25.6.05

PERDAS E GANHOS

Todos os "comentadores" esperaram pela apresentação do orçamento rectificativo na sexta-feira. O governo, na senda do silêncio pedagógico que constitui o seu modo mais conhecido de falar, aguardou a chegada da noite e, cerca das 22 horas, entregou o dito orçamento na Assembleia da República. Nada disso impediu que alguns serões televisivos fossem preenchidos a "analisar" o documento e as suas propostas. A crédito do governo fica, aparentemente, a coragem de defender um diploma sem travestismos nem fórmulas mágicas. Ou seja, como tem sido amplamente divulgado, se não se fizesse nada, o défice rondaria os 6,8% no final do ano. Com as "medidas" que o orçamento rectificativo contempla, prevê-se uma redução de cerca de 0,6% nesse défice. Conta-se ir diminuindo até 2008, altura em que não seriam ultrapassados os miríficos 3%. Acontece que, por causa destes escassos zero vírgula seis, o governo e o PS andam por aí a ser impiedosamente chamuscados. Não teria sido preferível - já que tem que ser feito, e o governo e o PS inevitavelmente chamuscados- fazer "o mal" todo de uma vez e, preferencialmente, bem feito? Perpassou de imediato a ideia de que é demasiada "parra" para tão pouca "uva", sobretudo à custa do aumento do IVA a partir de Julho. É que nada ou muito pouco vai ajudar daqui em diante. O preço do petróleo, o impasse europeu, a má gestão do "dossier" autárquico, a excitação corporativa, a ansiedade da opinião pública e a necessidade de sobrevivência da que se publica, tudo isto resulta numa mistura explosiva que rebentará, mais tarde ou mais cedo, à porta de Sócrates. E Sócrates está exactamente como Barroso no início, com a diferença que este tinha uma ministra das Finanças com maior "autoridade" política. Como demonstra um estudo do Instituto de Ciências Sociais, coordenado por António Barreto e divulgado esta semana na Casa de Mateus, o eleitorado move-se por objectivos de curto prazo, o que justifica o que assistimos desde Dezembro de 2001 até ao último 20 de Fevereiro em matéria de resultados eleitorais. Não foi nada de excessivamente "profundo" que concedeu a maioria absoluta ao PS há uns meses (a deriva "santanista" e a falta de confiança no PSD e no governo, no essencial). Cada vez mais pesa a contingência no modo de decisão do "povo". O governo tem de contar com ela, sem abdicar de exercer a autoridade democrática, com sentido de oportunidade e de utilidade. Só assim estará apto a perder muito provavelmente as eleições autárquicas e as presidenciais sem, por isso, perder a razão ou o poder.

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