Num país "consensual" e morno como o nosso, o Expresso é o melhor retrato dessa aurea mediocritas, zelando permanentemente pela moderação dos instintos e pelos bons costumes democráticos. Basta reparar na coluna "altos e baixos" e entende-se o exercício. Para ninguém sair melindrado, há sempre o cuidado de colocar um "baixo" em "alta" na semana seguinte, e vice-versa. A parafernália de colaboradores, todos naturalmente distintos, não mete medo a uma mosca. É tudo convenientemente "centrão", rebarbativo e extremamante correcto. De vez em quando Mário Soares, Duarte Lima e Carrilho, já claramente outsiders, escapam à cor cinzenta. O Sr. Espada, por todos e em nome do sagrado nome de Popper, vela pelo "equilíbrio" geral. Em suma, o Expresso é o jornal lido pela "élites" da democracia e limita-se a reflectir aquilo que essas "élites" são. Este velho cacilheiro do jornalismo português é dirigido pelo arquitecto Saraiva, uma figura patusca que, em tempos, achou que era historiador e que agora se revela sibila. Esta semana defende uma "tese" muito interessante. Segundo ele, os "comentadores" e os "analistas" (ele não se mistura, pois claro) passam a vida a "triturar" as benditas élites, do governo às mais pequenas direcções gerais ou às lideranças dos partidos, levando-as incompreensivelmente à demissão, como vulgares marionetas. Na "visão" de Saraiva, estes "eleitos" devem conduzir a sua missão até ao fim, sem vacilar, aguentando tudo a bem da "estabilidade". O exemplo escolhido para atestar esta "boa prática" não podia ter sido melhor: Sampaio versus Souto Moura. Julgo que pouca gente levará a sério o arquitecto Saraiva, à excepção dos dois últimos citados. Esta sua tese peregrina do "respeitinho", do "juizinho" e do "bom caminho", levada ao absurdo, nunca teria permitido a Sá Carneiro fazer o que fez no partido e no país, a Mário Soares romper com Eanes e com metade do PS, a Eanes romper com ele mesmo, a Cavaco e a Marcelo mandarem o partido às urtigas, a Sampaio avançar para a CML e depois para Belém, a Guterres dar lugar a Barroso, a Pacheco Pereira renunciar à UNESCO etc, etc. Ou seja, nunca teria havido lugar a rupturas e a clarificadoras "separações de águas", afinal aquilo que é a essência da democracia. Saraiva e o seu timorato Expresso estão bem longe dos gloriosos "idos de 70". Hoje limitam-se a ser a imagem mais fiel dos seus pusilânimes leitores e do regime salazarista democrático em que vegetamos.
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