7.1.05

AS LISTAS

Aos poucos, os partidos vão "fechando" as listas de candidatos a deputados. O carácter "instantâneo" e voraz da actual vida política obrigou o país a acompanhar a par e passo este "felliniano" processo. Tratou-se de um remake meio sério, meio light, da "quinta das celebridades" ou, em versão sofisticada, do extinto "big brother". Quem costuma encher a boca com preocupações acerca do "crescente desprestígio da instituição parlamentar", ao olhar para o "processo" e para o resultado do "processo", deve ter tido vontade de enfiar uma rolha. Toda a misantropia anónima própria da "vida partidária", toda a cegueira acéfala dos aparelhos, toda a miséria das "secções", todos os "galos" e "galinhos" das "federações", toda a corja mais ínfima de "partido-dependentes", todos se puseram a jeito do olhar da direcção e dos líderes para constar. No PS há a bizarria da "quota" do secretário-geral para temperar os excessos ou para os piorar. No PSD, há Santana Lopes e chega. Nesta altura do campeonato, eu francamente já esperava ideias. Sócrates bem pode aparecer em conferências bem arrumadas para falar da economia e das finanças. Ninguém o ouve. O que representam estas extravagâncias quando comparadas com o drama pessoal do sr. Carranca ou do sr. Asdrúbal, putativos candidatos a deputados em lugares desprezíveis? Quem não compreende os estados de alma daqueles abnegados militantes que viram os lugares cimeiros ocupados por "independentes" ou por inimigos da paróquia? Na verdade, são estes "problemas" e são estas "angústias" que prevalecem. Se não fossem preocupantes por aquilo que revelam, seriam cómicas. E são preocupantes por desnudarem, em todo o seu esplendor, o nível de mediocridade atingido pelas nomenclaturas dos principais partidos, justamente aqueles em que temos de votar para escolher um governo. Este folclore das listas, das entradas e das saídas, do "sobe e desce", do "fica mas pouco", merecem do cidadão comum um esgar. Como é que alguém de "bem", no seu inteiro juízo, e com a lucidez intacta, pode acreditar nisto? Os que, como eu, defendem ferozmente a democracia, devem sentir-se apoucados com este grotesco e desviante espectáculo. Salvo honrosas excepções, a generalidade das listas dos partidos que efectivamente "contam", pouco mais merece que o desprezo dos cidadãos. Felizmente para eles, praticamente ninguém se lembra que se trata de eleições legislativas. A proeminência na eleição da escolha do chefe do governo, ajuda a esconder esta calamidade. Uma calamidade que se agrava quando os do "meio" e do "fim" saltarem para cima por os outros terem ido para o governo... Nem quero imaginar o Parlamento que se prepara para a próxima legislatura, onde o PSD fez listas para perder clamorosamente. Será que pior era impossível?


Adenda: Vale a pena ler o editorial de José Manuel Fernandes no Público de sexta-feira sobre este assunto. Está lá tudo dito.

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