O fim de semana não correu bem a José Sócrates, um primeiro-ministro que comemora os seus inaugurais cem dias. Tudo começou na longa noite de sexta-feira em Bruxelas. A emergência de Tony Blair, o fracasso das negociações orçamentais e a clara derrota do "eixo" ao qual Portugal estava ancorado por causa da sua teimosia em relação à aprovação do Tratado Constitucional Europeu, marcaram a sua infeliz conferência de imprensa que passou praticamente despercebida. Ao falar na madrugada de sábado, Sócrates deu a ideia - talvez deliberada - de que o "acordo" a que se tinha chegado em matéria financeira, na quinta-feira, era bom para o país. Ou seja, até parecia que o dito "acordo" estava já em vigor, quando, na realidade, não passou de wishful thinking por causa do veio a seguir. Dito de outra forma: Portugal veio de Bruxelas com uma mão atrás e outra à frente. Mais realista, foi essencialmente isto que Campos e Cunha transmitiu aos deputados do PS no Algarve: Portugal perdeu. Depois, neste mesmo Algarve, e perante os mesmos deputados, Sócrates foi falar em "moralidade" para justificar as "medidas" que afectam os detentores de cargos políticos. A inovocação da "moral" no seio da política costuma ser desastrosa para além de ser populista. E mesmo sendo populista, é duvidoso que produza grande efeito atendendo ao grau de irritação e de incómodo crescentes que outras "medidas" anunciadas estão a provocar em determinados sectores. Não vale nunca a pena tapar o sol da política com a peneira da "moralidade". Ninguém acredita. Nem sequer os seus próprios deputados, seguramente. José Gil, num texto complexo mas certeiro, ensaiava, na Visão desta semana, uma explicação para o sentimento, algures entre a simpatia e a perplexidade, que o governo de José Sócrates nos deixa em apenas cem dias. São dele as palavras seguintes, registadas sem mais comentários.
Um aspecto do Governo a quem os portugueses deram a maioria absoluta, supreende: é um governo sem imagem. O seu primeiro-ministro é sem imagem; o ministro que mais aparece nos media, o ministro das Finanças, não tem imagem. Os que tendem a afirmar uma personalidade mais singular, são logo remetidos para o silêncio. Para começar, essas características correspondem adequadamente ao momento crítico que a sociedade atravessa. A crise ameaça transformar-se em caos, as pessoas esperam, num temor sem rosto. E a oposição também não o tem.
Não se trata de um estilo de governação. Porque nenhum traço é verdadeiramente marcante. Por agora, parece apenas uma estratégia para atenuar a crise nos espíritos, não agudizar, não criar ruído, ao mesmo tempo que se criam ondas. Estratégia de neutralização da angústia da população e de esvaziamento dos media, que a amplificam. Repare-se: não há um discurso legitimador das medidas já tomadas - as justificações (em nome da "justiça para todos", da moralidade na prática política) são pontuais, a propósito de derrapagens demasiado evidentes. Nada de grandes valores, de grandes posições ideológicas, nem sequer de traços gerais de metodologias da acção (...) Como se se quisesse criar a ideia de uma necessidade natural, técnica, absoluta, desta política, sem alternativa possível, necessidade que se justificaria pela própria natureza da crise.
A imagem do Governo não afirma nem a tecnocracia, nem o humanismo, nem o socialismo, nem o neoliberalismo. Quer-se mudar Portugal. abrindo um espaço para a acção. Porém, este período não pode durar sempre. A ausência de imagem não será sempre eficaz, como é o caso. Virá o momento em que o primeiro-ministro e o Governo terão de produzir uma imagem (mesmo inovadora) decifrável da sua política, sob pena de incorrer nos mais variados riscos, o menor dos quais não é o de governar contra o povo.
Um aspecto do Governo a quem os portugueses deram a maioria absoluta, supreende: é um governo sem imagem. O seu primeiro-ministro é sem imagem; o ministro que mais aparece nos media, o ministro das Finanças, não tem imagem. Os que tendem a afirmar uma personalidade mais singular, são logo remetidos para o silêncio. Para começar, essas características correspondem adequadamente ao momento crítico que a sociedade atravessa. A crise ameaça transformar-se em caos, as pessoas esperam, num temor sem rosto. E a oposição também não o tem.
Não se trata de um estilo de governação. Porque nenhum traço é verdadeiramente marcante. Por agora, parece apenas uma estratégia para atenuar a crise nos espíritos, não agudizar, não criar ruído, ao mesmo tempo que se criam ondas. Estratégia de neutralização da angústia da população e de esvaziamento dos media, que a amplificam. Repare-se: não há um discurso legitimador das medidas já tomadas - as justificações (em nome da "justiça para todos", da moralidade na prática política) são pontuais, a propósito de derrapagens demasiado evidentes. Nada de grandes valores, de grandes posições ideológicas, nem sequer de traços gerais de metodologias da acção (...) Como se se quisesse criar a ideia de uma necessidade natural, técnica, absoluta, desta política, sem alternativa possível, necessidade que se justificaria pela própria natureza da crise.
A imagem do Governo não afirma nem a tecnocracia, nem o humanismo, nem o socialismo, nem o neoliberalismo. Quer-se mudar Portugal. abrindo um espaço para a acção. Porém, este período não pode durar sempre. A ausência de imagem não será sempre eficaz, como é o caso. Virá o momento em que o primeiro-ministro e o Governo terão de produzir uma imagem (mesmo inovadora) decifrável da sua política, sob pena de incorrer nos mais variados riscos, o menor dos quais não é o de governar contra o povo.
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