12.8.09

ALHEIRA DE BACALHAU?


Passado o pequeno tumulto causado pelo tecido azul e branco, coisas mais importantes e saborosas. Há quem tivesse inventado a "alheira de bacalhau", uma contradição nos termos. É como se, de repente, a "direita amiguinha" viesse finalmente assumir que Sócrates merece ficar porque, apesar de não ser uma alheira verdadeira, sempre é uma alheira só que de bacalhau. Mas adiante. O Virgílio, gastrónomo de fino gosto e transmontano descomplexado, explica a coisa. «Por que não se chama ao produto “enchido de bacalhau”? Já temos tantos movimentos de destruição cultural que nos faz pena que seja o último local expectável, Mirandela, a desenvolver esta diatribe. Tive o prazer de saber que um grande restaurante, e de gabarito, depois de entender que a questão é cultural – a nossa herança –, alterou a designação de alheira de bacalhau para enchido de bacalhau. A Tradição Portuguesa, e eu, agradecemos e aplaudimos o gesto. Comam o enchido de bacalhau, mas não lhe chamem alheira.» E siga-se o conselho de Raul Teixeira a Abel Salazar por carta de 26.10.34 : “Por este correio segue, dirigida à Senhora sua Irmã, uma encomenda com tabafeias, que é como se chamam as alheiras a que ahi dão foros de especialidade bragançana. Essas alheiras teem tanto de Bragança como eu de santo. A especialidade d’aqui – convém acentuar, para que a História o registe – é a tabafeia. Na altura competente mandarei ao meu Ex.mo Amigo aquilo que não é especialidade de Bragança, mas que constitui um bom acepipe, que Brillat-Savarin apreciaria sibaritamente: o salpicão, manjar este que V. Ex.a ainda durante este inverno há-de comer, querendo Deus e os homens, à lareira desta sua casa. Primum vivere, deinde philosophare. Isto é, traduzido em vulgar: - depois da comesaina, a Arte.» Finalmente coma-se a alheira, a genuína, como deve ser. «Habitualmente servem-nos a alheira frita, à qual depois retiram a pele, acompanham com batata frita e ainda colocam um ovo estrelado. Ninguém em Trás-os-Montes come alheiras assim preparadas. Também não se comem, naturalmente, durante o Verão. Fui habituado a comer a alheira, como prato principal, preparada em cima de uma frigideira sem gordura. A alheira é então picada e a sua própria gordura é expulsa. É essa gordura, e se vai mantendo na frigideira, que vai ajudar a cozinhar a alheira. Quando a alheira rebenta, e aqui está medo dos restaurantes que acham destruída a apresentação, é para mim um prazer pois aquela massa que se solta vai ficar estaladiça e constitui, para mim, o melhor da alheira. Depois sempre acompanhada com grelos. Ou cozidos, ou salteados com um pouco de azeite e alho. Como petisco é só colocá-la sobre chapa grelhadora ou grelha em lareira, virá-la para cozer em toda a volta, e depois cortá-la aos pedaços.»

Foto: Alheiras, de Jacinta Fernandes

4 comentários:

Mani Pulite disse...

Dizer que a direita "amiguinha" é como a alheira de bacalhau é um insulto à alheira e ao bacalhau,produtos nobres.Esses "amiguinhos" do Sócretino são mais miolos fingidos,aquilo que lhes enche a caixa.

ana disse...

picada, numa frigideira sem gordura e se o lume estiver no mínimo nem rebenta, mas leva aí uma hora a fritar (experiência de transmontana)

Anónimo disse...

Caros Amigos:
Desde que comecei a ter passado(talvez três ou mais anos, já via fazer ALHEIRAS(recheio:toda a carne do porco(a) que não fosse para fazer outras especialidades).Eram acrescentadas outras carnes, entre elas "aves de pena" e animais de caça.A categoria das verdadeiras alheiras era o seu conteúdo.Haveria muito mais para acrescentar... A maneira mais deliciosa de as preparar, era numa lareira transmontana, onde foi antecipadamente feito um "braseiro" adequado...Só faltam os grelos e as batatas que, depois de cozidos eram refogados em azeite com alho...
Estou com água na boca...Por amor a DEUS, não ofendam as genuínas ALHEIRAS!Arranjem outro nome que não ofenda os porcos, e os outros animais que as recheiam... O bacalhau nem é português, deve ser norueguês...inventem outro nome.
Estas memórias são de uma aldeia transmontana, para onde vou na sexta-feira:CORTIÇOS-MACEDO DE CAVALEIROS.Um comentário marginal:uma aldeia linda com história, antes e depois do 25 de Abril, mas neste momento deserta!
Até amanhã! Até sempre! Júlia Príncipe

Sr. Caralho disse...

Também chamam Engenheiro ao Sr. Sócrates e há quem se ofenda e quem não se ofenda cambada de intelectuais de merda deixem os homens vender as alheiras de bacalhau e quem não quiser que não coma, foda-se