INFORTÚNIOS DA VIRTUDE
O primeiro-ministro de Timor Leste disse que vai escrever uma carta a Durão Barroso acerca do "incidente " Maggioli Gouveia. Acrescentou que, malgré tout, continuamos muito amigos e fraternos. Eu não queria dizer nada sobre isto por dois motivos. O primeiro, o humano, por consideração pela família de Gouveia, que andou 28 anos de incerteza em incerteza quanto à localização do corpo e quanto ao verdadeiro desfecho da sua infeliz saga. O segundo, pelo assunto "Timor", tão mal explicado nestes anos de Democracia e tão rapidamente embrulhado em desfiles e festas, depois de 1999. Acontece que as fotos que ilustravam a cerimónia oficial nos mostravam invariavelmente um ministro da Defesa compungido e beato, ajoelhado em frente ao sarcófago do ex-militar. De alguma forma, naquela cerimónia exorcizavam-se ao mesmo tempo dois tipos de infortúnio. O de Maggioli Gouveia, que num gesto singular, largou tudo - até o código de honra militar - em nome de uma sua visão das coisas em Timor e em Portugal, naquele fatídico momento de abandono geral. Por isso sofreu, foi preso e torturado e, finalmente, assassinado. E o de Paulo Portas, cuja relação com os militares está fragilizada pelos tropismos discursivos e pelas encenações mediáticas vazias, a que associou agora uma oportuna genuflexão, gesto que cai sempre bem na Igreja e nas fotografias. Infortúnios da virtude...
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