...de Joaquim Manuel Magalhães
(...) Ao ler em português com tanto prazer, Quatro Quartetos, neste tempo político português de hoje, penso no lenitivo que Eliot enquanto poeta poderá oferecer a quem vive, sem alienação partidária, o momento de destruição da classe média, essa que conseguiu, ao longo da história recente europeia, ser o centro comum moral e político e económico donde pôde partir a compreensão integradora nos comportamentos e nas leis dos avanços da cidadania alargada à totalidade do tecido social. Contudo, com a governação que temos agora e com um Presidente que não pode ou não sabe ser uma força actuante para lá de vagos discursos, nunca desde os anos do domínio do Partido Comunista a seguir ao 25 de Abril essa classe média foi tão persistentemente boicotada. Os extremos políticos sabem que, se se retirar à média social o seu equilíbrio económico, ela deixa de poder preocupar-se com os valores da cidadania, pois tem de confrontar-se antes de tudo com as suas necessidades económicas primárias que não foi ela a culpada de terem entrado em colapso: isso dá muito jeito àqueles a quem convém manter um país moralmente retrógado nos princípios das próprias leis. Porém terão sempre que ser confrontados com o que implicam essas palavras do Eliot conservador e eticamente esclarecido: "a vergonha/ De motivos tradiamente revelados e a consciência/ De coisas mal feitas e feitas em agravo de outros/ As quais tomaste então por exercíco de virtude./ Então o aplauso dos loucos fere e a honra mancha", "Little Gidding", II.
(in suplemento Actual do Expresso de 23 de Outubro de 2004: A partir de "Quatro Quartetos" de Eliot)
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