GERAÇÕES
A revista Pública trazia esta semana uma curiosa reportagem com aqueles a quem chamava os "pré-adolescentes". Diversas entrevistas com jovens de 11 ou 12 anos mostravam que a própria divisão entre adolescentes e pré-adolescentes é artificial. Tal como hoje os adolescentes têm comportamentos de adultos. Só que estes adultos são adolescentes retardados, ficam muitos anos em casa dos pais, vivem numa certa dependência económica, e têm condições favorecidas para o exercício da sexualidade. Donde, são pós-adolescentes. Faço-me entender? Eu próprio não estou certo de perceber tudo isto.
Sento-me numa esplanada, ao sol, olhando o mar, e ouvindo com curiosidade e algum espanto as conversas de alguns pré-adolescentes que estão perto de mim. O espanto vem certamente de eu não pertencer, longe disso, a esta geração, e nem sempre entender tudo o que mudou. A sensação que tenho é a de que conversam sobre coisa nenhuma. Ou melhor, conversam sobre formas de comunicação, que passam por três instâncias privilegiadas: o telemóvel, com relações orais e mensagens escritas, a Internet, e a discoteca.
No caso das discotecas, os horários mudaram por completo. Pergunto-me sobre a questão dos efeitos destes ritmos. Como é que chegando a casa às cinco da manhã se consegue ler um livro no dia seguinte? Ou mesmo seguir uma aula? E, no entanto, muitos deles jantam, deambulam pela cidade, acumulam-se à porta dos bares a beber cervejas e a fumar e começam a dançar por volta das duas. Antes disso, a discoteca está ocupada por alguns pares deslumbrados ou sonolentos que murmuram palavras de filmes antigos.
Escutando as conversas destes candidatos à adolescência, concluo que têm um vocabulário sucinto e concentrado em certas áreas temáticas. Que utilizam obsessivamente determinados estereótipos. Que por vezes deslizam para formas que se aproximam do grito ou do grunhido. E que, embora frequentem o cinema, com pipocas e tudo, é a música que emerge como a prática cultural dominante.
Há um aspecto que vale a pena citar. Estes jovens não têm os mesmos rituais linguísticos que nós tínhamos. Na minha geração, a linguagem era um instrumento de sedução em que a rapariga deixava que as palavras a tocassem afectivamente. Aflorar com a mão o joelho trémulo era o mesmo que ir buscar uma citação de um poeta: mostrava-se entre duas pessoas um espaço de encanto e delicadeza. Hoje, rapazes e raparigas falam exactamente a mesma linguagem, feita de piadas algo boçais e convites explícitos. A linguagem não tem zonas secretas nem assimetrias sexuais. Instrumentalizou-se sem invenção nem insinuação. Os códigos amorosos perderam subtileza e requinte.
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