Desde que Vasco Pulido Valente escreveu há dias acerca da sua geração - com o pretexto dos sessenta anos de Bill Clinton - e "ousou" designar o regime de Salazar e de Caetano como não exactamente "fascista", emergiu um pequeno debate em torno da ideia geracional. Vitor Dias, o "intelectual de serviço" do PC, para além de Ruben de Carvalho, mais virado para as "artes", zurziu em Pulido Valente por causa da toponímia utilizada. Vista com uma distância de vinte, vinte e cinco anos - o número, em idade, que me separa dela -, à geração de sessenta calhou-lhe pastorear a nação após o 25 de Abril. Com a excepção de Cunhal e de Mário Soares, foram eles que mandaram entre 76 e 95, em "postos" tão diversos como ministros (v.g., Medeiros Ferreira, António Barreto), primeiros-ministros (Sá Carneiro e Cavaco tinham pouco mais de quarenta anos quando ascenderam ao cargo), constitucionalistas (Jorge Miranda ou Vital Moreira) ou directores de jornais (Mário Mesquita, no DN, ou, na fundação do Público, Vicente Jorge Silva). Até VPV "mandou", como secretário de Estado da Cultura e Adjunto de Sá Carneiro. Balsemão, como de costume, conta pouco, mas também apareceu e Freitas do Amaral, um "late bloomer", conseguiu fazer "a ponte" - toda torcida - entre os "de sessenta" e os que se lhe seguiram, de Barroso a Sócrates. A "geração" também produziu livros, filmes, actores e actrizes emblemáticos (Maria Cabral, por exemplo), polémicas, professores, ensaístas, poetas, "outsiders" (Joaquim Manuel Magalhães) e mais umas quantas coisas que servem para contrapôr à mediocridade vigente a densidade graciosa e vagamente desalinhada dessa gente toda. Se houve - ou ainda existem - elites na sociedade portuguesa, muito devem àqueles que agora oscilam pelos sessenta e alguns anos de idade. Aquilo que foram e são os trinta e (já quase) três anos deste regime, é-lhes inteiramente assacado, com a exclusão do dr. Soares, do dr. Cunhal e dessas extravagâncias pueris chamadas Guterres, Barroso, Portas ou Santana Lopes. Eanes, o prolongamento democrático do MFA, é atípico e explicável pela necessidade de pôr a tropa em sentido. Jorge Sampaio, a coroa de glória do famoso muro da cidade universitária, acabou por presidir a dez anos literalmente perdidos. O engraçado da "história" é que, havendo pelo meio da geração tantos "talentos", foi o seu "Zelig - Sampaio" - o rosto das "abstracções sem rosto", como chama Eduardo Pitta aos que se destacaram "na definição de comportamentos de natureza anti-disciplinar" (Rui Bebiano) -, quem conseguiu ir mais longe politicamente, mesmo que isso tivesse servido para quase nada. Depois veio o dilúvio onde eu mergulhei. Nos anos oitenta, na minha adolescência, Eduardo Prado Coelho escreveu que a sociedade - a lisboeta, inevitavelmente - se tinha "fragilizado" por referência a esse cadinho dos novos costumes que foi o Frágil de Manuel Reis, inaugurado em 1982. O "Metro e Meio" cedeu perante o Bairro Alto. E, de cedência em cedência, chegámos ao ponto em que estamos. A minha geração está agora no poder, desde 2002, e, pelas piores razões - Margarida Rebelo Pinto, Inês Pedrosa, Mexia, Rodrigues dos Santos e "tutti quanti" -, instalada na "cultura" e no "bezerro de ouro", nome que o Victor Cunha Rego dava ao dinheiro. Já nem o Frágil se aproveita. Só posso lamentar.
11 comentários:
Desculpe, não percebo muita coisa do seu post. Considera Freitas do Amaral um "late bloomer" mas a que data se refere? Quando ele se tornou nº 1 do governo AD após a morte de Sá Carneiro ou quando foi MNE de Sócrates, há poucos meses?
VPV manda nas nossas cabeças, faz opinião há décadas, o que é bem mais importante que a sua rápida passagem pelo governo de Sá Carneiro.
Lembrar Maria Cabral neste contexto revela um certo mau gosto.
Faltou-lhe dizer que Mário Mesquita foi director do DN com vinte e poucos anos enquanto Medeiros Ferreira ou António Barreto eram pouco mais mais velhos quando foram ministros.E faltou-lhe muitas outras coisas.
Pode causar-nos alguns engulhos, mas parece hoje mais ou menos evidente que as gerações que surgiram para a Política e, de um modo geral, para a Cultura, depois de Abril de 74, ficaram aquém das anteriores, exceptuando desta comparação as áreas técnico-científicas, onde talvez até se tenha verificado situação contrária. Tais comparações são sempre discutíveis e podem ser odiosas, mas um pouco de objectividade levar-nos-á a conclusões porventura amargas. Será que a Ditadura formava melhor as gerações na área das Humanidades, apesar do restringido acesso aos bens culturais ? Ou a falta de liberdade estimularia nos cidadãos o seu enriquecimento cultural, o seu investimento pessoal, de um ponto de vista espiritual ? Ou tal se deveria a um ambiente geral, de dimensão mundial, que fomentava os interesses culturais, influenciando mesmo os lugares onde vigoravam ditaduras políticas : Portugal, Espanha e Grécia, para só falar em países da Europa ocidental ? Há aqui muito por onde debater, averiguar, investigar. E que não se temam as comparações nem as conclusões !
Depois de ler este post, só nos resta uma coisa. Portugal e os portugueses serão lembrados para todo o sempre.
Juntar o país todo, sem excepção de ninguém. No meio do tabuleiro da ponte 25 de Abril, do Tejo, Salazar, o que quiserem. E atirarmo-nos ao rio num suicídio colectivo que ficará para sempre na memória dos povos!
Confesso que desconheço quem é Maria Cabral.
E sim, houve um empobrecimento generalizado da formação humanística em todo o mundo.
Ó homem, a Maria Cabral foi a primeira mulher (e mãe da filha) do Vasco Pulido Valente. Entre outros, estrelou «O Cerco» de António-Pedro de Vasconcelos, onde protagoniza uma famosa cena hard core. Uma mulher lindíssima.
Ah, tudo bem. ;)
É o que dá nascer depois do 25 de Abril (eu bem digo que as pessoas estão a perder qualidades...)
Além disso, o Mesquita ainda teve tempo para ser o afundador do "Diário de Lisboa".
Qual Mexia?
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