Talvez por causa do calor, fui dar praticamente a mesma volta nocturna que fazia com o meu cão. Um pouco como Mr. Glover, do livro da foto. «O Patrick era o cão do Mr. Bouhan. Mr. Bouhan costumava dar-lhe uísque Chivas Regal. Eu passeava o cão e também era o barman do cão. Mr. Bouhan disse que depois de ele morrer me iam pagar dez dólares por semana para tomar conta do Patrick. Escreveu isso no testamento. Eu tinha de o passear e de lhe comprar o uísque. Quando o Patrick morreu, fui ter com o juiz Lawrence. O juiz era o executor testamentário de Mr. Bouhan. Disse-lhe: "Senhor juiz, pode deixar de me pagar os dez dólares agora porque o Patrick morreu." E o juiz Lawrence disse: "O que é que quer dizer com isso de o Patrick ter morrido? Como pode ser? Eu vejo-o ali. Ali mesmo, em cima da carpete." Olhei para trás e não vi cão nenhum. Mas, depois, pensei durante um minuto e disse: "Acho que também o estou a ver, senhor juiz." E o juiz disse: "Óptimo. Continue a passeá-lo que nós vamos continuar a pagar-lhe." O cão já morreu há vinte anos mas ainda o passeio. Subo e desço a Bull Street, olho por cima do ombro e digo: "Anda lá, Patrick."
4 comentários:
Dez dólares por semana faziam-me jeito, a mim que levo a passear todo o canil de Gaia e dou aos bichos todos os postes, todo o whisky e todos os pneus urináveis da Cidade.
Não é só Mr. Glover que é Mr. Glover.
Sou bem mais real e não fuckson (ficção) e além disso nunca recebi um cêntimo por semana por levar à sagrada excreção nocturna todos os cães imaginários de todos os milionários loucos demasiado tarde sepultados.
Quando escrever mais posts deste genero, ponha-lhes tambem por cima o titulo "Grandeza" que utiliza para os videos de musica.
Ja agora, gostou do alfarrabio de Hamsun? ou anda por ai armado em met'nojo e ainda nao teve tempo ou paciencia para ler?
Um abraco.
Sim, eu sei que é uma referência a um livro mas também é um post sobre a saudade, ou melhor a falta. Porque a saudade ganha-se em encontros sucessivos e dá-nos momentos de alegria; a falta faz-nos crescer um vazio e uma melancolia. Outro cão fazia-lhe bem. Não, não é para substituir. Os vazios não se preenchem. Mas vai encontrar outro espaço para preencher.
Pois é, Ana, quem uma vez teve um cão vai ter que ter um cão sempre.
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