Não garante, por isso, um módico de protecção aos putativos heróis nacionais no Médio Oriente. Em suma, é a mesma pinderiquice de sempre que, no caso vertente, só serve para atrapalhar a eventual "força de interposição". Mesmo assim, parece que há quem pretenda colocar Portugal "como um "produtor de segurança e estabilidade" na cena internacional" (sic). Que mal pergunte, mas não haverá por aí ninguém com o mínimo sentido do ridículo?

28.7.06

TORTURADA

Na verdade, Maria João Pires- que aprecia fazer-se passar por modesta e simplória - tem um talento e uma vaidade equivalentes à irritação que, por vezes, provoca. Ainda me lembro, numa das fases mais assanhadas das gentes da "cultura nacional" contra Santana Lopes na SEC, de a pianista ter ido ao Coliseu ler um "manifesto" contra o dito que lhe valeu os ombros de tudo o que é culturo-dependente neste pobre país. Pires socorre-se do seu génio musical para coisas que nada têm a ver com arte e que têm muito a ver com a gestão da vida dela. Gosta de ser bajulada e tem-no sido. Normalmente é o Estado que vai a Belgais e não contrário. Está, por isso, mal habituada. Acha-se subtil e indispensável a uma pátria que, aparentemente, não só não a compreende, como a "tortura". Aprendeu, pelos vistos, com o "exilado" sr. Saramago. Péssima companhia.

VALE TUDO



A inspirada dupla Bush/Blair, descredibilizada pela magnífica "democratização" do Iraque, vem agora "apoiar" uma "força internacional" para o Médio Oriente que trate de acompanhar um "cessar-fogo". Duvido que alguma das partes esteja interessada em forças internacionais e, muito menos, num cessar-fogo. Israel precisa de se defender, atacando, e o Hezbollah precisa de atacar para se defender e justificar a sua supremacia política sobre os restantes grupos radicais da zona. Fragilizados e envergonhados - nunca mais se ouviu falar de Miss Rice depois de Roma - os EUA e a Inglaterra já estão por tudo, até pela ONU, na qual, com alguma razão, não confiam. É pena que tenhamos chegado a este ponto, praticamente "desarmados" perante o "outro", graças, sobretudo, à estupidez "ocidental" - que, entre outras coisas, vê em Israel uma espécie de baluarte contra o islão quando, na verdade, àquele apenas lhe interessa salvar a pele - e à impertinência assassina do Hamas e do Hezbollah. Ambos - Israel e o Hezbollah, para já - querem naturalmente acabar um com o outro. Por enquanto, apenas estão a conseguir dar cabo de uma nação, o Líbano. E sobre o Líbano, nem os pró-semitas, nem os pró-terroristas, conseguem proferir uma palavra. Para ambos, o que interessa é atacar e defender, e defender e atacar. Vale tudo. Nem que não sobre um cedro no Líbano.

A MORTE


Assisti hoje a um funeral. Depois do velório, o féretro encaminhou-se para o Alto de São João, em Lisboa, onde teve lugar a cremação. Tudo feito com o "profissionalismo" de uma multinacional da especialidade, muito em voga, que trata as "agências" por "lojas" e usa cores vivas. A viúva, minha amiga, e eu, chegámos a tomar um chá numa área destinada ao efeito na qual as capelas mortuárias não têm aquele ar agreste e de abandono habituais, mobiladas com peças de segunda mão. Fazem justiça a uma frase que retive das memórias de Gabriel Garcia Marquez, relativa à publicidade a uma agência funerária às portas da sua aldeia natal: "não tenha pressa, nós esperamos por si". Depois do funeral, dirige-me à secretaria do cemitério - com senhas de presença e "multibanco" - para pedir o número da gaveta do columbário onde se encontram as cinzas do meu pai. Ao meu lado, a agente que tinha tratado do funeral que eu acompanhara, tratava da burocracia relativa à "pós-cremação". Ao telemóvel, perguntava a uma colega se podia "levar este" ("este" era o "meu" defunto) mais tarde, uma vez que a dita colega tinha de se deslocar ao cemitério para acompanhar outra cremação. Se alguma dúvida persistisse acerca do que valemos, as visitas intermitentes a cemitérios servem, pelo menos, para acabar com as dúvidas. Somos pó e ao pó voltamos. Todavia, até o pó já constitui um excelente negócio. Não se morre mais como se morria.

LENDO OUTROS


"De há uns dias para cá tenho pensado muito no Rany. Desde que começou a ofensiva militar no Líbano. Os pais dele (que não conheço mas que, segundo me disse o Rany, rezam por mim com frequência) vivem em Beirute. Assim como toda a família de Rany. Tentei ligar-lhe vezes sucessivas sem sucesso. Até hoje. Falei com ele e percebi que a guerra não é lá longe. Com uma profundíssima tristeza na voz contou que à volta da casa dos pais só existe morte e destruição. As notícias que lhe chegam (ele vive em Amsterdão) são escassas e o meu amigo treme sempre que o telefone toca por achar que vai receber a notícia que teme receber. Os pais do Rany estão em perigo. Assim como toda a família dele. Não há muito a fazer, diz ele. Quando lhe perguntei como estava a família, a resposta foi lacónica: "They are just trying to survive".

In, Da Inquietude

27.7.06

UM LIVRO

Um livrinho adequado aos tempos que correm, cá dentro e lá fora: Cynismes, portrait du philosophe en chien, de Michel Onfray. Ao pé dos Cínicos, Platão era apenas um tipo sem tomates. Nietzsche e Heidegger, muito tempo depois, vieram para pôr um sublime termo à "metafísica" platónica.

"OS AMIGOS DE PENICHE"

Li no Público que uns grupelhos "pacifistas" - os mesmos que, antes do Muro ruir, entendiam que só a NATO é que tinha mísseis maus - promoveram duas patéticas manifestações, uma em Lisboa e outra no Porto, contra Israel. Não é nada recomendável andar de braço dado com estes dinossauros os quais, aliás, devem perturbar imenso as manobras sionistas em curso no Líbano. Agora só falta uma manifestaçãozinha a favor do "outro lado". Os lusos "amigos de Peniche" de Israel, aparentemente em tão nutrido número, de que é que estão à espera para exibirem o seu penchant prudentemente distante?

IDEM

"Que alguns idiotas que por aí andam desenterrem a treta do anti-semitismo cada vez que se fala do Médio Oriente é problema deles. Ou melhor, uma maneira, como qualquer outra, de desconversar. O que, a mim, só me dá para dar o troco em desconversa - num debate franco, aberto, como acho que devem ser todas as conversas públicas, sinto-me à vontade para ironizar sobre a pronúncia do Cavaco, as barbas do Papa e, porque não?, o anti-semitismo."

João Morgado Fernandes, in French Kissin'


"A razão por que Israel não convence muita gente só tem a ver com o Hezbollah na medida em que a sua resposta à provocação deste, com o massacre indiscriminado de infra-estruturas e de civis inocentes no Líbano, só veio aumentar as razões de queixa e de ódio antijudaico entre as massas árabes, inclusive no Líbano, sentimentos que ampliam os apoios do Hezbollah e dos movimentos radicais islâmicos. Lá para trás, foi a prolongada ocupação israelita do Líbano que criou o Hezbollah; agora, com o novo ataque destrutivo ao Líbano, Israel está a entregar ao Hezzbollah o protagonismo de todos os agravos árabes contra o Estado judaico, incluindo na questão palestina."

Vital Moreira, in Causa Nossa

"A OPINIÃO PÚBLICA INTERNACIONAL"


Há pouco, na SIC Notícias, um tal Martim Cabral, "especialista", asseverava- vindo directamente de Israel - que a coisa está "para lavar e durar". Que há árabes que enviam "mensagens" ao governo israelita a incitar à luta contra o Hezbollah. Que, apesar da ampla preparação militar dos israelitas - os civis são todos putativos militares -, não contavam com uma guerrilha tão severa por parte dos outros. Que enquanto Israel estiver a zurzir impiedosamente o Herzbollah, mesmo destruindo com método, zelo e persistência um país inteiro, a "opinião pública internacional" estará ao seu lado. Este jargão da "opinião pública internacional", bem como o da "comunidade internacional", intriga-me. Quem é esta misteriosa entidade a quem o sr. Cabral se refere? Como o exemplo mais próximo que temos de "democratização" a expensas da "opinião pública internacional" - o Iraque - custa cerca de cem mortos por dia, é de desconfiar do que pensa a referida "opinião" em relação ao conflito em curso. Para já, nem Israel, nem o Hezbollah, nem a Al- Qaeda - entretanto ressuscitada -, nem a Síria, nem o Irão, parecem muito preocupados com a "opinião pública internacional" e, muito menos, com a nação libanesa. O "humanitarismo" de que se fala em relação aos refugiados - outra "preocupação" da tal "opinião pública internacional - é nojentamente hipócrita. Até parece "natural" - estilo "danos colaterais" leves - que mais de setecentas mil pessoas sejam forçadas a abandonar o que é seu como se fosse uma trivialidade. O bonzinho Guterres, aliás, já veio falar no arroz e nas tendinhas, como lhe competia. E o governo português quer, se for o caso, mandar uns quantos valentões para o sul do Líbano, mais uma vez em nome da mística "opinião pública internacional". Isto tudo é bem mais sério do que parece. No fundo, a "opinião pública internacional" está metida numa enorme trapalhada e, agora, não sabe como sair dela.

A.O.S.


Não percebo nada de numerologia. Certo é que os dias 27 e 28 estiveram sempre ligados à biografia de António de Oliveira Salazar. Nasceu num dia 28, deveu a sua ascensão política ao "28 de Maio", tomou posse como o mais famoso ministro das Finanças do século passado num 27 de Abril, chegou, para aquelas que seriam as últimas férias no Estoril, no dia 27 de Julho de 1968, foi substituído nas funções de presidente do Conselho em 27 de Setembro do mesmo ano e faleceu no dia 27 de Julho de 1970, precisamente há trinta e seis anos. No último ano de lucidez, Salazar recebeu por diversas vezes o seu ministro dos Estrangeiros, Franco Nogueira, e seu biógrafo. "Todos os dias, quase a todas as horas, vejo o fim da minha vida", confessou-lhe em Abril. E, já depois da queda fatal no Estoril, ainda lhe disse: "no dia em que eu abandonar o poder, quem voltar os meus bolsos do avesso, só encontrará pó". Quando morreu, tinha, na única conta que possuia e onde lhe era depositado o ordenado, 50 contos. Premonitório, sussurrou a Nogueira, dois anos antes da queda, que "chegara ao fim". "Os que vierem depois de mim, vão fazer diferente ou o contrário e contra mim". Era verdade e era necessário que assim fosse. Não o foi completamente porque Caetano estava cercado pelo regime. Mesmo assim, algum "reformismo" de que hoje ainda se sentem os contornos, foram introduzidos nos primeiros anos da década de setenta. "Respirava-se" um pouco melhor. Em quatro anos, uma das corporações apascentadas pela ditadura, a tropa, acabou com ela. O que se seguiu é conhecido. Salazar não deixa ninguém indiferente, pelos piores e pelos melhores motivos. O país que somos em 2006 é, em certo sentido, "salazarento". Aí, o antigo chefe do governo obteve uma vitória póstuma. São ténues os vestígios de uma cultura e de uma qualidade de vida democráticas. Este regime não gerou elites, à excepção de uma ou outra figura que já tinha uma "biografia". É o caso inequívoco de Mário Soares. Na campa rasa do Vimieiro, Salazar quis uma sepultura à altura da sua visão dele próprio e do mundo. As iniciais "A.O.S." encerram simbolicamente uma história que parece nunca acabar.

A VOZ DA RAZÃO


Depois da "conferência de Roma" - que os directos intervenientes na violência em curso no Médio Oriente ignoraram olimpicamente - é hoje a vez do Parlamento português "debater" o assunto. Pode ser que, dada a relevância e a reconhecida idoneidade política e intelectual da nossa ilustre deputação, Israel e o Hezbollah parem por uns instantes as confrontações para escutarem a "voz da razão" emitida a partir de Lisboa, São Bento. Se não fosse trágico, era cómico.

26.7.06

LENDO AMIGOS

Para poupar nas palavras, remeto para dois posts do Jorge Ferreira: um, sobre a insídia que se abateu abruptamente sobre o José Pacheco Pereira, e o outro sobre a justiça que se abateu sobre o dr. Souto Moura.

GÉMEOS

Enquanto me deliciava com uma espetada de tamboril, apareceu, numa televisão por cima da minha cabeça, o "patrão" do Hezbollah, cujo nome me escapa. Pareceu-me luzidio, tranquilo e bem dispostinho, por debaixo daqueles óculos bestialmente ocidentalizados e daquela barba hirsuta. Pela legendagem, percebi que o referido senhor pretende ir mais além de Haifa, uma cidade israelita que os seus petardos têm atingido. Do lado contrário, deu-se o caso de os respectivos petardos terem ido de encontro a quatro observadores da ONU, em território libanês, cada vez mais primitivo. Também, ainda a espetada ia a meio, vi um simpático porta-voz do governo de Israel a prometer um inquérito "e tal, e que talvez não tivesse sido bem assim, e tal". Apesar de os israelistas terem melhor aspecto que o senhor do Hezbollah, a digestão do tamboril inflamou as minhas brechas anti-semitas (atenção Eduardo: eu sou daqueles que não têm medo da expressão) que, já de si, são bastante frágeis. À medida que a guerra avança, dá-me ideia que o senhor do Hezbollah e os senhores do lado contrário se aproximam cada vez mais. Epistemologicamente falando, digo eu, quais "gémeos" guerrilheiros e políticos, uma coisa que consta estar na moda. Todavia, perdoe-se-me a pergunta, mas o que é que aqueles "líderes" atarantados (de quê e de quem?) foram fazer a Roma? Para a coisa ter sido perfeita, só faltou mesmo o dr. Barroso e a sua sempre preclara "visão" sobre a "vida internacional". Mandou o eterno valet de chambre Solana que equivale a pouco mais que nada. Isto promete. Pode ser que o Paulo Gorjão - que é "especialista" - me possa esclarecer.

MUNDO CÃO


A pessoa de quem mais saudades tive enquanto permaneci fora de Lisboa foi o Bruno.

25.7.06

"PAZ DURADOURA"

Na versão presidencial, "Condi" - o nickname de Bush para Condolezza - transmitiu bem o recado. Ao falar constantemente de "paz duradoura", sem se rir, Miss Rice devia fazer-se acompanhar de um "dvd" sobre o Iraque. O Iraque é, nesta hora exacta, o melhor monumento à "paz duradoura" que Bush quer ver instituída no Médio Oriente. Há agora quem pense na UE e em países árabes para tapar o buraco. Rice anda de um lado para o outro, feita barata tonta voluntariosa. Já deve ter percebido que A conversa da "paz" não interessa a nenhum dos interlocutores. Só falta Bush, himself, perceber.

LEBENSRAUM


Andam por aí a circular os habituais "manifestos". Tirando o "manifesto reformador", do António Barreto e do Medeiros Ferreira, de 1979, não me lembro de ter assinado mais algum. Talvez contra a regionalização, concedo. Em geral, sou alérgico por causa da frivolidade do exercício e dos nomes que lá aparecem. Os mais recentes - de que tenho conhecimento - dizem respeito ao Médio Oriente e ao Teatro Rivoli, do Porto. O primeiro abrange "intelectuais" e políticos esquerdinos - mais ou menos os do costume- e um bispo. É um "movimento". Imagino que deve comover imenso os israelistas e demovê-los imediatamente de lutarem pelo seu "Lebensraum". O segundo é mais modesto mas nem por isso menos "significativo". Destina-se a evitar que Rui Rio "venda" o Teatro a privados. É mais tipo "petição". Não falta quase nenhum subsídio-dependente na lista, onde se destacam os grandes sobas Cintra e Silva Melo. Ricardo Pais, na versão de "encenador", também surge. Acontece que ele é o director do Teatro Nacional de São João e não deve estar ali por acaso, apesar de andar mais caladinho do que é seu hábito. É o genéro de rapaz que não costuma dar passos em falso e que gere os seus silêncios tão bem como as suas falas. Por exemplo, quando Lagarto foi corrido do Dona Maria, Pais só se lembrou de dizer qualquer coisinha uns tempos depois. O que nós não fazemos pelo nosso "espaço vital", não é verdade?

LENDO OUTROS

De Fernanda Câncio, "a maldita gi." O Ministério Público, às vezes, tem razões que a razão desconhece. Nem mesmo a puramente jurídica.

SETE

O professor Marcelo - de quem tenho saudades de encontrar no Guincho - continua imparável na sua versão mais conhecida, a pantomineira. Este domingo deu nota sete à dra. Maria de Lurdes Rodrigues que, desde a semana passada, anda a ser frita em lume brando, logo a partir do Rato. Já anteriormente tinha dado pesada negativa a Jaime Silva, o homem que, na Agricultura, faz o favor de ir pacientemente explicando ao nosso marialvismo agrícola que já não vivemos nos tempos de Júlio Dinis ou de Sara Beirão. Não é por acaso. Maria de Lurdes e Jaime Silva são dois bons membros do governo que, felizmente, não são perfeitinhos. No caso da primeira, a circunstância de ter como secretário de Estado o dr. Lemos, não a ajuda em nada. Se calhar é para isso mesmo que ele lá está. Marcelo passou um atestado de incompetência política à ministra da Educação que, para utilizar um termo em voga, é manifestamente desproporcionado. Devolvo-lhe, por isso, o sete.

A FÁBULA

O verão "lava mais branco", como o "Omo". Para a política nacional, isso é bom. Está desaparecida entre a crise do Médio Oriente e um encontro de 45 minutos, no aeroporto da Portela, com Hugo Chavez, essa pérola castrista que tem petróleo para vender. O secretário de Estado da Administração Pública, pelo contrário, parece que continua, sem desfalecimentos, a "reformar" a dita administração pública. Em resposta ao PSD, o seu gabinete afirmou "não ter certezas" de que tenha existido um aumento "tout court" de funcionários públicos, como relatou uma direcção-geral na tutela do mesmo ministério a que pertence João Figueiredo. Que eu não tenha "certezas tout court" é uma coisa. Que um membro do governo assuma, preto no branco, que as não tem, é mais sério. Estimativas, previsões, cenários, diagnósticos, tudo isso é maravilhso, sobretudo se for exibido com bons métodos publicitários. Sucede que existe, fora deste brando contexto, uma realidade. De resto, é só escolher entre ela e a fábula. Eu posso escolher a fábula. O governo não.

24.7.06

PROPORÇÕES


Não me apetecia muito voltar à vaca fria. Acontece que o tema da "desproporcionalidade" merece duas ou três observações. Refiro-me, naturalmente, a Israel. Todos nós, no mundo, temos aparentemente uma "questão mal resolvida" com os judeus. E nós, portugueses, em particular. Agora somos muito "solidários" e piedosos com eles - à distância, naturalmente - mas, em devido tempo, com a desculpa religiosa, arrasámos literalmente a dita comunidade, queimando-a e expulsando-a sem hesitação ou melancolia. Quer na cultura, quer na "economia", este "progrom" foi devastador para o "desenvolvimento" e para a "qualificação" da pátria pelo que, para todo o sempre, pagaremos caro esse atrevimento. Por isso, e pela natureza das coisas e dos homens, tudo o que diz respeito aos judeus será sempre despropositado e desmesurado. Trata-se de um povo e de um Estado - Israel - que, por se sentirem permanentemente acossados e perseguidos, estão prontos, a todo o instante, para fazerem emergir o pior de si próprios. A insolência com que, sem olhar a meios, estão a arrasar o Líbano - e o Líbano não é o Hezbollah -, "condescendendo" em corredores humanitários, essa hipocrisia da "comunidade internacional" para lavar tranquilamente as suas mãozinhas, não parece impressionar as boas almas sempre dispostas a dobrar a espinha para o habitual pedido de perdão. Destruir o terrorismo e os seus sequazes não pode ser um pretexto cego para matar indiscriminadamente pessoas que não têm nada a ver com isso e para fazer uma nação regressar a um patamar pouco mais do que primitivo. Com esta atitude, Israel está pôr a tal "comunidade internacional", que tanto o apaparica, a jeito para um novo "9/11", numa altura em que a debilidade diplomática dos EUA está no estado em que está por causa desse estrondoso sucesso contra o "demónio" chamado Iraque. Ou seja, vejo por aí muita gente "preocupada" com Israel como se o Líbano fosse um "trivial pursuit" que não conta. Eu, no meu desprezo geral pelo mundo, ainda consigo pensar em israelitas e em libaneses como homens, como individualidades que a minha formação obriga a proteger da crueldade. E quando se trata disso, não se podem aplicar critérios matemáticos. Ter sido ao longo da história vítima da crueldade, não desculpa "mais" crueldade. Nenhuma vida humana é uma proporção.

STOP

Imaginem se agora os centros de saúde, os hospitais, as repartições de finanças, os governos civis, as câmaras e outros quaisquer serviços públicos desatassem a publicitar quase diariamente as suas actividades e o resultado das mesmas, como se de algo extravagante se tratasse. As chamadas forças de segurança, pelo contrário, cada vez que fazem uma exibição pública da sua "eficácia" - agora em "intervenções conjuntas" - têm direito a televisão e a estatísticas (muito gosta a GNR de estatísticas). É claro que mais não fazem do que cumprir a sua obrigação, a que resulta da lei, sem mais. Esta propaganda securitária, que envolve o congestionamento de auto-estradas para os senhores agentes das várias inspecções vasculharem tudo e mais alguma coisa, faz-me lembrar os telejornais da Guatemala e de El Salvador, quando lá estive há seis anos. Quase tudo diz respeito à actividade policial e criminosa, com destaque para raptos e sequestros. Ainda não chegámos lá. Mas continuamos imparáveis na nossa palonça "américo-latinização".

22.7.06

TRAMADOS

Fazer de conta que o Líbano não existe, como população e como nação, apenas porque um bando de terroristas partilha o seu território, é uma monstruosidade sem nome. O "país do cedro" está em vias de ser metodicamente destruído pelos soldados sem rosto de Israel. Quinhentas mil pessoas em debandada, simulacros de lugares para viver por todo o lado e mais de trezentos mortos "civis" não chegam para redimir as criaturas de dois soldados israelitas, o pretexto mais ironista dos últimos tempos? Ao contrário de Pedro Lomba, não nutro nenhuma simpatia especial por Israel, não sendo propriamente de "esquerda" ou "amigo" de bandidagem política. Isto é, respeito o estado e a nação judaicas e o seu direito óbvio à existência, mas não nutro nenhum tipo de temor reverencial ou "ternura" pela "causa". Têm, eles e os palestinianos, o mesmo direito à terra, a uma terra. Neste contexto difuso, o melhor de Mário Soares veio, de novo ao de cima, com uma entrevista dada a um jornal espanhol. Ao fazer o que está a fazer - invadir e destruir uma nação independente e tudo o que apanha pela frente em nome do seu doentio niilismo umbiguista - Israel limita-se a acicatar o que os seus inimigos mais gostam, o puro terror e a pura destruição. Ao arrepio do que Bush, Blair e Israel supunham, a "cosmogonia" terrorista está viva e de boa saúde, desde o Médio Oriente ao Afeganistão, reforçada pela inconsciência destes zelosos "polícias" do nosso maravilhoso mundo ocidental. A Europa, como bem lembra Soares, navega dramaticamente à vista. Para não ser muito complacente com a situação criada na "comunidade internacional" - essa farsa alimentada pelas revistas da especialidade -, estamos, na verdade, todos bem tramados.

21.7.06

PERDÃO

Parece que Portugal está interessado em mandar tropas para mais uma trapalhada da ONU no Médio Oriente. Mais vale estar quietinho para não atrapalhar ainda mais. Por outro lado, pode um dia pôr-se a seguinte questão (que os zelosos guardiões do templo "correcto" classificarão, sem hesitar, de "anti-semita") : quando é que chegará a vez de Israel pedir "perdão" à semelhança do que tudo quanto é chefe de Estado, de governo e de religião por esse mundo de Cristo tem feito em relação aos ditos cujos? Ou o "perdão", quando "nasce", é só para alguns?

O PACOTE DEMOCRÁTICO

O governo abriu um precedente interessante de seguir. José Magalhães - quem diria - proferiu um despacho sobre dois processos disciplinares a sindicalistas da PSP, reformando-os compulsivamente. Um teria querido mandar o primeiro-ministro para o Quénia e o outro disse que o então director da polícia nem para escuteiro servia. Também José Miguel Júdice foi "julgado" na Ordem dos Advogados e ficou a falar sozinho quando o respectivo conselho superior abandonou a sala. Pelo caminho ainda teve tempo de dizer que o relator do seu processo não servia sequer para julgar "uma manada". Palavra de honra. Estes jogos florais, do foro jurídico-político, colocam um problema. O ex-ministro Freitas do Amaral chamou-lhe "licenciosidade", outros poderão pensar em "liberdade de expressão" e, outros ainda, referir as liberdades "sindicais". Como se tem abundantemente salientado aqui, vivemos num regime imaturo quanto às liberdades. No verdadeiro sentido da palavra, este é o país menos liberal que conheço. Para além disso, sofre cronicamente de uma gravitas despropositada que não corresponde à qualidade das suas instituições. Os sindicalistas da PSP em causa são pouco mais que broncos. Basta ouvi-los. Não têm, todavia, culpa disso. Emanam de um país, o "de Abril", com que José Magalhães, hoje orgulhoso membro do PS e do governo, foi solidário anos a fio ao lado do PC. Júdice pertence - e até já dirigiu - uma corporação muito ciosa das suas coisinhas e da preservação da preeminência do "direito" na sociedade e na política portuguesas. Por outro lado, é um magnata do mesmo direito, como sócio de uma das maiores sociedades de advogados do país. Como lhe competia, saiu em ombros do "julgamento". O actual Bastonário, coitado, é, afinal, "apenas" o filho de um polícia. Não sei se é por andar a ler os "antigos", mas cada vez mais me sinto "deles" e nada, mesmo nada, "moderno". Além de pirosa, conservadora e mal formada, a nossa sociedade - toda - tem pretensões de ser levada a sério. Ignora, na sua inconsciência, que faz tudo parte do mesmo pacote, o da "democracia". E que, por isso, estão - não me canso de o repetir - muito bem uns para os outros.

LER


O artigo de Mario Vargas Llosa, editado no Diário de Notícias, sem link, no original aqui: "À sombra dos cedros", sobre o Líbano e outras "identidades".

O MODELO

Em matéria de administração pública, impera o ilusionismo. Há umas escassas semanas, uma "comissão técnica" presidida pelo solene prof. Belhim - cuja opus maior, no governo de Guterres, foi a invenção do símbolo fálico que representa o ministério da Justiça - contou 230 mil funcionários públicos. Ontem, o ministério da tutela já apresentou, salvo erro, 530.291 (o pormenor do "um" é tocante). Por outro lado, sobre a famosa "mobilidade", paira uma nuvem que nem o próprio ministro ou o seu diligente secretário de Estado conseguem dissipar. Depois, para complicar, "apareceram" nas insuspeitas contas da Direcção Geral do Orçamento mais não sei quantos mil funcionários, o famoso "um por cada dois que saem", mas ao contrário. Para inconstantes, já bastam as "previsões" do dr. Constâncio. Ou será que, afinal, o dr. Constâncio é mesmo o modelo?

COM ELA


Apesar de ser para isso que vota nas eleições legislativas, nunca me passou pela cabeça eleger "deputados". Desde 1979, primeira vez em que votei, escolhi sempre candidatos a chefes de governo e governos. Sá Carneiro, Mota Pinto, Cavaco, Fernando Nogueira, Barroso e, agora, Sócrates justificaram o meu voto e jamais o sr. Asdrúbal ou a D. Ermenegilda do remoto quadragésimo lugar da lista. Dito isto, não tenho a mínima consideração pela "representação nacional" que se arrasta pelas cadeiras de São Bento. O último dia da sessão legislativa, confirmou-me nas minhas certezas supostamente "reaccionárias". Qual feira do Relógio ou de Carcavelos, consoante a bancada, a deputação - pior que as antecedentes - zurziu metodicamente na ministra da Educação, escolhendo para o efeito do pior que lá tinha. O PSD pôs a palrar o sr. Pedro Duarte, uma miniatura de típico cacique partidário, nado e criado na nefasta JSD, que pretendeu dar "lições" a Maria de Lurdes Rodrigues. O PC recorreu à sra. D. Mesquita, uma estalinista histriónica, que primou pela "delicadeza" e pelo "bom-gosto". O BE e o PP usaram o que tinham disponível na altura, duas esquecíveis nulidades, uma das quais já dera provas num governo. O PS, incomodado, limitou-se a defender timidamente uma dama que não é sua. Não reconheço a um Parlamento tão pindérico e tão politicamente medíocre um pingo de autoridade para criticar, da maneira "peixaral" como o fez, a ministra da Educação. Já se percebeu que Lurdes Rodrigues está para abate. A ministra pôs-se ligeiramente a jeito com os secretários de Estado que lhe deram - um, em especial, o sr. Lemos - e com a "brecha" que abriu na sua "fortaleza" com a história da Química e da Física. Todavia nada disso justifica este "vento de verão" que começa a correr contra ela. O ministério a que preside devia ser implodido e dar lugar a outra coisa. Como o regime é o que é, prefere ir "queimando" em lume brandinho quem lá passa a extirpar verdadeiramente o monstro. Nestas coisas, estou sempre com quem se quer fazer cair à força e à conta do "deixa-estar-como-está-para-ver-como-fica", na expressão do saudoso Ruben A. Nunca a sinistra FENPROF teve tantos aliados. E insuspeitos. Se Sócrates lhes oferecer a cabeça da ministra numa bandeja, quando lá tem Pinhos e Linos à farta para exportar, então é sinal de que, como tantos outros, é um mero "tigre de papel".

20.7.06

UM LIVRO


"A tragédia não reside nos tempos mas nos nossos corações."

Malcolm Lowry, Under the Volcano

COMO ELA

A ministra da Educação é uma pessoa competente e independente. Duas pechas lamentáveis para o regime e para o pior PS. António Vitorino, um político intermitente e oportunista, de vez em quando lembra-se que usa cartão partidário. E não se furtou a exibi-lo contra Maria de Lurdes Rodrigues. A ministra não devia ter consentido na repetição de exames? Não devia, naturalmente. Não é por muito repetir os exames que a rapaziada lá vai. Fosse "isto" sério e a sério, a maior parte dos que vão concluir o 12º ano, por pudor e por decência cívica, nem devia pôr os pés numa universidade. É verdade que muitas das universidades são puros estabelecimentos comerciais ou, no caso das públicas, antros de má tradição e de péssimos hábitos. De nada disto Maria de Lurdes Rodrigues tem culpa. Pelo contrário, está já a pagar o preço da sua independência e de alguma ingenuidade. Dar "poder" aos pais contra os professores, meter estes todos no mesmo saco e ser benevolente para com a malandragem a que também chamam "alunos", só contribui para afundar ainda mais o "sistema". Lurdes Rodrigues, como diria Borges, precisa de encontrar o seu "centro" e ser politicamente apoiada. Ninguém é perfeito. Todavia tomara Sócrates ter mais ministros como ela.

O CASTIGO DO VERÃO

Um bom barómetro da "confiança" e do "crescimento" que diariamente o sr. ministro das Finanças vem certificar, está nas férias dos portugueses. Segundo me explicaram, as "famílias" acotovelam-se em T0 e T1 - ou seja, onde deviam estar dois, estão quatro, onde deviam estar três estão seis e por aí fora -, não usam os restaurantes - levam "geladeiras" e "sandochas" e à noite usam o fast-food dos centros comerciais - e poupam os carrinhos, pressurosamente tapadinhos e estacionados até à partida. Os que não "fazem praia", vão às prestações para o Brasil e para o Caribe. Outros ainda, passam as pontes respectivas e vão até às praias adjacentes às grandes cidades. Esta é a "mobilidade" possível. O pior de tudo é o inferno das criancinhas que berram por todo o lado. É um castigo. O castigo do Verão.

19.7.06

BASTAVA UM

Na "conta-corrente" em curso no Médio Oriente (fonte: CNN), Líbano-200, Israel -25. Falo de mortos, naturalmente. Vivos estão dois militares israelitas, sequestrados, e um terceiro. É por causa deles - juram os israelitas e o Cymerman da SIC que nos brindou com uma simpática reportagem sobre a sua "vida" em Telavive- que estes mortíferos jogos florais de verão estão a decorrer. Os Hezbollahs andam, naturalmente, misturados com as populações civis. A contabilidade dos mortos interessa pouco numa zona em que a toda a gente está prontinha a desaparecer a qualquer momento. Todavia, bastava um, fosse de que lado fosse, para isto ser o horror que é. Apesar de cínico e céptico, ainda consigo ser cristão, nem judeu, nem muçulmano.

O ÍCONE -2

Este post foi mal lido por alguns simpáticos "comentadores". Designadamente "pensaram" que eu estava a chamar "provinciano" ao Pogorelich do Porto, o pianista e gestor Pedro Burmester. Nada disso. Referi-me apenas à localização da Casa da Música, por contraposição à capital da nação macrocéfala que é Portugal. Ou será que as "gentes do Norte" não entendem o país onde vivem? Burmester, esse pequeno "génio", entende perfeitamente. É só ver como ele "geriu" as suas entradas e saídas da dita Casa para o perceber melhor. Se isto é ser provinciano, vou ali e já venho.

18.7.06

VENDO OUTROS

Como não estou com pachorra para "ilustrações", fica este "retrato de trabalho no Líbano", "postado" pelo João Morgado Fernandes.

O ÍCONE

Uma nota "cultural". A sra. D. Guta Moura Guedes - de quem Santana Lopes se lembrou para fazer companhia ao vetusto prof. Fraústo da Silva "dos últimos dias", no Centro Cultural de Belém -, vai agora para "directora de marketing" da Casa da Música. A D. Guta possui um dom especial que consiste em gerir os seus interesses privados paredes-meias com os públicos, e vice-versa. Nada de particularmente grave neste país em que nada é para levar verdadeiramente a sério. Acresce - factores a ter em conta - que não tem nada de burra e é bonita. Chega para a fazer circular intermitentemente pelos equipamentos culturais disponíveis? Não chega. Porém insiste-se em fazer o mesmo com os mesmos. Burmester será o director artístico da Casa, como se (e ele) esperava, e a "maltosa" do "norte" fica, grosso modo, a dominar a coisa. Não acho bem, nem acho mal. Apenas espero que o poliedro funcione como uma instituição nacional e não como um ícone de província. O dinheiro que os contribuintes - todos - lá investiram, não reclama outra coisa.

OS MACHADINHOS DE AÇO

"Confiança" é uma palavra gasta. Todavia, não há dia nenhum em que, por isto ou por aquilo, ela não nos seja prometida. O dr. Pinho, que se supôe ministro da Economia e da Inovação - este último título, olhando para a personagem, dá direito a quinze dias ininterruptos de riso nacional - foi a um lado qualquer e disse que era preciso dar com um "machadinho de aço" no "pessimismo". Logo ele, cujo facies transpira optimismo e "confiança" por todo o lado. Não contente com este exercício, Pinho foi não sei onde lançar a famigerada "primeira pedra" de qualquer coisa. Saiu, uma vez mais, incólume da peripécia. Acontece que, há precisamente um ano, o mesmo dr. Pinho, mais o dr. Lino e o próprio primeiro-ministro, num talk show dirigido a uma plateia muito especial, apresentavam o power point mais famoso da saison: a OTA e o TGV. Segundo julgo entender, ambos os mamutes vão fazendo o seu perigoso e irresponsável caminho. Estamos já todos a imaginar os milhares de passageiros que vão andar entre Lisboa e Madrid todos os dias, não estamos? Ou o risível "check in" na estação do Oriente para voar a partir da Ota, não é verdade? Cavaco Silva, tudo o indica, terá que "fazer linha" e um "stop" oportuno a estes dislates ou, pelo menos, exigir que nos expliquem detalhadamente a célebre relação "custo/benefício". Que falta fazem os machadinhos de aço em certas cabeças.

A FUNDAÇÃO

A gloriosa Fundação Gulbenkian fez cinquenta anos. Jamais se saberá o que deu na cabeça do arménio para vir aterrar aqui. Ainda bem que o fez. Salazar, a obscura figura que nos pastoreou durante anos a fio, percebeu rapidamente o interesse da coisa e deu "luz verde" ao "aportuguesamento" da instituição. Até eu aproveitei, frequentando umas aulas de música, em criança, num edifício que já não existe, em frente à instituição. A minha primeira ópera, uma estopada de Monteverdi, ouvi-a no Grande Auditório, com o meu pai, teria eu para aí uns onze anos. Lembro-me que assistia a veneranda figura do Chefe do Estado, o mesmo que tinha inaugurado as instalações actuais da Avenida de Berna. Hoje, pelo que pude ver à distância, o actual regime esteve em peso nos jardins da Gulbenkian. Até o eterno coronel Vasco Lourenço, não percebo bem porquê. Será que o 25 de Abril "também" tem a ver com a Fundação e vice-versa? Enfim, muitos anos e bons a uma boa coisa que, como o país em que assentou as fundações, tem dias.


17.7.06

SEMPRE EM PÉ

Se as taxas de juro aumentarem em 2007 e se a economia mundial sofrer um qualquer "choque" - que, tudo o indica, irá sofrer -, o balsâmico e salomónico dr. Constâncio, garante, pela enésima vez, que as famosas décimas do nosso extraordinário "crescimento económico" podem vacilar. Só Constâncio não vacila e ninguém se preocupa com isso.

PÃO COM MANTEIGA

Vi agora na televisão. George W. Bush estava a comer o seu pãozinho com manteiga enquanto ouvia Blair dissertar sobre a "crise" do Médio Oriente. Não foi de modas e desejou que aquela "merda" acabasse depressa, naturalmente às mãos de Israel. Mencionou, como lhe competia, a Síria. Confesso que sinto uma enorme ternura pela boçalidade texana de W. Bush. E sou francamente pró-americano. Talvez por isso, penso ser oportuno recordar que foi justamente esta parelha do pãozinho com manteiga que levou os EUA - a Europa não conta - a soçobrar no Iraque, de tal maneira que até Blair já sorri menos quando fala numa "força internacional" em Israel para "acalmar" os indígenas e, por tabela, parar com os ataques terroristas. Daqui para diante, tudo é possível. Quando Bush voltar de novo à terra, não vai gostar de que vai ver. Como dizia Ratzinger em Les Combes, no fim-de-semana, "espero que Deus ajude". Apesar de Deus andar involuntariamente metido nesta loucura.

LENDO OUTROS

De Eduardo Pitta, "O prazo", em torno das andanças da "colecção Berardo" e do CCB. Não deve ter sido por acaso que Sócrates, no debate do "estado da Nação", omitiu, entre outras coisas, a "cultura". Não fará parte da "revolução tranquila" que inclui o plano tecnológico e o "tgv"? Se nunca fez, por que iria fazer parte agora? O remanso em que vivem os habitantes da Ajuda, desde os tempos de Carrilho, é a melhor resposta. Quando haverá coragem para acabar, de vez, com o ornamental ministério?

BANDEIRAS -2

Isto não é politicamente correcto, porventura, mas eu simpatizo tanto com a "causa" isrealita como com a "causa" terrorista. Estão muito bem uns para os outros. Só é pena que, para acabarem uns com os outros, matem tanta gente como se engolissem tranquilamente galões. E que, como se verá em breve, ponham ainda mais em causa esta treta chamada hipocritamente de "ordem internacional", sobre a qual paira uma inutilidade chamada ONU. Por causa de três militares seus terem sido raptados - num daqueles eternos jogos florais entre Israel e a rapaziada circundante "comandada" à distância" por aquela figura excêntrica que é o presidente do Irão -, Israel decidiu arrasar o Líbano e, em resposta, os terroristas lá acolitados decidiram arrasar Israel. Pelo meio, mata-se tudo o que aparecer pela frente, de um e do outro lado. O mundo está, de novo, perigoso. A nós só nos interessa pacoviamente salvar a pele de uma dúzia de portugueses que moram no Líbano. Aparentemente os que vivem em Israel estão seguros. Ou dar-se-á o caso de não morar lá nenhum luso ou, morando, sentir-se-á mais seguro do que no Líbano? Por que será?
Adenda: Filipe, eu não teria assim tanta certeza que Israel seja um paraíso para o "outro", seja lá a forma que esse "outro" exiba. Quanto aos "outros", tenho apenas mais algumas certezas. E é mais fácil nós nos "judaíficarmos" do que Israel deixar de temer a sua própria sombra.

BANDEIRAS

O PS anda pelo país a "explicar-se" aos "camaradas". Um dos "explicadores" foi o dr. Ascenso Simões, um ajudante do dr. Costa para os incêndios. Pediu - imagine-se - "ideias", uma coisa que manifestamente não sobra na cabeça dele. Ontem foi a vez da Juventude Socialista - uma agremiação que, à semelhança das congéneres, devia ser pura e simplesmente extinta - falar nas suas "bandeiras" a que chamam irritantemente de "fracturantes". Sócrates foi lá dizer-lhes que a única "bandeira" que lhe interessa é a do governo. Finalmente, o dia terminou com o dr. Silva Pereira, um dr. Morais Sarmento em sofisticado, a falar na 2: e no Público. Também foi clarinho como água. Para a "esquerda moderna", que ele o engº Sócrates subtilmente representam, só existe uma "agenda", a do governo. As coisas dos "costumes" espevitam os "camaradas" mais impenitentes, mas não o governo. Na sua perturbadora inconsciência, a "camarada" Ana Gomes, manifestamente da "esquerda da idade da pedra", continua perturbada, lá do seu exílio parlamentar europeu, com os aviões americanos que alegadamente atravessaram o espaço aéreo nacional, ameçando os bons costumes democráticos que ela supôe representar. É outra "bandeira". Enfim, de "bandeira" em "bandeira", o PS veio para ficar. Naturalmente até ao dia em que Cavaco lhe apetecer reler o seu programa de candidatura, uma "bandeira" como qualquer outra.

15.7.06

À LAPELA

Vagueando por outros blogues, percebo que ainda há quem considere a Maria João Avillez uma "boa" jornalista. Parece-me que ela tem dias. É um híbrido entre uma dona-de-casa sofisticada e uma curiosa com pretensões a "fazer história". Nunca percebeu que os outros - que ela entrevista - é que fazem "história" à conta dela. Nunca me hei-de esquecer de uma vez que ela chamou a Hintze Ribeiro, o "Índice Ribeiro". Não esteve, como é óbvio, à altura de Sócrates. Quis armar-se em "política", logo ela que não tem um pingo de talento para fazer perguntas sobre o que quer que seja. É "bem" estar de bem com a Maria João. Por isso, não houve ninguém, neste anos de democracia, que a não tivesse usado à lapela. Nisso, ela serve às mil maravilhas o regime, tal como o regime se serve dela.

COM A CABEÇA DENTRO DE ÁGUA - 2

Uma das instituições mais ferozmente corporativas, o Ministério Público, promoveu, no Porto, um jantar alegadamente destinado ao "convívio" entre magistrados e à comemoração dos 30 anos da Constituição. O dr. Cluny, o "patrão" do respectivo sindicato, lá veio com a magnífica conversa da "independência" face a quaisquer maiorias ou minorias. E aproveitou - ele e outros - para deixar a mensagem habitual, numa altura em que Souto Moura está de saída: os procuradores nao querem ninguém fora da corporação a mandar neles. Nos primórdios da "revolução", o esquerdismo dominante também contagiou o Ministério Público. Foi criado o sindicato e a respectiva corporação conseguiu ser equiparada a magistratura, como a judicial. Cluny, por exemplo, navegou anos a fio nas águas do PC. Outros, na extrema-esquerda. Só o pobre do dr. Souto Moura é que foi "criticado" em silêncio lá dentro - imagine-se - por ir à missa. O MP, ao contrário dos juízes, não administra a justiça nem, tão-pouco, a política. É bom que se assente nisto, de uma vez por todas. Não existe, como o dr. Cluny pretende sugerir todos os dias, nenhuma cabala contra o MP. Se alguma coisa de menos agradável sucedeu pelo caminho, deve-se mais a comportamentos casuísticos do órgão competente para promover a acção penal do que propriamente à "política", essa eterna "porca". O próximo PGR deve ser escolhido fora do Ministério Público. O regime tem muitas "figuras" adequadas e o poder judicial também. O MP é, naturalmente, independente. Todavia, ser independente não significa ir além do que deve ser. O Estado "acusador-público" não é etéreo. Vive e defende o Estado democrátic0 de direito, aquele que, por mais que lhe custe, resulta do sufrágio eleitoral. Não foi para isso que se fez a "revolução", onde tantas das actuais figuras de proa do MP se "formaram"?

PARABÉNS, PRESIDENTE


Quando vi o Presidente da República chegar aqui de comboio, alegrei-me. Afinal, sempre tinha dispensado uma avioneta ou um helicóptero. E obrigava os concidadãos a pensar no prazer que é suposto constituir uma viagem de comboio. Fiz muitas para Tavira, quando andava na tropa. Era uma experiência medieval. Tudo começava em Lisboa, no cais em frente ao ministério da Finanças. Seguia-se uma travessia de barco até ao Barreiro onde se "apanhava" o dito comboio. Entre cais e chegada, a coisa demorava mais de oito horas. Pelo caminho, parava-se por tudo e por nada, sobretudo para deixar passar outros comboios. Entretanto as auto-estradas cresceram, os comboios "modernizaram-se" e os carris ficaram sensivelmente na mesma. Para a viagem correr bem ao PR, veio uma "locomotiva-batedora" à frente para garantir que as linhas estivessem libertas para o "Alfa" presidencial. Pensava que era apenas a família Cavaco Silva. Parece, afinal, que eram mais. A "comitiva" deu para carruagem e meia, com direito a "gnr's" por todo o lado. Cavaco, educado na austeridade e nas linhas modestas do Algarve, não necessita que lhe preparem o fausto. Basta-lhe ser, como chefe de Estado, igual a si mesmo. Discreto, competente, oportuno e atento. Parabéns, Presidente, e muitos anos de vida.

14.7.06

A CABEÇA DENTRO DE ÁGUA -1


1. Não, este blogue não acabou. Está apenas de férias. Há dias, o PR passou pela região e recomendou moderação aos autarcas na construção civil. Ele que experimente fazer um "roteiro" só para o "imobiliário". Nem precisa de andar muito. Basta-lhe circular pelas redondezas do seu local de nascimento. E as rotundas, meu Deus. As rotundas. E o fraquejar da frequência. Um país que precisa seriamente de meditar no "sucesso" prometido. As "férias" dos autócnes são um bom momento para instalar um barómetro no rabo de cada português. Normalmente vem a família toda, da avó aos bisnetos, as carrinhas e as geladeiras. Restaurantes, nem vê-los. Quando tirarem o barómetro, lá mais para Setembro, haja alguém que tire conclusões.

2. Leio nos jornais que os resultados das provas dos 9º e 12º anos são desastrosos. Português e matemática, como de costume, com patamares risíveis. Deixar entrar nas universidades esta gente - onde parece que até há mais vagas - é ajudar a afundar tudo isto mais um bocadinho. Ontem, no Diário de Notícias, um "estudante" de 16 anos resumia bem a coisa: não estudou, teve 1 numa cadeia e pouco mais noutra, mas como lhe "dava para passar", para quê preocupar-se? Quanto a física e química, a ideia do governo de escancarar as portas das universidades aos meninos e meninas do 12º com negativas - e, depois, logo se vê -, também resume o essencial. O secretário de Estado, um rapaz que até já foi do CDS e que possui um facies inconguente com o cargo que desempenha, acha que os resultados, "em geral", até são melhorzinhos dos que os do ano passado. Ninguém lhe arranja um explicador ou ele contenta-se com a mediocridade do "sistema"?
3. Sócrates esteve bem na televisão - é, aliás, onde ele está melhor - explicando que anda a "aprender" com Cavaco, como já antes tinha aprendido com Guterres, Sampaio e Soares. Olha-se para ele e percebe-se que, melhor, é impossível. Ele é, sem dúvida, o melhor de muita coisa que não presta. Tem um louvável espírito de missão pública e um "passo" que não é acompanhável por muitos dos que o rodeiam. Infelizmente para ele, o mundo continua a rodar e a Europa também, nem sempre no melhor dos sentidos. O "futuro" que a contabilidade e a mercearia tentam garantir, está em muitas daquelas criaturas-desperdício que aspiram ao "canudo". Vale a pena?

4. Por falar nelas, um episódio de praia. Os algarvios, pelos vistos, são muito ciosos da sua infalível masculinidade. Três rapazolas passaram ontem o dia "à cata" de congéneres do sexo oposto, de preferência com sotaque distinto. Lá apareceram duas, uma gordalhufa e uma candidata a "bo derek" quando crescer. Dois dos rapazes ficaram "a ver navios" e a mergulhar. O outro, mais franzino e de aparelho nos dentes, foi dar uma volta com a teenager vaporosa e voltou agarrado a ela. Foram ao banho, onde o rapaz exibiu a sua destreza marítima e beijoqueira. Os amigos riam-se, sobretudo da pequena crise da erecção indisfarçável por debaixo do calção de banho. E, de súbito, tudo a mãe da jovem vamp levou, tirando-a dali. Os calções acalmaram-se e hoje, o pobre lá anda de um lado para o outro, com o seu "ipod", à espera da sua Godot de ocasião. Quando tinha a idade deles, também dei para aquela vasto peditório do "boy meets girl" e "girl meets boy", amores de praia com fim marcado para Agosto. Entretanto, dei-me conta de que havia outros Godots por quem esperar, normalmente em vão. Muitos vieram, ficaram um bocado e, depois, como lhes competia, partiram. Raramente sobrou um nome. Há, claro, o mar - sempre o mar -, um céu limpo para admirar e a cabeça dentro de água. O pior mesmo é quando a tiro de lá. Até amanhã.

12.7.06

O ESTADO DA NAÇÃO

11.7.06

DOS BANANAS


"Portugal não pode ser uma República das bananas, muito menos de bananas." Meu caro prof. Vital Moreira, não pode ter mais razão. No nosso caso, porém, temos de viver com as bananas e os bananas que nos calharam em sorte. Como é que chegámos a descobrir mundos, é que eu ainda estou hoje para saber.

UM ABRAÇO...

... ao O Insurgente pelo destaque. Temos em comum o sermos liberais. Nem sempre pelos mesmos motivos, porém todos ferozes defensores da liberdade.

ALICE JÁ NÃO MORA AQUI


De uma penada, um porta-voz da GM disse tudo. Os custos logísticos, a pequena dimensão da fábrica da Azambuja quando comparada com o espaço em Saragoça, a quase totalidade dos fornecedores que não são portugueses, a "desvantagem competitiva" com a Espanha na produção do "Opel Combo". Em suma, um país da periferia, condenado a ser cada vez mais periférico. Chegou a condoer-me a conversa do pobre do dr. Manuel Pinho, sempre na estratosfera. Que vêm aí mais investimentos, nacionais e estrangeiros - onde estão, a não ser no "power point"? -, que vão pedir uma indemnização, etc., etc. Começo a pensar que nós é que devíamos pedir uma indemnização por termos um dr. Pinho como ministro da Economia. Alice já não mora aqui. Não há quem lhe explique?

A LICENCIOSIDADE

O Henrique Silveira regressou, em boa hora, da sua "digressão artística". Até eu, que tenho alguma estima política por Rui Rio, não posso deixar de me solidarizar com o Augusto M. Seabra. Por uma questão de maturidade da democracia em que é suposto vivermos. Gostava que o "colega" de jornal do Augusto também fizesse o mesmo. O ministro que inventou a "teoria da licenciosidade" já se foi embora. Ficaram sombras por aí?

SHOW BUSINESS - 3

Neste torvelinho que atravessa a "cultura", existe uma personagem misteriosa que é o actual secretário de Estado, Mário Vieira de Carvalho. Três anos depois, julguei que não fosse necessário voltar "à vaca fria". Mas, infelizmente, é. Vieira de Carvalho, segundo julgo saber, tem a tutela dos teatros nacionais por delegação da prof. ª Pires de Lima. Foi, até bastante tarde, um fervoroso adepto dos "amanhãs que cantam", na versão aprimorada da falecida RDA. É, por consequência, um musicólogo e um "intelectual" formado na melhor escola marxiana. "Reciclou-se" na "esquerda moderna " e aterrou de cabeça na Ajuda. A única posição pública de relevo que se lhe conhece, consistiu na transformação do Teatro Nacional D. Maria II numa delegação da FNAT/INATEL, da qual, até agora, não brotou uma ideia original. Pelo contrário, o TMDMII jaz, de novo, numa modorra incompreensível depois de uns anitos de alguma notoriedade graças a António Lagarto, expeditamente corrido por Vieira de Carvalho para dar lugar, no Rossio, a uma remake pífia do Teatro da Trindade do "neo-realismo" democrático. Acontece que Lagarto, à frente do TNDMII, deixou um acervo que a Direcção-Geral do Tesouro, a "accionista" da "sociedade anónima", sempre avalizou positivamente. E eu nem sequer sou adepto do "modelo SA". Mas tão-pouco simpatizo com a actual situação em que o "plano de actividades(?)" da nova dupla gestionária não "passou" no crivo da DGT, que tem obrigado o Teatro a governar-se com o que tem. E o que há - ou havia -, é um saldo positivo de cerca de 500 mil euros da anterior gestão e a reserva de capital legal obrigatória da SA. Em suma, Vieira de Carvalho, quando decidiu intervir, interveio mal, apenas para o pequeno episódio ad hominem. Se ele ainda for secretário de Estado da Cultura quando o famoso PRACE entrar em vigor, lá para a época Outono/Inverno, é de esperar o pior para os teatros nacionais e equiparados, à excepção de um ou outro caso mais "amigo". Aliás, é sintomático que uma criatura tão "reivindicativa" e imaginativa como Ricardo Pais, do São João do Porto, esteja tão caladinho. E quem diz Pais, diz outras personagens que silenciosamente tecem as suas teias. E não, não estou a pensar no actual director do São Carlos - com quem trabalhei e de quem discordei quando tive de discordar - pelo que posso afirmar tranquilamente que deve ter um papel decisivo na nova entidade que irá gerir o teatro de ópera e a Companhia Nacional de Bailado. Vieira de Carvalho, talvez por causa da sua "formação" política, não esqueceu nem aprendeu muita coisa. A "cultura" é que não tem culpa.

DANÇA COM LOBOS


Não fosse o mecenato da Fundação EDP e o dinheiro que a Companhia Nacional de Bailado recebe do Estado pouco mais daria do que para pagar o respectivo funcionamento. Existe, nos teatros nacionais, um tropismo insanável que só uma reforma profunda do modelo de gestão poderá eventualmente atenuar. O peso das despesas de funcionamento é brutal quando comparado com o que sobra para a produção artística. É assim na CNB, é assim nos restantes teatros nacionais. Por exemplo, no São Carlos, que eu conheci bem, num orçamento de, digamos, onze milhões de euros, nove são para funcionamento, sobrando dois para a produção artística, a que acresce o mecenato do BCP. O ministério da Cultura, ao abrigo da famosa "gestão flexível", passa o tempo a tapar um buraco aqui ou ali, até que se destape o próximo. Não se sai disto. Quando eu defendi que o São Carlos devia fechar para se "reestruturar", caíu-me o "carmo e a trindade" em cima. A "técnica" é sempre a mesma: "chutar a bola para a frente" e remover a poeira para debaixo de tapete. A auditoria que o Tribunal de Contas realizou à CNB, olha para o modelo de gestão em vigor e, naturalmente, critica-o e propôe sanções. Se o Tribunal fizesse o mesmo aos restantes organismos similares, as conclusões não seriam muito diversas. Basta estar atento à "história" dos últimos vinte e tal anos destas instituições para se perceber que a tutela, quer sob a forma de secretaria de Estado, quer sob a forma de ministério, nunca soube bem o que fazer delas. A instabilidade legislativa e financeira a que têm estado sujeitas, não é da responsabilidade dos respectivos órgãos de gestão, também eles permanentemente em "danças" e em "mudanças". Meio a brincar, meio a sério, enquanto estive na direcção do São Carlos costumava dizer que aquilo só era governável em ditadura. Depois, pelo meio, há uma imensa pusilanimidade em tudo isto. Da parte da tutela - quase sempre - e da parte dos "escolhidos" para dirigir. Não é à toa que o relatório do Tribunal de Contas teve tanta publicidade quando, todos os dias, saem idênticas prosas sobre outras organizações públicas. Piedosamente, o ministério veio garantir "ajuda" e "confiança" em quem primeiro deixou ser enxovalhada, sozinha, na praça pública, sabe-se lá com que intenções. Ana Pereira Caldas é apenas um caso de "dança com lobos". Há por aí muitos mais.

O REQUERIMENTO

O sr. Gilberto Madaíl, um dos "sempre-em-pé" mais patuscos do regime, pretende que as finanças isentem de IRS os rapazolas da selecção - inerente ao prémio de 50 mil euros que cada um vai receber - em virtude dos "feitos" transcendentes a favor da pátria, realizados na Alemanha. Se isto pegar, todos os que sentem que o seu contributo para o prestígio da nação merece uma isenção fiscal, corram à repartição de finanças mais próxima e acenem com o requerimento.

10.7.06

O LIVRO DAS ILUSÕES


"Frieda era uma daquelas raras pessoas em que a mente acaba por vencer sobre a matéria. A idade não diminui essas pessoas. Torna-as velhas, mas não altera as pessoas que elas são, e, quanto mais tempo vivem, mais radical e implacavelmente se encarnam a si próprias:"

LENDO OUTROS


"... E a água gelada a subir no porão, atingindo primeiro os da "terceira classe", mas subindo sempre. Sempre."

José Pacheco Pereira, "Lá vamos cantando e rindo", no Abrupto

SENTIDO DE OPORTUNIDADE

No mês passado, aqui, manifestei a minha indignação por uns pais, tão energúmenos como os filhos, entrarem numa escola pública para agredir professores. Defendi- e defendo- a introdução, nas nossas escolas, de um rigoroso regime disciplinar e a nomeação dos directores pelo Ministério da Educação. Quem não é aluno ou não se sente como tal, nem consegue perceber que existe uma hierarquia dentro da escola à qual deve obediência, sujeita-se, nos casos de pura delinquência, a ser suspenso ou, mesmo, expulso. O dinheiro do orçamento do Estado, afecto à educação, não se destina a pastorear preguiçosos e ignorantes ou criminosos de delito comum. É, por isso, com satisfação, que vejo o Estado assumir, com raro sentido de oportunidade, a sua função de acusador público.

VIVER HABITUALMENTE

Para sossego do engº Sócrates, esse soturno sortudo, seguem-se as férias. A eventual ressuscitação do dr. Marques Mendes não terá qualquer relevância. Como de costume, o país arderá tranquilamente, voe o avião ou não voe. D. Sebastião e Nossa Senhora de Fátima recolheram aos balneários. Voltámos ao "viver habitualmente", não já o do dr. Salazar, mas o da democracia. Sempre é mais "colorida". Todavia, esta gente não aprende. Qualquer dia será tarde demais. Ou talvez não. Afinal, não é dos pobres de espírito o reino dos céus?

9.7.06

IL TROVATORE


Lá fora está uma fabulosa lua cheia. Não há vento. Noite ideal para ouvir a exclusivamente nocturna ópera de Verdi, Il Trovatore. O argumento é patético e inverosímil. Mas a música...

Sugestões: Na RCA, com Domingo, Price, Cossotto, Milnes, dirigidos por Zubin Mehta; na DG, com Bergonzi, Stella, Cossotto, Bastianini, dirigidos por Tullio Serafin; também na DG, Domingo, Plowright, Fassbaender, Zancanaro, dirigidos por Carlo Maria Giulini, na EMI, Di Stefano, Callas, Barbieri, Panerai, dirigidos por Herbert von Karajan.

GUARDAR SILÊNCIO

Na Guarda, morreram seis pessoas no combate a um incêndio. O dr. Costa foi para lá com o seu ajudante Ascenso Simões, reputado especialista nacional em fogos. Espero que, desta vez, Ascenso tenha sido aconselhado para não voltar à "teoria do conta-contas e da lareira". Como explicava o filósofo austríaco, sobre o que não sabemos, o melhor é guardar silêncio.

SHOW BUSINESS -2

Os jornais - hoje é o Público- insistem em crucificar Ana Pereira Caldas, a directora da Companhia Nacional de Bailado, por causa disto. Convinha, no entanto, que lessem na íntegra as sessenta e tal páginas da auditoria e "somassem um mais um". A menos que alguém ande a encomendar alguma coisa, o que é, aliás, trivial. Vamos ver até que ponto, na nova entidade que vai gerir a Companhia Nacional de Bailado e o Teatro Nacional de São Carlos, o "crime", salvo seja, compensa. Depois falamos.

ÁMEN

As três televisões generalistas estão a dar a chegada da selecção como se se tratasse da vinda do Papa. Ratzinger pode dispensar-se de cá vir. A fé está garantida pelas pernas de duas dezenas de homens comuns que dão chutos em bolas. Ámen.

DEUS COM TODOS

O Papa esteve vinte e seis horas em Espanha, o tempo suficiente para, repetidamente, "lembrar" que o matrimónio é coisa exclusiva entre homem e mulher. Ratzinger não é tolo. Por isso sabe que, não só o conceito tradicional de casamento tem uma ou mais interpretações laicas, como está ciente da sua "crise". A indissolubilidade prometida nos altares, cada vez mais acaba desfeita dentro de portas. E a Igreja, por mais que se esprema, não entra lá dentro. Como se isto não bastasse, a Espanha legal deixou de se referir ao casamento e respectivas sequelas como um contrato entre pessoas de sexo diverso. Agora, é um mero convénio entre pessoas. Ponto. Devia a Igreja "abençoar" estes "novos tempos"? Não me parece. Se o fizesse, comprometia séculos e séculos de doutrinação e acabava, de vez, consigo própria. Ratzinger, mais frio e distante do que o seu antecessor, mas nem por isso menos atento, limita-se justamente a preservar o essencial. Não ignora que, no meio do milhão de pessoas que o escutava em Valência e dos restantes milhões pela televisão, estavam muitos que abraçam fervorosamente a mesma fé e que praticam exactamente o contrário do que ele prega. As "muitas moradas na Casa do Senhor" - esse "caminho" que não é único - estão abertas, como sempre estiveram. O Papa limitou-se a cumprir a sua missão e foi-se embora. Tão satisfeito como os que ficaram. Cada um na sua. E Deus, à mesma, com todos.

ORGULHOSAMENTE NÓS

Um avião adquirido há poucos dias para combater incêndios, supostamente do mais moderno que por aí voa, provocou um mini-incêndio na primeira tentativa para arribar, o que obrigou à intervenção de cem bombeiros. Um cidadão de Mirandela foi condenado a oito anos de cadeia porque, em Abril de 2005, lhe deu para prender a mulher, nua e sem comida, a um tanque. Consta que também tratava os filhos a tiro. A arqueologia mais sofisticada pretende saber se Afonso, o Conquistador, era gigante ou um trivial "homem médio" português, e se o mítico Sebastião jaz efectivamente na pátria, em vez de pairar permanentemente sobre ela. Os cónegos da bola, capitaneados pelo vigário da "auto-estima" nacional, o prof. Marcelo Rebelo de Sousa, queriam receber a selecção como a nova padroeira da pátria, dado o iminente vexame que ameaça o referido D. Sebastião. Sócrates, o dr. Lino e o prof. Correia, do Ambiente, anunciam, com bonecos virtuais e "powerpoint", "placas giratórias" para qualquer coisa, para daqui a alguns anos. Com ou sem Sebastião, continuamos nós. Orgulhosamente nós.

8.7.06

GOLPE DE ESTADO

O Estado foi assistir à humilhação nacional na Alemanha. É o que se pode chamar um verdadeiro golpe... de Estado.

SHOW BUSINESS


1. A Companhia Nacional de Bailado, à semelhança dos restantes "teatros nacionais" e equiparados, é paga fundamentalmente pelo Orçamento de Estado. O Tribunal de Contas realizou uma auditoria ao desempenho da CNB, no exercício de 2004, que pode ser lida na íntegra aqui.
2. Apenas duas ou três observações. Quando cheguei, em Maio de 2002, ao Teatro Nacional de São Carlos, pedi ao Tribunal de Contas - devem ter o ofício lá arquivado - uma auditoria ao triénio antecedente. Foi agendada, salvo erro, para o ano seguinte. O TNSC deve ter lá o ofício do Tribunal arquivado. Em Agosto de 2002, enviei para o Ministério da Cultura, na qualidade de presidente do conselho directivo em exercício, um diagnóstico exaustivo das situações de pessoal do São Carlos e respectivos custos. Deve estar lá, tranquilamente, há quatro anos, numa prateleira. Como lhes compete, os custos e as "situações" aumentaram entretanto. Em Abril de 2003, pedi a demissão e nunca tive notícia da presença do Tribunal de Contas no Teatro. A carta que então remeti aos drs. Pedro Roseta e Amaral Lopes, falava por si. Também estará, em sossego, no Palácio da Ajuda, pelo que, a título de curiosidade, poderia ser lida pela profª Pires de Lima no intervalo das lides com o Fundador. A senhora que me sucedeu "contratou" alguém que foi do Tribunal, mas que já estaria reformado, presumo que para "elaborar" as contas de gerência. Daí, a referida senhora foi arregimentada para o Centro Cultural de Belém onde ainda agora faz companhia ao dr. Mega Ferreira na gestão da casa. Foi substituída, no São Carlos, em Novembro de 2004, pelo até aí subdirector da Companhia Nacional de Bailado - onde esteve nove anos, pelo que deve saber do que fala a auditoria - que é agora um distinto membro do conselho directivo do teatro de ópera.
3. No âmbito do PRACE, o governo vai fundir a CNB com o São Carlos, lá mais para o Outono. Em comum, para já, os dois organismos têm duas criaturas nas respectivas direcções: uma que esteve nove anos na CNB e outra que é do São Carlos mas que acumula com a CNB, já nomeado pela actual tutela. O ministério não tem sido muito imaginativo nas suas escolhas e, pelos vistos, resolve tudo com a "prata da casa", mudando-os de um lado para o outro. Ana Pereira Caldas, que muito estimo, apesar de ser a directora da CNB, e por consequência, a responsável máxima pela gestão, é uma artista que, para os devidos efeitos, é sobretudo ornamental.
4. Esta auditoria do Tribunal de Contas tem o mérito de chamar a atenção para três coisas. A primeira, consiste na evidência que os teatros e equiparados não podem ser geridos como vulgares direcções-gerais. Precisam de um planeamento e de um sistema orçamental plurianuais. Em segundo lugar, carecem de mais mecenato e de menos orçamento público. E, em terceiro lugar, devem ser internamente reformados, de alto a baixo, para que o que se passa nos bastidores e nos gabinetes não custe mais do que o que se passa no palco. É para o palco e para o público que eles existem, e não para alimentar uma burocracia idiota. Ignoro quem irá presidir a esta nova estrutura bicéfala. É natural que haja alguém a afiar facas para espetar nas costas do parceiro mais próximo, já que é assim que tudo se costuma passar entre nós. Antes de avançar, era bom que a prof.ª Pires de Lima e o seu secretário de Estado meditassem nesse trabalho do Tribunal de Contas. Para espectáculo, e triste, já basta assim.

AQUI AO LADO


"Quantos Caminhos há para Deus?"
"Tantos, quanto há pessoas. Porque mesmo dentro da mesma fé o caminho de cada um é muito pessoal. Nós temos a palavra de Cristo: "Eu sou o Caminho". Neste sentido, há, afinal um só caminho, e cada um que está a caminho de Deus está também, de alguma maneira, no caminho de Jesus Cristo. Isto não significa que, consciente e deliberadamente, todos os caminhos sejam idênticos, mas, pelo contrário, que o caminho é realmente tão grande que se torna, em cada um, no seu caminho pessoal".

Joseph Ratzinger, in O Sal da Terra. Bento XVI está este fim-de-semana em Valência para, entre outras coisas, falar da "família".

UM PAÍS DE CAGÕES


De acordo com o Expresso, o "patrão" da IKEA, o sr. Ingvar Kamprad, "apenas" um dos homens mais ricos do mundo, de 80 anos, veio fazer uma visita surpresa ao seu armazém de Alfragide. Hospedou-se na Pensão Alegria, na Praça com mesmo nome, foi de táxi até à loja e regressou na carreira 14 da Carris, que o largou na Praça da Figueira. Esta peripécia devia fazer pensar os parvenus domésticos. Qualquer mísero cargo dá direito, na nossa provinciana sociedade, a um carro, a um motorista, a um telemóvel, a cartões e a umas secretárias. Ninguém dá um passo sem andar de carro, mesmo que se alimente a cafés ou a "sandes de fiambre", viva numa barraca ou num condomínio de luxo. Para além de analfabetos, os portugueses são cagões. Preferem o perfume ao duche, o automóvel brilhante a uma casa decente, umas férias no Caribe a uma boa escola para os filhos, montar falsas empresas a pagar impostos. Por isso, jamais iremos a lado algum. Nem sequer de autocarro.