29.4.11

«COMPROMISSO NACIONAL»*


«Os quatro presidentes da República, para celebrar o "25 de Abril", vieram pedir aos portugueses nada mais, nada menos do que um "compromisso nacional". E o dr. Cavaco pareceu exigir (ou exigiu mesmo) um governo maioritário para depois do 5 de Junho. Dada a natureza angélica destas quatro entidades, é difícil compreender se estavam a falar a sério ou se conversavam directamente com o Altíssimo, porque em si própria a proposta não passa de uma piedade pretensiosa e estúpida. Não há maneira de garantir um "compromisso" entre os portugueses, nacional ou outro, no estado a que o país chegou, a não ser pela força; e não há maneira de misturar (ou fundir) o que é claramente e proclamadamente incompatível, a não ser que de princípio se desista de qualquer espécie de unidade de acção. Mas não importa. Os catequistas do entendimento patriótico não querem mudar o mundo. Querem com a modéstia que sempre os distinguiu um única coisa: que o PS não fique na oposição. Porquê? Porque gostam dele? Não. Porque têm medo que o PS um dia destes venha para a rua com o PC e o Bloco e com a gente que por aí anda na maior miséria. O "compromisso" nacional não se destina a estabelecer a fraternidade e o sossego entre a populaça. Ao que se destina é a isolar a extrema-esquerda e a privar o presumível descontentamento com as medidas do FMI e da "Europa" de uma cabeça política eficaz. Daí que ninguém se atreva a sugerir uma segunda Aliança Democrática: puro anátema para os crentes e quase uma provocação para o PS. Os presidentes não gostam disso. Nem os "negócios", nem a "burguesia", nem a "alta classe média". Antes de tudo, ordem e sossego. O PS precisa de entrar na sopa turva do poder. Ou directamente, fazendo parte do governo; ou indirectamente, estabelecendo um pacto parlamentar, público e solene, com o PSD. Esse pacto amarraria o PSD à vontade do eng. Sócrates (se ele se recusasse a sair de cena), não permitiria nenhuma reforma de substância (no ensino, na saúde, no funcionalismo ou na justiça) e deixava manifestamente o PS em boa posição para nos voltar a pastorear. O "compromisso nacional" não passa de um artifício (ou de uma tentativa) para influenciar os resultados do 5 de Junho, antes do 5 de Junho. Irá com certeza acabar na balbúrdia e na paralisia. Mas nunca Portugal assistirá às cenas lamentáveis que vimos na Grécia. Os presidentes são sábios.»

*Vasco Pulido Valente, Público

6 comentários:

Anónimo disse...

"Os presidentes são sábios"; e cada um a seu tempo - quer no governo ou na presidência - conviveu confortavelmente, e de forma bonacheirona, com todos os desvarios, incompetências e crimes que nos trouxeram aqui. E até deles beneficiaram; pelo menos os seus partidinhos beneficiaram de certeza. A não ser para Cavaco, o Cavaco 'recente' dos dois últimos anos, a insustentabilidade e o abismo a desenhar-se e a aproximar-se de nós a toda a velocidade, escapou candidamente e de forma "sábia" a todos os outros. Eanes tem alguma desculpa porque é um tipo à parte e já presidiu há muito tempo - e viu Sá Carneiro ascender, desaparecer o Conselho da Revolução, duas intervenções FMI, a adesão-à-merda-da-europa-cee e a perda de Independência de Portugal.
Uma sociedade assim pastosa, cobarde e corrupta merece é uma ditadura.

Ass.: Besta Imunda

Bmonteiro disse...

Com Eanes, ninguém aprendeu, ou fez por isso.
A desligar a luz quando saía do gabinete, maus hábitos de micro-economia cultivados no anterior regime.
Dos seguintes, do 'fundador' e mãos largas Soares ao distinto e mole Sampaio, a pastorearem o regime, aí temos agora o resultado à vista.
Alguém de fora, para apagar a luz.

MINA disse...

VPV é incisivo neste artigo em que analisa o "compromisso nacional" com alguma ironia. Só não estou tão certo que os portugueses não acompanhem os gregos naquilo a que VPV chama "cenas lamentáveis". Depende das medidas de austeridade que venham a ser adoptadas. É que me parece que os portugueses, que até são "bem comportados", já estão fartos.

Cada povo estúpido tem o seu bode expiatório! disse...

Muita parra e pouca uva.

Todo o santo dia os tugas vomitam análises e soluções.

Mas de dia para dia o país vai afundando-se.

Os mais descarados dizem que a culpa é do tonto do Sócrates!!!!

E esta, heim?

joshua disse...

Clarificação total e brutal e punição exemplar do socratismo: não espero outra coisa, embora tema que tudo fique na mesma.

Tenho tudo a temer do controlo informático dos resultados eleitorais, dadas as imparidades verificadas nas Presidenciais, uma vez que ninguém rasgou as vestes pelo ultrage. Espere-se o pior.

Anónimo disse...

Portugal é uma bolha muito maior que a Grécia, por isso "cenas lamentáveis" irão acontecer.
Quanto aos Presidentes caídos em desgraça, não se poderia ter reunido gente mais responsável pela ruína do País, pois uns deles incentivaram os loucos e outros deixaram-nos à solta.
São faltou aos Presidentes caídos em desgraça dizer que agora as eleições são de braço no ar e instituir uma câmara corporativa.


lucklucky