"Pensem quais podem ser as razões básicas para o desespero.
Cada um de vocês terá as suas. Proponho-vos as minhas:
a volubilidade do amor, a fragilidade do nosso corpo,
a opressiva mesquinhez que domina a vida social,
a trágica solidão em que no fundo todos vivemos,
os reveses da amizade,
a monotonia e a insensibilidade que andam associadas ao costume de viver."
Enrique Vila-Matas, Paris nunca se acaba
Não há como um dia depois do outro. Por acaso de calendário, o dia de hoje fecha um mês e fecha um ano. Há muitos anos que já não existem anos diferentes. Não adianta olhar para trás. O passado está pejado de cruzes. As dos nossos mortos, as dos nossos "ideais", as dos nossos desejos, as dos nossos amantes - bonita expressão a de Hervé Guibert, "o mausoléu dos amantes" -, as das nossas múltiplas vidas. Todo o homem é um ser complexo e só os pobres de espírito podem supor que tudo corre como numa auto-estrada no meio do deserto, sem trânsito e sem outra paisagem que não o sol e o céu azul. Proust escreveu que era preciso guardar um pouco de céu azul na nossa vida, logo esse nervoso genial que se fechou num quarto para remoer "o tempo perdido". Não, não adianta olhar para trás. Aos quarenta e seis está-se mais perto dos cinquenta do que dos vinte, dos trinta ou mesmo dos quarenta. Provavelmente houve um tempo para tudo da mesma forma que haverá agora um tempo para um outro tudo. Nas magníficas páginas iniciais do seu "Saint Genet - comédien et martyr", Sartre adverte que, sermos ainda o que vamos deixar de ser e sermos já o que seremos, é a mais solene e trágica das nossas condições. Olho para o futuro com a esperança do "progressista" que não sou. Não há como um ano depois do outro.
Cada um de vocês terá as suas. Proponho-vos as minhas:
a volubilidade do amor, a fragilidade do nosso corpo,
a opressiva mesquinhez que domina a vida social,
a trágica solidão em que no fundo todos vivemos,
os reveses da amizade,
a monotonia e a insensibilidade que andam associadas ao costume de viver."
Enrique Vila-Matas, Paris nunca se acaba
Não há como um dia depois do outro. Por acaso de calendário, o dia de hoje fecha um mês e fecha um ano. Há muitos anos que já não existem anos diferentes. Não adianta olhar para trás. O passado está pejado de cruzes. As dos nossos mortos, as dos nossos "ideais", as dos nossos desejos, as dos nossos amantes - bonita expressão a de Hervé Guibert, "o mausoléu dos amantes" -, as das nossas múltiplas vidas. Todo o homem é um ser complexo e só os pobres de espírito podem supor que tudo corre como numa auto-estrada no meio do deserto, sem trânsito e sem outra paisagem que não o sol e o céu azul. Proust escreveu que era preciso guardar um pouco de céu azul na nossa vida, logo esse nervoso genial que se fechou num quarto para remoer "o tempo perdido". Não, não adianta olhar para trás. Aos quarenta e seis está-se mais perto dos cinquenta do que dos vinte, dos trinta ou mesmo dos quarenta. Provavelmente houve um tempo para tudo da mesma forma que haverá agora um tempo para um outro tudo. Nas magníficas páginas iniciais do seu "Saint Genet - comédien et martyr", Sartre adverte que, sermos ainda o que vamos deixar de ser e sermos já o que seremos, é a mais solene e trágica das nossas condições. Olho para o futuro com a esperança do "progressista" que não sou. Não há como um ano depois do outro.