«Somos poucos mas vale a pena construir cidades e morrer de pé.» Ruy Cinatti joaogoncalv@gmail.com
31.8.04
O BRONZE
O IMPOSSÍVEL
O PRINCÍPIO
30.8.04
COMO É QUE A SENHORA AGORA SE SENTE?
29.8.04
JORNAL DO GATO
Da carta de Pacheco a Pepe Blanco:
Da carta de Cesariny a Pacheco:
CASUS BELLI
28.8.04
AGENDA POLÍTICO-DESPORTIVA
27.8.04
O ÚLTIMO DOS SANTANISTAS
26.8.04
O FUTURO II
Li há uns dias um artigo da Fátima Bonifácio - que julgo que ainda era aluna, quando eu já era professora - que faz um diagnóstico do "estado dos alunos" que poderia a traços largos subscrever. Como ela, penso que a questão do dinheiro não é a principal, se não falarmos em que é utilizado e como... ("Mais dinheiro para a Educação?", 15/08/04). Mas sobre a evolução desse "estado" - que não é assim tão recente... - as causas apontadas e a sugestão dos "remédios" é que me parecem ser mais perigosas do que à primeira vista parecem e são aqueles que não levarão nunca a qualquer melhoria, nem transformação.
Quatro notas:
1. O habitual método de comparar o que já foi (ou se imagina que já foi) e o que é (ou se julga que é - sempre a partir da própria experiência noutra situação) não costuma levar muito longe. Mesmo quando se enunciam as diferenças óbvias entre os tempos, não se leva em conta nem as diferenças entre as populações escolares de então e de agora (e eu-dinossauro ainda admito que existem classes sociais...), nem o diferente papel que o sistema político atribui às escolas na sociedade actual (e eu-dinossauro ainda acredito que há ideologia e que a escola, agora de outro modo, é um "veículo de manutenção e reprodução social da ideologia dominante"...)
2. O "jogo" e o hipotético "prazer" na escola como causa da ignorância e do não-pensar , em oposição ao "esforço" e ao "sacrifício" necessário ao "saber" (qual saber? que saber? para fazer o quê com esse saber?) e ao "pensamento" tem barbas. O que talvez não tenha barbas é o "sacrifício do esforço do jogo obrigatório". Longa história, mais "moderna"... Sobre estas aparentes e falsas oposições remeto para um texto de Mário Dionísio (de há meio século...) chamado "Enfado ou prazer: problema central do ensino" (que o Rui Canário, prof. de Ciências da Educação, retomou há bem pouco tempo), onde evidentemente o autor não defende o "enfado" e onde o "esforço" não se opõe obviamente a "prazer"...
3. Tem-me sido difícil imaginar, ao longo de décadas de professora do ensino secundário oficial (ainda por cima no "centro" da capital...), a maioria dos meus alunos como "centro" da vida dos pais que terão deixado de ter vida própria (em tantos casos, alguma vez a tiveram ou virão a tê-la?) para "contentar" os filhos, etc..., nem qualquer "respeito" pela sua "personalidade", nem "antigamente" nem agora. A acontecer, seria um fenómeno digno de nota na nossa sociedade... As questões são provavelmente outras e bem mais graves: os novos modos de "ascensão social", de "sucesso" e de "selecção", o império do mercado, etc., etc., etc...
4. A lembrar ainda: as alterações relativamente recentes nas escolas e no sistema escolar que têm feito diminuir as "excepções" (sempre excepções) daqueles poucos (professores e alunos) que, das mais diferentes maneiras, foram lutando contra ventos e marés, em épocas muito diversas, dentro das próprias escolas. Se se observa que os alunos estão nas escolas "para passar" e que estudam "para a nota", também se deve observar que poucos professores há que não dêem aulas para "terem bons resultados"... Ou seja: para os alunos "passarem" e terem a décima necessária para entrarem na universidade... e eles serem considerados por isso "bons professores". O trabalho burocrático (em nome da "pedagogia") dos professores aumentou, o medo das leis e dos "inspectores" também (há quem os "avalie"..., a população escolar diminui, etc...), a "desobediência civil" (que sem este nome foi fruto de coisas muito interessantes noutras altura) é-lhes inimaginável, e os "CV" (reais ou fabricados, listas de "acções" frequentadas, etc. e tal) passaram a existir para isto ou para aquilo...
Julgo-me no direito de escrever estas linhas (inúteis e porventura enfadonhas), uma vez que:
1. Dou aulas de Português desde 1969. Sem destacamentos nem equiparações. Únicas interrupções no trabalho lectivo: um ano sabático (suponho que as centenas de páginas de um trabalho de comparação dos programas de Português desde a I República até aos anos 90 em todos os graus de ensino e um pouco com os programas actuais de língua materna em França e em Inglaterra deve ter ido para o lixo...); de há três anos para cá, em resultado de uma doença (mas continuo "ao serviço"). Ou seja: tenho quatro anos de experiência de escolas "marcelistas", de uns anitos de PREC e de duas décadas de "actualidade", que começou nos anos 80.
2. Fui co-autora de muitas antologias de textos de Português (para vários graus) que introduziram nas aulas autores que até então não eram "escolares" (e alguns ficaram). Fui co-autora de programas de Francês para o ensino complementar (antes do 25 de Abril e tenho a alegria de ver que o "Silence de la Mer" do Vercors ainda se passeia pelos programas...). Fui co-autora dos primeiros programas de "Iniciação ao Jornalismo" (disciplina que já foi extinta) e de livros de textos (antes de haver "manuais"). Fui "assistente pedagógica" (orientadora de estágios...) e desisti quase logo a seguir ao 25 de Abril, porque achei que havia coisas mais interessantes para fazer.
3. Deixei de dar Francês quando o Inglês passou a ser "a" língua e os queijos, os perfumes, os vinhos e os cantores da moda ficaram no centro da matéria. Deixei de dar "Iniciação ao Jornalismo", quando a disciplina mudou de rumo e passou a ser ministrada por jornalistas (que se orientavam por "manuais"). Passei há uns anos para o ensino nocturno (e fui parar depois ao recorrente por unidades "capitalizáveis"!), quando alunos "do dia" me começaram a sugerir que "ditasse apontamentos"... e outros que não sabiam ainda escrever "normalmente" (quase no fim do curso secundário) tinham 19 valores em Jornalismo... Deixei o ensino nocturno, porque foi extinto - por desnecessário - na minha escola. Recusei-me sempre a ensinar 12º ano, porque seria "com enfado" que daria aquele programa, porque nunca "prepararia bem os alunos para exame" e porque com outros professores eles teriam mais hipóteses de entrarem na universidade (o que no meu tempo se fazia com um simples 10 e com "classe social" adequada, claro...) 4. Daqui a dias terei os 36 anos de serviço na "carreira", mas não me poderei reformar, porque não tenho ainda 60 anos... Espero que não passe entretanto para 65 anos a idade mínima da reforma como medida de saneamento da economia nacional... Talvez volte ainda a dar aulas, recomeçando a "estudar" programas, que as doenças que impedem de dar aulas só são válidas por dois anos...
Eduarda Dionísio, professora do ensino secundário
VALE A PENA?
25.8.04
É TÃO FÁCIL
24.8.04
PARA LER
A COR DO GATO
23.8.04
O NAVIO FANTASMA
22.8.04
SALAZARISMO DEMOCRÁTICO
21.8.04
POR CAUSA DAS MANIAS
Dos son los argumentos principales que utilizan los defensores de la excepción
cultural, a saber:
A) Que los bienes y productos culturales son distintos a los otros bienes y productos industriales y comerciales y que por lo mismo no pueden ser librados, como estos últimos, a las fuerzas del mercado -a la ley de la oferta y la demanda-, porque, si lo son, los productos bastardos, inauténticos, chabacanos y vulgares terminan desplazando en la opinión pública (es decir, entre los consumidores) a los más valiosos y originales, a las auténticas creaciones artísticas. El resultado sería el empobrecimiento y degradación de los valores estéticos en la colectividad. Dependiendo sólo del mercado, géneros como la poesía, el teatro, la danza, etc., podrían desaparecer. Por tanto, los productos culturales requieren ser exceptuados del craso comercialismo del mercado y sometidos a un régimen especial.
B) Los productos culturales deben ser objeto de un cuidado especial por parte del Estado porque de ellos depende, de manera primordial, la identidad de un pueblo, es decir, su alma, su espíritu, aquello que lo singulariza entre los otros y constituye el denominador común entre sus ciudadanos: sus patrones estéticos, su identificación con una tradición y una manera de ser, sentir, creer, soñar, en suma el aglutinante moral, intelectual y espiritual de la sociedad. Librada al mercantilismo codicioso y amoral esta identidad cultural de la nación se vería fatalmente mancillada, deteriorada, por la invasión de productos culturales foráneos -seudoculturales, más bien-, impuestos a través de la publicidad y con toda la prepotencia de lastransnacionales, que, a la corta o a la larga, perpetrarían una verdadera colonización del país, destruyendo su identidad y reemplazándola por la del colonizador. Si un país quiere conservar su alma, y no convertirse en un zombie, debe defender su identidad preservando sus productos culturales de la competencia y de la aniquiladora globalización. No pongo en duda las buenas intenciones de los políticos que, con variantes más de forma que de fondo, esgrimen estos argumentos en favor de la excepción cultural, pero afirmo que, si los aceptamos y llevamos a su conclusión natural la lógica implícita en ellos, estamos afirmando que la cultura y la libertad son incompatibles y que la única manera de garantizar a un país una vida cultural rica, auténtica y de la que todos los ciudadanos participen, es resucitando el despotismo ilustrado y practicando la más letal de las doctrinas para la libertad de un pueblo: el nacionalismo cultural. Adviértase lo profundamente antidemocrático que es el primero de estos argumentos. Si se respeta la libertad del hombre y la mujer comunes y corrientes la cultura está perdida, porque, a la hora de elegir entre los bienes culturales, aquéllos eligen siempre la bazofia: leer El código da Vinci, de Don Brown, en vez Cervantes, e ir a ver SpiderMan en vez de La mala educación. Así, pues, como el público en general es tan poco sutil y riguroso a la hora de elegir los libros, las películas, los espectáculos, y sus gustos en materia de estética son execrables, es preciso orientarlo en la buena dirección, imponiéndole, de una manera discreta y que no parezca abusiva, la buena elección. ¿Cómo? Penalizando a los malos productos artísticos con impuestos y aranceles que los encarezcan, por ejemplo, o fijando cupos, subsidios y rentas que privilegien a las genuinas creaciones y releguen a las mediocres o nulas. ¿Y quiénes serán los encargados de llevar a cabo ese delicadísimo discrimen entre el arte integérrimo y la basura? ¿Los burócratas? ¿Los parlamentos? ¿Comisiones de artistas eximios designadas por los ministerios? El despotismo ilustrado versión siglo veintiuno, pues. El otro argumento conlleva consecuencias igualmente nefastas. La sola idea de identidad cultural de un país, de una nación, además de ser una ficción confusa, conduce inevitablemente a justificar la censura, el dirigismo cultural y la subordinación de la vida intelectual y artística a una doctrina política: el nacionalismo. La cultura de un país como Francia o como España no puede resumirse en un canon o tabla de valores y de ideas de las que todas las obras artísticas e intelectuales producidas en su seno serían expresión y sustento coherente. Por el contrario, la riqueza cultural de esos dos países está en su diversidad contradictoria, en la existencia, en ellos, de tradiciones, corrientes y creadores y pensadores reñidos entre sí, que representan visiones del mundo y del arte que se repelen la una a la otra, y en el universalismo que esas obras alcanzaron en sus momentos más altos gracias a que fueron concebidas sin el corsé de un horizonte localista o nacional y -como ocurre con el Quijote, con Baudelaire, con el Tirant lo Blanch, con Proust, con el Greco y Goya y Velázquez y La Tour, Toulouse Lautrec, Matisse, Gauguin, y tantos otros- fueron por ello mismo entronizadas como representaciones estéticas donde podían reconocerse los seres humanos de cualquier tiempo o cultura. Esas obras no hubieran sido posibles dentro de las fronteras nacionales que presupone la noción aberrante de una identidad cultural colectiva. Ni siquiera la lengua puede ser considerada un campo de concentración para la vida cultural, porque, por fortuna -y, gracias a la globalización, este proceso se irá extendiendo cada vez más- casi todas las lenguas desbordan las fronteras o varias lenguas conviven dentro de una nación, y hay entre artistas una movilidad que les permite cada vez más elegir su propia tradición y su propio país espiritual, de modo que querer convertir a una lengua en una seña de identidad cultural de un pueblo es también otro artificio ideológico. Si la misma idea de nación -un concepto decimonónimo que ha perdido estabilidad y aparece cada vez más diluido a medida que las naciones se van integrando en grandes mancomunidades- resulta en nuestros días bastante relativo, la de una cultura que expresaría la esencia, la verdad anímica, metafísica, de un país, es una superchería de índole política que, en ver-dad, tiene muy poco que ver con la verdadera cultura y sí, en cambio, con aquel "espíritu de la tribu" que, según Popper, es el gran lastre para alcanzar la modernidad. Francia y España han avanzado ya demasiado en lo relativo a la cultura democrática para que sus ciudadanos, que a veces se dejan seducir por la demagogia y el chovinismo escondidos en los espejismos de la excepción cultural, acepten lo que serían las consecuencias prácticas de semejante propuesta: una vida cultural regimentada por burócratas o artistas y escritores instrumentales, en la que todo lo extranjero sería considerado un desvalor, y todo lo nacional, el valor estético supremo. De manera que, en términos prácticos, probablemente toda la alharaca que en estos dos países rodea a la política de la excepción cultural sólo desemboque en que unos cuantos artistas reciban los subsidios que piden y, con el pretexto de proteger los bienes culturales, los burócratas perpetren más derroches que los consabidos. Poca
cosa, a fin de cuentas, si toda la excepción cultural no pasa de eso, y en ambos países se respeta la libertad, el Estado no se mete a sustituir a los consumidores a la hora de elegir los productos culturales, y éstos siguen sometidos al juego de la oferta y la demanda con las mínimas interferencias posibles. Es verdad que los productos culturales son distintos a los otros. Pero lo son porque, a diferencia de una gaseosa o una nevera, en vez de desplazar en el mercado a sus
competidores, les abren la puerta, los promueven. Una obra de teatro, un libro, un pintor que tienen éxito son la mejor propaganda para el arte dramático, la literatura y la pintura y crean unas curiosidades y apetitos -unas adiccciones- que benefician a los otros artistas y escritores. El mercado no determina la calidad, sino la popularidad de un producto, y ya sabemos que ambas cosas no siempre coinciden, aunque algunas veces sí. Lo que el mercado muestra es el estado cultural de un país, lo que el hombre y la mujer del común prefieren, y lo que rechazan, en ejercicio de un derecho que ningun gobierno democrático puede objetar ni recortar. Querer acabar con el mercado para los bienes culturales porque el público no sabe elegir es confundir el efecto con la
causa, liquidar al mensajero porque trae noticias que nos disgustan. Desde luego que sería preferible que los consumidores tuvieran a veces mejor gusto a la hora de elegir un libro, un espectáculo, una película, un concierto, y que dieran en sus vidas mayor presencia a la cultura. ¿Puede un gobierno hacer algo al respecto? Muchísimo. Es la educación, no los subsidios, lo que puede crear un público más culto. Pero no sólo los maestros enseñan a leer, a oír buena música, a discriminar entre lo que es arte y lo que es caricatura. También las familias, los medios de comunicación, el entorno social en que cada ciudadano se forma. Y, qué duda cabe, la preservación del patrimonio es una responsabilidad central del Estado. Pero, incluso en este campo, es indispensable que los gobiernos involucren a la sociedad civil, mediante políticas tributarias que estimulen el mecenazgo y la acción cultural. El mayor número, no sólo los funcionarios, debe decidir dónde canalizar los recursos públicos y privados para promover la cultura. Pero la obligación primordial de un gobierno en este ámbito es crear unas condiciones que estimulen el desarrollo y la creatividad cultural y la primera de ellas es la libertad, en el más ancho sentido de la palabra. No sólo la libertad de opinar y crear sin interferencias ni censuras, sino también abrir las puertas y ventanas para que todos los productos culturales del mundo circulen libremente, porque la cultura de verdad no es nunca nacional sino universal, y las culturas, para serlo, necesitan estar continuamente en cotejo, pugna y mestizaje con las otras culturas del mundo. Ésa es la única manera de que se renueven sin cesar. La idea de "proteger" a la cultura es ya peligrosa. Las culturas se defienden solas, no necesitan para eso a los funcionarios, por más que éstos sean cultos y bienintencionados.
20.8.04
MENOS QUE ZERO
19.8.04
DER FREIER ALS ICH, DER GOTT
Du meines Herzens heiligster Stolz!
Leb' wohl! Leb' wohl! Leb' wohl!
Muß ich dich meiden,
und darf nicht minnig
mein Gruß dich mehr grüßen;
sollst du nun nicht mehr neben mir reiten,
noch Met beim Mahl mir reichen;
muß ich verlieren dich, die ich liebe,
du lachende Lust meines Auges:
ein bräutliches Feuer soll dir nun brennen,
wie nie einer Braut es gebrannt!
Flammende Glut umglühe den Fels;
mit zehrenden Schrecken
scheuch' es den Zagen;
der Feige fliehe Brünnhildes Fels! -
Denn einer nur freie die Braut,
der freier als ich, der Gott!
Der Augen leuchtendes Paar,
das oft ich lächelnd gekost,
wenn Kampfeslust ein Kuß dir lohnte,
wenn kindisch lallend der Helden Lob
von holden Lippen dir floß:
dieser Augen strahlendes Paar,
das oft im Sturm mir geglänzt,
wenn Hoffnungssehnen das Herz mir sengte,
nach Weltenwonne mein Wunsch verlangte
aus wild webendem Bangen:
zum letztenmal
letz' es mich heut'
mit des Lebewohles letztem Kuß!
Dem glücklichen Manne
glänze sein Stern:
dem unseligen Ew'gen
muß es scheidend sich schließen.
Denn so kehrt der Gott sich dir ab,
so küßt er die Gottheit von dir!
(Richard Wagner, Die Walküre, III Acto. Wotan despede-se da filha predilecta, a guerreira Brünnhilde, antes de a cercar por uma linha de fogo onde ela esperará, mergulhada num sono profundo, que alguém "mais livre do que o deus", Wotan, a liberte.)
A PRÓXIMA RODADA
18.8.04
COR-DE-ROSA
BOHEMIAN RAPSODY
(Queen)
DUPLA VÍTIMA
17.8.04
AFORISMOS
MUSEUS
16.8.04
MUNDOS
O "FUTURO"
15.8.04
VALE A PENA?
14.8.04
JURISTAS
13.8.04
A vaca
Jorge Sampaio, e o ministro de Estado e da Presidência (com a tutela da Comissão da Igualdade para os Direitos das Mulheres), Nuno Morais Sarmento, resolveram publicar ontem nos jornais duas redacções, talvez para mostrar que poderiam perfeitamente ter passado o 9.º ano. Bem sei que estamos na silly season, mas de qualquer maneira convém não exagerar. A redacção do Presidente da República versa sobre «O espírito dos Jogos Olímpicos e o nosso tempo», um assunto que de quatro em quatro anos milhares de professores com certeza sugerem na esperança desesperada de entreter as crianças. Sampaio, um aluno esforçado, fala da Grécia, fala de Roma, fala da «herança», não se esquece de uma notazinha patriótica e compara o Império Romano à União Europeia. Há frases como esta: «Se a democracia grega radica no "lógos", na razão política e no debate público entre os cidadãos e os seus representantes, já a matriz da civilização romana repousa na regra ou "jus".» Toda a gente pode ver que, embora confuso e muito ignorante, o rapaz «se interessa». Nota: 11. Morais Sarmento com outra ambição, e a propósito de uma «Carta» do Vaticano aos bispos da Igreja Católica, disserta sobre a «mulher». Sarmento acha a dita carta um «hino» à «maternidade» e explica com ardor a importância da «maternidade». Ele não considera a «mulher» inferior, de maneira nenhuma. Só não a considera «como um ser à parte, como se de uma peça se tratasse». Para ele, chegou a «hora» das «mulheres capazes de conciliarem a vida familiar e a vida profissional». Coisa que ele declara, não se percebe porquê, «um desafio fascinante». Sarmento ainda vai conseguir ser quase, quase um intelectual. Nota: 12. Com estes percursores não tarda aí uma redacção do primeiro-ministro A Vaca: «A vaca dá bifes. Eu cá gosto de bifes. A vaca dá leite. O leite dá manteiga. Eu cá gosto de manteiga. Eu cá gosto da vaca.»
(in Diário de Notícias de 13 de Agosto de 2004)
Segundo O Independente, o ministro dos Assuntos Económicos está à margem do núcleo mais restrito de decisão política do Executivo. Santana Lopes "despacha" com Morais Sarmento, Paulo Portas e Rui Gomes da Silva. Você pediu que estes cavalheiros mandassem em si? Eu não.
12.8.04
O Dr. Sampaio, numa daquelas prestações folclóricas que lhe são particularmente caras, andou embarcado na "Sagres". A viagem levou-o até aos Jogos Olímpicos, na Grécia, cuja abertura ocorre agora. No "caminho" escreveu uns "diários de bordo" que um jornal anda a publicar. Não os posso comentar porque, naturalmente, não me apetece lê-los: desde há uns tempos que deixei de levar a sério o que escreve e diz Sampaio. Levou, na embarcação, uns jornalistas e, de manhã na rádio, certamente inspirado pela maresia, debitou umas vulgaridades acerca dos "nossos atletas". Depois, num acesso feliz, recomendou que não se pensasse em realizar Jogos Olímpicos em Portugal, por manifesta falta de "infraestruturas". Mesmo embarcado, Sampaio não quis deixar de se pôr uma vez mais em sentido diante de Souto Moura, o nosso querido "Grande Inquisidor". Não fosse este ficar incomodado, Sampaio mandou emitir uma "nota" onde esclarecia que nada tinha a opôr à "nota" antes divulgada pelo primeiro sobre as "cassetes". Parece que, quando muito, Sampaio apenas "sugeriu" a Santana Lopes que recebesse a veneranda figura. E Lopes também lá se curvou respeitosamente perante o homem, em quem, aliás, "confia" plenamente. Não lhes ocorre, a um e a outro, que quem não confia minimamente neles, e tem manifesto "horror" aos "políticos", é Souto Moura, por eles, "políticos", escolhido. Com o seu sorriso enigmático, ele limita-se a agradecer, ao poder político democrático, a subserviência.
Nunca acreditei verdadeiramente no que quer que fosse. É muito importante. Não há nada que eu tenha levado a sério. A única coisa que levei a sério, foi o meu conflito com o mundo. Tudo o resto não é para mim mais do que um pretexto.
11.8.04
Um jornalista decidiu livremente e sem aparente consentimento dos visados, "gravar" as conversas, sobre o "caso Casa Pia", que manteve com entidades tão distintas como polícias, directores de polícias, magistrados, advogados, "vítimas", primos das "vítimas", "arguidos", primos dos "arguidos", curiosos dedicados e o inevitável Sr. Namora. No Burundi? Não, foi mesmo aqui, no "Portugal dos Pequenitos". O jornalista, por sinal de um prestigiado pasquim, "perdeu" as cassetes com as gravações, o que em português corrente e não jurídico, quer dizer que "foram roubadas". Graças às proezas da técnica e de outras artes humanas, as cassetes devem ter passado para um disco que se reproduziu aparentemente como os coelhos. Suspeito que, para além de mim e do meu cão, já praticamente toda a gente as ouviu. A cabeça do director da PJ rolou instantaneamente, com grande pesar público e exclusivo do CDS/PP, sabe-se lá porquê. Sempre original, o Dr. Souto Moura mandou fazer mais um "inquérito" para juntar aos mil que já instaurou sobre a "Casa Pia". E o primeiro-ministro, à falta de outra coisa mais interessante, decidiu "institucionalizar" as cassetes. Juntou-lhes o ministro da justiça e o PGR, agitou bem e falou ao país. Para quê? Para propôr mais um "pacto de regime", aquela coisa mole de que os governos se socorrem quando não sabem o que é que hão-de fazer, e para assegurar que tudo fique serenamente na mesma. Eu, dada a minha condição de semi pária, atrevo-me a dizer que Santana Lopes não pediu um "pacto de regime" sobre a justiça, já que, como ele deve saber, com as corporações não se brinca aos pactos. Elas não deixam. A inversa, porém, já não é verdadeira. As corporações, quando lhes convém, podem "brincar" às conversas de "pé de orelha" com jornalistas atrevidos, porque, elas e eles, são "irresponsáveis". Por isso, eu suspeito que Santana Lopes estava a propôr um "pacto" sobre as cassetes e não propriamente sobre a justiça. Neste lamentável episódio, que vai seguramente continuar, parece que ninguém soube estar, uma vez mais, à altura das suas responsabilidades e das respectivas "deontologias", profissionais e políticas. A esdrúxula intervenção do primeiro-ministro limitou-se a "fechar", por ora, o "círculo", um "círculo" apenas revelador de um irreprimível primitivismo.
10.8.04
A Sra. D.Maria Helena Adão, "secretária, 61 anos", de Lisboa, questionada pelo Público acerca da possiblidade de Carmona Rodrigues vir a ter um melhor desempenho na CML do que Santana Lopes, disse: "Não conheço o Carmona Rodrigues, por isso não sei o que se pode esperar. Quanto a Santana Lopes, acho que fez um bom trabalho na Figueira da Foz, onde passo muitas vezes. Acho que é uma pessoa simpática, bonita, com charme". Esta senhora tem futuro na "central de comunicação" que aí vem. Em apenas três qualificativos, resumiu brilhantemente todo o programa do governo.
9.8.04
Nesta data, há trinta anos atrás, Richard Nixon, o 37º presidente do Estados Unidos, renunciava ao mandato. Na véspera, à noite, dirigiu-se pela televisão aos seus compatriotas, anunciando a partida. Para trás ficava um mandato de cinco anos e meio e uma relação complexa, de um homem complexo, com a nação que o elegeu. Gore Vidal viria a escrever mais tarde: "nós somos Nixon, Nixon é o que nós somos". Oliver Stone, no filme homónimo, pôe Anthony Hopkins/Nixon, antes do fim, a contemplar o retrato de Kennedy, na Casa Branca, dizendo: "quando olham para ti, vêem o que eles querem ser, quando olham para mim, vêem o que eles são". A história pessoal e política de Nixon é a história de um percurso amargo, marcado pela luz e pela sombra, pelo ressentimento e pela dúvida, pelo sarcasmo e pela prepotência, pelo rasgo e pela banalidade. Nixon, como todos os homens que existiram para mudar qualquer coisa, era alguém profundamente contraditório. Kissinger, no filme, olhando a sua despedida, sussurra que o presidente "tinha os defeitos das suas qualidades". Kennedy, seu companheiro no Senado e que o derrotou na corrida para a presidência, não lhe perdoava a origem modesta e, à bom "menino-bem", dizia sempre que ele "não tinha classe". Nixon viveu em permanente angústia por não ser completamente um "deles", visto por ali como um arrivista com alguma sorte. Sofreu as maiores derrotas e as maiores humilhações, e voltou sempre com aquele seu famoso sorriso automático onde muitos viam um sinal de hipocrisia. Nixon, que abriu os EUA ao "desanuviamento" com a China e a URSS, que criou um departamento ambiental, e que, em quatro longos anos, acabou com a guerra no Vietname, saiu derrotado pela sua pusilanimidade, à conta de um arrombamento vil contra um político menor e inofensivo, McGovern. Nixon obteria, na reeleição, uma das mais expressivas vitórias na corrida à Casa Branca. Mais do que o assalto ao Edifício Watergate, o que os "States" puritanos não perdoaram, foi, uma vez mais, o perjúrio. A sua terrível insegurança crónica levou-o ao maior dos disparates, a gravação das conversas na Sala Oval. Grandeza e fatalidade andaram sempre de mãos dadas durante a vida política activa de Richard Nixon, um homem acossado pelas suas origens e notoriamente um mal-amado. Quis, na mensagem final, deixar uma mensagem de paz, algo a que se tinha proposto quando começou, em 1969. No dia 9 de Agosto de 1974, manhã cedo, reuniu o "staff" da Casa Branca e a família para se despedir. Falou dos seus pais "trabalhadores", dos seus irmãos mortos pela tuberculose e lembrou que a "grandeza não surge quando as coisas nos correm sempre bem, ela aparece quando se leva umas pancadas, quando ficamos desapontados, quando a tristeza nos invade, porque só se estivermos no vale mais fundo, é que vamos depois poder apreciar o esplendor de estar na mais alta das montanhas". Dito isto, dirigiu-se ao helicóptero que o levou de volta para a sua mansão na Califórnia, agitando com o braço um imenso adeus.
8.8.04
Na perfeita inutilidade que é a minha presente fase, deixei passar a data do desaparecimento de Norma Jean Baker, mais conhecida por Marylin Monroe. O Abrupto lembrou-se e citou Noel Coward a propósito. Eu cito Norman Mailer. É o mais belo epitáfio que conheço.
Norman Mailer, Marylin
Para evitar "problemas de comunicação", o governo vai criar uma "central" da dita. Essa "central" deve velar pela uniformidade da "mensagem" da acção governativa, ou seja, deve evitar que alguém, lá de dentro, se solte excessivamente. Passar tudo pela "central", é aparentemente o objectivo do exercício. Incluí sondagens, estudos de opinião, "impactos", enfim, tudo o que tem a ver com a "imagem", uma especialidade Santana. Ao pé disto, a conhecida "obra" em outdoors, efectuada em Lisboa, vai parecer coisa pequena. Por detrás de projecto estará naturalmente uma empresa e, seguramente, uma empresa bem contratada. Sob a alçada do ministro da presidência, a empresa garantirá a "integridade" do ofício. Sucede que, neste governo, para além deste ministro, um especialista na matéria, há a sua "cabeça de Janus", Santana e Portas. As relações políticas entre o primeiro-ministro e o seu ministro da presidência não são reconhecidamente fortes. Portas, por seu lado, não dispensa o seu one man show. As "informações" e as "contra-informações" a debitar para a "central" vão ser, pois, muitas e divertidas. Não tenho certeza que interesse demasiado ao "povo" saber o que se passa, ou não passa, na "casa de Santana". Aos "interessados", interessa naturalmente. A "venda" do produto, o bom e o estragado, a menos de dois anos de vista, precisa de "coordenação", o novo nome de uma velha conhecida, a propaganda.
6.8.04
Nunca conheci quem tivesse levado porrada.
Todos os meus conhecidos têm sido campeões em tudo.
E eu, tantas vezes reles, tantas vezes porco, tantas vezes vil,
Eu tantas vezes irrespondivelmente parasita,
Indesculpavelmente sujo,
Eu, que tantas vezes não tenho tido paciência para tomar banho,
Eu, que tantas vezes tenho sido ridículo, absurdo,
Que tenho enrolado os pés publicamente nos tapetes das etiquetas,
Que tenho sido grotesco, mesquinho, submisso e arrogante,
Que tenho sofrido enxovalhos e calado,
Que quando não tenho calado, tenho sido mais ridículo ainda;
Eu, que tenho sido cómico às criadas de hotel,
Eu, que tenho sentido o piscar de olhos dos moços de fretes,
Eu, que tenho feito vergonhas financeiras, pedido emprestado sem pagar,
Eu, que, quando a hora do soco surgiu, me tenho agachado
Para fora da possibilidade do soco;
Eu, que tenho sofrido a angústia das pequenas coisas ridículas,
Eu verifico que não tenho par nisto tudo neste mundo.
Toda a gente que eu conheço e que fala comigo
Nunca teve um acto ridículo, nunca sofreu enxovalho,
Nunca foi senão príncipe - todos eles príncipes - na vida...
Quem me dera ouvir de alguém a voz humana
Que confessasse não um pecado, mas uma infâmia;
Que contasse, não uma violência, mas uma cobardia!
Não, são todos o Ideal, se os oiço e me falam.
Quem há neste largo mundo que me confesse que uma vez foi vil?
Ó príncipes, meus irmãos,
Arre, estou farto de semideuses!
Onde é que há gente no mundo?
Então sou só eu que é vil e erróneo nesta terra?
Poderão as mulheres não os terem amado,
Podem ter sido traídos - mas ridículos nunca!
E eu, que tenho sido ridículo sem ter sido traído,
Como posso eu falar com os meus superiores sem titubear?
Eu, que tenho sido vil, literalmente vil,
Vil no sentido mesquinho e infame da vileza.
Álvaro de Campos
A contagiante originalidade deste governo em matérias de posse, já chegou a uma direcção-geral. Horas antes da tomada de posse do novo director nacional da PSP, da parte da tarde, dois membros da anterior direcção souberam, da parte da manhã, que iam ser removidos. À pressa, arranjou-se uma senhora, presumivelmente conhecida do novo director, e um superintendente-chefe em estado de permanente disponibilidade. Pobre polícia.
5.8.04
F. Scott Fitzgerald, The Crack Up, trad. de Aníbal Fernandes, Hiena Editora