1.7.07

O FIM DAS NOITES LONGAS


Constou-me que fecha este domingo o B'Leza. Antes de ser o B'Leza, foram as "noites longas" do Largo do Conde Barão. Tratava-se de um clube de bairro que foi adoptado, por assim dizer, pela "pós-modernidade" (originariamente, o Casa Pia Atlético Clube). Foi aí, em meados dos anos oitenta, que, encerrada a fase da "fragilização" - do Frágil, de Manuel Reis - passou a ser chique acabar a noite em Santos. Gente fashion que se prezasse, frequentava aquelas noites. Em algumas delas, havia "fila" e eventos. O senhor dessas "noites" era o "Zé da Guiné", uma personagem devidamente apaparicada por muita rapaziada que hoje escreve nos jornais, que dirigiu revistas, que escreveu livros e que acabou em cargos institucionais como, por exemplo, assessores de chefes de governo. Como tantas outras criações destes "criadores", o "Zé" desapareceu nas brumas do circunstancialismo, tragado pela voragem daquilo que não foi feito para durar. Há poucos anos corria um peditório porque o "Zé" - e, nessa altura, ser conhecido ou "amigo do "Zé" era uma espécie de passaporte, tal como se devia ser da "Guida Gorda" ou do "Pedro", no Alcântara Mar - estava na miséria. A "Guida Gorda" virou a senhora D. Margarida Martins, alguém que dispensa apresentações dentro do regime. Do "Pedro", nunca mais ouvi falar e, entretanto, também o Alcântara Mar se finou. Fui cliente das "noites longas" e recordo-me de, uma noite, com não sei quem, ter vindo a pé desde Santos até ao Marquês de Pombal para apanhar um táxi. Deixei-me de noites, curtas ou longas, há muito tempo. Só raramente saio, e apenas para jantar. Foi o caso desta, em Ponta Delgada. O Campo de São Francisco, a praça onde Antero pôs termo aos seus dias, está cheio de barraquinhas. Nem uma sequer vende bebidas da região. Fui forçado a contentar-me com "caipirinhas" - uma bebida "típica" de qualquer lado - e em ver adolescentes (a maior parte deles e delas, todos "betinhos", suspeito que menores de dezasseis anos) a emborcar o quíntuplo do que eu bebi, entre shots e outras porcarias imperceptíveis. A noite, seja em que lugar for, perdeu a graça e ficou entregue ao "Kindergarten". O bairro de Santos, aliás, está transformado num campo de batalha das criancinhas, em tudo idêntico ao agora montado em São Francisco. A "noite do mundo" - uma expressão de Hegel que deu título a um livro de Eduardo Prado Coelho - também ele um cliente daquelas noites no Atlético Clube, desapareceu. O B'Leza encerra um ciclo das noites de Lisboa que, por seu turno, já tinha desaparecido há muito. O que existe, seja em que sítio for e seja com quem for, é demasiado indistinto e indiferente para ser verdadeiro.

3 comentários:

San disse...

Numa das muitas noites longas que passei na Rua de S. Paulo, nos idos de 80, lembro-me de estar junto à janela com um amigo holandês e de este ter comentado quão fantástica era esta cidade em que havia eléctricos a funcionar a noite toda, tal como a festa. Lá lhe expliquei que a noite já tinha escorrido, imperceptivelmente, entre danças, bebida e conversa a rodos, e que aquele nem sequer era o primeiro eléctrico do novo dia!

Anónimo disse...

Pois é... a década dos "vintes" já passou há muito tempo...
Agora, meu caro J.G., resta-lhe o saudosismo desse tempo em que era jovem...
De qualquer forma nada justifica esta sua de "velho dos marretas", que tão bem ilustra neste blog (digo "velho dos marretas" para não dizer "velho do restelo")!!!
Com consideração, amizade e a memória dos anos oitenta,
JM

Anónimo disse...

boas recordações tenho do "Noites Longas" e até dos dias de praia com a "Guida Gorda" e restante pessoal... Obrigada pelas lembranças!