18.8.03

SADE

A RTP 2 passou ontem o filme Pier Paolo Pasolini, Salo ou os 120 dias de Sodoma. Como toda a obra de Pasolini, Salo é um filme cruel, com muita poesia lá dentro e eventualmente um pouco datado. Adapta a obra de Sade à Itália fascista, criando um micro-universo de violência e de orgia pela orgia, com abundantes referências literárias pelo meio (Baudelaire, Nietzsche, Blanchot, Barthes etc). Sade, ao contrário do que uma percepção superficial e analfabeta possa fazer supôr, é um grande escritor. Resmas de ensaios, de penas insuspeitas, têm sido escritos em torno da sua obra e figura. Limito-me a convocar um pequeno livrinho de Octavio Paz, Mais do que Erótico: Sade, editado pela Difel. Donatien Alphonse François, o Marquês de Sade, brilhante devasso e talentoso libertino, passou a maior parte da sua vida na prisão, vítima de inimigos pessoais e políticos. A Bastilha foi a sua residência por muitos anos, e esteve ainda lá encarcerado no Verão da Revolução, em 1789. Uns dias antes de a populaça irromper pela Bastilha, Sade atirou pela janela da prisão uns panfletos escritos à mão onde descrevia as degradantes condições prisionais a que estava sujeito. Depois dirigiu-se à multidão recorrendo a uma espécie de megafone artesanal. Após ter sido solto, foi eleito como que presidente da sua "junta de freguesia" e iniciou uma campanha anti-religiosa que ajudou a radicalizar a Revolução. Foi, porém , um opositor ao "Terror" que se seguiu. Quando os seus amados sogros - que foram responsáveis pelos muitos anos que passou na prisão - foram levados perante ele como contra-revolucionários, Sade opõs-se a que fossem executados. Por este "acto de clemência", os “ultra” Jacobinos prenderam-no, por se ter revelado um “moderado”, e foi condenado à morte. Ficou mais um ano na prisão, aguardando a guilhotina. A libertação chegou com o fim do "Terror", e os seus poucos anos de liberdade foram passados na mais terrível pobreza. Quando Napoleão chegou, Sade não resistiu a escrever uma sátira sobre o pequeno-grande homem, e como resultado, foi condenado a passar o resto da sua vida num asilo para doentes mentais. Respeitinho é que era preciso...

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