10.12.04

À SOLTA

Não faço a mínima ideia quais sejam as razões "formais" que Sampaio vai apresentar. As "políticas", qualquer analfabeto simples já as entendeu. Este doloroso percurso revelou uma vez mais a leveza do poder político democrático perante outras coisas. Nunca as corporações patronais e sindicais, as ordens profissionais ou quaisquer outros "representantes" de "interesses" tiveram tanta força e tanta voz. O "tempo novo" de Santana, à semelhança do "somos todos Portugal" de Barroso, pretensos porta-vozes da sempre angustiada e "oprimida" sociedade civil, falharam a sua divina missão. Este centro-direita, mal amanhado, descoordenado e insensato meteu-lhes medo e, quando chegou a hora, deixaram-no cair. Porém, e bem pior do que isto, é o facto de, ao não conseguir impôr-se perante o ouro e a insolência, o poder da "direita" revelou quer a sua impotência estrutural, quer a falta de autoridade do Estado democrático. Nunca o Estado democrático de "direito" esteve tão debilitado perante os "interesses" como agora, justamente quando os pretensos representantes políticos de parte deles estavam no poder. Este mal vinha, no entanto, de trás. Começou no pior Guterres, o primeiro a destruir com método e sorrisos o princípio da subordinação do poder económico e corporativo ao poder político democrático. A última vez que o Estado manifestou a sua autoridade democrática, sem ambiguidades oportunistas nem hesitações de circunstância, foi com Cavaco Silva, entre 1985 e os primeiros anos 90. E, mesmo aí, sabe-se com quem ele acabou rodeado e por que decidiu partir. Um ano inteiro em processos eleitorais, sem "economia" e com o drama financeiro por resolver, não é motivo de esperança para nós. Quanto aos "outros", esses continuarão como têm andado sempre, alegremente à solta.

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