23.12.07

POSTAIS DE NATAL - 1

As arcadas da Praça do Comércio, em Lisboa, são o derradeiro refúgio de muitos sem-abrigo. Homens e mulheres de qualquer idade dormem ali, embrulhados em cartão ou, com alguma sorte, num edredão para dois. "Deitam-se" cedo, como pude verificar esta semana quando me encaminhava, ao princípio da noite, para a nova estação do metro, no Terreiro do Paço. De dia, andam por ali de olhos postos em lado nenhum. Não imagino como reagem à Praça aberta aos domingos ao caprichismo demagógico do dr. Costa. Esta gente foi expulsa da vida e não possui quaisquer ilusões sobre a "humanidade". O Filho do Homem nasceu e viveu na maior pobreza material e na maior riqueza do coração. Maria e José bateram a várias portas e ninguém os acolheu. Foi num estábulo, dentro de uma gruta, longe dos homens, escondido e perseguido, que Deus surgiu menino. E esse Menino que emerge amanhã dentro do coração de cada um de nós, nada tem a ver com o materialismo desenfreado associado ao "natal" transformado em centro comercial. Levar o Menino Deus junto daqueles que perderam toda a esperança Nele e no homem, é cumprir a verdadeira mensagem do Natal. "Ele está no meio de nós" quer dizer isso mesmo: intransigência na esperança e na fé, contra o mundo, a frivolidade e a morte. A lição do Menino da gruta é a maior lição de vida destes dias. O resto é lixo.

11 comentários:

Anónimo disse...

A condição da gente de que fala é muito pior da dos pais de Jesus Cristo. Estes eram pessoas normais com uma vida normal, julgo eu. E suspeito que o mundo de hoje tenha aspectos mais desumanos que o mundo de há 2000 anos. Não acredito que há 2000 anos houvesse tanta gente completamente perdida no mundo como agora. Talvez me engane.
Às vezes pergunto-me: se Jesus Cristo regressasse, como se exprimiria? Num movimento político? Numa nova igreja? Num blogue da Internet?
Quem o ouviria? Se calhar temos de esperar só pelo Apocalipse.

Maria Lua disse...

João,

só para desejar um Feliz e Santo Natal.
Que o menino Jesus traga muito amor, esperança e paz, ao coração cansado e dolorido da Humanidade.


Em nome dos que choram,
Dos que sofrem,
Dos que acendem na noite o facho da revolta
E que de noite morrem,
Com esperança nos olhos e arames em volta.
Em nome dos que sonham com palavras
De amor e paz que nunca foram ditas,
Em nome dos que rezam em silêncio
E falam em silêncio
E estendem em silêncio as duas mãos aflitas.
Em nome dos que pedem em segredo
A esmola que os humilha e os destrói
E devoram as lágrimas e o medo
Quando a fome lhes dói.
Em nome dos que dormem ao relento
Numa cama de chuva com lençóis de vento
O sono da miséria, terrível e profundo.
Em nome dos teus filhos que esqueceste,
Filho de Deus que nunca mais nasceste,
Volta outra vez ao mundo!

Ary dos Santos

joshua disse...

Caríssimo João,
falas do ápice do paradoxo que hoje vivemos: o Natal da Condescendência Divina em fazer-Se Um de nós celebra-se no apagamento estratégico do Nome de esse mesmo Deus (com o qual melhor se calque a dignidade de cada homem) e celebra-se na estragação esbanjadora mais obscena.

É um tempo de corações pesados de mais para ascender. O sobressalto da morte apanha muitos a arrotar abusos, insensíveis, impreparados para a Catabática Luz.

De resto, apesar da descaracterização, para ti os meus votos de um Natal Feliz,
sem barbas, sem tretas,
sem capuzes ridículos e ho,ho,ho's importados,
um Natal só com sentimentos resplandecentes,
a noção da nossa mortalidade provisória,
a noção da nossa fragilidade transcendente,
cheia de Fome e Sede de Divindade Aqui e Agora, PARUSIA,
a noção magnífica de como é importante NASCER
E TER NASCIDO e como isso é que é civilizacional
ao contrário do que enuncia a socretinidade vigente, essa clareira de Merda tão prontamente Aplaudida no seu Nulo.
(Perdão pelo desabafo!)

Enfim,
um Natal Ele Mesmo.

Entre trabalhos e gripes, sem saldos em lado nenhum nem em coisa nenhuma,
na grande luta pela sobrevivência
e por Justiça e por anti-carneirismos
e anti-jumências,
este que nunca te esquece, numa tácita e cúmplice amizade pelo ano fora!


joshua

PALAVROSSAVRVS REX

Anónimo disse...

Bravo!

Confesso que não aprecio muitos dos seus posts sobre religião ou sobre a Igreja pois acho-os, as mais das vezes, carregados de beatice. No entanto, tenho que reconhecer que este foi um dos melhores posts que já li no seu blog.

Bem haja.

Um Feliz e Santo Natal.

Anónimo disse...

E era tão fácil de resolver.
O drama dos sem abrigo.
Ou no mínimo de remediar.

«Se o Natal fosse tomado a sério, os pobres não eram pobres»,
no cartão de boas festas de um amigo da Igreja.

Anónimo disse...

NATAL

"Natal de quê?
Natal de quem?
Daqueles que não o têm?"

Jorge de Sena

Anónimo disse...

NATAL

Hoje é dia de Natal.
O jornal fala dos pobres
em letras grandes e pretas,
traz versos e historietas
e desenhos bonitinhos,
e traz retratos também
dos bodos, bodos e bodos,
em casa de gente bem.
Hoje é dia de Natal.
- Mas quando será de todos?

Sidónio Muralha

Anónimo disse...

se o sol quando nasce é para todos, o menino, escurraçado, com mãe prenhe, das hospedarias da época, também veio aos seus, todos nós, «e os seus não o conheceram», mas aos simples, que, como os pastores das imediações de bethlhem, o conheceram, deu-lhes o poder de serem chamados «filhos livres de deus»...mais, acrescentou-nos neste último tempo com o consolador que nos revelará toda a ciência - pra lá da que ele ensinou aos seus amigos. achamo-lo de muitas maneiras. q vela connosco e todos suaviza. é um homem vivo como vivos nós. não tem nenhuma teoria ou panaceia em venda, deu, vivido e morrido e ressurto, o Mandamento Novo, Amigo é, e não exclusivo de capelas, nasceu - PARA TODOS - COMO O SOL DE HOJE!

Anónimo disse...

Desejo um Feliz Natal para todos e em particular para o mentor deste excelente "blog", João Gonçalves.
E que 2008, que não parece tazer nada de bom, passe muito depressa ...

ochoa disse...

Escancarei corações aO Menino Deus, a que Ele nasça em vós. Dai-Lhe o amanhã, Ele vos dará Seu Amanhã Sem Fim...

Anónimo disse...

Há quatro ou cinco meses que não voltava a Lisboa e pude constatar, durante este Natal, que a cidade está cheia de gente sem-abrigo. Aliás, fiquei com a sensação que vi mais mendigos que outra espécie de gente. Aliás, onde é que param os Lisboetas? Em Cascais, sei lá? em Alfragide?