A mercearia deve ter limites. Quando se coloca a hipótese de transformar monumentos nacionais em “hotéis de charme”, de os arrendar ou vender para prover às nunca acabadas necessidades de tesouraria do Estado, significa que entrámos num terreno em que já vale tudo e no qual os serventuários que propõem tamanhos disparates não possuem a menor noção do que significa o património material histórico (o imaterial praticamente não conta ou tem sido alvo de atentados obscenos) de uma nação. Dantes dizia-se que possuíamos uma direita estúpida. Não era, não é, infelizmente, mentira. Tudo somado, os quatro anos disto revelam não apenas esta derradeira loucura a pretexto de um “novo regime geral dos bens de domínio público” como a “esquerda moderna” mais estúpida da Europa. Uma “esquerda” definitivamente empenhada num “Portugal dos Pequeninos”.
15 comentários:
os devoristas do monstro socretino não têm limites para a sua voracidade.
nada me admira.
admito tudo
com esta escumalha ignorante e sem vergonha.
a assembleia de S. Bento ainda acaba dividida em quartos para alugar à hora.
chego a ter pena de não vivermos em tempo de peste que nos livrasse destas pestes. a putrefação social já tem cheiro pestilento
radical livre
Subscrevo. Com estas "soluções" do espírito tecnocrata que nos governa, sinto-me cada vez mais um estrangeiro nesta terra. Acho que nunca vi um governo e autarquias (ou um regime, digamos, porque estas espertezas não são de agora) alienar tanto da identidade cultural de um povo - da língua, passando por inúmeros exemplos de destruição de "identidade material" quotidiana, a monumentos. Isto não é ser Velho do Restelo, porque não sou velho nem sou do Restelo: é apenas o desencanto com a aparente incapacidade dos nossos politicos perceberem que é possível ser moderno e preservar ao mesmo tempo, sem destruir elementos identitários que nos constituem como povo. Como o péssimo exemplo da Casa dos Bicos ou ainda o futuro leilão do Convento de Sta Clara em Coimbra, agora desanexado do Exército. Não há nenhum projecto de animação e recuperação integrada do Património, aliado a uma política cultural. Não existe. Há negociatas. Negociatas provincianas.
Acrescento só um pormenor. O Convento do Carmo deve estar assombrado e foi o precursor de como uma elite burra e pretenciosa que já se insinua há muito. Concerteza todos se lembrarão que em finais de 80 ou inícios de 90 havia uns concertos abertos ao público (i.e., gratuitos) às sextas-feiras. Presidia o Maestro Pereira (?) à frente de uma orquestra que, não sendo eu grande especialista de crítica musical), sempre me pareceu bastante razoável, entusiasmada, e tinha um reportório bastante interessante que excedia largamente a ideia de "concertos para o povo" (como faria agora, aposto, o vereador Fernandes, caso se lembrasse disso, em vez de alugar praças). Havia, sobretudo, umas pérolas, como uma excelente execução do Concerto para Clarinete de Mozart e, se não a memória não me atraiçoa, um bravo Concerto de Violino de Beethoven. Era um pouco na linha dos concertos de câmara ao domingo no átrio da Biblioteca da FCG ou no Fórum Picoas, ao sábado de manhã (estes um pouco mais selectos, mesmo ao lado das galinhas frescas no mercado 31 de Janeiro). Seja como for, no Carmo, a afluência ao longo de uns meses foi crescendo, criou um largo número de habituais e, sobretudo, fascinava os transeuntes (os estrangeiros e os distraídos). Era belíssimo estar ali, a ouvir música, o rufa-rufa dos pombos e às vezes o rádio de pilhas dos fulanos da GNR no quartel ao lado. Funcionava. Cresceu de tal forma que, a dada altura, numa bela sexta-feira, toda a gente bateu com o nariz na porta. A orquestra estava lá, mas era "por convite". Nem era a pagar, note-se: era por convite. Pouco depois acabou e nunca mais se ouviu falar dos "concertos no Carmo". Ou seja, aquilo que começou como um exemplo de política cultural bem sucedido, não tardou em ser apropriado pela burrice e por um elitismo parolo. Este é o problema de muita gente: é incapaz de pensar em políticas culturais sem naturalidade, elitismo rançoso e, pior, paternalismo idiota. Não estamos a falar de umas charangas com a graça do 1812 de Tchaikovsky. Estamos a falar de como um projecto honesto e natural - por oposição ao pedagógico, rapidamente se transforma num "produto" cultural que é fonte de cobiça e parolice snob. Que agora pretendam transformar o Convento do Carmo (que como expliquei foi animado naturalmente pelos lisboetas e os visitantes e tem uma identidade própria por causa disso) num hotel de luxo (e não tenho nada contra hotéis de luxo) acho uma afronta, e uma derrota do que deve ser o Património e, também, do que deve ser uma cidade. Os mesmos parolos que resolveram ficar com os concertos do Carmo, querem transformar a cidade num empreendimento de luxo, desprezando aquilo que a move e aquilo de que é feita.
Escrevi acima com algumas gralhas e erros («reportório», então, é uma grande bronca). As minhas desculpas a quem tiver lido o que já não posso emendar.
Este pavão chamado antónio pinto ribeiro, altamente recomendado pela fernanda câncio, chegou ao poder para fazer mais, gastando menos – foi o que nos revelou há uns dias atrás ao falar aos senhores deputados da AR.
Já estamos a ver onde queria chegar, qual era a ideia – é brilhante, só podia sair duma cabeça daquelas, com tanto cabelo !
Vamos concessionar os nossos monumentos ao pestana, ao júdice, ao amorim, ao belmiro, sacar dali uns milhões e já está – estamos prontos a financiar o namoradinho de portugal para que este nos mostre, finalmente, como se faz teatro em portugal.
Está explicado o silêncio no tndm ii – estão à espera de verba para começar. Até lá, até chegar o cacau, não há teatro para ninguém. Nem o namoradinho quer brincar aos teatros.
E o manoel de oliveira pode estar descansado – enquanto viver, pode projectar aquelas obras primas que tanto espantam o mundo. Não vai faltar incentivo.
Isso é a perspectiva diabólica, caro anónimo... Para mim basta saber que essas pessoas não sabem o que estão a fazer.
Desde o século XIX, da denúncia de Herculano sobre a degradação do património cultural em grande parte como consequência da alienação dos bens das ordens religiosas extintas, em 1834, com o triunfo do liberalismo, que se colocou a questão da necessidade da preservação dos bens culturais enquanto valores identitários de uma Nação. A partir daí, com altos e baixos foi-se consolidando que era necessário salvaguardar o património cultural, política seguida por sucessivos regimes, incluindo a primeira república e o Estado Novo que criou a DGEMN para tratar do património edificado e o Instituto José de Figueiredo para tratar do património artístico, organismos extintos pelo actual governo,para além dos museus que remontam aos finais do séc. XIX. Esta noção de proteger o património cultural enquanto bens que deviam fazer parte do domínio público é hoje posta em causa, a troco de alguns patacos. Basta nos lembrarmos das casitas mandadas construir algures, na Guarda, pelo nosso "primeiro" para percebermos o seu nível cultural e o seu desprezo pelo património, seja ele arquitectónico, artístico, arqueológico, bibliográfico ou arquivístico. É mais um contributo deste governo para apagar a memória. A memória e o sucesso desta pátria com mais de oito séculos de história está no "Magalhães e nas novas oportunidades".
O aluguer ou venda de monumentos históricos seria um escândalo sem precedentes.
Por menos do que isso rolou no cadafalso a cabeça de Luís XVI, permita-se-me este desabafo.
Espero que nunca venha a concretizar-se tal hipótese!
MINA
Longe vão os tempos em que a DIRECÇÃO GERAL DOS EDIFÍCIOS E MONUMENTOS NACIONAIS editava mensalmente um Boletim com a descrição pormenorizada do restauro (irrepreensível, sem olhar a custos) de um monumento…
Portugal está, actualmente, a saque.
É assim quando se vota em alguém pela "lindeza" do que diz e como diz, pelo bom aspecto e ar saudável, pela capacidade de ser sempre politicamente correcto, ...
Acho cada vez mais que os estúpidos somos nós que parece que não temos capacidade para aprender a lição e vamos votando sempre "no que luz", sem tratar de tentar perceber em QUEM estamos a confiar as nossas vidas.
Aparece um qualquer a dizer: dá-me o PIN do teu cartão de crédito e amanhã sai-te a Sorte Grande. E nós damos! É como dar a chave da nossa casa ao primeiro tipo (ou tipa) com bom aspecto que nos apareça com as "falinhas mais mansas"! Depois ficarmos admirados quando de manhã acordamos ou quando chegamos a casa depois termos saído para tratar do nossa vida e vemos que nos levaram as pratas e a mobília.
Cada vez mais acho que os burros não são eles.
E claro está, que nem querem saber se existirá por aí um mecenas interessado em comprar uma das pechinchas, para simplesmente transformar o espaço numa montra de exposição de colecções, etc. Lembram-se da Bacalhoa? Não foi transformada em hotel de charme e lá está, ao que dizem, recuperada e em ordem.
Mas se insistem muito, talvez o Belmiro transforme alguns dos palacetes em centros comerciais que ficarão às moscas. E com uma intervençãozita do Taveira, então é que seria um mimo, como aquele monte de merda betonada que fez erguer no saldanha. Que vergonha...
Uma pergunta:
O João sabe do que está a falar ou está apenas a servir de caixa de ressonância?
Quando vejo o BE e o PCP a protestar contra este tipo de propostas, até aceito, pois é a sua função - protestar contra tudo, agora ver outras forças a servir de altifalante é que já me espanta.
Penso que aqui há uma questão fundamental que pode aliar a esquerda e a direita, e essa questão é pura e simplesmente o BOM SENSO.
Não vale tudo!
Mas qual o espanto? O IPPAR, bem cindido pelo Carrilho em IPA + IPAR, voltou de novo a ser uma coisa disforme, o IGESPAR, constantemente a tropeçar nas suas mil e uma patas de funcionalismo público, gente à toa que outro projecto não terá do que o de garantir que o sistema sovrevive, à custa do que o sistema deveria proteger, fiscalizar e regular.
É assim que se nomeia para a parte arqueológica do IGESPAR um arqueólogo cinzento que outro papel não tem que o de liquidar o que ainda resta da estrutura de fiscalização e regulãção do Estado. Fecham-se revistas, suspendem-se bases de dados, despedem-se os fiscais, dão-se 15 dias para se abandonar as instalações da Avenida da Índia (para dar lugar ao putativo nóvel Museu dos Coches) e exige-se que se transfira em 20 dias todo um acervo de 10 anos - deitando ao rio o dinheiro das obras de melhoria e beneficiação que se fizeram até agora - sem que haja um plano, um objectivo, uma estratégia...
O que nos vale, aos poucos que ainda têm voz e hombridade para a usar, é que nos anos bons, Portugal foi parte ratificante de muitas Convenções internacionais, Convenções essas cuja força jurídica está apenas abaixo da Constituição e acima de qualquer outra legislação nacional.
Logo, uma coisa é querer, outra é poder - assim haja quem se chegue à frente e denuncie internacionalmente esta tacanhez de espirito e esta gente que, do mundo, só lhe conhece as berças onde, na sua cabeça, ainda continuam a apascentar cabras.
"Longe vão os tempos em que a DIRECÇÃO GERAL DOS EDIFÍCIOS E MONUMENTOS NACIONAIS editava mensalmente um Boletim com a descrição pormenorizada do restauro (irrepreensível, sem olhar a custos) de um monumento…
Portugal está, actualmente, a saque."
Não devemos consultar os mesmos boletins...
Deve-lhe ter escapado a "limpeza" que o barroco português levou... ou as "ameias às três pancadas" que muitas torres, fortificações e castelos viram acrescentadas...
Tudo em nome dos dois únicos estilos admissíveis como portugueses por época do Estado Novo : o Românico (da origem da nação) e o Manuelino (da senda ultramarina portuguesa)
Pegue nos boletins das igrejas de Santarém por exemplo, e perceba porque é que hoje lhe chamam a "capital do românico português"...
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